Acórdão nº 2262/20.8YIPRT-8 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Outubro de 2021
Magistrado Responsável | TERESA MARIA PAIS |
Data da Resolução | 21 de Outubro de 2021 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa A… melhor identificado nos autos, e em diante Requerente, apresentou Requerimento de Injunção contra V […S.A ], melhor identificada nos autos, doravante Requerida, pedindo a condenação desta no pagamento “[do] valor pago a título de inscrição e de “Capital Levy” no montante global de € 5.180,00 (sendo € 1.280,00 a título de inscrição anual e € 3.900,00 a título de “Capital Levy”), montante esse ao qual acrescem juros de mora no valor de € 112,40, contabilizados à taxa legal de 4% desde 25/06/2019 até à presente data (...) acrescida dos juros vincendos até integral e efectivo pagamento.” Como fundamento do peticionado alega, em suma, que procedeu à inscrição da filha num Colégio gerido pela Requerida, tendo efectuado, em 29/04/2019, o pagamento de um total de € 5.180,00, a título de “Annual Registration” e “Capital Levy”. Após a realização da inscrição e de tais pagamentos, constatou ser impossível conciliar a carga lectiva da filha no colégio com os estudos religiosos, o que fez com que procedesse ao cancelamento da inscrição.
Assim, e não obstante ter explicado as razões que levavam ao cancelamento da inscrição, e solicitado a devolução das quantias pagas, o colégio gerido pela Requerida disse-lhe que a restituição já não era possível.
Neste sentido, considera que a recusa da restituição das quantias pagas não tem fundamento legal, e não é admissível, pelo que peticiona que a Requerida seja condenada a proceder à devolução das quantias liquidadas.
Devida e regularmente citada, a Requerida apresentou oposição na qual confirma que o Requerente procedeu à inscrição da filha num colégio por si gerido, tendo-lhe sido explicadas as condições de admissão e inscrição, assim como os pagamentos que tinha de efectuar.
A isto acresce que facultou ao Requerente o formulário de inscrição, que continha as tabelas e o tarifário em vigor, do qual consta que os valores pagos a título de taxa de inscrição e “capital levy” não são reembolsáveis.
Desta forma considera que o Requerente, na posse de todas as informações, concordou com as condições oferecidas e manifestou a sua aceitação, pelo que deverá a acção ser julgada não procedente e ser absolvida do pedido.
***** Em virtude da oposição apresentada o Requerimento de Injunção foi distribuído a este Tribunal enquanto acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias.
Foi realizada audiência final de julgamento, procedendo-se à produção das provas requeridas e respeitando todo o formalismo legal, conforme consta da respectiva acta.
**************** Com relevância para a decisão da causa consideraram-se provados, os seguintes factos: 1 – A Requerida é uma sociedade comercial anónima que tem a seu cargo a gestão do Colégio “…..
”.
2 – Em data não concretamente apurada, mas certamente anterior a 29 de Abril de 2019, o Requerente, cuja família é de origem muçulmana, manifestou junto da Requerida a intenção de inscrever a filha no Colégio “….
” para o ano lectivo de 2019/2020.
3 – Para o efeito, a Requerida entregou ao Requerente um formulário designado “Inscrição” que foi por este assinado.
4 – Desse formulário consta, entre o mais, o seguinte: “Todas as candidaturas têm de ser acompanhadas do pagamento de uma taxa de inscrição não reembolsável, bem como do pagamento de emolumento [N.T.: capital levy], de acordo com o tarifário publicado pela Escola anualmente. Os alunos são admitidos por um ano inteiro. A admissão e matrícula do aluno constitui a obrigação de pagar todas as taxas e mensalidades conforme especificado na tabela de propinas. Não há redução ou reembolso por ausência, saída ou expulsão (...)”.
5 – De tal formulário constava também um documento designado “Regras e regulamento do Colégio”, no qual se podia ler: “TAXAS DE INCRIÇÃO INICIAL Incrição Anual Esta valor será pago pelo aluno, todos os anos, no acto da inscrição e não é reembolsável Taxa de admissão [N.T.: capital levy] Este valor será pago pelo aluno, apenas uma vez, quando da inscrição e não é reembolsável (...) Deverá ser dado um aviso prévio (90 dias), por escrito, por parte do aluno que queira desistir. As propinas, taxa de admissão e taxa de inscrição não serão reembolsados (...) 1ªInstª) Aceitação Ao proceder à inscrição completa de cada aluno, os pais aceitam as regras e regulamentos do colégio (...)”.
6 – No dia 29 de Abril de 2019, o Requerente, efectuou as seguintes transferências bancárias para a Requerida: i) € 1.280,00, com o descritivo “Ranya Ibraimo anual registration”; ii) € 3.900,00, com o descrito “Ranya Ibraimo Capital levy”.
7 – Após efectuar a inscrição e as transferências indicadas em 6, o Requerente encontrou outro colégio que, no seu entender, tinha um ambiente melhor e era mais adequado à educação religiosa islâmica da filha.
8 – Nesse seguimento, por email remetido em 24 de Junho de 2019, o Requerente solicitou junto da Requerida o cancelamento da inscrição e o reembolso das quantias indicadas em 6.
9 – A Requerida indicou ao Requerente que não era possível realizar esse reembolso.
10 – A filha do Requerente não iniciou o ano lectivo de 2019/2020 no Colégio “….
”.
11 – No dia 23 de Setembro de 2019, Cristina Silva, em representação do Requerente, remeteu missiva registada com aviso de recepção à Requerida, com o assunto “Restituição do capital levy pago”, da qual consta, entre o mais, o seguinte texto: “Exmos. Senhores, Na qualidade de Mandatária do Exmo. Senhor A…., venho expor e solicitar a v/especial atenção para a situação que passo a expor. Na sequência da inscrição, neste Colégio, da filha do m/ Consttiuinte (...) aquele pagou as seguintes quantias: - € 1.280,00, a título de “Annual Registration”. - € 3.900,00, a título de “Capital Levy”.
Após efectuar a inscrição e tais pagamentos, constatou o m/Cosntituinte a impossibilidade de conciliar a carga lectiva da filha neste colégio, com os estudos religiosos, atendendo que se trata de uma família muçulmana.
Tal facto levou a que o m/Constituinte se visse obrigado, por razões de ordem religiosa (...) a repensar a frequência do colégio por parte da filha, o que conduziu ao consequente cancelamento da respectiva inscrição efectuada.
Solicitado o reembolso das quantias pagas, foi-lhe informado que tal não era possível. Se em relação ao reembolso do valor anual da inscrição, o m/Constituinte entende a sua não restituição, o mesmo já não sucede com o valor de € 3.900,00 pago a título de “Capital Levy”.
12 – O Requerente frequentou o Colégio “…”, enquanto aluno.
13 – O Requerente sabia que as aulas do Colégio “…”, em geral, terminam por volta das 16h00. * b) Factos não provados: I – A decisão de cancelar a inscrição no Colégio “….
” teve que ver, em exclusivo, com a impossibilidade de conciliar a carga lectiva da filha com os estudos religiosos.
II – A Requerida não indicou ao Requerente que os montantes indicados em 6 não seriam restituídos em caso de cancelamento da inscrição.
III – O Requerente não entendeu o significado de “non refundable”.
Inexistem, com relevo para a decisão da causa, outros factos que se devam considerar como não provados.
A final foi proferida esta decisão: “Nestes termos, e com os fundamentos supra indicados, julga-se a presente acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias, proposta por A… contra V…. S.A, totalmente improcedente e, em consequência, absolve-se a Requerida do pedido Condena-se o Requerente nas custas do processo (cf. Artigos 527.º, n.º 1 e 2 do C.P.C).” **** É esta decisão que o requerente impugna formulando estas conclusões:
-
O autor entregou à ré, enquanto entidade gestora do colégio denominado “….”, as quantias de € 1.280,00 e de € 3.900,00, a título, respectivamente, de inscrição e “capital levy”, com vista à frequência do colégio por parte da sua filha, no ano lectivo de 2020/2021.
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Tal frequência não se veio a concretizar, razão pela qual o autor solicitou à ré a restituição das quantias pagas, pedido esse que o autor efectuou em Junho do ano 2020, ou seja, antes do início do ano lectivo.
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A ré não aceitou restituir as referidas quantias ao autor.
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O Tribunal recorrido, com a fundamentação fáctica e jurídica constante da aliás douta sentença, entendeu “…absolver a requerida do peticionado”.
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Entende o recorrente que, a cláusula contratual geral aposta no formulário que configura o contrato celebrado entre recorrente e recorrida é abusiva, e daí ser nula.
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Além do mais, sem prescindir, entende o recorrente que a douta sentença recorrida, salvo o devido respeito, enferma de erro de julgamento, pelas razões que passamos a demonstrar.
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II Da Questão prévia h) Da nulidade da cláusula contratual geral aposta no contrato de prestação de serviços aqui em causa por ser abusiva i) Resulta dos factos provados, e no que respeita aos termos contratuais sub judice, e para o que aqui interessa, o seguinte: “4 – Desse formulário consta, entre o mais, o seguinte: “Todas as candidaturas têm de ser acompanhadas do pagamento de uma taxa de inscrição não reembolsável, bem como do pagamento de emolumento [N.T.: capital levy], de acordo com o tarifário publicado pela Escola anualmente. Os alunos são admitidos por um ano inteiro. A admissão e matrícula do aluno constitui a obrigação de pagar todas as taxas e mensalidades conforme especificado na tabela de propinas. Não há redução ou reembolso por ausência, saída ou expulsão (…)”. 5 – De tal formulário constava também um documento designado “Regras e regulamento do Colégio”, no qual se podia ler: “TAXAS DE INCRIÇÃO INICIAL Incrição Anual Esta valor pago pelo aluno, todos os anos, no acto da inscrição e não é reembolsável Taxa de admissão [N.T.: capital levy] Este valor será pago pelo aluno, apenas uma vez, quando da inscrição e não é reembolsável (…) Deverá ser dado um aviso prévio (90 dias), por escrito, por parte do aluno que queira desistir. As propinas, taxa de admissão e taxa de inscrição não serão reembolsados (…) Aceitação Ao proceder à inscrição...
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