Acórdão nº 08B1862 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Junho de 2008

Data26 Junho 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA e BB intentaram, no dia 20 de Outubro de 2000, contra CC-Sociedade de Construções, Ldª, DD Ldª, EE e FF, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a declaração de nulidade de identificadas escrituras públicas, uma celebrada entre a primeira e a segunda rés, e a outra entre esta e os terceiros réus, e de que os autores são donos e possuidores delas e do respectivo recheio, se ordene o cancelamento dos registos de aquisição a favor da segunda ré e dos terceiros réus e a condenação dos réus a entregar-lhes as fracções prediais, ou subsidiariamente, a pagarem-lhe 54 500 000$ correspondentes ao valor das fracções e respectivo recheio.

Alegaram terem comprado as fracções prediais à primeira ré em 9 de Julho de 1996, ter o gerente daquela assumido o compromisso de as registar em nome deles, que ele omitiu isso e CC, Ldª as vendeu à segunda ré, sabendo esta pertencerem aos autores, e que a última as vendeu aos terceiros réus depois de os autores já terem requerido o registo a seu favor.

DD Ldª, na contestação, afirmou desconhecer a compra das fracções pelos autores, e que foi a primeira ré que as vendeu ao terceiro réu, acrescentando serem excessivos os valores que os primeiros pretendem pelas fracções e recheio.

GG e BB , em contestação, afirmaram desconhecer terem os autores requerido o registo de aquisição das fracções em 13 de Agosto de 1999, acrescentando ser a primeira ré a única responsável perante os autores, por virtude da segunda ré e dos terceiros réus estarem de boa fé, registando as aquisições, desconhecendo as relações entre os autores e a primeira ré.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 27 de Dezembro de 2006, por via da qual foi declarado serem os autores proprietários das fracções, declarada a nulidade dos dois contratos de compra e venda em causa, condenados os réus a restituírem aos autores as fracções e determinado o cancelamento das inscrições registais de aquisição delas a favor dos réus.

GG e BB apelaram da referida sentença, e a Relação, por acórdão proferido no dia 17 de Janeiro de 2008, revogou-a e condenou CC- Sociedade de Construções, Ldª a pagar aos autores € 274 000 e juros de mora à taxa legal desde 27 de Dezembro de 2006.

AA e BB interpuseram recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação; - por efeito do contrato, tornaram-se proprietários dos imóveis, o registo predial não é constitutivo de direitos, não constituindo os recorrentes, primeiros adquirentes, nem os recorridos, adquirentes subsequentes, nem outrem, proprietários dos imóveis; - a presunção derivada do artigo 7º do Registo Predial é ilidível, e os recorrentes invocaram na acção de reivindicação a aquisição originária dos imóveis e a cadeia de transmissões a ela conducentes; - tendo provado que, depois de CC, Ldª lhes haver vendido as fracções, as vendeu a outrem, ilidiu a presunção decorrente do artigo 7º do Código do Registo Predial; - a venda de coisa alheia feita a DD Ldª, e por esta a GG e FF são nulas, nos termos do artigo 892º do Código Civil; - os recorrentes têm a posse dos dois imóveis desde que os adquiriram por compra; - GG e FF não podem arrogar-se o direito de propriedade sobre os imóveis, porque a acção foi registada e foram citados para ela antes de decorridos três anos sobre a data em que outorgaram no contrato de compra e venda com DD Ldª; - eles não podem, de futuro, arrogar-se de boa fé porque foram citados para a acção e sabem desde então pertencerem os prédios aos recorrentes, pelo que lhes falece a prioridade do registo, certo que este não é constitutivo de direitos; - os registos de aquisição a favor de DD Ldª e de GG e FF foram feitos com base em contratos nulos, que não podiam produzir quaisquer efeitos, por virtude de CC, Ldª não ter legitimidade para vender por ter antes vendidos aos recorrentes; - nos termos do artigo 16º do Código do Registo Predial, DD Ldª e GG e FF, após a aquisição a favor dos recorrentes, registaram a aquisição com base em títulos nulos, desconformes à realidade substantiva, por as vendas terem sido feitas por quem carecia de legitimidade para as fazer; - nos termos do artigo 16º do Código do Registo Predial pode ser pedido o cancelamento de registos efectuados com fundamento em título falso ou nulo, desconforme com a realidade substantiva, o que os recorrentes fizeram, pedindo o cancelamento dos registos das aquisições posteriores à sua, com fundamento na respectiva nulidade; - o nº 2 do artigo 291º do Código Civil inclui no conceito de terceiro os recorrentes como primeiros adquirentes com título conforme à realidade substantiva; - o referido preceito não se refere aos adquirentes de um adquirente sem título ou com título falso, ambos desconformes com a realidade substantiva, referindo-se à acção intentada pelo primeiro adquirente com título conforme à realidade substantiva, que intente acção para a declaração de nulidade das aquisições posteriores à sua, o que terá de fazer no prazo de três anos após a conclusão dos negócios subsequentes ao da sua aquisição, devendo no mesmo prazo registar a acção, de modo a que o seu direito prevaleça sobre o dos outros terceiros; - o acórdão recorrido violou os artigos 291º, nº 2, do Código Civil e 16º e 104º do Código do Registo Predial; - deverá ser mantida a sentença proferida pelo tribunal da primeira instância ou serem todos os accionados condenados solidariamente a pagar o peticionado.

