Acórdão nº 08S723 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução28 de Maio de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 31 de Outubro de 2005, no Tribunal do Trabalho de Guimarães (2.º Juízo), AA instaurou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contraM...& P..., L.da, pedindo: a) se declare sem termo o contrato de trabalho celebrado entre as partes; b) se declare válida a resolução do contrato com justa causa que efectuou; c) a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 15.289,72, a título de indemnização, férias, subsídios de férias e subsídio de Natal, acrescida de juros de mora, à taxa legal, que, em 31 de Outubro de 2005, ascendiam a € 455,67, e a contar até efectivo e integral pagamento.

A ré contestou, impugnando todos os factos articulados na petição inicial (artigo 15.º) e sustentando que o autor nunca foi seu trabalhador, o que, segundo a ré, «não está em contradição com a existência do documento escrito [...] que as partes denominaram ‘contrato de trabalho a termo certo'», nem com a existência de recibos de salários passados a favor do autor (artigos 10.º e 11.º), porquanto, «[o]s recibos de salários eram emitidos a pedido e no interesse do Autor e teve a colaboração da Ré, e destinavam-se a pagar o salário da mulher do Autor, que, por ter alguns débitos pendentes perante terceiros, não podia figurar como empregada» (artigo 12.º), mas mesmo assim, «e tendo em conta a existência do contrato escrito, inexiste contrato de trabalho entre Autor e Ré, sendo tal documento ineficaz e nulo, já que as declarações aí produzidas não correspondem à realidade, nem à vontade das partes» (artigo 13.º).

O autor respondeu, afirmando ser falso o alegado na contestação.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que decidiu julgar a acção improcedente, por se entender que o autor não provou a existência de um contrato individual de trabalho entre as partes, ficando «prejudicada a apreciação dos demais factos e questões a decidir, com a inerente absolvição da ré».

  1. Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação, sendo que a Relação do Porto, apesar de ter «dado como provada a existência do alegado vínculo laboral entre A. e ré» e, «consequentemente, por omissão da fundamentação do termo resolutivo, dada a nulidade (por insuficiência) do respectivo motivo justificativo, a consideração como contrato sem termo (cfr. art. 130.º/2 e 131.º/4 do CT), e como tal a sua oportuna declaração [como contrato de trabalho sem termo], em conformidade com o peticionado na al.

    1. da [petição inicial]», julgou improcedente o recurso, por considerar que o autor não provou, como lhe competia, a justa causa invocada para a resolução daquele contrato.

    É contra esta decisão que o autor agora se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as seguintes conclusões: «1ª - Na presente acção, o A. pede a condenação da Ré no pagamento de quantias devidas a título de prestações salariais emergentes de um contrato de trabalho escrito celebrado entre ele e a mesma Ré, que contestou, excepcionando a nulidade por simulação do invocado contrato.

    1. - Em 1ª instância, o tribunal considerou "não provado" o invocado contrato individual de trabalho, decisão revogada pelo acórdão recorrido, que considerou provado o dito contrato individual de trabalho, mas julgou não se ter provado (pelo A.) justa causa de resolução.

    2. - Esta última decisão é inaceitável, já que face aos factos provados (que conduzem à comprovação da existência do vínculo laboral) a acção teria de proceder. Com efeito: a) A defesa por excepção, como foi usada in casu pela Ré ora recorrida, conduz a duas importantes consequências: em primeiro lugar, a excepção implica, sendo uma defesa "de flanco" que deixa intocada a matéria da acção, o reconhecimento, ao menos em princípio, dos factos a que se opôs; em segundo lugar, sendo a matéria de excepção ónus da prova de quem a invoca, o não se provar essa matéria implica a prova dos factos aos quais aquela excepção foi oposta (cfr. art° 487.º, n.º 2, e 493.º do Código de Processo Civil); b) O regime probatório do art° 376.º do Código Civil, referido no douto Parecer do M.º P.º, em que o Acórdão se estriba, para considerar ter sido provada a existência do vínculo laboral, aplica-se de igual forma e maneira à redução de salário e à resolução do vínculo operada pelo recorrente segundo a forma legal; c) Face à rescisão do contrato operada pelo recorrente com fundamento na falta de pagamento de retribuições, o que fez por carta registada com aviso de recepção dirigida à R. e ao IDICT, e tendo o impetrante pedido o pagamento de retribuições vencidas e subsídios de férias e de Natal, certo é que a recorrida demandada não conseguiu fazer prova dos factos, cujo ónus lhe competia - do pagamento - nos termos do disposto no Art.º 342.º, n.º 2, do Código Civil, pelo que se tais valores estão em dívida, e se são devidos, terá de os pagar (cfr. neste exacto sentido in Ac TRP de 25.02.2001, proferido no âmbito do proc.º 1303/01 pela 1ª Secção); d) Quer pela confissão da recorrida relativamente aos factos que lhe são desfavoráveis (redução de salário), quer por sobre ela impender, como matéria de excepção, o ónus da prova do pagamento, quer ainda porque basta o pressuposto objectivo da falta de pagamento estar preenchido, a justa causa da resolução do vínculo laboral deveria ter sido reconhecida e declarada; e) Constam dos autos: o contrato de trabalho assinado; os recibos de vencimento emitidos; a carta enviada pelo A. ao IDICT e [a] carta de resolução enviada à Ré; f) Constam igualmente dos autos (cfr. fls. 140 a 149 do apenso A) cópia das declarações prestadas em auto e juntas a processo judicial em curso, em que o próprio gerente de facto da Ré - e única testemunha arrolada e ouvida no processo -, interpelado pelo inspector do IDICT sobre a razão de ter diminuído o salário ao A, disse: "(...) a redução da retribuição resultou de uma proposta feita pela gerência aos trabalhadores que os mesmos na altura aceitaram, não existindo qualquer documento que sustente a sua afirmação, visto tudo ter acontecido de forma verbal" (nosso sublinhado) - cfr. fls. 141; g) Adiante, refere-se ainda nesse auto que "A entidade empregadora ficou ciente de que não podia reduzir a contribuição (...) todavia, limitou-se a afirmar, em vez de regularizar a situação, que contestaria qualquer autuação até à via judicial" (nosso sublinhado) - cfr. fls. 142; h) As confissões feitas pela Ré, designadamente quanto à posição assumida face aos documentos juntos, sempre valerão nos autos principais enquanto confissão judicial, nada impedindo a aplicação do disposto no art. 355.º, n.º 3, do Código Civil; i) Nos termos do disposto nas disposições conjugadas dos [n].º 1 do artigo 374.º do Código Civil que o n.º 1 e 3 do artigo 376.º [sic], a[s] declarações ínsitas no contrato de trabalho e nos recibos de vencimento haverão de ser consideradas verdadeiras quer porque a recorrida não impugnou, antes confessou, a letra e assinatura constantes dos documentos e a sua autoria; j) Tal "confissão" feita pela recorrida, no sentido de que o contrato e os recibos de vencimento junto aos autos são da sua autoria, veio atribuir às declarações ínsitas no[s] mesmo[s] o valor de prova plena (cfr. art. 376.º, n.º 1, do Código Civil), considerando-se provados os factos compreendidos na declaração (cfr. n.º 2 do art. 376.º do Código Civil), ou seja: - [Q]ue a Ré admitiu ao seu serviço, em 3/2/2004, o A para exercer as funções inerentes à categoria profissional de director administrativo, mediante uma...

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