Acórdão nº 2167/10.0PAVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Fevereiro de 2013

Data06 Fevereiro 2013
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 2167/10.0PAVNG.P1 (proc. urgente) ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO No T. J. de Vila Nova de Gaia (3. Juízo Criminal) o MP deduziu acusação contra o arguido, B…, com os sinais dos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º ns. 1, al. a) , 2 e 4, do C. Penal.

C…, assistente, deduziu pedido de indemnização civil contra o arguido, peticionando a indemnização de 3.000 euro, por danos não patrimoniais.

O arguido contestou a acusação, negando a prática dos factos, antes imputando à assistente comportamentos de desafio, agressão e injúria.

X Foi realizada a audiência de discussão e julgamento, na sequência da qual foi elaborada sentença, dela constando o seguinte DISPOSITIVO:- (…) Nos termos legais e factuais expostos julgo a acusação totalmente procedente e, em consequência, condeno o arguido B… pela prática, em autoria material, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo art. 152º ns. 1 al. a) e 2, do C. Penal, na pena de 2 anos de prisão.

Ao abrigo do disposto no art. 50º, do C. Penal, considerando a ausência de antecedentes criminais do arguido, é nosso entendimento que as necessidades de prevenção, quer especial, quer geral ficarão satisfeitas, com a suspensão da execução da presente pena de prisão, pelo período de 2 anos, o que se determina, sujeita, porém, a regime de prova a elaborar pela DGRS do qual deverá constar a frequência de cursos e programas de prevenção de violência doméstica de molde a permitir que o arguido interiorize a gravidade da sua conduta e restabeleça um relacionamento de normalidade dom a assistente, mãe do seu filho, de molde a permitir a restabelecimento das relações familiares que neste momento continuam a ser afectadas pelo arguido.

Julgo parcialmente (procedente) o pedido de indemnização civil deduzido e, em consequência, condeno o arguido B… a pagar a C… a título de indemnização pelos danos morais causados, a quantia de 2.000 euro, acrescidos de juros de mora contados, à taxa legal, desde a notificação para contestar até integral pagamento.

Custas criminais a cargo do arguido, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal, com os legais acréscimos.

Custas cíveis a cargo do arguido e da assistente na proporção do respectivo decaimento Notifique.

Após trânsito remeta boletins ao registo, comunique à DGRS e remeta certidão da presente sentença, bem como suporte digital das declarações prestadas pelo menor D… na presente audiência de discussão e julgamento ao Tribunal de Família e Menores deste Tribunal a fim de serem juntos aos autos de regulação das responsabilidades parentais em que são requerido os aqui arguido e assistente, para os fins tidos por convenientes.

(…) XXX Inconformado com o decidido, o arguido veio interpor recurso, motivando-o e aduzindo CONCLUSÕES (as quais se sintetizam sem, contudo, as desvirtuar):- Assim e no entender do Recorrente:- - a sentença enferma dos vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada; - a sentença enferma do vício do erro notório na apreciação da prova; - foram incorrectamente julgados os pontos de facto dados como provados nos pontos “2 a 9, 11 e 12 da acusação”(apelando à motivação, refere o Recorrente, erroneamente a “acusação”, mas facilmente se depreende que entende incorrectamente julgados os pontos de facto dados como provados nos ns. 2 a 11 da fundamentação da sentença ( que se segue por enumeração e numeração); - foi violado o princípio da livre apreciação da prova (art. 127º, do CPP) e o princípio “in dúbio pro reo”; o arguido-recorrente deve ser absolvido.

- está errada a subsunção jurídica dos factos dos factos ao Direito XXX Responderam o MP e a assistente.

O MP defende a total improcedência do recurso.

A Assistente entende que o recurso é intempestivo e subsidiariamente, totalmente improcedente.

XXX Nesta Relação o Ilustre Procurador-Geral Adjunto, para além de defender a tempestividade do recurso, pugna pela total improcedência do recurso, por via do douto Parecer que emitiu.

Cumprido que se mostra o disposto no art. 417º nº 2, do CPP, verifica-se que não foi deduzida qualquer resposta.

XXX COLHIDOS OS VISTOS LEGAIS CUMPRE DECIDIR:- Na sentença recorrida consta a seguinte:- (…) II. Fundamentação Factos Provados (vão numerados por questão de maior clareza relativamente ao recurso da matéria de facto):- 1 - O arguido e C… contraíram casamento civil no dia 1 de Março de 1997 e católico no dia 20 de Março de 1999, em V. N. de Caia, passaram a residir na Rua …, n.° …., …, .° Esquerdo, em …, V. N. de Gaia, e dessa união tiveram um filho, D…, nascido em 30 de Abril de 1998.

2 - Decorridos alguns dias após o casamento de ambos, em Março de 1997, e quando se encontravam em Lua-de-mel, o arguido, sem qualquer motivo, abeirou-se de C… e desferiu-lhe uma bofetada na face que lhe causou dores.

