Acórdão nº 08B1846 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Julho de 2008

Data10 Julho 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: A&A, SA intentou a presente acção declarativa, com processo ordinário, na 7ª Vara Cível do Porto, contra BB -Companhia de Seguros, SA, pedindo que a Ré fosse condenada a pagar-lhe a importância global de € 29.679,32, por tal quantia se traduzir no pagamento das reparações nas construções vizinhas e que a autora efectuou, devido aos danos que causou no decurso da obra realizada em Matosinhos, sendo certo que tal responsabilidade civil pelo pagamento de tais indemnizações se encontrava transferida para a R., por contrato de seguro realizado entre ambas.

A Ré Companhia de Seguros contestou, pedindo a improcedência da acção, por o contrato de seguro invocado ser um contrato de responsabilidade civil da actividade de empreiteiro (e não responsabilidade na execução de obra do empreiteiro) e, por outro lado, como resulta das condições especiais e particulares da apólice, ter sido excluída a responsabilidade civil no caso de danos ocorridos: em terrenos, ...instalações subterrâneas, imóveis, bem como respectivos inquilinos ou recheios, que se produzam por desmoronamento ou abatimento de terreno ou no decurso dos trabalhos de escavação...ou infiltração de qualquer líquido..."; e pelo uso de ... martelos pneumáticos, aparelhos semelhantes e pelo arremesso de estilhaços resultantes do uso de explosivos". No mais impugnou os danos e pagamentos alegados pela autora.

Na réplica, a autora, além de ter impugnado a matéria de facto consubstanciadora de excepção, pugna pela natureza global do seguro contratado, o qual engloba todas as obras executadas pela autora e garante, sem excepção, toda e qualquer responsabilidade extracontratual da autora.

Ainda alega que a Ré assumiu a responsabilidade pelo pagamento dos danos em causa e que com a sua atitude contrária, incorreu em claro abuso de direito.

Por outro lado, sustenta que a actuação da A. - ao intervir imediata e prontamente em ordem a evitar o agravamento dos danos, e por estar em risco eminente a cedência das habitações afectadas pelos trabalhos por si executados - é enquadrável no instituto da acção directa, configurando a sua actuação também uma situação de estado de necessidade.

Ainda pede a condenação da Ré como litigante de má fé, em multa e indemnização não inferior a € 5.000,00.

A Ré treplicou, concluindo nos mesmos termos da sua contestação e pugnando pela sua absolvição do pedido.

Foi proferido saneador e organizou-se a condensação, realizando-se julgamento com decisão da matéria de facto e sendo proferida sentença que julgou a acção improcedente.

Inconformada a autora, apelou dessa sentença, tendo a apelação sido julgada procedente e sendo a ré condenada parcialmente no pedido.

Desta vez foi a ré que inconformada interpôs a presente revista, tendo nas suas alegações formulado as seguintes conclusões: - Tendo a autora suscitado a questão da nulidade da cláusula 1º 2.1 e 1º 2.2 das condições especiais do contrato de seguro no recurso de apelação, o Tribunal recorrido não podia tomar em conhecimento de tal nulidade contratual, porquanto se tratava de uma questão nova.

- É que os recursos destinam-se a conhecer questões já tratadas nos autos e já decididas, e não para conhecer de questões novas, o que se verificou in casu, pois que - Só em sede de recurso de apelação a autora veio a suscitar a questão da nulidade de tais cláusulas contratuais - o que o Tribunal recorrido conheceu no douto acórdão recorrido.

- Por isso, foi violado o disposto no art. 676º do CPC.

- Mesmo que assim se não entenda, sempre as ditas cláusulas são válidas, pois que ao caso não diz respeito a contratação da cláusula "cabos e tubagens subterrâneos".

- Sendo válidas tais cláusulas, a ré não responde pelos danos provocados pela autora.

- É que a cláusula "cabos e tubagens subterrâneos " não diz respeito à colocação de tais equipamentos, mas sim, aos danos provocados em tais bens quando se efectuam obras que implicam abertura de solos e perfurações ou mexidas no subsolo.

- Por isso, tal cláusula refere-se à cobertura de eventuais danos em bens que não são visíveis.

- Mas isso nada tem a ver com a natureza das obras ou com o processo construtivo em que as obras se desenrolam ou são executadas.

- Por isso, a contratação de tal cláusula não interfere com a contratação das cláusulas previstas em 1º 2.1 e 1º 2.2 das condições especiais da apólice ou até com a cláusula prevista em 5º.2 e) das condições gerais da apólice.

- Sendo válidas as cláusulas gerais e especiais da apólice, os danos provocados pela autora, conforme resulta dos factos provados, não estão cobertos pelo seguro.

- É que tais danos foram provocados por desmoronamento ou abatimento de terreno, no decurso de trabalhos de escavação, por infiltração de água, por uso de martelos pneumáticos e aparelhos semelhantes e ainda provocados por vibrações.

- Assim, não estava transferida para a ré a responsabilidade pelos danos provocados pela autora, pelo que a acção devia ter sido julgada totalmente improcedente, como decidiu o Tribunal de 1ª instância.

- Ao decidir em sentido contrário, o Tribunal recorrido violou o disposto nos arts. 236º, 238º, 405º e 406º do Cód. Civil, no art. 427º do Cód. Comercial, e ainda nos arts. 10º e 11º do Dec.-Lei nº 486/85 de 25/10.

- Além disso, a acção devia também ser julgada improcedente, pois que a autora - atento o estabelecido no art. 24º-2 das condições gerais da apólice - estava impedida de liquidar quaisquer indemnização a terceiros.

- Tal cláusula contratual é válida e estava em vigor, pelo que, atento o disposto nos arts. 405º e 406º do Cód. Civil, que se mostram violados pela autora - ao pagar - pagou mal, donde dever ser a acção julgada totalmente improcedente.

Contra-alegou a recorrida defendendo a manutenção do decidido.

Corridos os vistos legais, urge apreciar e decidir.

Como é sabido - arts. 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do Cód. de Proc. Civil -, o âmbito dos recurso é delimitado pelo teor das conclusões dos recorrentes.

A aqui recorrente nas conclusões das suas alegações levantou, para conhecer neste recurso, as seguintes questões:

  1. Tendo a autora apenas suscitado a questão da nulidade da cláusula 1º 2.1. e 1º 2.2. das condições especiais do contrato de seguro em causa, no recurso de apelação, não podia a Relação tomar conhecimento de tal nulidade contratual, por se tratar de questão nova ? b) De qualquer modo as ditas cláusulas são válidas e importam a desresponsabilização da recorrente pelos danos peticionados, porque a cláusula "cabos e tubagens subterrâneos " não diz respeito à colocação de tais equipamentos mas sim aos danos provocados em tais bens já colocados por terceiros quando se efectuam obras que impliquem aberturas dos solos e perfurações ou mexidas no subsolo ? c) E sempre a acção devia ser improcedente por força da cláusula 24º- 2 das condições gerais da apólice ? Mas antes de apreciar estas questões há que especificar a matéria de facto que as instâncias deram como provada e que a seguinte: A) A Autora dedica-se ao exercício da indústria de construção civil de obras públicas e particulares.

    1. Em 19/04/2000, a Autora, como segurada/tomadora de seguro, e a Ré, como seguradora, celebraram o contrato de seguro, do ramo «responsabilidade civil», titulado pela apólice n° 2-1-91-051748/01 (actualmente apólice n° 54325218 - doc. de fls. 27), cuja «Condição Particular» se encontra junta a fls. 18, contrato esse que teve início na referida data e nos termos do qual a Autora transferiu para a Ré a responsabilidade civil, por «danos corporais e ou materiais», de obras públicas «com a cláusula de cabos e tubagens subterrâneas», sendo o capital seguro de Esc. 200.000.000$00, com uma franquia de 10,00% do sinistro, com um mínimo de Esc. 100.000$00.

    2. Nos termos do art. 2° das «Condições Gerais» do contrato de B), juntas a fls. 20/25, tal contrato «tem por objecto a garantia da responsabilidade extracontratual que, ao abrigo da lei civil, seja imputável ao Segurado, através do pagamento das indemnizações que legalmente lhe sejam exigíveis pelos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes das lesões corporais e/ou materiais por este causadas a terceiros, enquanto na qualidade ou no exercício da actividade expressamente referida nas Condições Especiais e Particulares» desse contrato.

    3. De acordo com o art. 5.º, n° 2, al. e) dessas mesmas «Condições Gerais», «salvo convenção em contrário das Condições Especiais e mediante pagamento de sobreprémio e sem prejuízo de outras exclusões nelas constantes», o contrato de seguro de B) «não garante também os danos resultantes de lesões cobertas pelo art. 2° quando causadas e/ou decorrentes» «pela alteração do meio ambiente (...), assim como todas aquelas que forem devidas à acção de fumos, vapores, vibrações, ruídos, cheiros, temperaturas, humidades, corrente eléctrica ou substâncias nocivas».

    4. Segundo o art. 24°, n° 1 das mencionadas «Condições Gerais», «em caso de sinistro coberto» pelo contrato de B), «o Tomador de Seguro e o Segurado, sob pena de responderam por perdas e danos, obrigam-se», designadamente: - «a comunicarem à Seguradora, no prazo de 48 horas a contar do momento em que tenham tido ou devam ter tido conhecimento de qualquer acto ou facto de que possa eventualmente resultar responsabilidade garantida por esta Apólice e a participarem-no, por escrito e de forma circunstanciada, no prazo de 8 dias» (al. a); - «a comunicarem à Seguradora, no prazo de 48 horas a contar do momento em que tenham tido ou devam ter tido conhecimento de qualquer pedido de indemnização formulado pelo lesado (...), mesmo quando tenham já participado o sinistro» (al. b).

      E de acordo com a al. a), do n.º 2 desse mesmo art. 24°, «o Segurado não poderá também, sob pena de responder por perdas e danos», «abonar...

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