Acórdão nº 572/09.4TTCBR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução30 de Janeiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1--- AA e BB instauraram uma acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra Município de Coimbra, pedindo que: - Em relação à 1.ª autora - (AA): a) se reconheça a existência de um contrato de trabalho desenvolvido ininterruptamente desde a sua admissão em 1/6/02; b) que se reconheça a antiguidade desta autora desde a admissão em 1/6/02; c) que se reconheça a categoria profissional da autora como de Técnica Superior de 1ª classe desde 1/6/07; d) a condenação do R a pagar-lhe a quantia de € 27.573,91, acrescida dos juros legais desde a citação.

Entendendo-se que não deve ser alterada da 2ª para a lª classe a categoria profissional e consequente retribuição constante do contrato celebrado em 1/5/08, então, mantendo-se o demais atrás pedido, pede-se agora subsidiariamente que o montante da condenação referida passe a ser de € 34.478,24, acrescida dos juros legais desde a citação.

Em relação à 2ª autora - BB: a) se reconheça a existência de um contrato de trabalho desenvolvido ininterruptamente desde a sua admissão em 14/10/02; b) se reconheça a antiguidade desta desde a admissão em 14/10/02; c) se reconheça a categoria profissional da A. como de Técnica Superior de 1ª classe desde 14/10/07; d) a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de € 23.920,59, acrescida dos juros legais desde a citação.

Entendendo-se que não deve ser alterada da 2ª para a 1ª classe a categoria profissional e consequente retribuição constante do contrato celebrado em 1/5/08, então, mantendo-se o demais pedido, pede-se subsidiariamente que o montante da condenação passe a ser de € 23.920,59, acrescida dos juros legais desde a citação.

Alegaram, para tanto, que são trabalhadoras subordinadas do R desde 1/6/2002 e 14/10/202, respectivamente, estando a sua actividade ligada com o gabinete das contra-‑ordenações, cujos processos, após distribuição pelas chefias, tratavam, desenvolviam, instruíam e emitiam a respectiva proposta de decisão; que prestavam o seu trabalho nas instalações da Câmara, utilizando os instrumentos de trabalho desta, como computadores, fotocopiadoras, móveis, livros e consumíveis e cumprindo horário de trabalho, auferindo como contrapartida 12 meses de retribuição, sendo um correspondente a férias (que gozavam efectivamente), embora nunca tivessem chegado a receber subsídios de férias e Natal.

Sustentam assim que, embora tivessem celebrado vários contratos de avença, todos a prazo, e que tiveram de assinar, pois doutra forma não eram contratadas, esta colaboração tem de ser qualificada como prestada ao abrigo dum contrato de trabalho, com o consequente direito aos subsídios de férias e Natal, e às diferenças salariais derivadas da categoria profissional de “Técnica Superior de 1ª classe” desde 2007.

O réu contestou, configurando a relação entre as partes como contrato de prestação de serviço. Subsidiariamente e se se entender que os contratos devem ser qualificados como contratos de trabalho, invocou a respectiva nulidade.

Prosseguindo o processo, veio a ser proferida sentença que, julgou a acção parcialmente procedente e declarou: - que entre a Autora AA e o Réu vigorou um contrato de trabalho sem termo, iniciado em Setembro de 2005 e cessado em 30 de Abril de 2008; - que entre a Autora BB e o Réu vigorou um contrato de trabalho sem termo, iniciado em 14 de Outubro de 2002 e cessado em 30 de Abril de 2008; - a nulidade desses contratos.

No mais, absolveu o réu do pedido.

Desta decisão apelaram ambas as partes, tendo a Relação de Coimbra deliberado: “a) julgar improcedente a apelação do réu; b) julgar parcialmente procedente a apelação das autoras e, consequentemente, alterar a sentença recorrida, declarando ter existido um contrato de trabalho nulo entre a autora AA e o réu, iniciado em 1 de Junho de 2002 e cessado em 30 de Abril de 2008, e entre a Autora BB e o réu, iniciado em 14 de Outubro de 2002 e cessado em 30 de Abril de 2008, e condenando-se o réu a pagar à autora AA a quantia € 17.960,37 (dezassete mil novecentos e sessenta euros e trinta e sete cêntimos) e à autora BB a quantia de € 15.172,75 (quinze mil cento e setenta e dois euros e setenta e cinco cêntimos), quantias essas acrescidas de juros legais desde a data da citação até integral pagamento, absolvendo o réu do demais pedido.

Custas, na acção e na apelação das autoras, na proporção de 25% para as autoras e 75% para o réu.” Novamente inconformado trouxe-nos o R a presente revista, que por despacho do ora relator, só foi admitida em relação à A, AA, em virtude do pedido da acção, no que respeita à A, BB, se situar dentro da alçada da Relação, tendo o recorrente rematado a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. A relação entre AA. e R. consubstancia um verdadeiro contrato de prestação de serviço e não uma relação laboral.

