Acórdão nº 3415/05.4TBPRD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução13 de Setembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I M B e C B instauraram acção declarativa com processo ordinário “de interpretação de testamento” contra A, R, C e MINISTÉRIO PÚBLICO EM REPRESENTAÇÃO DE INCERTOS, alegando que a leitura do testamento realizado pelo testador M C B, pela sua estrutura gramatical, resulta confusa, não sendo claro a quem devem ser atribuídos os bens sobre que incide o usufruto, conclui peticionando que o Tribunal “ … se digne interpretar a vontade subjetiva do testador aquando da feitura do testamento, no sentido de que fique claro quais são os bens que o testador quis atribuir a cada um dos beneficiários do seu testamento.” O Ministério Público, em representação de incertos, apresentou a sua contestação impugnando os factos alegados na petição inicial.

A Ré A contestou por sua vez, invocando a ilegitimidade dos autores, por não serem destinatários de qualquer deixa testamentária, excepcionando a aquisição, por usucapião, a favor de R, do usufruto de todos os móveis e imóveis de que o “de cujus” era dono e possuidor em Portugal, e a aquisição pela Ré A, também, por usucapião, da propriedade da raiz de todos os móveis e imóveis que o “de cujus” era dono e possuidor em Portugal, concluindo assim pela ilegitimidade dos Autores, por não serem, nem poderem ser legatários por força do testamento que invocam.

Defendendo-se quanto ao mais por impugnação termina pedindo que, na procedência da excepção de ilegitimidade seja absolvida da instância, ou, a não proceder esta, que seja absolvida do pedido.

Os Autores, na resposta, impugnam os factos articulados pela Ré e concluem pela improcedência das excepções da ilegitimidade e da usucapião.

No despacho saneador foi julgada improcedente a excepção da ilegitimidade invocada pela Ré.

Tendo os autos prosseguido para julgamento, veio no final a ser proferida sentença que julgou a acção totalmente procedente e, em consequência, interpretou a vontade subjectiva do testador M C B aquando da feitura do testamento, datado de 25 de Julho de 1978, no sentido de que quis deixar o usufruto vitalício de todos os móveis e imóveis que existirem em Portugal, de sua propriedade, em favor da sua irmã R e quis deixar à sua esposa D, de entre todos os bens existentes em Portugal, os bens imóveis referidos nos pontos 13 a 14 e, ainda, todas as importâncias em dinheiro existentes em estabelecimentos bancários em Portugal e deixar aos seus sobrinhos, aqui Autores, C B e M B, em partes iguais, os restantes bens existentes em Portugal referidos nos pontos 15 a 20 da factualidade provada.

Não conformados com esta decisão, vieram os Réus R e A, interpor recurso de Apelação, o qual veio a ser julgado improcedente.

Aqueles mesmos Réus, recorrem agora de Revista, apresentando as seguintes conclusões: Recurso de R: - O recorrente não contestou e assim procedeu porque não tinha de contestar, pois que, não sendo herdeiro nem legatário, nada tinha ou podia ter a ver sobre a pretensão de interpretação de um testamento.

- Não obstante, a douta sentença, coadjuvada pelo acórdão sob revista, houve por bem declarar que: «julga-se a acção totalmente procedente», com «custas pelos réus», assim visando o recorrente.

- A leitura da sentença, que é a que aprecia a questão de início, mostra, à evidência e saciedade, que em parte alguma dela o recorrente é referido, pois nada havia que referir, pelo que a conclusão decisória nada tem a ver com as premissas.

- Isso mesmo já resultava da petição inicial em que nada foi dito que consubstanciasse qualquer causa de pedir quanto ao apelante, que não existe.

- Subsistia, e subsiste, pois, total ausência de causa de pedir a propósito do Réu, ora Recorrente.

- O acórdão recorrido fez prevalecer razões de forma ou adjectivas - mesmo assim indevidamente ponderadas - sobre questão de direito substantivo que as precede e, só por isso, decidiu erradamente, salvo o devido respeito. Ora: - A primeira consequência da total falta de causa de pedir é de natureza substantiva e substancial: não pode ser condenado aquele sobre o qual nenhum facto é aduzido que o vincule, por qualquer forma, à relação jurídica sujeita a contencioso - como é o caso.

- Esta banalidade jurídica significa a necessária oficiosa absolvição do pedido deduzido contra quem nada tem a ver com o caso - o que as Instâncias deviam ter feito e não fizeram, condenando o recorrente por relação jurídica em que nunca foi parte nem invocado foi que o tivesse sido, violando, salvo o respeito devido, os mais elementares princípios do Direito das Obrigações (CCiv., arts. 397.º e segs.).

- Só no plano processual, e como mera complemento desnecessário (como bem resulta do que foi arguido nas anteriores alegações), esta óbvia violação, é, outrossim, motivo de nulidade de todo o processo (a respeito da parte concreta sobre a qual impende um pedido), e era, como ainda é, geradora de «ineptidão da petição inicial» (também a respeito, pelo menos, da mesma parte visada) [CPCiv., art. 193.º-1 2 2-0)] e, sendo de conhecimento oficioso como excepção dilatória [CPCiv., art. 494.º-1-b)], nunca é sanável e, antes, por natureza, é de conhecimento oficioso (CPCiv., art. 495.º).

- Deste modo, mantendo o julgamento da acção como procedente no que ao recorrente se refere e condenando-o em custas, o douto acórdão violou também, salvo o devido respeito, as citadas normas, pelo que deve ser revogada, sendo o apelante absolvido.

- Recurso de A: - Mais uma vez a douta decisão o quo não encarou a questão essencial a seu tempo levantada, embora aqui tenha procedido ao invés de no recurso anterior: tinha uma questão processual que evitava, como evita, tratar a substância, mas não tratou a primeira, para se ater à segunda, como se lhe fosse possível.

- Com efeito, o Tribunal não pode substituir-se à parte na formulação do pedido, agindo como se tivesse sido formulado um pedido que não foi feito.

- Deste modo, a questão processual equivale a ter decidido para além do que era lícito pedir e antecede a questão substancial de o Tribunal proceder autonomamente à interpretação do testamento, sem que os AA. tenham formulado qualquer pedido do sentido que defendessem para aquela interpretação.

- Aliás, os AA. ora recorridos apesar de alertados (na contestação) para a total deficiência da sua petição, nunca a corrigiram de qualquer modo.

- É que do teor da petição, consta o pedido, que é tão somente o seguinte: «Termos em que se requer a Vª. Exª. que se digne interpretar a vontade subjectiva do testador aquando da feitura do testamento, no sentido de que fique claro quais são os bens que o testador quis atribuir a cada um dos beneficiários do seu testamento.».

- A simples leitura demonstra que os AA. não se dão ao trabalho de...

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