Acórdão nº 0853598 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Junho de 2008

Magistrado ResponsávelSOUSA LAMEIRA
Data da Resolução30 de Junho de 2008
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

RECURSO DE AGRAVO Nº 3598/2008 Acordam no Tribunal da Relação do Porto I-RELATÓRIO

  1. No Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Gaia, inconformado com o despacho de fls.108 (23 destes autos), proferido nos autos de Investigação de Paternidade com Processo Ordinário, intentados por B.......... contra C.........., D.......... e E.......... no qual se entendeu "admitir a prova pericial requerida pelo autor (ou seja a recolha de ADN ao falecido F.......... pela exumação do cadáver)", vieram os Réus interpor recurso de agravo, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª- O Recorrido instaurou a presente acção de investigação de paternidade baseada em algumas das presunções da paternidade previstas no n.º 1 do artigo 1871°, do Código Civil.

    1. - A causa de pedir formulada nos presentes autos constituiu uma ou várias das situações de facto descritas na norma supracitada, e que presume a filiação ou realidade biológica da filiação, de cuja prova está o autor dispensado.

    2. - O Recorrido nasceu em 20/11/1958, instaurou a presente acção quando tinha já quarenta e nove anos de idade.

    3. - Isto significa que o autor não tem que provar directamente a filiação biológica, porque está impedido de a invocar directamente, face à caducidade estabelecida no n.º 1 do artigo 1817° do Código Civil.

    4. - Esta filiação biológica apenas pode ser provada por presunção, ou seja, através da demonstração que foi tratado como filho pelo pretenso pai, tal como articulado pelo Recorrido.

    5. - O tribunal não tem que conhecer directamente do facto biológico, da procriação.

    6. - Os exames biológicos e hematológicos ordenados no despacho recorrido destinam-se directamente à prova da filiação biológica.

    7. - Prova essa que, como se disse, não pode ser feita directamente no caso concreto em apreço por já ter caducado o direito do autor de instaurar uma acção de investigação de paternidade com fundamento imediato no facto biológico da procriação.

    8. - Sendo assim, não se justifica a admissão e produção da prova pericial em causa.

    9. - Acresce ainda que os Recorrentes, como representantes e sucessores do investigado, têm legitimidade para se oporem à admissão do exame, recusa esta que foi expressa nos autos, e não atendida 11ª- Violou o Tribunal de 1ª- Instância as normas constantes dos arts. 18l7.°, n.º 1, 2, 3 e 4.° do Código Civil.

    Concluem pedindo que seja revogado o despacho que admitiu a realização de prova pericial, através de Exumação de cadáver, e substituído por um outro que não admita a realização desta prova pericial.

  2. O Recorrido ofereceu contra-alegações defendendo a manutenção do decidido.

    II - FACTUALIDADE PROVADA Mostram-se provados os seguintes factos: 1º- O autor B......... intentou a presente acção Investigação de Paternidade contra C.........., D.......... e E.......... .

    1. - Alegou ser filho do falecido F.........., pessoa que a sua mãe conheceu e com quem estabeleceu uma relação extra-matrimonial.

    2. - O autor apesar de não perfilhado sempre foi reconhecido como filho do falecido e este sempre foi reconhecido como pai do Autor.

    3. - O falecido sempre assumiu a paternidade do Autor.

    4. - O autor nasceu em 20 de Dezembro de 1958, o F.......... faleceu em Janeiro de 2003 e os Réus são os únicos herdeiros do falecido.

    5. - O Autor requereu "a recolha de ADN ao falecido F.......... pela exumação do cadáver" o que foi deferido pelo despacho recorrido.

    III - DA SUBSUNÇÃO - APRECIAÇÃO Verificados que estão os pressupostos de actuação deste tribunal, corridos os vistos, cumpre decidir.

    O objecto do recurso é definido pelas conclusões da alegação do recorrente, artigo 684 nº 3 do Código de Processo Civil.

    A questão de que cumpre conhecer e decidir é a seguinte: 1ª- Havendo oposição dos familiares do falecido, pretenso pai, pode ser deferido o pedido de realização de exames ao ADN, com a necessária exumação do cadáver para recolha de tecidos? Vejamos

  3. Para a resposta a esta questão devemos ter também em consideração que a presente acção de investigação de paternidade se baseia, no tratamento como filho por parte do pretenso pai, ou seja tem por fundamento a posse de estado, não tendo o Autor alegado nem invocado a exclusividade de relações sexuais por parte da sua mãe nem a verdade biológica decorrente de exames periciais.

    A posse de estado constitui uma presunção legal da filiação, pelo que, provando-se esta, deve a acção de investigação proceder ainda que não se prove a exclusividade das relações sexuais da mãe com o pretenso pai.

    Daí que "se o Autor da acção de paternidade baseia a investigação em presunções fica o mesmo dispensado de provar o vínculo biológico e o réu terá de ilidir a presunção", Ac. do STJ de 7.2.1995, CJ./STJ, 1995, 1º 66; no mesmo sentido o Ac. do STJ de 6.5.1997, BMJ, 467, 588.

    "Nas acções de investigação de investigação de paternidade a causa de pedir é o facto da filiação biológica, sendo a "posse de estado" simples presunção de tal realidade", Ac. STJ de 25.02.1987, BMJ, 364-873 Como afirma Lopes do Rego "a causa de pedir nas acções de investigação ou reconhecimento da paternidade é o facto naturalístico da procriação biológica do filho pelo réu a quem a paternidade é imputada, perspectivado como facto natural dotado de relevância jurídica. Tal facto - a referida procriação biológica - pode, naquelas acções, ser alternativamente demonstrado por uma das três vias distintas: I- em primeiro lugar, pode sê-lo directamente, através dos "exames de sangue e quaisquer outros métodos cientificamente comprovados", a que alude o artigo 1801 do CC, e que implica, no processo, a produção de prova pericial (art.388 do CC). II- Em segundo lugar, pode sê-lo indirectamente, através do recurso pelo autor a alguma das presunções legais de paternidade previstas no artigo 1871 do CC, desde que não ilididas pelo réu, através da criação, no espírito do julgador, de "dúvidas sérias sobre a paternidade do investigado". III- Finalmente, poderá sê-lo, também por forma indirecta, através do recurso a presunções naturais ou judiciais, alicerçadas em regras ou máximas de experiência, nos termos consentidos pelo artigo 351 do CC, é o que sucede na generalidade das causas, em que não haja lugar à realização de exames de sangue e em que não ocorra alguma das situações de facto que servem de substracto às aludidas presunções legais de paternidade, incumbindo então naturalmente ao autor demonstrar que houve relações de sexo entre a mãe e o pretenso pai no período legal de concepção do filho e que tais relações foram exclusivas", in RMP, 58-166.

    Podemos pois concluir, tal como se refere no Acórdão do STJ de12 de Setembro de 2006...

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