Acórdão nº 297/10.8TBCPV.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelLUÍS LAMEIRAS
Data da Resolução21 de Janeiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso de Apelação Processo nº 297/10.8TBCPV.P1---. Apelante - B… e - C…, ambos residentes no …, …, em Castelo de Paiva;---. Apelado - D…, SA, com sede na …, nº .., no Porto.

--- SUMÁRIO: I – O despacho do juiz que, na sequência de suspensão da instância cautelar, manda notificar as partes para se pronunciarem sob pena de determinar a sua extinção por falta de interesse no seu prosseguimento, constitui despacho de expediente, não carente de fundamentação e sem virtualidade de poder transitar em julgado (artigos 156º, nº 4, início, 158º, nº 1, e 679º, do Código de Processo Civil); II – A transmissão da posição do locatário, em contrato de locação financeira de coisa que não seja bem de equipamento, não exige a outorga do locador no contrato instrumento dessa transmissão, mas apenas o consentimento dele à sua realização (artigos 11º, nº 2, do Decreto-Lei nº 149/95, de 24 de Junho, 1059º, nº 2, e 424º do Código Civil); III – As benfeitorias que algum terceiro introduza no bem dado em locação financeira não são susceptíveis de gerar na esfera do locatário um crédito indemnizatório sobre o locador; e, por isso, insusceptíveis de sustentar o direito de retenção por ocasião do termo do contrato (artigos 1273º e 754º do Código Civil); IV – Se os factos apurados evidenciam que o contrato de locação financeira cessou, por decurso do prazo, e que o locatário não fez operar o direito à aquisição do bem, nem o devolveu ao locador, deve a providência cautelar de entrega judicial por este desencadeada ser julgada procedente e ordenada a pretendida entrega (artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 149/95).

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório 1. Da instância cautelar.

1.1.

D…, SA propôs, no dia 29 de Setembro de 2010, providência cautelar de entrega judicial contra B… e C…, pedindo a entrega do terreno de pinhal e da casa destinada a oficina de carpintaria de um pavimento sitos na …, em …, no concelho de Castelo de Paiva (descrição 00657 da conservatória do registo predial de Castelo de Paiva).

Alegou em síntese, que como locador celebrou com os requeridos como locatários, em Abril de 1998 e pelo prazo de 10 anos, um contrato de locação financeira que teve por objecto o mencionado bem imóvel; que os requeridos deixaram de pagar as rendas firmadas em Agosto de 2003; e que, ademais, o contrato chegou ao seu termo em Abril de 2008, sem que os locatários exercessem o direito de compra. Ainda assim, que em Março de 2010 lhes enviou carta de resolução do mesmo contrato. Mas que, por fim, nunca lhe restituíram o bem imóvel locado; coisa que se têm sempre recusado a fazer.

1.2.

Em despacho liminar o tribunal “a quo” ordenou a citação dos requeridos para se oporem à providência.

1.3.

Os requeridos apresentaram instrumento de oposição.

Disseram, em síntese, terem proposto, em 2004, a cessão da sua posição contratual a E… e esposa, pessoas idóneas e com capacidade financeira para honrar o contrato, aceite pelo requerente; este, contudo, no escrito do contrato, tendo trocado os nomes dos outorgantes; ficando os requeridos a aguardar regularização; tirando-lhes legitimidade para o procedimento; e gerando abuso de direito por a cessão só não se verificar por causa do requerente. Ainda que o artigo 21º do DL nº 149/95, de 24 de Junho, que sustenta o procedimento, não é aplicável, face ao seu nº 9, por se tratar de imóvel; gerando a impropriedade do meio cautelar. Por fim, que por intermédio de terceiros realizaram no imóvel benfeitorias que lhe aumentaram substancialmente o valor; foram construídos muros de vedação e feitas instalações de escritórios que o valorizaram em mais de cem mil euros; gerando o direito de retenção até que o requerente lhes pague o respectivo valor, sob pena de enriquecimento ilegítimo.

Em suma; devem proceder as excepções, ser reconhecido o direito de retenção sobre o imóvel e, em qualquer caso, improceder o procedimento instaurado.

1.4.

A instância cautelar prosseguiu.

Em 25 Out 2010 foi designada audiência final (v fls. 81); reagendada em 8 Nov 2010 (v fls. 94); e adiada por decisão de 23 Nov 2010.[1] A seguir, a instância cautelar foi suspensa; em 26 Nov 2010 (v fls. 101); e em 10 Dez 2010 (v fls. 110). Por despacho de 7 Mar 2011 foi agendada audiência (v fls. 122). Em 1 Abr 2011 foi suspensa a instância (v fls. 137). Em 16 Mai 2011, reagendada a audiência (v fls. 140). Em 16 Jun 2011, suspensa a instância (v fls. 158); voltando a sê-lo em 25 Jan 2012 (v fls. 161).

Entretanto, em 2 Mai 2012, foi proferido o seguinte despacho: «Notifique-se as partes para requererem o que tiverem por conveniente com a advertência de que nada sendo dito, em 5 dias, se determinará a extinção da instância por falta de interesse processual no seu prosseguimento.» (v fls. 162).