  1. A distinção entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviço assenta em dois elementos essenciais: o objecto do contrato (prestação de actividade ou obtenção de um resultado); e o relacionamento entre as partes (subordinação ou autonomia).

  2. O contrato de trabalho tem como objecto a prestação de uma actividade e, como elemento típico e distintivo, a subordinação jurídica do trabalhador, traduzida no poder do empregador de conformar, através de ordens, directivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou.

  3. No contrato de prestação de serviço, o prestador obriga-se a proporcionar um resultado, que efectiva por si, com autonomia, sem subordinação à direcção da outra parte.

  4. A subordinação jurídica, característica fundamental do vínculo laboral e elemento diferenciador do contrato de trabalho, implica uma posição de supremacia do credor da prestação do trabalho e a correlativa posição de sujeição do trabalhador, cuja conduta pessoal, na execução do contrato, está necessariamente dependente das ordens, regras ou orientações ditadas pelo empregador, dentro dos limites do contrato e das normas que o regem, a que o trabalhador deve obediência, o que não se verifica nos presentes autos.

  5. Resulta dos factos provados que entre as AA e o R. foram livremente celebrados por escrito os acordos constante de fls., que as próprias partes designaram de "contrato de avença".

  6. Dos vários contratos de avença celebrados entre AA. e R resulta que as ora recorridas não ficavam subordinadas hierárquica ou disciplinarmente ao R e a prestação de serviços não implicava o cumprimento de horário de trabalho, nem o contrato lhes conferia a qualidade de funcionário ou agente do R.

  7. Contratos que surgem na sequência da apresentação às AA de convites para a celebração de contrato de avença, no âmbito do procedimento de consulta prévia para o exercício das funções descritas nos contratos, procedimentos justificados pela necessidade premente apoio e assessoria jurídica.

  8. A matéria de facto provada não permite concluir que entre as AA e o R vigorou, nos períodos descritos, um contrato de trabalho.

  9. Aquando da formação do contrato foi expressamente ressalvado que as AA não ficavam subordinadas hierárquica ou disciplinarmente ao R e que tal não implicava o cumprimento do horário de trabalho.

  10. Na inexistência de invocação de qualquer vício da vontade, tal implica a aceitação de que, fossem quais fossem as razões, nem as AA se pretenderam colocar como trabalhadoras do R., nem este as pretendeu contratar nessa qualidade (cfr. pontos 1., 8., 9., 14., 20., 22., 24., 26., 27., 28., 34., 36., 38., 40., 43., 46., 47. e 48. da matéria de facto provada).

  11. Não foi dado como provado que o cumprimento do horário de trabalho foi imposto pelo R, donde se pode concluir que as AA cumpriram horário de trabalho porque assim o entenderam (cfr pontos 4., 31. e 41. da matéria de facto dada como provada).

  12. E esse "cumprimento" de horário não releva para o efeito de distinguir a relação contratual estabelecida entre as partes, dado que o mesmo não era imposto ou obrigatório.

  13. O facto de as AA executarem os serviços que lhe eram distribuídos pelo R também não permite concluir pela existência de uma verdadeira subordinação, na medida em que as instruções que eventualmente lhes fossem dadas não eram ordens determinantes da forma de executar a actividade.

  14. Apenas está dado como provado no ponto 2) que as AA estão adstritas ao gabinete das … cujos processos, após distribuição feita pelas chefias, especialmente a Directora do Departamento …, tratam, desenvolvem, instruem e onde emitem propostas de decisão a ser proferidas, em conformidade, ou após as correcções determinadas pela hierarquia, pelo Presidente ou Vereador com competência para tal, reportando-se à actual situação contratual, iniciada em 1 de Maio de 2008 (ponto 1. dos factos provados).

  15. Não resulta da matéria de facto provada que as AA estavam sujeitas a ordens dos superiores hierárquicos do R.

  16. As AA acompanhavam os processos em Tribunal, em representação do R, o que tudo denota que as mesmas tinham necessariamente autonomia técnica e jurídica no exercício da sua actividade, sem sujeição a controlo externo do R.

  17. Em relação à A AA não foi dado como provado que a sua actividade estivesse sujeita a aprovação das chefias, do Presidente ou do Vereador competente.

  18. Todas as actividades prestadas pela A. AA, conforme resulta provado dos pontos 10, 12, 15, 16, 20 e 21, indicam que a mesma não estava sujeita a ordens ou direcção do Réu, nem, consequentemente, se verificava uma situação de subordinação jurídica, de acordo com o já descrito.

  19. A mesma A. exercia a sua actividade Técnico-Jurídica especializada, mediante a assessoria ao Gabinete do Vereador (ponto 10), coordenando e apoiando os serviços de fiscalização municipal (ponto 12), apoiando tecnicamente os vários serviços da Câmara, que superintendia (ponto 15) e dava apoio jurídico e elaborava pareceres (ponto 16), o que tudo bem denota estarmos na presença de um efectivo contrato de prestação de serviço.

  20. E, em relação à A. BB...

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