Acórdão nº 1045/08.8TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Outubro de 2012
Magistrado Responsável | CARLOS MOREIRA |
Data da Resolução | 09 de Outubro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.
JP (…) intentou contra NM (…), MF (…), HI (…), SA, JM (…), AM (…) e FM (…), ação declarativa, de condenação, sob a forma de processo ordinário.
Pediu: a) seja anulado, na totalidade, o contrato de aumento de capital e alteração do pacto social da sociedade ré, H (…), S.A., celebrado em 10 de Agosto de 2007, em que intervieram todos os sócios da referida sociedade, por absoluta incapacidade de facto permanente do ora autor no momento da sua celebração.
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subsidiariamente, seja o mesmo contrato anulado por incapacidade acidental do autor no momento da sua celebração, nos termos do artigo 257° do Código Civil; c) sejam os réus condenados a restituir imediatamente ao autor as seguintes quantias por ele realizadas: - € 160,000.00, a título de participação social; - € 640.000,00, como prémio de emissão; - € 700.000,00, a título de “Prestações Suplementares” não remuneradas à sociedade; bem como respetivos juros contados à taxa legal a partir da data de citação, tudo no total de € 1.500.000,00.
Alegou: Após a morte do seu pai, em 18.12.1997, começou a demonstrar estados de tristeza, desorientação e abandono, tendo-lhe sido diagnosticado, em meados de 2000, um quadro clínico próprio de um “Transtorno Esquizo-Afetivo” de tipo depressivo, ministrada medicação e sujeito a vários internamentos hospitalares.
Entre final de 2006 e o primeiro semestre de 2007 e conhecedores da sua situação, JM (…) e NM (…) propuseram-lhe que participasse num investimento/aumento de capital na sociedade B (…) Lda.
Assim, em 10 de Agosto de. 2007 foi celebrado um “contrato de aumento de capital e alteração do pacto social”, em que intervieram todos os sócios e o autor, em resultado do que o capital social foi aumentado para €360.000,00, mediante a entrada em dinheiro no montante de €160,000.00 realizada pelo novo sócio, o ora autor. O autor pagou também um prémio de emissão de €640.000,00, tendo logo realizado, quer o valor da sua participação, quer o valor do prémio. O autor comprometeu-se, ainda a efetuar “Prestações Suplementares” à sociedade no montante de €700.000,00, no prazo limite de 90 dias, tendo logo realizado € 200,000.00.
Porém, a sociedade tinha resultados e valor patrimonial sofríveis, a quantia que pagou não era de modo algum comparável à que todos os outros acionistas pagaram e ficou onerado com a obrigação de efetuar prestações suplementares de elevadíssimo montante (sem direito a juros remuneratórios e correndo elevado risco de impossibilidade de restituição), não detendo qualquer poder de decisão na empresa pelo que verificou-se um desequilíbrio das prestações assumidas pelos diversos intervenientes, pois o autor pagou uma quantia exorbitante para deter 44,44%.
Em 20 de Setembro de 2007, apercebeu-se que a empresa em que investira se encontrava, em momento imediatamente anterior à sua entrada no capital, em situação de falência técnica, e ficou de tal forma transtornado que se tentou suicidar.
Aquando da celebração do negócio encontrava-se em estado de anomalia psíquica, pois que apresentava uma afetação grave das faculdades intelectuais, afetivas e volitivas, não tendo capacidade e aptidão para avaliar e decidir, reger a sua pessoa e os seus bens, estando extremamente vulnerável e influenciável por terceiros na gestão do seu património, sem noção dos atos jurídicos que pratica, razão porque a sua mãe instaurou uma ação destinada à sua interdição/inabilitação.
Os intervenientes no negócio e sócios da referida sociedade H (..), S.A., ora réus, bem sabiam da extrema debilidade psíquica do autor, Conclui que deve ser aplicado ao negócio o disposto acerca da incapacidade acidental, conforme determina o artigo 150º e 257° do C.Civil, devendo ser anulado o aludido contrato de aumento de capital e alteração do pacto social.
Contestaram os réus AM (…) e FM (…) Por exceção invocaram a sua ilegitimidade uma vez que foram demandados na qualidade de sócios/acionistas da ré, H (…), S.A., qualidade que já não detêm, por terem alienado as suas participações sociais ao acionista JM (…).
Que apenas participaram de forma residual no capital da ré H (…), S.A., o que ocorreu para que fosse preenchido o mínimo legal de sócios necessários à transformação da ré, H (…), S.A., em sociedade anónima. À data ficou acordado que a sua participação no capital social da ré, H (…), S.A. seria temporária e apenas pelo período necessário à conclusão da operação de aumento de capital e transformação da ré, H (…), S.A., em sociedade anónima, sem qualquer direito a participação nos lucros da mesma, o que se verificou.
Que são também partes ilegítimas para o pedido deduzido sob a alínea c), já que nunca receberam qualquer quantia do autor ou mesmo ou da sociedade ré, H (…), S.A..
Por impugnação disseram que o autor está a peticionar a restituição daquilo que, manifestamente, não prestou/realizou, já que pretende ser restituído de valores superiores àqueles que efetivamente transferiu, prestou ou realizou, como o mesmo reconhece no art.º 83º da petição inicial.
Negando que tivessem conhecimento da incapacidade do autor ou que a mesma fosse percetível por qualquer pessoa de diligência média.
A ré MF (…) arguiu também a sua ilegitimidade, dizendo que, nos termos em que a ação é configurada pelo autor, apenas a sociedade detém legitimidade passiva.
No que respeita ao pedido de condenação formulado sob alínea c), os montantes prestados pelo autor foram por conta da sua participação social/entrada no capital da 6ª ré e transferidos para esta ré e não para qualquer os seus acionistas. Não tendo ela recebido do autor qualquer quantia relativamente à entrada deste no capital social da 6ª ré.
Mais alega que no contacto que teve com o autor por via do negócio objeto dos presentes autos o mesmo não aparentava estar incapacitado, nem a ora ré alguma vez teve conhecimento de que essa situação de incapacidade existia, pois de outro modo recusava-se a aceitar a entrada do ora autor para a sociedade.
A ré H (…)S.A. impugnou os factos que não se suportam em documentos, bem como aqueles que não são do seu conhecimento pessoal.
Contextualizou a entrada do autor no capital social da ré, o que ocorreu por não ter sido concretizada a operação de Private Equity com o BANIF CAPITAL, bem como a relevância da participação do autor na estrutura acionista da ré.
Deduziu, ainda, pedido reconvencional, peticionando a condenação do autor a pagar o valor de €212.152,90, atinente às prestações em falta, a que o autor se obrigou, acrescidas de juros, bem como indemnização no valor que se liquidar em execução de sentença.
Alegou que, no contexto do contrato de aumento de capital e alteração do pacto social que o ré celebrou, este obrigou-se ainda a efectuar Prestações Acessórias de Capital no valor de €700.000 no prazo limite de 90 dias, tendo apenas realizado o valor de €487.847,10. Por causa de tal incumprimento a ré sofreu prejuízos, cujos montantes ainda não é possível contabilizar.
O réu JM (…) arguiu a sua a sua ilegitimidade passiva dizendo que, ele, o réu, como pessoa singular, nada lhe deve restituir, pois nada recebeu, sendo a sociedade quem recebeu as quantias entregues pelo autor a título de aumento de capital. Assim a ação apenas deveria ter sido instaurada contra a sociedade e não contra demais réus na qualidade de acionistas.
Por impugnação nega que o autor sofra de incapacidade permanente ou que à data em que o contrato foi outorgado se encontrasse em situação de incapacidade acidental. O autor tinha perfeita compreensão do negócio jurídico em causa, quer por via de observação própria, quer através de um técnico habilitado que para o defeito mandatou. Foi informado relativamente à situação da empresa, em cujo capital social e administração iria participar e esteve assessorado por um ROC de sua confiança pessoal que foi destinatário de informação de igual natureza, tudo de modo a tornar compreensível o relevante para uma decisão negocial consciente inclusive ex vi da relação pessoal que de há muito ligavam o autor e o réu contestante.
O autor não prestou as quantias que se refere na alínea c) do pedido tendo apenas transferido para a ré a quantia de €1.287.847,10.
E inexistindo desequilíbrio de prestações, dado o relevo da participação societária do autor.
NM (…) também arguiu a sua ilegitimidade, na medida em que a ação, nos termos do disposto no artº 45º, nº 2 e 47º do Código das Sociedades Comerciais deveria apenas ser instaurada contra aquela sociedade.
Que não recebeu do autor qualquer quantia relativamente à entrada deste no capital daquela sociedade H(…), S.A.
Ainda que assim se não entenda, a obrigação de restituição sempre teria que ser reduzida à quantia efetivamente prestada à sociedade, ou seja, para a quantia de €. 1.287.847,10.
Em nenhum momento, mesmo quando o autor esteve presente para a formalização do negócio, o réu teve a perceção de que o autor tivesse perdido a sua noção da realidade, nem muito menos a capacidade para gerir a sua pessoa ou os seus bens.
Replicou o autor ,pugnando pela improcedência das pretensões dos réus.
Mais reduzindo o pedido para o valor de €1.287.847,10.
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Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença que: Julgou os pedidos iniciais do autor bem como os pedidos reconvencionais dos réus, improcedentes, por não provados, e, em consequência, absolveu os réus e o autor dos mesmos.
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Inconformado recorreu o autor.
Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) Contra-alegaram os réus JM (…), MF (…) e H (…) SA (…) E, a título subsidiário, recorreram os réus, NM (…), AM (…), FM (…),requerendo a ampliação do âmbito do recurso do autor.
Concluindo nos seguintes termos: (…) 4.
Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 685-A º do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, as questões essenciais decidendas são, lógica e metodologicamente, as...
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