Acórdão nº 209/07.6TBMTR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA ADELAIDE DOMINGOS
Data da Resolução17 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 209/07.6TBMTR.P1 (Apelação) Tribunal recorrido: Tribunal Judicial de Montalegre Apelante: Junta de Freguesia … Apelada: Herança Indivisa de B… Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO Junta de Freguesia …, concelho de Montalegre, intentou ação popular, sob a forma de processo sumário, contra herança Indivisa de B…, representada por C…, D…, E…, F… e F…, peticionando que os réus sejam condenados: “

  1. A reconhecerem que o “Caminho e espaço público de carga e descarga de …”, (…) em …, têm natureza pública.

  2. A retirarem do troço daquela via e espaço público que indevidamente vedaram e fizeram seu, todos os materiais, veículos que neles depositaram, demolição do muro envolvente à casa da garagem por forma a restituir-lhes a respectiva funcionalidade.

  3. A absterem-se de praticarem quaisquer actos que ofendam e impeçam o normal e pleno uso e fruição do caminho e espaço públicos de … (…)”.

    Para fundamentar a sua pretensão alegou, em suma, que os réus ocuparam parte de um caminho e espaço públicos, em …, com um muro cuja construção levaram a cabo e, a partir de então, depositaram no mesmo um veículo.

    Estes atos vêm impedindo os habitantes de … e demais cidadãos de usufruíam daqueles espaços como vinham fazendo.

    Os réus foram citados e ofereceram contestação, negando ser o espaço em causa público, mas tendo sido em tempos – já não atualmente – onerado com uma servidão de passagem a favor de dois prédios (de terceiros) para fins agrícolas (sementeiras, plantações e colheitas). Alegaram, ainda, que extinta essa servidão, com a construção do prédio pretendem os réus exercer o seu direito legal de tapagem.

    A autora respondeu, mantendo o alegado na petição inicial e peticionando a condenação dos réus como litigantes de má fé.

    O Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser a autora convidada ao aperfeiçoamento da petição inicial, com vista a concretizar a natureza pública do caminho.

    A autora pronunciou-se pelo preenchimento dos requisitos para a ação popular.

    Foi proferido despacho a determinar as citações legalmente previstas, dos titulares dos interesses em causa na ação.

    Realizou-se audiência preliminar com frustração da tentativa de conciliação.

    Foi proferido despacho saneador e dispensou-se a seleção da matéria de facto assente e elaboração da base instrutória.

    Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente, absolveu os réus do pedido, incluindo o de condenação como litigantes de má fé.

    Inconformada, apelou a autora.

    Contra-alegou a ré.

    Conclusões da apelação: 1º Existe imperceptibilidade parcial do depoimento/gravação da testemunha H…, está a A. condicionada nas suas alegações e apreciação da matéria de facto, que foi detectada agora aquando da audição das gravações para elaborar o presente recurso.

    1. A imperceptibilidade das gravações, de forma parcial, equivale à omissão de um acto que a lei prescreve, com influencia directa no exame e decisão da causa, na medida que condiciona a reacção que as partes podem dirigir contra a decisão proferida sobre a matéria de facto – art. 690-A do CPC.

    2. Esta deficiência de gravação constitui nulidade secundária (art. 201, nº 1 e 204 a contrario) a arguir mediante reclamação nos termos dos artigos 205 nºs 1 e 3 do CPC e art. 9º do DL nº 39/95 de 15 de Fevereiro.

    3. Nulidade esta, arguida tempestivamente em alegações deste recurso (vide Ac do STJ de 14 de Janeiro de 2010-4323/05.4TBVIS.CJ.S.I. de 15 de Maio de 2008-08B1099 e de 13 de Janeiro de 2009-08A3741.) que implica a anulação da decisão da matéria de facto e sentença proferida.

    4. A Mma Juiz a quo, entendeu que, efectivamente, existe um terreno de passagem entre a EN e as ditas fossas e terreno, que vem sendo utilizado há mais de 20 anos pelos moradores para acesso aos respectivos prédios, a pé, com tractores e outras máquinas agrícolas e pelos funcionários da Câmara Municipal … para acederem às fossas públicas da povoação e procederem à respectiva limpeza com as respectivas máquinas, veículos e a pé, à vista de toda a gente, ininterruptamente, sem qualquer estorvo, turbação ou importúneo de quem quer que fosse.

    5. Entendeu, ainda, a Mma Juiz a quo, que estavam assim demonstrados dois dos requisitos para se dar como provada a natureza pública do caminho, que estava no uso directo da povoação e que tem por função a satisfação de interesses públicos relevantes, mas que, a imemorialidade do uso ficara por provar.

    6. Na nossa modesta opinião, não podemos concordar, pois que, pela prova produzida pela Autora, todas as testemunhas confirmaram que, “quer o espaço do Carregadouro em … e que integra o caminho que vai no sentido Norte para Sul, desde a EN, de toda a vida, foi utilizado pelo povo e por quem queria”, muitos deles, referiram ainda que já assim era, sendo eles crianças e que não tinham bem na memória como se iniciou, outros, além de ser do seu conhecimento, tais factos, foram-lhes, também, transmitidos pelos antecessores e pessoas da povoação.

    7. Pelo que, deveriam ter sido respondidos de forma positiva, os artigos da PI nºs 3, 5º, 7º, 8º, 9º, 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 16º, 17º, 18, 19º, 20º, 21º, 22º, na totalidade e ainda os arts. nº 4 e 6.

    8. Está aqui em causa, a afectação que o caminho em causa e carregadouro que o integra de …, …, freguesia …, e a sua utilização que tem por objecto a satisfação de interesses colectivos de certo grau e relevância da povoação da localidade de … e que vem de tempos recuados no tempo.

    9. O caminho que serve as fossas da povoação, é público, já que, nele se localiza, o sistema de condução das águas residuais e acesso à fossa da povoação. Quanto aos sistemas públicos de distribuição de água e de drenagem de águas residuais importa ter presente que o D.L. 207/94 de 6 de Agosto e o Decreto Regulamentar 23/95 de 23/8 identificam os sistemas públicos de distribuição de águas e de drenagem de águas residuais que no primeiro caso compreendem todos os órgãos de captação e de distribuição de água, até ao limite da propriedade a servir incluindo-se ainda na rede pública os ramais de ligação. No caso das águas residuais o sistema público é essencialmente constituído pelas redes de colectores, instalações de tratamento e dispositivos de descarga final (cf. artigos 32º, 115º e 282º do Decreto Regulamentar 23/95, de 23/8), sendo considerados bens públicos.

    10. A sentença a quo viola o art. 201 º, 668º, art. 653º, 646º nº 4 do CPC e art. 84º da CRP, Uniformização da Jurisprudência do STJ - AC. DO S.T.J., DE 19-4-1989, www.dgsi.pt., ACS. DO S.T.J., DE 28-9-2009, 23-12-2008, 13-3-2008, 18-5-2006 e 3-2-2005, www.dgsi.pt; DA RELAÇÃO DO PORTO, DE 28-4-2009, 17-5-2005, 23-10-2003e 5-12-2002, www.dgsi.pt. No AC. DO S.T.J., DE 14-10-2004, www.dgsi.pt., AC. DO S.T.J., DE 23-12-2008, pelo que, deve ser anulada, com repetição do julgamento e/ou, caso não seja doutamente entendido, ser substituída por ou outra em consonância com a boa e sã justiça.

    Conclusões das contra-alegações: 1.ª O depoimento da testemunha H… está totalmente perceptível, contrariamente ao invocado pela apelante.

    1. A apelante não cumpriu o ónus de alegação imposto pelo artigo 690º - A, nº 1, al. b) do CPC (na redacção anterior ao DL. 303/07, de 24/08): não especificou quais os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, nem especificou qual a resposta que devia ser dada a cada um desses pontos da matéria de facto, que têm que constar das alegações e das conclusões.

    2. O que acarreta a inadmissibilidade do recurso quanto à matéria de facto.

    3. Não tendo a A./apelante logrado provar os requisitos legais para a qualificação como “público” nem do alegado caminho nem do invocado carregadouro, teria a acção que improceder totalmente, como bem decidiu o Tribunal “a quo”.

    4. No corpo das alegações a apelante faz referência aos depoimentos das seis testemunhas que indicou, sendo que nos termos do art. 789º do CPC, a cada facto só podem responder três testemunhas, pelo que se impunha que especificasse o mencionado na conclusão 2ª, ónus que não cumpriu.

    5. Inversamente ao pretendido pela apelante, dos depoimentos das testemunhas por ela indicadas, resulta cristalino que se trata de uma servidão de passagem, e não de um “caminho público”, e não resultou demonstrada a existência no local em causa de qualquer “carregadouro público”.

    6. Dos depoimentos das testemunhas da R./apelada, I… (faixa 13 do CD digital), J… (faixa 14 do CD digital), K… (faixa 15 do CD digital) e L… (faixa 16 do CD digital) também resulta demonstrado que se trata de uma servidão de passagem que onera o prédio da R., e que inexiste no local em causa qualquer espaço público (“logradouro ou carregadouro”).

    7. Os documentos de fls. 234 e ss (inventário de 1961) e 255 e ss (escritura de 1987) dos quais consta o prédio de M… do qual foi desanexado o prédio da R., demonstram que aquele prédio não confrontava com qualquer...

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