Acórdão nº 1939/10.0JAPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Maio de 2012

Data23 Maio 2012
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Rec.nº1939/10.0JAPRT.P1 TRP 1ª Secção Criminal Acordam em conferencia os juízes no Tribunal da Relação do Porto No Proc.C.C. nº1939/10.0JAPRT do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oliveira de Azeméis, em que foi julgado o arguido B…, e em que foi deduzido pedido de indemnização civil por C…, onde peticiona a condenação do arguido ao pagamento, a titulo de danos patrimoniais, a quantia de €6.745,00 e a título de danos não patrimoniais a quantia de €80.000,00, acrescido de juros moratórios, à taxa legal, desce a citação até efectivo e integral pagamento, bem como a quantia que se apurar em execução de sentença pelo pagamento salarial equivalente ao salário mínimo nacional até que a demandante consiga trabalhar e obtenha um emprego certo e continuo, assim como os tratamentos e consultas psiquiátricas de que necessite durante os próximos dez anos.

Foi por acórdão de 12/1\2/2011, proferida a seguinte: “… Decisão Nestes termos julga-se procedente por provada a acusação pública, e, os Juízes que constituem o Tribunal Colectivo decidem:

  1. Condenar o arguido B…, pela prática de um crime de violação, p. e p. pelo art. 164º, nº 1, al. a) do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos de prisão.

  2. Condenar o arguido B…, como autor material de um crime de atentado à segurança de transporte rodoviário, p. e p. pelo art. art. 290º/1, b), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão; C) Passando agora ao cúmulo das penas parcelares, ora impostas ao arguido B…, atento o disposto no art.77º nº2 Código Penal, condena-se o mesmo na pena unitária de 8 (oito) anos de prisão.

(…) F) Outrossim, julga-se parcialmente procedente por provado o pedido de indemnização cível deduzido pela demandante C… Duarte contra o demandado B… e, em consequência, condena-se este a pagar-lhe a quantia global de € 30.950,00 a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros moratórios a contar desde a data do presente acórdão, até ao efectivo reembolso, absolvendo-se dos restantes pedidos.

(…) G) Atento o disposto no art.213 nº1 al.b) do C.P.P., face aos fundamentos já invocados a 343 e ss., que se são aqui por reproduzidos, e aos factos dados como provados, qualificação jurídica dos mesmos e pena aplicada, determina-se a manutenção da medida de coacção de prisão preventiva ao arguido B….

(…) Após trânsito em julgado desta sentença: (…) - cumpra-se o disposto no 8ºnº2 da Lei5/2008 de 12/2 (recolha de amostra de ADN do arguido) (…)”+Recorre o arguido o qual no final da sua motivação apresenta as seguintes conclusões: 14. Quanto à reconstituição dos factos, cumpre dizer que os factos dados como provados, tiveram em conta (como se expõe na motivação dos factos), essencialmente, os depoimentos, da assistente, das testemunhas D… e E… e fundamental, foi ainda, conforme o expõe o Tribunal “a quo”: “ …a inquirição da testemunha F…, inspector da Polícia Judiciária que explicou… e o modo como este, aquando da busca domiciliária a sua casa, admitiu a prática dos factos, e disponibilizou-se voluntariamente a realizar a reconstituição dos mesmos, conforme resulta de fls 180 a fls. 190.

Tal diligência foi assim determinante para o apuramento da autoria dos factos, porquanto, só o autor dos factos poderia ter apontado o local onde os mesmos ocorreram com a precisão que o arguido o fez, e demonstrando em que posição colocou a assistente na altura em que consumou a violação.

  1. O arguido, ora recorrente, na audiência de julgamento remeteu-se ao silêncio. O exercício desse direito nunca o pode desfavorecer, cfr. art. 343/1 e 345/1 do CPP, o que não aconteceu nos autos.

  2. No nosso CPP (art. 141/5) vigora o princípio da proibição do arguido ser utilizado como meio de prova, no entanto, ao considerar o Tribunal “a quo” fundamental o depoimento do Inspector da PJ, que presidiu à reconstituição dos factos, durante o qual foi feito um depoimento indirecto e camuflado das declarações prestadas pelo arguido em sede de inquérito.

  3. Em causa, nos presentes autos, está a liberdade de um ser humano, que se presume inocente até trânsito em julgado do acórdão e a quem assiste, em caso de dúvida razoável, o princípio in dubio pro reo.

  4. Impõe-se que o processo penal seja justo, não podendo optar pelo tratamento privilegiado de um qualquer meio de prova nos termos do qual, em caso de dúvida quanto à matéria probatória, a decisão deve ser a mais favorável ao arguido, implicando a inadmissibilidade da presunção da culpa, o que aqui não aconteceu.

  5. Não podem, portanto, ser valoradas em julgamento provas que não tenham sido obtidas de forma válida, produzidas ou examinadas em audiência, cfr. 355/1 e 2 do CPP.

  6. Oram, reservando-se o arguido ao silêncio na audiência de julgamento, a utilização e valoração das declarações por si prestadas durante a reconstituição dos factos, utilizando-se para isso o depoimento da testemunha F…, que descreveu em audiência tudo aquilo que, supostamente, o arguido terá dito durante a reconstituição dos factos, é proibida (art.º 357ºCPP), cfr. se pode constatar da parte do depoimento da referida testemunha, ouvido na audiência de julgamento do dia 21-11-2011, das 15:21:37 às 15:37:51, através do sistema de videoconferência, que está gravado em suporte digital, com inicio a 00:00.01 e fim a 00:16:13, prestadas aos 05:10 a 09:33.

  7. Perante isto não podemos deixar de concluir que a reconstituição de facto é, na sua essência, não mais do que declarações do arguido prestadas em sede de inquérito.

  8. Assim, ao relevar-se a referida diligência como tal para efeitos de decisão condenatória, estamos perante uma clara violação da lei.

  9. Por outro lado, constata-se que há uma preocupação daquela testemunha, durante o seu depoimento, de esclarecer e insistir que todos os formalismos legais foram cumpridos, que o arguido terá, voluntariamente, esclarecido os factos e a procedeu à reconstituição ao local, tendo dado a sua autorização, veja-se a esse propósito a parte do depoimento da testemunha F…, ouvido na audiência de julgamento do dia 21-11-2011, das 15:21:37 às 15:37:51, através do sistema de videoconferência, que está gravado em suporte digital, com inicio a 00:00.01 e fim a 00:16:13, prestadas aos 14:57 a 16:07.

  10. Importante salientar, ainda, para o facto de o arguido ter sido sujeito a interrogatório e a todas as outras diligências, anteriores e posteriores aquele, na ausência de defensor, apesar de o mesmo ter, formalmente e processualmente, prescindido do mesmo.

  11. É entendimento da nossa jurisprudência, cfr. refere o AC RP de 9/9/2009, in proc 230/08.7PDVNG.P1 (www.dgsi.pt) que: “I – A ‘reconstituição do facto’ não tem por finalidade a existência de factos em si, mas se podem ter ocorrido de determinada forma.

    II – Um ‘auto de reconhecimento externo’ que corporiza apenas uma confissão da autoria dos factos, in loco, não pode valer como ‘reconstituição do facto’, antes e tão só, como declaração ilustrada do arguido.

    III – A leitura daquele ‘auto de reconhecimento externo’, bem como – optando o arguido pelo silêncio em audiência – a inquirição sobre o conteúdo das declarações prestadas no seu decurso, a quem, a qualquer título, participou na sua recolha, consubstancia produção de prova proibida.

  12. A reconstituição efectuada apenas pretendeu documentar os autos com uma confissão “ilustrada” do arguido e in loco, pois da referida diligência apenas se poderia concluir que os factos poderiam ter sido praticados pelo arguido, mas não que, efectivamente o foram.

  13. Decidindo, o Tribunal "a quo", com base no prova processualmente inadmissível violou o ínsito no art.º 357º nº 1 do CPP, cuja consequência legal é a nulidade, devendo a decisão ora impugnada ser substituída por uma outra que determine a anulação do julgamento.

    ……………………………………… ……………………………………… ……………………………………… Respondeu o MºPº pugnando pela manutenção da decisão; Nesta Relação o ilustre PGA é de parecer que o recurso deve improceder; Foi cumprido o artº 417º2 CPP Cumprida as formalidades legais, procedeu-se á conferência Cumpre apreciar Consta do acórdão recorrido (transcrição): “2 - Fundamentação 2.1. Os factos provados 1 - No dia 25 de Novembro de 2010, no seu local de trabalho, na empresa G…, o arguido apercebeu-se que uma colega sua, C…, pessoa por quem sentia forte atracção física, iria continuar o respectivo turno de trabalho, para além das 23 horas, até à uma hora da madrugada.

    2 - Uma vez que tal envolvimento por parte daquela nunca fora correspondido, decidiu por tal motivo levar à prática a intenção de aproveitar oportunidade que lhe permitisse poder sujeitar a visada a ter consigo relacionamento sexual forçado.

    3 - Nessa noite, decidiu então concretizar semelhante intenção.

    4 - Cerca da uma hora da madrugada, no perfil mais estreito da uma Rua secundária estreita, ladeada por mata e campos de cultivo, rua essa que permite o acesso à localidade de … e que normalmente era a utilizada pela C… para se deslocar do seu local de trabalho para a residência e no local com menor luminosidade e mais isolado, começou o arguido a colocar em toda a largura da via, dezenas de pedras e um ramo de uma árvore no sentido perpendicular da mesma, tendo algumas daquelas mais de 20 cm de altura, assim conseguindo barrar por completo qualquer circulação automóvel.

    5 - Seguidamente procurou refúgio na berma da estrada, mas a 30 metros do local barrado, tendo-se então agachado perto de uns arbustos, aguardando a passagem da C… no seu automóvel, marca Opel, modelo ….

    6 - Na altura em que esta passou, teve necessidade de imobilizar a viatura, porquanto lhe era impossível transpor a barreira que o arguido tinha criado.

    7 - Colocou então um gorro na cabeça e empunhando um objecto em tudo idêntico a uma da arma de fogo, aproximou-se então do veiculo, colocou uma das mãos no puxador da porta do lado do condutor, abriu a mesma e, apontando a réplica de uma arma de fogo na direcção da C…, pediu-lhe, utilizando uma voz rouca e com sotaque brasileiro, de modo...

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