Acórdão nº 12905/09.9TDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DIONÍSIO
Data da Resolução10 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Relatora: Maria Deolinda Dionísio Adjunto: Moreira Ramos.

Processo n.º 12905/09.9TDPRT.P1 4ª Secção Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO Nos autos de inquérito que corria termos pela 5ª Secção do Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto, sob o n.º 12905/09.9TDPRT, o assistente B… deduziu acusação particular contra o arguido C…, com os demais sinais dos autos, pela prática de um crime de difamação previsto e punível pelos arts. 180º n.º 1 e 183º n.º 1 a), do Cód. Penal.

O Ministério Público não acompanhou a acusação particular por entender que não existiam indícios que permitissem identificar o autor do ilícito.

***Inconformado, o arguido requereu a abertura de instrução, visando o afastamento da responsabilidade pelo cometimento de tal crime e, consequentemente, a sua não pronúncia.

***Admitido o requerimento e declarada aberta a instrução foram realizados os actos de instrução considerados necessários, essencialmente consubstanciados em exame pericial com vista a identificar o autor da mensagem em causa, após o que foi designado, sem mais, o debate instrutório que veio a realizar-se na data aprazada.

Na decisão instrutória subsequente, o arguido foi pronunciado com base nos factos e subsunção jurídica vertidos na acusação particular.

Não se conformando com o decidido, interpuseram recurso o Ministério Público e o arguido, finalizando a motivação com as seguintes conclusões: (transcrição)Ministério Público1) Da questão Prévia: - A não realização de interrogatório, em sede de instrução, de arguido contra quem foi deduzida acusação particular e que apenas tinha sido inquirido, em inquérito, como testemunha - pelo que a aquisição do estatuto processual de arguido ocorreu por força do n.º 1 do art. 57º do CPP - é capaz de quadrar a nulidade insanável prevista na al. d), do art. 119º, do CPP, por violação dos direitos elencados na al. b) do art. 61º, n.º l, do CPP, conjugado com o art. 32º, n.º l, da CRP.

2) Do mérito do Recurso: - Não foi efectuada, em instrução, qualquer diligência de prova.

- No debate instrutório, o M°P° pugnou pela não pronúncia do arguido, por entender a não verificação de indícios da prática de crime a que aludia a acusação particular (incriminação do arguido pelos arts. 180º, n.º l e 183º, n.º l, al. a) e acompanhando a posição do MºPº, em fase de inquérito, porém, na decisão instrutória, com grande surpresa, a Ma JIC, veio a pronunciar o arguido pela prática de crime de Difamação, previsto e punido pelos arts. 180º, n.º l e 183º, n.º l, al. a), ambos do C.P.

- Se por um lado, das diligências levadas a efeito em inquérito, não se conseguiu apurar o autor do email remetido ao arguido e por este reencaminhado, por outro lado não resulta dos autos que o arguido, constituído como tal com a acusação, entendesse que o conteúdo do que lhe havia sido enviado via email, e que reencaminhou, tivesse sido absorvido pelo mesmo como tal, isto é, que entendesse como ofensivo à honra do assistente e por isso o reencaminhava para o atingir.

- Entendemos, ao contrário do despacho sob censura, que a conduta do arguido não preenche, objectivamente, o tipo legal de crime de que vinha acusado pela acusação particular. Assim, o arguido não havia sido o autor de tal email (devidamente comprovado nos autos e que o despacho sob censura também não discute) e limitou-se a reencaminhar para os seus contactos para terem conhecimento daquilo que lhe surgira - não se sabe de que origem - e onde se apercebera do conteúdo mas sem interiorizar, de que o seu conteúdo do email, tinha o seu acordo (e tal não resulta dos autos, com toda a certeza).

- No que toca ao elemento subjectivo do tipo de crime, não resulta dos autos que o arguido ao reencaminhar um email, que lhe havia sido remetido, visava atingir a honra e a consideração do assistente e que tinha consciência da ilicitude de tal acção.

- O despacho sob censura violou o disposto nos arts. 180º, n.º l, 183º, n.º l, al. a) e 14º, do C.P.

3) Do pedido: - Aderindo à motivação atinente à questão prévia requer-se a declaração de nulidade da instrução, bem como da decisão instrutória, que deve ser revogada, determinando-se o interrogatório do arguido; - Caso assim se não entenda deve o despacho sob censura deverá ser revogado e substituído por outro que, nos termos do n.º l, do art. 307º do CPP, profira decisão instrutória de não pronúncia do arguido C….

Arguido1. Utilizando o resultado da perícia solicitada pelos doutos Juízos de Instrução Criminal, resulta o seguinte: o arguido recebeu as mensagens no endereço electrónico D…@vahoo.com.br, descarregou o conteúdo para o seu PC e posteriormente criou mensagem no endereço E…@iol.pt e reencaminhou-a para o endereço F…@gmail.com.

  1. Resulta ainda que as mensagens de correio electrónico reencaminhadas para o endereço F…@gmail.com foram gerada no e-mail E…@iol.pt. tendo as mesmas sido recebidas pelo Arguido no endereço D…@yahoo.com.br. tudo indicando que o conteúdo não foi criado pelo Arguido.

  2. Não podia ser mais claro que as imagens não foram divulgadas para pessoas que conhecem o arguido e muito menos para organizações. Aliás, nem ficou identificado o detentor do e-mail F…@gmail.com.

  3. Pelo que não existe qualquer indício para sustentar aquele facto pronunciado pelos Juízos de Instrução Criminal (JIC). Existe até informação que sustenta o exacto oposto. O arguido, a ter reencaminhado a mensagem, apenas o fez para uma pessoa. Tal prova foi solicitada pelos JIC que, posteriormente, procedeu a ignorá-la e a pronunciar o arguido contra o resultado de perícia feita por técnico credenciado para o efeito.

  4. Tal é violador do conteúdo das disposições conjugadas dos Artigos 283º/2 e 308º/1 e 2 CPP, na interpretação de que apenas se deverá pronunciar o arguido se resultar indiciada factualidade suficiente para considerar que existirá possibilidade de lhe ser aplicada pena em julgamento.

  5. O domínio iol.pt não é propriedade de qualquer sociedade comercial que seja conhecida ou tenha sido conhecida por G….

  6. Tal domínio pertence à sociedade comercial H…, S. A., como é de conhecimento público, pelo que mal andaram os JIC a considerar tal facto como indiciado o suficiente para pronúncia.

  7. O arguido não é detentor de um Blog que dá pelo nome I… e de endereço electrónico criado no GMAIL (Google Mail) com a mesma designação.

  8. Tal não resulta minimamente indiciado até porque, 10. Resulta do relatório pericial que tal endereço não pertence ao arguido.

  9. Na verdade, os JIC tentaram identificar a origem e o proprietário dos endereços IP utilizado pelo e-mail I1…@vahoo.com. Sucede no entanto que da informação vinda da J… resulta que um dos IP corresponde a um estabelecimento de restauração e da K… resulta que nunca saberemos, pois tal informação já não existe.

  10. Em momento algum foi estabelecida conexão entre o arguido e o dito estabelecimento de restauração, nem o arguido foi identificado como pessoa que sequer frequenta tal estabelecimento.

  11. O mesmo se diga em relação à página do facebook que referencia todos os endereços acima referidos.

  12. Aliás, como resulta do relatório pericial, os únicos e-mails efectiva pertença do arguido são os que têm os endereços E…@iol.pt e D…@yahoo.com.br.

  13. Não ficou, portanto indiciado que os e-mails identificados por G1… e mesmo o blog do mesmo nome sejam pertença do arguido.

  14. Não resulta, portanto, qualquer indício que ligue o arguido aos supra referenciados e-mails.

  15. Dar como suficientemente indiciado tal facto violador do conteúdo das disposições conjugadas dos Artigos 282º/2 e 308º/1 e 2 CPP, na interpretação de que apenas se deverá pronunciar o arguido se resultar indiciada factualidade suficiente para considerar que existirá possibilidade de lhe ser aplicada pena em julgamento, tendo o tribunal tido interpretação diversa, conforme se retira das presentes alegações.

  16. Resulta que o arguido nunca difundiu a imagem do arguido, nem a utilizou para qualquer fim.

  17. Quanto ao facto de o ofendido ser pessoa de prestígio no mundo das artes marciais, também não resulta qualquer indício nos autos que o seja ou não.

  18. Dada a relevância de tal facto, não deveriam os JIC considerar suficientemente indiciado que o ofendido é pessoa que goza (ou gozava) de prestígio no mundo das artes marciais 21. O artigo 180º/2 b) CP sempre prevê como causa de exclusão da ilicitude a prova da verdade da imputação ou a fundamentação suficiente para se acreditar na sua veracidade.

  19. Apesar de muito discorrer sobre o elemento subjectivo do crime de difamação, nem uma palavra existe no despacho de pronúncia quanto à causa de exclusão de ilicitude, pronunciando um facto que não resulta minimamente indiciado na positiva, isto é, que o arguido goza de prestígio no mundo das artes marciais.

  20. Portanto, novamente, cremos que mal andaram os JIC ao considerar suficientemente indiciado um facto meramente alegado na acusação particular.

  21. Se bastar o que se alega na acusação para pronunciar, a instrução não terá cumprido os seus fins pois que, 25. Se o objectivo da instrução e comprovar judicialmente a acusação, sempre cremos que durante a mesma se deverão verificar se se configuram suficientemente indiciados os factos acusados.

  22. Tal é violador do Artigo 180º/2 b) CP na interpretação que o elemento subjectivo deve conter em si a possibilidade de exclusão de ilicitude e não só a adesão ao conteúdo e, bem assim, das disposições conjugadas dos Artigos 283º/2 e 308º/1 e /2 CPP, na interpretação de que apenas se deverá pronunciar o arguido se resultar indiciada factualidade suficiente para considerar que existirá possibilidade de lhe ser aplicada pena em julgamento quer objectiva, quer subjectivamente, tendo o tribunal tido interpretação oposta, conforme resulta das presentes alegações.

  23. Nenhuma da factualidade identificada pela numeração inicial nestas Alegações está suficientemente indiciada nos autos, não deveria o arguido ter sido pronunciado pelos mesmos.

  24. Ao...

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