Este despacho foi notificado às partes, por transmissão electrónica, elaborada no dia 3 Mai 2012.[2] Em 11 Mai 2012 o banco requerente pediu o seguimento da instância e a designação de nova data para a audiência (v fls. 164 e 165).

Em 5 Jun 2012 foi designada audiência (v fls. 166).

1.5.

No dia 15 de Junho de 2012 o tribunal “a quo” produziu decisão.

Julgou procedente a pretensão cautelar; e determinou a entrega ao banco requerente do bem imóvel objecto do contrato de locação financeira firmado com os requeridos.

  1. Da instância de apelação.

    2.1.

    Os requeridos apelaram da decisão que julgou o procedimento.

    Produziram alegação; e findaram com estas sínteses conclusivas: a) Pelo despacho anterior a designação do julgamento é dito que, se nada fosse comunicado nos autos, quanto ao estado das negociações, entre as partes, seria extinta a instância; b) Na falta de norma salvaguardando a sua não constituição, como e o caso do nº 3 do artigo 508º do CPC, em relação à audiência preliminar, aquele constitui caso julgado formal, nos termos do artigo 672º, nº 1, do mesmo código; c) Passando, esse despacho, a ter força obrigatória dentro do processo; não podendo ser proferida decisão posterior, que com ele não seja compatível; d) Como o é a sentença recorrida, determinando a apreensão e entrega à requerente do prédio em causa; e) Acresce que, na oposição que deduziram, foi pelos requeridos suscitada a inviabilidade processual do procedimento cautelar, por respeitar a imóvel; f) Conforme consta de c) dos factos provados, o contrato entre requerente e requeridos, tendo por objecto um prédio misto, que foi celebrado, em 27.4.1998; g) Entendendo os requerido, não ser o artigo 21º do DL nº 149/95, neste caso, aplicável, face ao seu nº 9, dado tratar-se de bem imóvel; h) Por ser esse o regime aplicável ao contrato de locação financeira em apreço, atenta a regra tempus regit actus; i) O que os requeridos alegaram em 21º da oposição; j) Pelo que, no entendimento de que a questão, em bom rigor, não foi conhecida na sentença recorrida, importa, também, a sua nulidade, nos termos do artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil; l) De todo o modo, sem prescindir, sendo, nos termos do artigo 8º daquele artigo, subsidiariamente aplicáveis à providência as disposições gerais sobre providências cautelares, previstas no Cód Proc Civil, conforme referido na sentença; m) Entende-se que não são verificados os requisitos cumulativos do decretamento da providencia cautelar comum, nos termos dos artigos 381º e 387º, do CPC, maxime o fundado receio de lesão grave e dificilmente reparável, e ainda de não ser o prejuízo decorrente do decretamento da providência consideravelmente superior ao dano que através dela se pretende acautelar; n) É que, do objecto do contrato, faz parte uma casa destinada a oficina de carpintaria, ou seja, em que é exercida uma actividade industrial, sendo de presumir elevados os danos que causaria; o) Pelo que, uma vez findo o contrato, para os fins visados pelo requerente, deverá considerar-se a normal acção declarativa como o meio próprio; p) E não o recurso a procedimento cautelar, atenta a natureza deste; Sem prescindir, q) Por outro lado, os requeridos (também) alegaram na sua oposição (artigo 3º): “(…) em 2004, os requeridos propuseram ao requerente a cessão da posição contratual no sentido da cessão da posição dos requeridos a E... e esposa, pessoas idóneas e com capacidade financeira bastante para poderem assumir as obrigações decorrentes do contrato em causa, o que foi aceite pelo requerente”; r) E que (artigo 4º): “(…) no respectivo contrato de cessão de posição contratual, os serviços do requerente trocaram os respectivos agregados familiares, colocando o ora requerido B... casado com a esposa daquele, F...”; s) Não sendo assim compreensível o constante da sentença recorrida, referindo, nos factos não provados: “1. Que B... e mulher fossem pessoas idóneas e com capacidade financeira para assumir as obrigações decorrentes do contrato.”; t) Independentemente de se concordar ou discordar do seu alcance; u) E, sobre tais factos alegados, nenhuma resposta foi produzida pelo requerente; v) Sendo, desde logo, das regras da experiência, que, as pessoas, em geral, não têm acesso a papel timbrado, em branco, do requerente banco; x) Pelo que, de acordo com as regras de alegação e prova (artigo 342º do CC) caberia ao requerente provar que a anomalia verificada (troca de identidades dos outorgantes) ou era imputável aos requeridos, ou não lhe era imputável; z) Pelo que, será de presumir que a si (aos seus serviços) se ficou a dever; aa) Referindo, ainda, os requeridos, em 9º da oposição, que, assim, “(...) estaria o requerente em manifesta posição de abuso de direito, porquanto a não, verificação da cessão da posição contratual só a si se deve”; bb) Questão que não se mostra, igualmente, conhecida; cc) Sendo certo que da motivação da convicção sobre os meios de prova, nada é concretizado quanto às testemunhas inquiridas, encontrando-se uma frase introdutória, que termina com “dois pontos”; o que, importa, manifestamente, suprir, completando; Ainda sem...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT