Acórdão nº 1816/08.5TBVLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ARAÚJO
Data da Resolução15 de Janeiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

PROC. N.º 1816/08.5TBVLG.P1 Do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo.

REL. N.º 689-A Relator: Henrique Araújo Adjuntos: Fernando Samões Vieira e Cunha*ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: I.

RELATÓRIO “B…, Lda.”, com sede na Rua …, ../.., …, Valongo, intentou, no Tribunal Judicial de Valongo, acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato contra “C…”, com sede em …, Rue …, ….., França, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de 38.678,44 €, acrescida de juros de mora sobre o capital de 35.040,56 €, desde a propositura da acção até efectivo e integral cumprimento, com fundamento no fornecimento de diverso material da indústria de serralharia de precisão que a Ré não pagou.

Em 26.05.2008 foi expedida carta-registada para citação da Requerida na sua sede social, onde foi entregue em 30.05.2008 – cfr. fls. 92/93.

Na sequência dessa carta foi apresentado articulado em língua francesa, subscrito pelos Ex.ºs Advogados D… e E….

Notificada desse articulado, a Requerente veio dizer o seguinte: “Não obstante parte documento junto a fls. 89 e 90 estar redigida em língua estrangeira, resulta inequivocamente de todo o seu teor, nomeadamente do respectivo cabeçalho, que o mesmo constitui resposta à carta que recebeu, para citação, sendo ainda que o mesmo se encontra subscrito por Advogados, embora de uma sociedade de Advogados de Direito francês.

(…) Verifica-se, porém, que aquele articulado, por ser apresentado em língua francesa, não respeita o disposto no art. 139º-1, o que impede a Autora de exercer o respectivo contraditório.

Para além disso, a Ré não comprova a autoliquidação da taxa de justiça inicial.

Salvo melhor opinião, deve a Ré ser notificada nos termos e para os efeitos do disposto no art. 486ºA-3 CPC, e bem assim para, no prazo que lhe for concedido, apresentar aos autos cópia traduzida em língua portuguesa, do articulado que produziu, sob a cominação de o mesmo ser desentranhado, com todas as consequências legais.

(…)”.

O Mmº Juiz a quo deferiu esse requerimento e, em 05.01.2009, foi expedida nova carta registada para a Requerida, tendo esta apresentado tradução do articulado apresentado.

Em 18.09.2009, o Mmº Juiz proferiu novo despacho do seguinte teor: “Constata-se … que não foi junta aos autos procuração outorgada a favor do advogado subscritor da oposição apresentada. Assim, notifique-o nos termos do disposto no art. 40º, n.º 2, do CPC”.

Em 27.01.2010, foi expedida carta-registada à Requerida, notificando-a nos termos do transcrito despacho.

No dia 04.06.2010, o Mmº Juiz exarou o despacho que segue: “Foram apresentados, em nome da requerida, requerimentos subscritos por mandatário que não juntou aos autos procuração outorgada a seu favor.

Notificado para juntar aos autos procuração, não a juntou em 10 dias nem até ao momento.

Assim, e atento o disposto no art. 40º, n.º 2, do CPC, fica sem efeito tudo o que o mesmo praticou, ordenando-se o desentranhamento de tal processado e sua devolução ao apresentante. (…)”.

Finalmente, em 26.01.2011, foi proferida decisão que, por falta de oposição da Requerida, conferiu força executiva à petição (fls. 124/125).

Notificada dessa sentença, veio a Ré arguir a incompetência internacional do tribunal português, a nulidade da citação e a recusa deste acto.

Por decisão proferida em 05.04.2011, o tribunal da 1ª instância julgou improcedentes as arguições da Ré que, inconformada, logo recorreu.

O recurso foi admitido como sendo de apelação, com efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso a apelante conclui do seguinte modo: DA INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO TRIBUNAL 1. Estando em causa um contrato de compra e venda de bens, o Autor poderia ter optado entre propor a presente acção no foro do lugar do domicílio da Ré (em França) ou no foro facultativo do lugar da entrega dos bens.

  1. No caso concreto, ao contrário do decidido no tribunal a quo, os bens foram entregues em França, pelo que o foro competente sempre será o francês.

  2. Nas facturas juntas aos autos vem expressamente referido que o Local de Carga das mercadorias é a morada da Autora e que o Local da Descarga das mercadorias entregues é: …, Rue …, …., France (sede da Ré, ora Recorrente).

  3. Os teores da nota de encomenda e das guias de transporte ora juntas como documentos 1, 2 e 3, confirmam inequivocamente que as mercadorias foram efectivamente entregues, como acordado, em … – França.

  4. O lugar da entrega dos bens [França] foi um facto alegado pela Recorrente no requerimento de arguição da incompetência absoluta do tribunal, facto esse que a Recorrida não impugnou e aceitou.

  5. Sendo o domicílio do Réu, Recorrente, em França, e tendo o lugar da entrega dos bens sido também em França, os tribunais portugueses são absolutamente incompetentes para conhecer deste litígio (cfr. n.º 1 do art. 2º e n.º 1 do art. 5º do Regulamento (CE) n.º 44/2001, do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000.

    DA NULIDADE DA CITAÇÃO POR PRETERIÇÃO DE FORMALIDADES LEGAIS 1. O acto de citação da Recorrente é nulo por violação das formalidades exigidas pelo Regulamento (CE) n.º 1348/2000, de 29 de Maio de 2000.

  6. Com efeito, o acto de citação estava redigido em Português e não estava acompanhado de qualquer tradução que possibilitasse à Recorrente a plena compreensão do objecto do processo, das cominações legais a que se encontrava sujeito e, bem assim, dos termos em que podia apresentar a sua defesa.

  7. Além disso não continha a indicação da possibilidade de recusa da recepção do acto de citação pela Recorrente.

  8. O acto de citação também é nulo por omissão do prazo dilatório para defesa da Ré, que tem lugar mesmo no procedimento especial previsto no Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro.

  9. Por requerimento com data de 12 de Junho de 2008, enviado ao abrigo do art. 8º do Regulamento (CE) n.º 1348/2000 do Conselho, de 29 de Maio de 2000, a Recorrente arguiu expressa e tempestivamente a nulidade da citação.

  10. O pressuposto processual do patrocínio judiciário previsto no Código de Processo Civil não é aplicável aos requerimentos remetidos ao abrigo do art. 8º do citado Regulamento.

  11. O requerimento da Recorrente com data de 12 de Junho de 2008 não revela que esta tenha tido conhecimento da causa de pedir da acção nem dos seus meios de defesa.

  12. Nesse requerimento a Recorrente recusa a citação, contesta a sua validade e pede que lhe seja remetida uma versão portuguesa do acto de citação, o que constitui o exercício legítimo de um direito que o tribunal recorrido devia ter deferido.

  13. Sendo a citação nula e tendo tal nulidade sido arguida legítima e tempestivamente, deve todo o processado subsequente ser anulado e repetida a citação com observância das formalidades legais.

    Subsidiariamente … 10. Perante a citação em língua portuguesa, a Recorrente nem sequer tinha o ónus de arguir a nulidade da citação, nos termos do n.º 1 do art. 198º do CPC, mas apenas de recusar o acto de citação nos termos do art. 8º do Regulamento n.º 1348/2000.

  14. À citação para estes autos aplica-se o Regulamento n.º 1348/2000, que determina que o citando pode recusar o acto de citação nessa língua, sem, todavia, impor nenhuma formalidade para o exercício do direito de recusa da recepção da citação e sem fazer depender do cumprimento das regras processuais civis portuguesas destinadas a assegurar a regularidade ou suficiência do patrocínio judiciário.

  15. A Ré limitou-se, portanto, a comunicar, válida e eficazmente tal recusa, mediante requerimento dirigido ao presente Tribunal, em 12 de Junho de 2008.

  16. A declaração emitida pela Ré deve valer com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele (art. 236º do CC).

  17. O douto tribunal não pode deixar de interpretar esta declaração da Ré – independentemente da regularidade ou não do mandato judicial –...

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