Acórdão nº 1115/10.2TTVNG-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Dezembro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA SOTTOMAYOR
Data da Resolução19 de Dezembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - Relatório AA, residente em Vila Nova de Gaia, veio intentar contra BB – ..., S.A., com sede em Palmela, a presente acção declarativa de condenação com processo comum emergente de contrato de trabalho, pedindo a condenação desta a readmiti-lo ou indemnizá-lo por antiguidade e pagar-lhe retribuições vencidas e vincendas, remuneração por trabalho nocturno e suplementar, e juros.

Alegou em síntese que foi admitido em 2001, como servente de limpeza e que, na sequência de processo disciplinar, a Ré procedeu ao seu despedimento em 19 de Outubro de 2009.

E mais invocou o Autor que o processo disciplinar é nulo e que não cometeu factos que justifiquem o despedimento.

O processo deu entrada em 13 de Outubro de 2010. Por despacho saneador proferido, em 29 de Novembro de 2011, foi decidido oficiosamente julgar improcedente o pedido de condenação da Ré na reintegração do Autor ou no pagamento da indemnização de antiguidade e nas prestações vencidas e vincendas, porquanto, resultando da petição inicial que o despedimento foi proferido por escrito, a forma de processo era a prevista no art. 98º-C e seguintes do Código de Processo de Trabalho (CPT), e a acção devia ter sido intentada, nos termos do art. 387º nº 2 do Código do Trabalho de 2009, no prazo de 60 dias a contar da recepção da comunicação de despedimento, pelo que na data de propositura da presente acção já havia caducado o direito do Autor.

Inconformado, interpôs o Autor recurso para o Tribunal da Relação do Porto, requerendo a revogação da sentença recorrida, e que seja ordenada a apreciação da pretensão de declaração da ilicitude e nulidade do despedimento do Autor efectuado pela Ré, em 19 de Outubro de 2009.

Contra-alegou a Ré pugnando pela manutenção do decidido. O Tribunal da Relação do Porto decidiu conceder provimento ao recurso e revogar a decisão recorrida, ordenando a apreciação dos pedidos formulados pelo Autor relativamente à ilicitude e nulidade do despedimento e às consequências que delas peticiona.

Inconformada, recorreu a Ré para este Supremo Tribunal, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: «5.1 A partir de 1 de Janeiro de 2010, o processo adequado para impugnar o despedimento é o processo especial previsto no artigo 98.º-B e seguintes do Código de Trabalho, estando vedada a aplicação do processo comum por força do disposto no artigo 48.º, n.º 2 do CPT e do disposto no artigo 460.º do CPC.

5.2 O Autor só poderia recorrer à acção comum se instaurasse a acção até 31 de Dezembro de 2011.

5.3 Aliás, face à "vacatio legis" então em curso, nem se entende porque é que o A. não instaurou a acção até 31/12/2009.

5.4 O que conta para este efeito não é a lei vigente na data em que o Autor foi despedido, mas a lei vigente na data em que a acção foi instaurada.

5.5 E o que estava em vigor era, como é, o artigo 387.º do Código de Trabalho e os artigos 48.º e 98.º-B e seguintes do Código do Processo de Trabalho.

5.6 A interpretação, segundo a qual os artigos 48.º e 98.º B do Código do Processo de Trabalho só são aplicáveis ao despedimento ocorrido após 1/1/2010 não tem qualquer fundamento lógico, nem legal.

5.7 Pelo contrário, tal interpretação configura uma clara violação do princípio da aplicação imediata, embora sem retroactividade, da lei do processo, consignada no artigo 12º, nº 1 do Código Civil.

5.8 O Acórdão aqui posto em crise violou o princípio consignado no artigo 142º do Código do Processo Civil, segundo o qual a forma dos diversos actos processuais é regulado pela lei que vigora no momento em que são praticados e a forma de processo aplicável determina-se pela lei vigente à data em que a acção é proposta em conclusão também pelo artigo 48º do CPT.

5.9 O Acórdão em recurso, ao decidir que os artigos 98.º B a 98.º P do CPT só se aplicam a despedimentos ocorridos após 1/1/2010 violou o disposto no artigo 9.º, n.º 1 do Decreto-Lei nº 295/2009 e também o disposto no artigo 9.º, n.º 2 do C. Civil.» Termina a Ré, concluindo que deve admitir-se o presente recurso, dar-se-lhe provimento e, consequentemente revogar-se o Acórdão recorrido e confirmar-se a sentença da 1ª instância.

Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, nos termos do disposto do art. 87.º, n.º 3 do CPT, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso, defendendo que a acção não está ferida de caducidade, pois a aplicação retroactiva do art. 387.º, n.º 2 do CT de 2009 constituiria um impedimento injustificado ao exercício do direito de acção pelo trabalhador, mas entendendo que há erro na forma de processo, devendo adoptar-se o processo especial, de natureza urgente, previsto nos arts 98.º B e seguintes do CPT, e não o processo declarativo comum. Tal erro consiste numa mera irregularidade processual, cabendo ao juiz convolar a forma de processo que foi adoptada para a que devia ter sido utilizada.

Tendo sido notificado este parecer às partes, respondeu a Recorrente, manifestando a sua discordância.

Sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas respectivas conclusões, nos termos do disposto nos arts 684.º, n.º 3 e 685.º-A do CPC, na versão que lhes foi conferida pelo Decreto-lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso, as questões a decidir são as seguintes: a) A forma de processo aplicável aos despedimentos ocorridos entre a entrada em vigor do Código de Trabalho de 2009 (Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro) e do Código de Processo de Trabalho de 2010 (DL n.º 295/2009, de 13 de Outubro) e o prazo de caducidade da acção de impugnação judicial do despedimento.

Corridos os «vistos», cumpre decidir.

II - Matéria de facto A constante do relatório que antecede.

III - Fundamentação de direito O novo regime da impugnação do despedimento, simultaneamente material e processual, suscita vários problemas de aplicação da lei no tempo, nos casos em que a situação jurídica a regular é duradoura ou de constituição progressiva, estando em conexão com várias leis. Ou seja, a situação jurídica origina-se com um procedimento disciplinar que culmina com uma decisão de despedimento. Na data do despedimento constitui-se o direito do trabalhador o impugnar, mas o exercício deste direito depende de um prazo de caducidade.

O caso sub iudice versa uma questão de sucessão de leis no tempo relativamente à forma de processo e ao prazo de caducidade da acção de impugnação de...

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