Acórdão nº 512/11.0TBTMR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDO MONTEIRO
Data da Resolução23 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: E (…) – Sociedade de Prestação de Serviços, Lda., CM (…) e MI (…)deduziram oposição à execução, alegando, em síntese: Não receberam as cartas de 22.9.2010 e 14.03.2011, com vista à sua notificação para efectuarem o pagamento das prestações em dívida e para a resolução do contrato celebrado; O Banco vinha gerindo dinheiro e aplicações financeiras dos executados, autorizado por estes; Se, em dado momento, os executados deviam ao exequente € 159.054,29 e o banco recuperou pela gestão referida € 389.762,03, a dívida ficou saldada.

Não podia o banco resolver o contrato, o que configura um abuso de direito.

O Banco I (…) SA, contestou e em síntese: Os executados não recepcionaram as cartas mas deve considerar-se que têm conhecimento do seu teor; O banco não se responsabilizou pela gestão de qualquer activo dos executados; apenas permitiu, pontualmente, que valores vencidos emergentes do contrato de mútuo fossem retirados de uma conta sobre a qual incidia um penhor, aberta pelos executados, conta só movimentável com autorização daquele; Nos termos do estabelecido na cláusula quarta do contrato de penhor, a relação responsabilidade/garantia foi de 60%, pelo que, para o montante financiado de € 2.500. 500,00, a garantia constituída pelo penhor incidia sobre € 1.500.000,00 da conta aberta pelos referidos executados; A determinada altura, o banco decidiu não autorizar mais a utilização da conta objecto de penhor, atento o facto de o rácio referido estar demasiado prejudicado e disso informou os executados por carta de 22/09/2010, no sentido de os instar a repor o rácio; À data da resolução do contrato de mutuo, o saldo da conta penhorada deveria ascender, conforme o rácio acordado, a € 1 351 765,81 mas em depósito existia um saldo de € 389 762,03; Este saldo não poderia ser utilizado para pagamento das prestações contratuais em dívida; A resolução operou porque os mutuários não efectuaram o pagamento das prestações em dívida.

Finda a fase dos articulados, o Tribunal de Tomar decidiu julgar totalmente improcedente a oposição à execução.

* Inconformados, os executados interpuseram recurso, pedindo a revogação daquela decisão e formularam as seguintes conclusões, por nós sintetizadas: 1. Não tendo as partes sido convocadas para a audiência preliminar (art.º 508.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil), tal omissão configura uma nulidade processual que influi na decisão da causa.

2. Aquela audiência só é facultativa em casos de manifesta simplicidade.

3. Com a obrigatoriedade de convocação de tal audiência preliminar, dará o juiz cumprimento ao sagrado princípio do contraditório, evitando as denominadas decisões surpresa.

4. A arguição e o conhecimento da nulidade podem fazer-se através deste recurso.

5. A sentença não cumpriu com o dever de motivação da matéria de facto, nos termos impostos pelo art.º 653.º n.º 2, do Código de Processo Civil, deixando de fazer uma análise crítica da única prova até àquele momento produzida, os documentos juntos pelas partes aos autos.

6. A sentença apenas refere que a matéria dada como provada, assim o foi “atenta a posição das partes assumida nos respectivos articulados e documentos constantes dos autos”.

7. Esta omissão impossibilita os Apelantes de sindicar qualquer questão sobre a produção de prova e/ou legalidade da mesma e torna a sentença nula nos termos do art. 668.º, n.º 1, al. b), do Código referido.

8. Mesmo a entender-se que na sentença existe uma verdadeira motivação ou fundamentação de facto, não poderia o Tribunal a quo ter dado como provada a factualidade que na sentença vem aduzida.

9. Com efeito, resulta da sentença em crise que o Tribunal partiu do princípio - apenas porque aprioristicamente se deu erradamente por provado - que determinadas quantias foram dadas em penhor financeiro, por contrato para o efeito celebrado. Tal entendimento afigura-se resultar da análise do contrato de mútuo com hipoteca junto pelo banco Apelado, onde na sua Cláusula Oitava é dito designadamente que para garantia do cumprimento das obrigações do dito contrato, (…) “será prestado Penhor Financeiro” (…). Acontece, porém, que não vem junto aos autos cópia do dito contrato de penhor financeiro, pelo qual o Tribunal erradamente se estriba para apressadamente concluir que “se são retirados valores a esse penhor financeiro, vê-se diminuída a garantia oferecida a favor do banco” e ainda que “Diferente seria se posteriormente os executados reforçassem o penhor financeiro na exacta medida em que foram retirados valores pelo Banco exequente para se pagar pelos valores em dívida pelos executados”. Com a devida vénia, só a junção do propriamente dito contrato de penhor financeiro permitiria concluir, para além da sua existência, quais as condições e valores a partir dos quais os mutuários Apelantes se obrigariam a reforçar, pois não há lugar a confissão ficta quando se trate de factos para cuja prova se exija documento escrito, como determina o art.º 485.º, alínea c) do CPC.

10. É manifestamente falso que alguma vez resulte dos autos que os Apelantes confessaram o que quer que fosse relativamente à inexistência de pagamentos, quando de uma perfuntória leitura dos artigos 10.º e º 14.º do articulado da Oposição resulta efectivamente o entendimento contrário.

11. Acerca do uso de quantias para pagamento das obrigações do mútuo, o banco Apelado confessa que amiúde aceitou que determinadas quantias colocadas na conta onde se encontravam as quantias (alegadamente) dadas em penhor financeiro, viessem a ser sucessivamente utilizadas para o cumprimento das sobreditas obrigações. Em bom rigor, sempre se acrescentará que sempre aceitou que tal sucedesse, o que criou a profunda convicção por parte dos executados Apelantes que a resolução do contrato nunca estaria em causa, convicção essa que deve obter protecção jurídica, designadamente à luz da figura do abuso de direito.

12. Por fim, a respeito da comunicação da resolução do contrato, também aqui se afigura que o Tribunal a quo laborou em manifesto erro quanto a dar por provada matéria que não tem correspondência com a prova aduzida pelas partes, bem como na correspondente análise jurídica efectuada.

13. Cumpre dizer, a respeito da junção do doc.1 com a Contestação do banco, pelo mesmo apenas é alegado que (…) logo em 22/09/2010, o banco enviou carta, registada e sob aviso de recepção, dirigida aos executados, CM (…) e MI (…) a reiterar os avisos de mora que lhe iam sendo dirigidos, mas que igualmente estes não recepcionaram. Por sua vez, se bem se analisar o teor das páginas 4 e 5 do sobredito doc.1, constata-se que as mesmas são cópias do aviso de recepção, nas quais não consta sequer a razão pela qual o mesmo não veio assinado. Donde, salvo melhor opinião, não poderia o Tribunal a quo dar como provado (e, pior do que isso, concluir) que tal carta não foi levantada pelos executados ora Apelantes por razões só a estes imputáveis, quando tal nem sequer foi pelo banco Apelado alegado, nem resulta dos autos um comprovativo de que foi deixado algum aviso na caixa de correio em apreço, para os respectivos...

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