Acórdão nº 4928/08.1TDPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução16 de Janeiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

(proc. n º 4928/08.1TDPRT.P1)*Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO 1. Na 4ª Vara Criminal do Porto, nos autos de processo comum (Tribunal Colectivo) nº 4928/08.1TDPRT, foi proferido acórdão, em 19.6.21012 (fls. 553 a 583 do 2º volume), constando do dispositivo o seguinte: Pelo exposto, e nos seus precisos termos, acordam os Juízes que constituem este Tribunal Colectivo em julgar procedente, por provada, a acusação pública e em consequência: - Condenam a arguida B… pela pratica em, autoria material, na forma consumada e em concurso real, de um crime de falsificação, p. e p. pelo art. 256º, nº 1, al. a) do Código Penal e de um crime de burla, p. e p. pelo art. 217º, nº 1 do mesmo diploma legal, respectivamente, nas penas de 7 (sete) meses de prisão e 10 (dez) meses de prisão; - Operam o cúmulo jurídico das penas parcelares, à luz do disposto no art. 77º do Código Penal, e em consequência condenam a arguida B… na pena única de 1 (um) ano de prisão cuja execução se suspende, à luz do disposto nos arts. 50º e 54º, ambos do Código Penal, pelo período de um ano, ficando a arguida obrigada ao pagamento da quantia de € 1030,20 (mil e trinta euros e vinte cêntimos) a favor do IEFP, IP no decurso de tal período; - Decidem julgar parcialmente procedente, por parcialmente provado o pedido cível apresentado por INSTITUTO DO EMPREGO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL, I.P (IEFP.IP) e, em consequência, condenam a arguida/demandada B… a pagar ao demandante a quantia de 1030,20 (mil e trinta euros e vinte cêntimos), acrescido de juros contados à taxa legal, desde a notificação do pedido cível e até integral pagamento; A arguida pagará 4 Ucs de taxa de justiça, 1% daquele valor nos termos do art. 13º, n.º 3 do D.L. 423/91 de 30/10, € 100,00 de Procuradoria em partes iguais.

As custas do pedidos de indemnização cível são a cargo de demandante e demandado, na proporção do respectivo decaimento, à luz do disposto no art. 446º do C.P.C.

(…)*2. A arguida B… não se conformando com esse acórdão, interpôs recurso (fls. 598 a 617 do 2º volume), formulando as seguintes conclusões: 1. A arguida vem condenada pela prática, em concurso efetivo, de um crime de falsificação, p. e p. pelo artigo 256º, nº 1 al. a) do Código Penal (CP) e de um crime de burla, p. e p. pelo artigo 217º do mesmo diploma, na pena única de um ano de prisão, com execução suspensa por um ano, com a obrigação de pagamento ao IEFP, IP da quantia de € 1.030,20 2. Na Acusação foi imputada à arguida, no âmbito de um contrato de prestação de serviços e respetivo aditamento, celebrados com IEFP, na disciplina de …, num curso de cozinha, a falsificação das Notas de Honorários relativas ao preço dos serviços prestados, por delas alegadamente e falsamente constar ter a arguida ministrado as aulas, o que não ocorreu.

  1. Sendo a arguida acusada de ter agido com a intenção de obter para si um benefício patrimonial no valor global de € 1.030,20.

  2. E ter induzido o IEFP em erro, determinando-o ao pagamento de tal quantia, com inerente beneficio patrimonial.

  3. Produzida prova em Audiência de Julgamento, como se consigna a fls. 7 do douto Acórdão em recurso, não se logrou demonstrar que a arguida tenha emitido e apresentado tais Notas de Honorários, que integram os autos a fls. 15 a 36 e 41 a 44.

  4. O que deveria ter conduzido, inelutavelmente, à absolvição da arguida, não fora o facto do Tribunal se ter socorrido, da faculdade prevista no artigo 358º do CPP, decidindo ter ficado provado ter ocorrido por parte desta falsificação dos sumários das aulas e já não das Notas de Honorários, que se provou terem sido emitidas pelo próprio IEFP, como pressuposto formal e prévio, juntamente com a emissão dos correspondentes recibos, dos pagamentos realizados.

  5. É modesta convicção da arguida que a operada alteração da factualidade em apreço é substancial, posto que a esta estava acusada de falsificar as Notas de Honorários, sendo que, na omissão da prova de tal factualidade, o Tribunal optou por alterar a mesma, passando a arguida a ser condenada pela alegada falsificação dos sumários das aulas, coisa substancialmente diversa.

  6. Na consideração de se tratar de uma alteração substancial dos factos descritos na acusação, teria a mesma os efeitos previstos no artigo 359º do C.P.C.

  7. Ora, o Acórdão recorrido, acabou por condenar a arguida por factos substancialmente diversos dos descritos na acusação, fora dos casos previstos no artigo 358º e 359º do C.P.P., pelo que é nulo, á luz do disposto no artigo 379º, nº 1, al. b) do C.P.P, o que se pretende ver declarado.

