Acórdão nº 1615/10.4TBAMT-B.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Outubro de 2012
Magistrado Responsável | JOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA |
Data da Resolução | 29 de Outubro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo n.º 1615/10.4TBAMT-B.P1 Recorrente – B… Recorrida – C…, Lda.
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto: 1 – Relatório 1.1 – O processo na 1.ª instância e a decisão sob recurso B… veio apresentar Oposição à execução que lhe é movida por C…, Lda. Pretende que, com a sua procedência, a oponente seja absolvida e a execução seja julgada extinta.
A oponente, fundamentando a oposição, esclarece que foi dada à execução uma declaração de dívida pela qual, entre outros, se confessou devedora da quantia de 50.739,86€, mas essa declaração é redondamente falsa; efetivamente, nunca deveu qualquer quantia à exequente e nem sequer a conhece. Acrescenta que o requerimento executivo é inepto, pois não foi alegada a relação fundamental e, por isso, falta causa de pedir. Diz ainda que a exequente já não pode vir alegar a relação fundamental e, por isso, a execução está votada ao fracasso.
Recebida a oposição, a exequente foi notificada para, querendo, a contestar.
A Exequente contestou. Aceitou o alegado pela opoente nos números 1 e 2 do requerimento de oposição[1] e, quanto ao mais, defende que é falsa a defesa apresentada. Esclarece que instaurou um procedimento cautelar e ação contra os oponentes e que nelas não houve contestação, tendo sido proferida sentença a condená-los. Que a opoente é irmã do executado D… e filha do executado E…, partilhando estes o mesmo espaço de trabalho e a oponente sempre os auxiliou na contabilidade, auditoria e consultadoria fiscal. Sucede que os réus da ação não cumpriram o disposto na sentença e a exequente intentou duas ações executivas. No dia 16.02.09, a Agente de Execução deslocou-se ao escritório da executada F…, Lda. para realizar diligências de penhora e, aí, o legal representante pretendeu resolver a situação, evitando a penhora e o constrangimento que tal situação provocaria à imagem da sociedade e, por outro lado, que fosse fixando o montante da dívida. Acresce que o executado D… referiu que não tinha forma de cumprir o segmento da sentença que o condenava na entrega dos documentos contabilísticos à exequente. Depois de terem verificado que o valor era elevado e dado que o D… referiu a impossibilidade de pagar de uma só vez, foi acordada a forma de pagamento nos termos constantes do título executivo, ficando acordado que todos os executados assumiriam solidariamente o pagamento. O acordo foi reduzido a escrito dois dias após a diligência e o executado E… recolheu as assinaturas. Posteriormente ao vencimento da primeira prestação, o executado D… dirigiu-se ao escritório do mandatário da exequente para entregar a quantia de 8.000,00€, em numerário, para pagamento parcial. Refere também que consta do título, no seu n.º 5, que (os executados) "declaram expressamente, que a presente confissão de dívida é feita nos termos do artigo 458º do CC” e que, em momento algum, as assinaturas apostas no mesmo foram impugnadas. Por outro lado, "relativamente à substância é o credor dispensado de invocar a relação subjacente, cuja existência e licitude se presume".
Findos os articulados foi elaborado despacho saneador. Aí se declarou que a petição (requerimento executivo) não padecia de ineptidão[2]. Os autos prosseguiram.
Depois de requerida a suspensão da instância, realizou-se a audiência de julgamento (fls. 89 a 93). Após, foi fixada a matéria de facto (fls. 94/96),[3] em despacho fundamentado[4], e proferida sentença que julgou improcedente a oposição e ordenou o prosseguimento dos ulteriores termos da execução.
1.2 – Do recurso Inconformada com o decidido, a oponente veio apelar. Entende que a matéria de facto foi incorretamente julgada, considera – de novo – que ocorre ineptidão do requerimento executivo, defende que a sentença padece da nulidade revista no artigo 668, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil (CPC) e, sustentando que a dívida não existe, pretende a revogação do decidido. Formula as seguintes Conclusões: 1 - A Recorrente considera que a decisão quanto à matéria de facto padece de alguns vícios, designadamente quanto à resposta dada ao alegado no artigo 4º da Oposição à execução.
2 - O testemunho do Sr. Dr. G…, gravado em suporte digital entre as 15:32:22 e as 16:01:52 do dia 26 de outubro de 2011, reputado de idóneo e credível, confirma que a Recorrente não tem qualquer negócio ou ligação com a Recorrida.
3 - Apenas a sociedade F…, Lda. teve relações com a Recorrida, sendo que, de acordo com a testemunha, a confissão de dívida se destinava a cobrir riscos advenientes de eventuais problemas desta com a Administração Fiscal, pese embora desconhecer como foi fixada a quantia, sendo certo que a mesma não foi negociada com nenhum dos confessados devedores, muito menos com a Recorrente, que não conhece ou reconhece.
4 - Por outro lado, a testemunha garantiu que o teor da confissão de dívida e os termos que nela constam são da sua autoria, sendo que, na sua versão dos factos, sempre terá acordado com o representante legal daquela sociedade que os demais assinantes seriam fiadores ou garantes do cumprimento.
5 - Estas provas justificam uma alteração da decisão quanto à matéria de facto no que concerne ao artigo 4º da Oposição, o qual deve ser dado como provado.
6 - Deve ainda ser dado como provado que a sociedade D… não podia cumprir a sentença que a condenava na entrega dos documentos contabilísticos à C…, Lda., uma vez que os mesmos não existiam, facto atendível por força do nº 2 do artigo 514º CPC.
7 - A sustentar esta afirmação está o depoimento da testemunha H…, Agente de Execução, que lavrou o auto de penhora encontrado a fls. 153 e 154 do apenso A, o próprio auto de penhora, e o testemunho do Sr. Dr. G…, que revelaram que a sociedade F…, Lda. não tinha quaisquer documentos para entregar à Recorrida.
8 - Trata-se, na verdade, de matéria especialmente relevante uma vez que fica demonstrado, sem contestação possível, que não existia qualquer causa para a dívida confessada aqui exequenda.
9 - Por outro lado, não pode o Tribunal deixar de verificar e declarar a ineptidão do Requerimento Executivo que deu o impulso a estes autos.
10 - Foi executado um documento particular designado “confissão de dívida”, o qual não contém em si os factos referentes à causa de pedir, factos que continuaram ausentes no Requerimento Executivo, fazendo a sua aparição apenas na Contestação à Oposição à execução.
11 - No entanto, dispõe o art. 810º, nº 1, al. e) do CPC que o requerimento executivo deve conter a exposição sucinta dos factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo, sendo que a sua falta determina o indeferimento liminar por ineptidão, o que deveria ter sido decidido.
12 - A invocação dos factos apenas na contestação à oposição à execução origina, por outro lado, alteração de causa de pedir, não podendo tal ocorrer salvo acordo do executado, nos termos do disposto nos artigos 272º e 273º, nº 1 CPC 13 - Como refere Joel Timóteo Ramos Pereira, em artigo publicado na revista “O Advogado”, n.º 20, de abril de 2002: a alteração da causa de pedir é inadmissível em sede executiva, salvo se houver acordo por parte do executado (art.º 272.º do CPC).
14 - Destarte, não deve ser permitido à execução a que esta segue apensa subsistir quando a petição que lhe deu origem se encontra irremediavelmente incapaz de cumprir o seu objetivo de sustentar todo o edifício processual, por falta de causa de pedir.
15 - Na Oposição à execução, a Recorrente colocou sobre a apreciação do Tribunal a questão de não poder a Recorrida alegar, em sede de contestação à oposição, factos referentes à relação material controvertida, pelo que o Tribunal de 1ª instância deveria ter-se pronunciado sobre esta problemática.
16 - Com efeito, o artigo 660º, nº 2, 1ª parte, obriga o juiz a resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, sendo que “é nula a sentença quando: o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”, nos termos do disposto no artigo 668º, nº 1, alínea d) CPC.
17 - Uma vez que, no presente processo, não houve qualquer decisão relativa à questão suscitada pela Recorrente, nem a solução da mesma ficou prejudicada por outra decisão tomada no mesmo âmbito, ocorre nulidade da sentença por falta de pronúncia.
18 - Ocorre, igualmente, nulidade por excesso de pronúncia, porquanto a sentença em crise conheceu os factos alegados pela recorrida na contestação, sendo o Requerimento executivo totalmente omisso quanto a eles.
19 - Decidindo-se que a Recorrida estava impossibilitada de alegar neste apenso os factos atinentes...
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