Acórdão nº 2361/10.4TBPVZ-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução29 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 2361/10.4TBPVZ-A.P1-Apelação.

Origem-Póvoa do Varzim, Tribunal Judicial, 2º Juízo Cível.

Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Caimoto Jácome 2º Adjunto Des. Macedo Domingues 5ª Secção*Sumário: I- A eficácia do caso julgado, como se depreende do disposto nos artigos 498.º, e 96.º nº 2 do C.P.Civil apenas cobre a decisão contida na parte final da sentença (artigos 659.º nº 2 in fine e 713.º nº 2 do C.P.Civil), ou seja, a resposta injuntiva do tribunal à pretensão do autor ou do réu, concretizada no pedido ou na reconvenção e limitada através da causa de pedir; II- Porém, é ponto assente na doutrina que os fundamentos da sentença podem e devem ser utilizados para fixar o sentido e alcance da decisão contida na parte final da sentença coberta pelo caso julgado; III- Quem pretenda liberar-se ou desobrigar-se pelo recurso à compensação tem, necessariamente, de admitir a preexistência de um crédito por banda daquele a quem se acha juridicamente vinculado.

IV- Pelo que o reconvinte não pode pretender a compensação se nega a existência do crédito invocado pelo reconvindo.

V- Penhorado o direito de superfície que abrange também a obra nele implantada, pode ser exercido o direito de retenção no que tange à citada obra; VI- Para que exista direito de retenção, nos termos do artigo 754º, «é necessário, em primeiro lugar, que o respectivo titular detenha [licitamente: cfr. artigo 756º, alínea a)] uma coisa que deva entregar a outrem, ou seja, que exerça poder de facto sobre a mesma em termos de defesa da garantia daquele crédito, pelo que, não havendo tal detenção não pode exercer aquele direito.

**I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: Por apenso aos autos de execução comum para pagamento de quantia certa n.º 2361/10.4TBPVZ que Banco B…., S.A. moveu contra C….., D….., E…., S.A. e F…., veio reclamar créditos a Massa Insolvente G…., S.A., alegando que a executada E…., S.A. é devedora à G…., S.A., entretanto declarada insolvente, aqui reclamante, da quantia de € 280.347,29 acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação e até efectivo e integral pagamento.

Tal dívida foi reconhecida por sentença transitada em julgado e é proveniente de obras executadas no prédio objecto de penhora nos autos de execução sendo garantido com direito de retenção.

*Devidamente notificado, contestou o executado F…. alegando que a credora reclamante não demonstra que o seu crédito se encontra vencido e é exigível uma vez que, a sentença em causa se encontra pendente de liquidação na medida em que o crédito que vier a ser objecto de liquidação é compensável com o crédito da reclamante, pelo que, atenta a falta de liquidação do crédito compensável, não pode ser reconhecido qualquer valor á reclamante.

Mais alega que o direito de retenção cessa a partir do momento em que o credor voluntariamente abdica do mesmo procedendo à entrega da coisa como sucedeu no caso vertente e o direito de retenção exerce-se sobre a coisa e enquanto esta se encontrar na posse de quem exerce o direito de retenção. Ora, se há quatro anos a obra foi entregue á E…. o direito de retenção da reclamante deixou de existir desde então Conclui, pugnando pela improcedência da reclamação.

*Respondeu a reclamante nos termos constantes de fls. 87 e seguintes, alegando que da sentença transitada em julgado resulta claramente a condenação do impugnante em pagamento de quantia certa, líquida e exigível, tendo, como tal, eficácia. Mais refere que, conforme resulta da sentença, o credor não entregou voluntariamente a obra, pelo que, o devedor não pode arrogar-se da posse para impedir a invocação do direito de retenção que foi tempestivamente invocado nos termos previstos no art. 865.º, nº 3 do Código de Processo Civil.

Conclui pedindo a improcedência da impugnação.

*O processo seguiu a sua tramitação, tendo a final, sido proferida sentença que julgando procedente, por provada, a reclamação deduzida pela Massa Insolvente G…., SA graduou, sobre o produto da venda do bem penhorado nos autos de execução, os créditos pela seguinte ordem: 1.º - O crédito da credora reclamante Massa Insolvente G…., S.A., garantido pelo direito de retenção, na importância reclamada- € 280.347,29 acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação e até pagamento; 2.º - O crédito da exequente garantido pela penhora registada.

*Não se conformando com o assim decidido vieram os executados F…. e o Banco B…., S.A. interpor os presentes recursos, concluindo as suas alegações nos seguintes termos: F…….

A-Decorre da sentença proferida que serve de título à reclamação deduzida pela G…. nos presentes autos, que o crédito em capital e juros reconhecido na sentença terá que ser objecto de compensação com o crédito decorrente do valor da liquidação dos danos decorrentes do cumprimento defeituoso do contrato, e constante do relatório mencionado na sentença, de onde o crédito da reclamante ou o débito, ser o resultante de tal compensação; B-Com efeito, ao condenar nos termos da al- a) da decisão indicando a final que a condenação é em conformidade com o supra exposto e estando consignado a fls. 56 da sentença que terá que se operar a compensação, decidiu-se que os créditos são compensáveis, resultando aliás tal natureza compensável quer dos créditos em causa, quer da dedução do pedido reconvencional; C-Tendo a compensação natureza retroactiva, e porque por um lado o crédito de uma das partes decorre da realização de trabalhos e o crédito da outra parte decorre do cumprimento defeituoso desses trabalhos, os créditos são contemporâneos e como tal, o valor dos juros não pode ser liquidado sem que seja apurado o saldo entre os créditos após a compensação; D-Da sentença que serve de título para a reclamação de crédito não decorre que a Reclamante não tenha efectuado a entrega da obra, falecendo assim prova nos autos de que estavam verificados os pressupostos para a graduação dos créditos nos termos dos ns.- 1 a 3 do Art.º 759º do Cód. Civil; E-Com efeito, era precisamente o inverso que decorria da sentença, dado que se deu como provado que a exploração do parque se tinha iniciado, o que seria de todo impossível sem a entrega da obra; Da mesma forma a entrega tinha sido invocada na contestação apresentada à reclamação do crédito, e a Reclamante reconhecia não ter a posse apenas tendo invocado que a entrega não tinha sido voluntária; F-Por tal facto, e não havendo prova plena, a entrega da obra era questão controvertida, em especial atentos os efeitos jurídicos decorrentes da entrega da obra para o direito de retenção, determinando a sua extinção; G-A douta sentença em recurso aplica de forma incorrecta as normas constantes dos Arts.º 754º, 756º, 759º, 847º, 854º e 1.267º n.º 1 al. d) do Cód. Civil;*Banco exequente: I-O presente recurso vem interposto da douta sentença que reconheceu e graduou o crédito do reclamante Massa Insolvente G…., S.A., com prioridade sobre os demais, para ser pago pelo produto da venda do bem penhorado nos autos de execução.

  1. Ora, salvo o devido respeito considera o recorrente que o crédito em questão foi erroneamente reconhecido e graduado.

  2. Nos termos do nº 1 do art. 865º do C.P.C. “só o credor que goze de garantia real sobre os bens penhorado pode reclamar, pelo produto destes, o pagamento dos respectivos créditos.” IV. O bem penhorado nos autos de execução, conforme resulta da matéria de fato provado não é um imóvel (e muito menos qualquer fracção autónoma) mas antes o direito de superfície sobre o imóvel.

  3. Ora, o direito de retenção traduz-se no direito conferido ao credor, que se encontra na posse de coisa que deva ser entregue a outra pessoa, de não a entregar enquanto esta não satisfizer o seu crédito, verificada alguma das relações de conexão entre o crédito do detentor e a coisa que deva ser restituída a que a lei confere tal tutela-arts. 754º e 755º C. Civil.

  4. Ora, nos termos do art. 202º do C.C. diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objecto de relações jurídicas.

  5. Face ao exposto, resulta evidente que o direito de superfície não é passível de ser objecto de direito de retenção, desde logo porque não é passível de posse ou de “recusa de entrega”.

  6. Assim sendo, a reclamação apresentada pelo credor reclamante deveria ter sido liminarmente rejeitada.

  7. Ao admiti-la o Tribunal a quo violou o disposto no nº 1 do art. 865º do CPC.

  8. Sendo certo que, nos termos o nº 4 do art. 868º do C.P.C., o facto da inexistência da garantia não ter sido invocada, nestes moldes, pelos interessados não tem qualquer efeito cominatório.

  9. Na verdade, sendo a ilegitimidade uma excepção dilatória – cfr. al. e) do art. 494º do CPC-o Tribunal a quo deveria dela ter conhecido oficiosamente – cfr. art. 495º do C.P.C.

  10. Pelo que, ao não fazê-lo o Tribunal a quo violou o disposto naqueles dispositivos legais.

  11. A sentença recorrida despreza, inexplicavelmente, a impugnação apresentada pelo executado F…..

  12. A reclamante não impugnou os fatos constantes dos arts. 15º a 17º da impugnação apresentada pelo executado nos termos dos quais a obra em causa, há mais de quatro anos que foi entregue à E…., sendo esta entidade que exerce a posse efectiva sobre a mesma, em concreto explora o parque, recebe viaturas, processa à sua conservação e pratica actos de posse, de forma exclusiva e sem a intervenção de terceiro, há mais de quatro anos, ininterruptamente.

  13. Factos que, não tendo sido...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT