Acórdão nº 387/09.0TBVLN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2013
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO Teresa … intentou a presente acção declarativa, com processo ordinário, contra Maria … e marido Abel …, pedindo, a final, que, por via dela: 1) Se reconheça à autora a sua qualidade de herdeira de seus pais, Carolina … e Joaquim …; 2) Se declare nula e de nenhum efeito a sua declaração negocial feita na escritura de partilhas referida no artigo 2º da petição inicial, na medida em que consentiu que na mesma se não incluísse e se lhe não adjudicasse a casa identificada no artigo 4º da p.i., por a tal ter sido induzida e mantida em erro pelos réus, não tendo a sua vontade declarada correspondido à sua vontade real, quando os réus bem conheciam ou, pelo menos, não deviam ignorar a essencialidade, para a autora, de que a referida casa devia constar da escritura de partilhas e nela ser-lhe adjudicada, o que constituiu o seu erro, induzido e mantido por aqueles; 3) Mais se declarando como incluída naquela escritura e adjudicada à autora a referida casa, para todos os efeitos legais; Ou, caso assim se não entenda, e subsidiariamente, que: 4) Se condene os réus a acordarem na adjudicação à autora, nos autos de inventário referidos no artigo 21º, a casa em questão; 5) Ou, então, que se condene os mesmos a outorgarem, com a autora e o interessado identificado no artigo 1º e sua mulher, em escritura de partilhas adicional, tendo por objecto a referida casa e sendo esta na mesma adjudicada à autora; 6) Condenando-se, ainda, os réus a pagar à autora a indemnização que venha a liquidar-se em execução de sentença, por todos os danos causados pela sua ilegal actuação, que não respeitou o legal princípio da boa fé.

Para tanto alegou, em síntese, que ela autora, a ré mulher e José …, celebraram, por escritura de partilhas realizada em 14.05.1995, partilha da herança dos seus falecidos pais, Carolina … e Joaquim …, na qual foram mencionados todos os bens que constituíam o acervo hereditário dos pais, com excepção da casa onde reside a autora, porquanto os réus, que foram quem orientaram a partilha, diziam que o notário a não podia fazer constar da dita escritura em virtude da mesma se mostrar indivisa, o que não correspondia à verdade, o que a autora só veio a saber no dia 18 de Maio de 2009, pois não só a indivisão era insubsistente, como também não era impeditiva de na escritura de partilhas ter sido incluída a casa em questão e adjudicada à autora, a qual foi assim induzida em erro pelos autores, que sempre quiseram a casa para eles.

Os réus, regularmente citados, não apresentaram contestação.

Foi proferido despacho a considerar confessados os factos articulados pela autora, nos termos do n.º 1 do art. 484.º do CPC, e deu-se cumprimento ao disposto no n.º 2 do mesmo preceito, tendo as partes apresentado alegações.

Na sequência de despacho proferido pelo Mm.º Juiz a quo a alertar a autora para a preterição de litisconsórcio necessário activo, veio esta requerer a intervenção principal provocada de José … e mulher Maria dos Anjos …, igualmente outorgantes na escritura de partilha ajuizada, sendo o primeiro na qualidade de herdeiro.

Citados os chamados, associaram-se à autora, fazendo seus os seus articulados.

Vieram então os réus apresentar uma contestação, a que se seguiu réplica e tréplica, tendo sido proferido, a fls. 158-161, despacho a determinar o desentranhamento do processo físico e entrega aos réus dos articulados por si apresentados, julgando-se tais peças processualmente inexistentes (não escritas) no âmbito do processo.

Foi finalmente proferida a sentença, cujo dispositivo se transcreve: «Termos em que, tudo visto e considerado, se decide:

  1. Absolver da instância os RR. MARIA … e marido ABEL … quanto ao pedido de condenação genérica relativamente aos danos de natureza não patrimonial.

    No mais, julgar a acção parcialmente procedente, por provada, e, consequentemente: b) Reconhece-se à autora TERESA … a sua qualidade de herdeira de seus pais, Carolina … e de Joaquim …;

  2. Declara-se inválida, por anulabilidade, a declaração negocial da autora emitida na escritura de partilhas referida no ponto 3) dos factos provados da causa, e, consequentemente, determina-se a anulação total do negócio jurídico de partilhas em causa (o que, determina, in casu, fazer extinguir, retroactivamente, ao momento da abertura da sucessão, os efeitos próprios da partilha hereditária, repondo a situação de indivisão hereditária – que só poderá ser superada com nova partilha, face à ineficácia global da primitiva).

  3. Absolvendo-se os réus no mais peticionado.

    Custas a cargo de autora e réus na proporção de 20% e 80%, respectivamente.» Inconformados, vieram a autora e, subordinadamente, os réus, interpor recurso de apelação, encerrando as respectivas alegações com as seguintes conclusões que a seguir se transcrevem: No recurso interposto pela Autora: «Quanto ao primeiro ponto 1. Estabelecendo o artigo 293º do Código Civil que “o negócio nulo ou anulado pode converter-se num negócio de tipo ou conteúdo diferente, do qual contenha os requisitos essenciais de substância e de forma, quando o fim prosseguido pelas partes permita supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a invalidade”, face aos elementos constantes do processo, mormente a não oposição dos réus ao peticionado, não pode subsistir o entendimento da sentença; 2. Qual seja, o de não ser aplicável ao presente caso a figura da conversão do negócio prevista naquela norma; 3. Com efeito, o(

  4. Mmº(ª) Juiz(a) a quo, para além de não ter especificado os fundamentos de facto ou de direito que lhe permitiriam, ou não, concluir como fez, ou seja, pela não aplicação da referida figura de conversão, tendo assim incorrido em nulidade da sentença, nos termos do artigo 668º, nº 1, al. b), do CPC, não tem qualquer razão; 4. Na verdade, apenas referiu que, não se afigurando aplicável a conversão, acabou por concluir pela anulação total do negócio jurídico de partilhas, sem que tenha exercitado a menor justificação para tal entendimento, que viola aquele referido preceito do Código de Processo Civil; 5. O que, aliás, nem seria possível, dada a evidência do entendimento contrário, como se passa a demonstrar; 6. É que, tal como preceituado se mostra na mencionada norma, a conversão do negócio de partilhas em causa num negócio de conteúdo diferente; 7. Ou seja, no qual seja incluída a casa identificada no artigo 4º da petição, considerando-se a mesma adjudicada à autora, ora recorrente, é perfeitamente possível; 8. Dado que o negócio realizado, partilhas, contém os requisitos essenciais de substância e de forma; 9. Para além de que o fim prosseguido por autores e réus, partes do negócio, permite supor que elas o teriam querido, se tivessem previsto a invalidade; 10. Efetivamente, tanto assim é que os réus nem contestaram a ação; 11. Pelo que é legítimo supor que se tivessem previsto a invalidade do negócio decorrente da não inclusão da referida casa na escritura de partilhas, e sua adjudicação à primeira autora, tal como estava acordado entre todos, não teriam querido correr o risco que correram e que foi o de ser, como foi, anulado o negócio de partilhas; 12. É uma medida drástica e desnecessária a simples anulação do negócio de partilhas, como foi decretada, quando aquele pode sobreviver pela simples inclusão no mesmo da casa em questão; 13. Convertendo-se, assim, o negócio noutro com conteúdo diferente, dado que passa a do mesmo fazer parte a referida casa; 14. Aliás, os autores ao terem formulado do modo como fizeram o pedido principal, tiveram em mente, como é por demais claro, a conversão do negócio, que é perfeitamente possível; 15. Nada se opondo a tal, quando pediram que mais se declarasse como incluída na escritura de partilhas e adjudicada à autora a casa em questão, para todos os efeitos legais; 16. Aliás, o artigo 239º do Código Civil, ao estabelecer que “na falta de disposição especial, a declaração negocial deve ser integrada de harmonia com a vontade que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso, ou de acordo com os ditames da boa fé, quando outra seja a solução por eles imposta”, impõe que igual solução seja dada ao caso; 17. Na verdade, quer pelo estabelecido no artigo 293º quer no artigo 239º, a conversão do negócio é a solução mais consentânea com a realidade; 18. Pois que é, igualmente, legítimo entender que a vontade de autores e réus teria sido a de incluir a casa em questão na escritura de partilhas, adjudicando-a à primeira autora, se tivessem previsto as consequências da sua falta; 19. Que o mesmo é dizer a invalidade do negócio; 20. Ao que também impõem os ditames da boa-fé; 21. Por outro lado, dada a distância temporal que medeia entre a data da escritura de partilhas e a atualidade, ou seja, 17 anos, não é razoável pensar que seja possível dar integral cumprimento ao disposto no artigo 289º do Código Civil; 22. O que, aliás, não deixaria de colidir com atos de alienação efetuados, onerosos ou gratuitos e a possível invocação de aquisição por usucapião do seu objeto; 23. Por tal motivo, tudo aconselha a que se opere a conversão do negócio de partilhas do modo como se vem de dizer; 24. Já que se verifica a conjugação de todos os elementos essenciais para tal, como acima se deixou demonstrado; Quanto ao segundo ponto 25. Dispondo o artigo 569º do Código Civil que “quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o impede, no decurso da acção, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos”, não é legítimo fazê-lo aplicar apenas aos danos patrimoniais; 26. Mas também aos danos morais, pois, constitui princípio geral de direito a respeitar que ubi lex non distinguit nec interpres distinguere debet; 27. Contudo, se não era esse o entendimento do o(a) Mmº(ª) Juiz(a) a quo, devia ter dado cumprimento ao...

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