3 - Em datas não concretamente apuradas, mas que se situam logo no início do casamento, em 1997, na supra citada residência, o arguido, por várias Vezes, desferiu em C… bofetadas que a atingiram na face, puxões de cabelo, socos que a atingiram nos braços e na cabeça e, numa ocasião, quando a assistente se baixou, o arguido desferiu-lhe uma bofetada que a atingiu nos olhos, causando-lhe dores e hematomas nas zonas atingidas.

4 - De igual modo, também por várias vezes, o arguido dirigiu-se à assistente e proferiu-lhe, em viva voz, as seguintes expressões “puta, fllha da puta, vaca”.

5 - Em Novembro de 1997, em data e hora não apurada, na supra citada residência, quando a assistente se encontrava no quinto mês de gravidez do filho de ambos, o arguido desferiu-lhe um soco que a atingiu na barriga, e causou-lhe dores.

6 - Como consequência das agressões físicas que o arguido vinha desferindo na assistente, esta teve necessidade de recorrer à assistência médico-hospitalar, nos dias 25 de Fevereiro de 1999 e 31 de Maio de 2003.

7 - No ano de 2004, em datas não apuradas, e quando ambos se encontravam a residir em Espanha, o arguido por várias vezes, sem qualquer motivo, tapava a boca e o nariz da assistente, apertava-lhe o pescoço, ao que esta ficava com falta de ar, ficava com dores e chorava, situação que era presenciada pelo filho menor de ambos, D….

8 - Em data não apurada, mas que se situa no início do ano de 2009, o arguido desferiu pontapés e empurrões na assistente, que lhe causou dores, e o filho menor de ambos teve de intervir para impedir que o arguido continuasse a bater-lhe.

9 - No dia 10 de Dezembro de 2010, cerca das 22H00, o arguido telefonou à assistente, e, em tom grave e sério, disse-lhe: “não tenho medo, vou aí’ (à casa da assistente) e vou acabar o que comecei na Lua de Mel, não adianta fugires que eu apanho-te”, ao que a assistente ficou com medo da reacção do arguido.

10- Desde o mês de Janeiro de 2010, o arguido e a assistente encontram-se separados. Ao agir do modo supra descrito, o arguido quis maltratar fisicamente a assistente, como efectivamente maltratou, bem como pretendeu, com tais expressões, amedrontar a assistente, que conseguiu, originando-lhe um medo constante das suas reacções, com medo daquilo que o arguido pudesse vir a fazer no futuro, contra a sua integridade física ou a sua vida, bem como humilhando-a na sua honra e consideração, no interior da residência conjugal e na presença do filho menor de ambos.

11- O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, desinteressando-se por completo pela saúde da assistente, estado psíquico e pelo seu bem-estar, bem sabendo que tais condutas supra descritas lhe estavam vedadas e punidas por lei, e, ainda assim, não se inibiu da sua realização.

12- Do CRC do arguido nada consta.

X O arguido é empresário em nome individual auferindo uma média mensal de 1.200 euro.

Vive com a mãe em casa desta.

Não paga renda de casa.

Tem a seu cargo o filho D… de 13 anos de idade.

É bem conceituado no meio familiar em que se insere.

Em consequência da conduta do arguido, C… sentiu humilhação, vergonha, desgosto, angústia e desilusão.

A assistente omitia as ofensas de que era vítima por ter vergonha e medo do comportamento do arguido, chegando a temer pela própria vida.

De igual modo, em consequência directa e necessária da conduta do arguido a assistente sentiu ansiedade, medo e intranquilidade.

A assistente é respeitada no meio familiar em que se insere.

Factos Não Provados Dos factos descritos na acusação, no pedido de indemnização civil e na contestação, com relevo para a decisão a proferir, não se provaram quaisquer outros, designadamente, os seguintes:- Na pendência do casamento o arguido dirigia à assistente as expressões: “vai para o caralho, vai-te foder” e “qualquer dia enterro-te viva, ninguém te vai encontrar nunca, faço-te desaparecer”.

A assistente era a causadora das discussões que o casal mantinha por sentir demasiados ciúmes do arguido, recusando-se a sair de casa, acusando-o de estar sempre a olhar para outras mulheres.

No decurso do casamento, a assistente empurrava o arguido, batia-lhe no ombro em jeito de desafio e encostava-lha a cabeça à cara enquanto discutia com o mesmo.

A assistente inferiorizava o arguido em frente da família e dos amigos, evidenciando a pretensa falta de cultura do arguido, corrigindo-o de modo jocoso, enquanto se ria e fazia rir os demais presentes, sempre que este falava.

Entre os anos de 1999 e 1997 a assistente partiu o nariz do arguido, atirando-lhe com uma escova de banho.

XXX XXX O RECURSO O Tribunal da Relação tem poderes de cognição de facto e de direito – cfr. art. 428º, do CPP.

É consabido que as conclusões da motivação do recurso balizam ou delimitam o respectivo objecto – cfr. arts. 402º, 403º e 412º, todos do CPP.

Tal não preclude o conhecimento, também oficioso, dos vícios enumerados nas als. a), b) e c), do nº 2, do art. 410º, do CPP, mas tão-só quando os mesmos resultem do texto da decisão recorrida por si só ou em sua conjugação com as regras da experiência comum (cfr. Ac. Do STJ nº 7/95...

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