Acórdão nº 1300/06.1TBCBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução14 de Maio de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

11 Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

  1. RELATÓRIO.

    A arguida VV– IT, Lda.

    foi condenada no processo de contra-ordenação nº 1177/2005, por decisão do Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional – Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (fls. 119 a 122), na coima de € 2.500, pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelos arts. 4º, nº 1 e 12º, nº 1, do Dec. Lei nº 93/90, de 19 de Março, com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei nº 213/92 de 12 de Outubro.

    Inconformada com o decidido, a arguida impugnou judicialmente a decisão administrativa, tendo o 4º Juízo Criminal de Coimbra proferido sentença em 4 de Janeiro de 2007 (fls. 143 a 149) que, negando provimento ao recurso, manteve a decisão administrativa nos seus precisos termos.

    Novamente inconformada com o decidido, a arguida interpôs recurso para este Tribunal da Relação que, por acórdão de 9 de Maio de 2007 (fls. 164 a 172), o rejeitou por manifesta improcedência.

    Interpôs agora a arguida recurso extraordinário de revisão, constando no termo da respectiva motivação, as seguintes conclusões: “ (…).

    1 – No processo de contra-ordenação nº 1177/2005, intentado pela Câmara Municipal de Coimbra, a ora recorrente foi condenada na coima de € 2.500 (dois mil e quinhentos euros), acrescida do pagamento das custas processuais, pela prática de uma contra-ordenação p. e p. nos artigos 4º, n.º 1 e 12º, n.º 1 do DL 93/90 de 19 de Março, alterado pelo DL 213/92 de 12 de Outubro, confirmada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, na medida em que rejeitou o recurso por manifestamente improcedente (art.s 417/3, al c), 419/, al a) e 420º do CPP).

    2 – O recorrente não se conforma com a decisão administrativa que a condenou e aplicou a referida coima, razão pela qual a impugnou judicialmente, ao abrigo do disposto no art. 59º, n.º 1, do DL nº 433/82, de 27 de Outubro, do Regime Geral de Contra-Ordenações e Coimas (doravante designado RGCOC), com as alterações introduzidas pelo DL nº 244/95, de 14 de Setembro, e, proferida a sentença, recorreu para o Tribunal da Relação de Coimbra, que rejeitou o recurso.

    3 – Para confirmar a referida sentença, o Tribunal da Relação referiu que: "Os preceitos do processo penal deverão ser aplicados «devidamente adaptados», o que não pode ter outro sentido senão o de considerar que diferente é a natureza da decisão porque diversa é a estrutura organizatória e funcional da Administração" e que "Do n.º 1 do art. 125º do CPA, resulta que «a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos anteriores, pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso integrante do respectivo acto»", pelo que, "no presente caso, a decisão administrativa contém a narração dos factos e a indicação dos factos provados e não provados, a análise da prova produzida, o enquadramento jurídico dos factos culminando com a decisão" – vide pág. 8 do acórdão, concluindo que a decisão administrativa não enfermava de vícios, pelo que devia ser validamente considerada.

    3 – Ora a recorrente, com o devido respeito, não pode concordar com tal decisão, transitada em julgado, pelo que vem dela recorrer, extraordinariamente, com vista à revisão da sentença condenatória.

    4 – Aliás, o recurso de revisão inscreve-se nas garantias constitucionais de defesa, no princípio da revisão consagrado no n.º 6, do art. 29.º, da Constituição da República Portuguesa: "os cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão de sentença e à indemnização pelos danos sofridos".

    5 – Essas condições da lei encontram-se também plasmadas nos art. 449.º a 466.º do Código de Processo Penal, admitindo-se a revisão das decisões penais, não só a favor da defesa, mas igualmente da acusação.

    6 – São fundamentos e condições de admissibilidade da revisão, na versão dada pela recente alteração legislativa contemplada na Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, entre outros, a inconciliabilidade de decisões: inconciliabilidade entre os factos que fundamentam a condenação e os dados como provados em outra decisão, de forma a suscitar dúvidas graves sobre a justiça da condenação – art. 449.º, n.º 1, al. c) do CPP – e a descoberta de novos factos ou meios de prova: descoberta de novos factos ou meios de prova que, de per si ou confrontados com os que foram apreciados no processo, suscitem dúvidas sobre a justiça da condenação – art. 449.º, n.º 1, al. d) do CPP.

    7 – E assim, o presente recurso de revisão assenta nestes pressupostos, devidamente clausulados, pelas quais se evidencia ou pelo menos se indicia, com uma probabilidade muito séria, a injustiça da condenação, dando origem, não a uma reapreciação do anterior julgado, mas a um novo julgamento da causa com base em algum dos fundamentos indicados no n.º 1, do art. 449.º do CPP.

    8 – Com efeito, a recorrente não se conforma com o teor da condenação, em primeira linha, atenta à inconciliabilidade entre a decisão a rever e as questões suscitadas numa outra decisão previamente proferida.

    9 – Na verdade, a decisão proferida no âmbito do processo 1981/04.0TBCBR, que correu termos no 1º Juízo Criminal do Tribunal de Coimbra, conflitua com a decisão a rever sendo que, da análise conjunta e conjugada de ambas, se pode e deve concluir não haver fundamento legal que conduza à sua condenação.

    10 – No âmbito do processo de contra-ordenação nº 955/2003, que deu origem ao processo nº 1981/04.0TBCBR, com mesmo enquadramento fáctico, ao arguido A… , foi aplicada uma coima fixada em € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), por infracção nos termos do disposto nos mesmos dispositivos legais dos artigos 4º, nº 1, do DL nº 93/90, de 19 de Março, com a redacção introduzida pelo DL nº 213/92, de 12 de Outubro, acrescido de custas processuais.

    11 – E suscitada a questão prévia da nulidade da decisão administrativa, que se prendia com a falta de indicação, na decisão administrativa, da motivação e dos meios de prova, foi por esse Tribunal, proferido o seguinte despacho: "Por tudo o exposto, julga-se procedente o recurso e declara-se nula a decisão recorrida, bem como os actos posteriores dela dependentes, devendo ser repetida a decisão administrativa.

    " 12 – Ora o processamento e julgamento das infracções de natureza contra-ordenacional encontra-se submetido, no nosso ordenamento jurídico, a regime autónomo e específico, nomeadamente o constante do DL nº 433/82, de 27 de Outubro (RGCOC), com as alterações introduzidas pelos DL nº 356/89, de 17-10, e DL nº 244/95, de 14-09, e Lei nº 109/01, de 24-12, sendo que, de acordo com o art. 41.º, nº 1, de tal diploma, o C.P.P. constitui seu direito subsidiário 13 – O artigo 58º do DL 433/82, epigrafado de "decisão condenatória", estipula no nº 1 o seguinte: "A decisão que aplica a coima ou as sanções acessórias deve conter: a) A identificação dos arguidos; b) A descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas (o destaque é nosso); c) A indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão; d) A coima e as sanções acessórias.

    " 14 – O legislador não permite que nenhum dos elementos que especifica no nº 1 do citado artigo seja aí mencionado por remissão, e aceitar que por ser uma decisão administrativa não é exigível tal especificação, por se considerar tecnicamente incorrecto mas compreensível, é ultrapassar a elasticidade desejada, adoptando uma interpretação permissiva e pedagogicamente nefasta, que apenas conduz a facilitismos crescentes e desajustados.

    15 – A norma em apreço obriga, portanto, a que a decisão administrativa descreva os factos concretos imputados à ora recorrente, para que deles se possa defender convenientemente e que, uma vez provados, possam ser qualificados como infracção, dado vigorar nesta matéria o princípio da tipicidade contra-ordenacional.

    16 – Não bastava, por isso, à autoridade administrativa enunciar a fórmula legal e vazia do facto com o seguinte teor: "vinha a proceder de forma indiscriminada ao aterro de um sapal em terreno inserido em área de Reserva Ecológica Nacional (REN), numa extensão aproximada de 10.000m2, com uma altura de cerca de 1,5 m, com terras, entulhos e pedras".

    17 – Com efeito, tal fórmula, em si mesma, nada representa, sendo necessário determinar, em concreto, os factos que integram tal conceito, e isso a decisão recorrida não faz em parte nenhuma.

    18 – Não estando descritos os factos concretos que pudessem integrar a cláusula genérica...

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