Acórdão nº 3944/10.8TXPRT-H.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelÉLIA SÃO PEDRO
Data da Resolução03 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso Penal 3944/10.8 TXPRT-H.P1 Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto 1.Relatório B…, recluso no Estabelecimento Prisional do Porto (Custóias), devidamente identificado nos autos, inconformado com a decisão proferida no Tribunal de Execução das Penas que não lhe concedeu a liberdade condicional, recorreu para esta Relação, terminando a motivação do recurso com as seguintes conclusões (transcrição): I. O recorrente foi condenado a uma pena de prisão de 12 anos e 3 meses, após aplicação de um perdão de 1 ano e 6 meses, à ordem do processo 1910/97.6JAPRT, da 4.ª Vara Criminal do Porto. Foi-lhe concedida liberdade condicional, por decisão de 12.05.2004, que se estenderia até 12.05.2009.

Liberdade condicional revogada por decisão revogatória proferida em 09.07.2008.

Sendo que o recorrente foi novamente detido em 10.02.2010, para o cumprimento do remanescente da pena de 5 anos, 1 mês e 8 dias de prisão.

  1. Por homologação, devidamente transitada em julgado, ficou fixado que os 2/3 da pena se cumpriam em 16.02.2011, os 5/6 da pena em 03.03.2013 e a totalidade da pena em 19.03.2015.

  2. Em 26.04.2012, em sede de Renovação de Instância, reuniu o Conselho Técnico e, depois de ouvido o recorrente, foi emitido parecer desfavorável à concessão de nova liberdade condicional. Decisão que é objecto do presente recurso.

    IV A aplicação da liberdade condicional deve aferir-se, no caso sub judice, nos termos do disposto no art.º 61.º do Código Penal (CP), pela verificação dos requisitos constantes no seu n.º 2, alínea a).

  3. Quanto aos requisitos de natureza formal dos 2/3 da pena, foram cumpridos mais de 6 meses da pena e foi dado o consentimento pelo recluso; VI. A aplicação da Liberdade Condicional depende da verificação do pressuposto material previsto no art.º 61.º, n.º 2, al. a), do CP, por remissão do n.º 3 do mesmo art.º 61.º.

    E a al. a) do referido art.º, faz depender a aplicação da Liberdade Condicional da prognose favorável de que o recluso, uma vez em liberdade, conduzirá a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes, atentas: a) As circunstâncias do caso; b) A vida anterior do agente; c) A sua personalidade, e d) A evolução desta durante a pena de prisão.

  4. A aplicação da Liberdade Condicional assenta, pois, num juízo de prognose, que embora ponderado e cuidadoso, não deixa de ser um juízo de probabilidade e não de certeza.

  5. Risco, aliás, clara e indiscutivelmente assumido pela legislação em vigor, ao prever a possibilidade de libertação ao meio e dois terços da pena, independentemente do tipo de crime em causa, tendo em atenção as finalidades e objectivos que prossegue.

    A Liberdade Condicional tem como base o sentido de orientação e a reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável e sem cometer crimes.

    Aliás, e como pode ler-se na Exposição de Motivos do Dec-Lei 400/82 de 23 de Setembro que aprovou o CP, “Definitivamente ultrapassada a sua compreensão como medida de clemência ou de recompensa por boa conduta, a liberdade condicional serve na política do código, um objectivo bem definido: o de criar um período de transição entre a prisão e a liberdade, durante o qual o delinquente possa equilibradamente recobrar o sentido e orientação social fatalmente enfraquecido por efeito da reclusão. Com tal medida (…) espera o código fortalecer as esperanças de uma adequada reintegração social do internado, sobretudo daquele que sofreu um afastamento mais prolongado da sociedade.” IX. Diz-se na decisão, ora notificada ao recorrente, que: “Reuniu o Conselho Técnico, que emitiu parecer desfavorável (por unanimidade) à concessão da liberdade condicional,…”.

    Do Conselho Técnico fazem parte, entre outros, um membro dos serviços prisionais e um membro dos serviços de reinserção social.

    É apresentado relatório e é, também, com base neste que a decisão de concessão ou não da Liberdade Condicional vai ser apreciada.

  6. Salvo melhor opinião, que se respeitará naturalmente, do relatório do técnico da Equipa de Reinserção Social do Porto Penal 5 não pode extrair-se a conclusão a que se chegou na decisão de que se recorre; o enquadramento familiar e social do arguido, e por contacto do técnico da equipa de reinserção social com a sua actual companheira, é positivo quanto à vida em comum, que pretendem aliás continuar; diz-se: “…mantendo ambos a intenção de continuar o relacionamento afectivo,…” XI. Quanto à habitação, diz-se claramente no relatório não se perceber qualquer conflito relacional no prédio onde habitava antes de ser novamente detido, e onde habitará assim que esteja em liberdade; aliás, o recluso ao mudar da habitação onde antes vivia, essa sim situada em zona problemática, quis “romper” com o passado e desviar-se das antigas amizades que lhe eram prejudiciais; a casa que agora lhe está atribuída é uma casa de construção recente e onde vivia antes da detenção com a actual companheira, sem qualquer problema; diz-se no relatório: “Não se percebeu a existência de algum conflito relacional no prédio onde habita,…”.

  7. Por outro lado, o recorrente tem assegurada colocação laboral assim que esteja em liberdade, quer em actividades agrícolas (C…), quer com o seu irmão que é comerciante de farturas e manifestou interesse na prestação laboral do recorrente; tem pois, assegurado projecto e colocação laboral.

  8. A sua actual companheira tem um contrato de trabalho estável e gratificante, auferindo um salário que lhe permite assegurar a sua subsistência e a do recorrente, e manifesta a vontade de partilhar a economia doméstica com este.

  9. O recorrente, nas palavras do próprio técnico, tem consciência crítica em relação à atitude criminal que revelou e que contribuiu para a situação prisional em que se encontra; consegue interiorizar que a sua conduta o levou à situação prisional em que se encontra, não se considerando vitima do que quer que seja, outrossim tem consciência de que foi a sua conduta que o “levou até ali”, e a dimensão da pena mostra-se suficientemente intimadora para o recorrente.

  10. Mostra arrependimento das condutas anteriores, e está absolutamente seguro que, uma vez em liberdade, a sua vida será orientada por padrões de normalidade, com reconhecimento pela pessoa humana e respeito pelas regras da comunidade; demonstra, pois, uma evolução na sua personalidade que não era perceptível aquando da anterior reunião para apreciação da concessão de Liberdade Condicional ao recorrente.

  11. Quanto à decisão negativa dos serviços prisionais no que concerne à concessão da Liberdade Condicional ao recorrente, não se entende porquanto, o recorrente continua a apresentar atitude consonante com as normas institucionais; tem excelente relacionamento pessoal com os restantes reclusos; cumpre com as normas institucionais, não criando qualquer tipo de problemas, quer aos restantes reclusos, quer aos serviços prisionais; tem uma actividade laboral dentro do estabelecimento prisional empenhada, inatacável, e releva de forma acentuada e distinta essa actividade; cumpre, presentemente, um horário entre as 08H15 e as 18H40, repartido entre o bar de apoio ao pavilhão e a cantina; durante todo o tempo de reclusão nunca foi punido ou sequer admoestado; revela uma evolução da sua personalidade.

  12. Não obstante a falta de tempo para outras actividades dentro do estabelecimento prisional, mostrou-se disponível para a sua valorização pessoal, frequentando um curso de GPS nas instalações da instituição.

  13. Diz-se, ainda, na decisão de que se recorre que “O condenado encontra-se detido pela quarta vez em estabelecimento prisional…”; o recorrente esteve preso no estabelecimento de Paços de Ferreira à ordem deste processo; beneficiou do regime de Liberdade Condicional que veio a ser revogada, e consequentemente foi novamente detido; esteve detido mais duas vezes, por não pagamento de multas; uma das vezes cumpriu 3 meses de prisão e da outra vez esteve detido apenas um par de horas pois a multa acabou por ser paga e foi libertado. Não foi pois por cometimento de outros crimes que foi detido, como pode parecer da simples leitura da decisão de que agora se recorre.

  14. Diz-se ainda que “…o seu comportamento em meio livre, após a sua detenção, não se mostra testado.”. Sendo verdade o que é dito na decisão, sempre se dirá que dificilmente será testado se persistirem os indeferimentos aos seus pedidos de flexibilização da pena, pois todos os pedidos efectuados até hoje para que sejam concedidas saídas precárias do estabelecimento prisional foram negadas, incluindo aquela a que se faz referência na decisão.

  15. Diz o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo: “Todas estas circunstâncias desaconselham a concessão de uma nova liberdade condicional no âmbito da pena de prisão agora (novamente) em execução, não obstante o trajecto prisional evidenciado (ressaltando integração laboral no sector da cantina e ausência de punições disciplinares) e a existência de condições objectivas favoráveis em meio livre (enquadramento habitacional, apoio sócio-familiar e colocação laboral), realidades que, de resto, também já ocorriam aquando da anterior concessão de liberdade condicional.” (Sublinhado nosso); o recluso cumpre objectivamente com os pressupostos para a concessão de Liberdade Condicional, pelo que deveria o Tribunal a quo, e nos termos do art.º 61.º do CP, ter-se decidido pela concessão da Liberdade Condicional ao recorrente, por verificação dos requisitos exigidos por este artigo, e cumprindo com o preceito legal que diz “o tribunal coloca o condenado em liberdade condicional….”.

  16. Tanto mais, sempre com o devido respeito por opinião diversa, o n.º 3 deste art.º 61.º não atribui qualquer poder discricionário ao julgador, pelo contrário, diz claramente que o tribunal coloca o condenado em liberdade quando se encontre preenchido, de forma objectiva, o requisito do n.º 2, al. a).

    Assim sendo, deveria o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo ter proferido decisão...

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