  8. Sem prescindir, pugna-se pela revogação da decisão de facto, desde logo no que tange á alegada falsificação dos sumários, na medida em que não se mostra junto aos autos qualquer documento com tal teor, não podendo ocorrer condenação pela prática do crime de falsificação de documentos sem que os originais dos mesmos integrem os autos, para que se possa ajuizar da existência de tais documentos, no âmbito da definição dada pelo artigo 255º, a) do CP, da sua falsificação e ainda por quem, o que sempre importaria o recurso a uma perícia.

  9. Na omissão de tal prova documental, essencial, nunca se poderiam considerar provados os factos vertidos em 3 (…que declarou inveridicamente ter lecionado…), 4 (…que ela declarou ter dado …), 6 e 7 do elenco da factualidade provada que integra a decisão, o que importa a sua impugnação e revogação.

  10. Impõe-se ainda a revogação da decisão de facto na parte em que considerou ter a arguida agido com intenção de obter para si um benefício patrimonial - ut. item 5 dos factos provados – tendo por referência e em consideração a prova produzida em Audiência, objeto de gravação, na medida em que decorre das próprias declarações da arguida( ouvida na sessão de 10-04-2012, com início da gravação áudio às 10.36.13 e termo às 11.11.58), que era sua intenção dar as aulas, o que manifestou ao Dr. C…, ao tempo Director do IEFP, tendo este confirmado tal facto no seu depoimento ( testemunha ouvida na sessão de 10-04-2012, com início de gravação às 11.23.33 e termo às 12.03.57), referindo que a arguida dissera que iria compensar as aulas em falta.

  11. Há ainda que ter em consideração e levar ao elenco dos factos provados a factualidade, essencial, provada, omitida no Acórdão em recurso, que se prende com o facto da inexistência de computadores no local onde foi ministrado o curso, em Santo Tirso, como foi referido pela arguida (ouvida na sessão de 10-04-2012, com início da gravação áudio às 10.36.13 e termo às 11.11.58), sendo confirmado pelas testemunhas, Dr. C… (ouvido na sessão de 10-04-2012, com início de gravação às 11.23.33 e termo às 12.03.57) que referiu “…muitas vezes não tinham equipamentos…” e pela testemunha D… ( ouvida na sessão de 10-04-2012 , com início de gravação às 12.34.02 e termo às 12.40.09) , formanda, no curso em apreço, que foi perentória ao afirmar que “não tinham computadores” e ainda pela testemunha E… ( ouvida na sessão de 29-05-2012 , com início de gravação às 17.01.25 e termo às 17.10.21), que foi formadora de cozinha e pastelaria no curso em apreço e que esclareceu que “nas instalações da residência onde decorria a formação havia uma cozinha e uma sala com mesas, onde não se recorda de ver computadores”, matéria com relevância em sede de culpa.

  12. O que tudo importa a revogação/ alteração da decisão de facto, na parte evidenciada.

  13. Quanto á questão de Direito, no que tange ao crime de falsificação, há que considerar que não se tendo logrado demonstrar a falsificação pela arguida das Notas de Honorários e na omissão de prova documental, essencial, relativa aos sumários que permita concluir pela sua falsificação, na esteira da revogação da decisão de facto, impõe-se a revogação da decisão de direito, por falta de prova dos elementos do tipo legal do crime em apreço.

  14. O que também sempre decorreria, pela ausência de prova da intenção por parte da arguida de causar prejuízo ao IEFP e de obter um benefício ilegítimo, na medida em que se provou a intenção manifesta desta em compensar as aulas em falta.

  15. Sendo de evidenciar que a prova da inexistência de computadores, sempre excluiria a culpa da arguida, essencial á incriminação.

  16. Pelo que ocorreu erro de interpretação e aplicação do disposto no artigo 256º, nº 1, al. a) e 255º, al a do CP.

  17. Quanto ao crime de burla, igualmente falecem os elementos essenciais do tipo em apreço – artigo 217º, nº 1 do CP, a impor a revogação do decidido 20. É que, independentemente da questão da verificação do concurso real e efetivo, resolvida pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 8/2000, falta o elemento essencial e instrumental da alegada burla – o documento falsificado. – para a prova do erro ou engano e também da astúcia.

  18. Não se tendo provado ainda a intenção por parte da arguida de obter um enriquecimento ilegítimo, pelo atrás alinhado e concluído acerca da comprovada intenção desta de compensar as aulas em falta.

  19. Diga-se ainda que na ausência de prova documental da falsificação, dos sumários, nada pode conduzir à conclusão do que levou o IEFP a emitir as notas de honorários, ou, pelo menos, que tal emissão possa ter como causa qualquer conduta criminosa da arguida, 23. Sempre, também, neste particular, a comprovada falta de computadores no local da formação excluiria a culpa da arguida, pressuposto da incriminação.

  20. Sem prescindir, quanto à escolha e medida da pena, mesmo que a arguida não venha a ser absolvida, como convictamente se crê e pugna, é convicção firme desta que o Tribunal desrespeitou os critérios de escolha da pena ao condenar a mesma em pena de prisão, ainda que suspensa, em detrimento da multa, e portanto em desrespeito pela preferência pelas penas não detentivas consagrada no artigo 70º do CP, que a douta decisão violou.

  21. Que estipula como critério de escolha a melhor prossecução das finalidades da punição, no que importa atender ao disposto no artigo 40º do CP, de que foi feita...

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