Responderam GG e FF, em síntese de conclusão de alegação: - face ao disposto nos artigos 4º a 7º e 17º, nº 2, do Código do Registo Predial, a nulidade do artigo 892º do Código Civil da segunda compra e venda apenas diz respeito às relações inter-partes, porque nas relações com terceiros vale em termos de eficácia o prescrito na lei de registo predial; - a prioridade do registo a favor de DD Ldª garante-lhe a prevalência do seu direito sobre o dos recorrentes, e, como a aquisição por estes é inoponível àquela, não se suscita a questão da nulidade do registo a favor dos recorridos; - os recorridos estavam de boa fé e confiaram na aparência e na presunção derivada do registo predial, e a presente acção não é uma acção de reivindicação, mas sim de anulação; - são pressupostos cumulativos do artigo 291º, nº 2, do Código Civil a invalidade substantiva do primeiro negócio do interessado na declaração da nulidade, a aquisição onerosa por terceiros e de boa fé, o registo da acção de nulidade ou anulação em três após a conclusão do negócio afectado de invalidade, que se não verificam; - aplica-se às situações em que o interveniente em negócio substantivamente inválido pretende a respectiva invalidação mas se vê confrontado com um terceiro que adquiriu, de boa fé e a título oneroso, um direito sobre o mesmo bem, cuja substância depende do primeiro negócio, o que não é de todo o caso; - em termos tabulares registais não há registo de acção válido e não é aplicável ao caso vertente porque o terceiro a que se reporta é o sub-adquirente posterior à celebração do primeiro contrato afectado de nulidade por ilegitimidade substantiva.

II E a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido, inserida por ordem lógica e cronológica: 1. A ré CC, Ldª está inscrita na Conservatória do Registo Comercial de Loulé, com o número de matrícula .../....., com sede no lote......., loja .., ............, freguesia de Quarteira, com o objecto social de construção civil, compra e venda de propriedades e revenda dos adquiridos para esse fim, tendo por sócios e gerentes HH e TT.

  1. A ré DD.Ldª, conhecida como Predial de Benfica, está inscrita na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa, com o número de matrícula ......../......, com sede social na ........., no ..., 1° esquerdo, freguesia de Benfica, na cidade de Lisboa, com o objecto social de exercício da actividade de compra e venda de propriedades e da construção civil, tendo por sócios NN, OO e PP, tendo declarou o início da sua actividade no dia 21 de Novembro de 1989.

  2. Os autores estão emigrados nos Estados Unidos da América desde muito tempo antes de 9 de Julho de 1996, e, nesta data, no Cartório Notarial de Anadia, QQ, como procurador e representante da ré CC, Ldª, e o autor, representado pelo seu procurador, RR, declararam, em escritura pública, a primeira vender e o ultimo comprar, cada uma por 8 000 000$, as fracções autónomas destinadas à habitação, designadas pela letras "C" e "L", correspondentes ao rés-do-chão C e ... andar C, descritas na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob os n° .......-.. e ......../......, Vilamoura, freguesia de Quarteira.

  3. Por ocasião da celebração daquela escritura de compra e venda, como os autores não residiam em Portugal, HH, gerente da CC, Ldª disse ao sogro do autor que...

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