Acórdão nº 0841877 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelLUÍS GOMINHO
Data da Resolução14 de Maio de 2008
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso n.º 1877/08 (Relator: L. Gominho) Acordam, em conferência, na Secção Criminal da Relação do Porto: I - Relatório: I - 1.) No Círculo Judicial de Vila Real, foi o arguido B.........., com os demais sinais, submetido a julgamento em processo comum, com a intervenção do tribunal colectivo, acusado pelo Ministério Público da prática em autoria material e concurso efectivo, de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, al.ªs d), e g), 22.º, e 23.º do Código Penal, de um outro, p. e p. nos art.ºs 131.º e 132.º, n.º 2, al.ª g), 22.º, e 23.º, e de um crime de omissão de auxílio, p. e p. pelo art. 200.º, n.ºs 1 e 2 do mesmo diploma.

Efectuado o julgamento e proferido o respectivo acórdão, veio a decidir-se: - Absolver o arguido do imputado crime de omissão de auxílio; - Condená-lo pela prática do crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º n.ºs 1 e 2 al.ªs d) e g), 22.º, 23.º e 73.º todos do Cód. Penal, na pena de cinco anos de prisão; - E pela prática do crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 131.º, 132.º n.ºs 1 e 2, al.ª g), 22.º, 23.º e 73.º do mesmo diploma, na pena de três anos de prisão.

Em cúmulo jurídico, na pena única de 7 (sete) anos de prisão.

I - 2.) Inconformado com o assim decidido, recorreu o arguido B.......... .

Uma vez que as conclusões que apresentou são simples reprodução do alegado na motivação, sem que tenha havido da sua parte um mínimo esforço em "resumir as razões do pedido", tal como lhe era exigido pelo art. 412.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, vamos substituirmo-nos na sua enunciação assinalando os respectivos tópicos essenciais, sem embargo do seu oportuno e ulterior aprofundamento: - Erro na apreciação da matéria de facto julgada; - Errada subsunção jurídica dos factos no artigo 132.º, n.ºs 1 e 2, alíneas d) e g), relativamente ao primeiro crime de homicídio; - Erro notório na apreciação da prova; - Insuficiência na apreciação da prova; - Errada subsunção jurídica dos factos no artigo 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea g), relativamente ao segundo crime de homicídio; - Determinação da medida pena - excesso da pena de prisão aplicada.

I - 3.) Ao recurso respondeu apenas o Ministério Público para concluir:

  1. Não se encontram erradamente julgados os pontos de facto impugnados pelo recorrente, pois os mesmos foram apreciados de forma crítica, imparcial, desprendida, lógica e racional, segundo as regras da experiência e a livre convicção do tribunal, conforme estabelece o art. 127.º do CPP. Por outro lado, a matéria de facto fixada pelo tribunal a quo só pode ser alterada pelo tribunal ad quem quando o registo da prova o permita com toda a segurança, o que não se verifica no caso sub-judice.

  2. A matéria de facto provada é integradora de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelo art.ºs 22.º, 23.º, 73.º, 131.º e 132.º, n.º 2, al.s d) e g) e de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelo art.ºs 22.º, 23.º, 73.º, 131.º e 132.º, n.º 2, al. g), todos do Código Penal e não como pretende o arguido em crimes de homicídio simples, na forma tentada, p. e p. pelo arts. 22.º 23.º, 73.º e 131.º, todos do mesmo diploma legal, pois da mesma emerge com evidência o agir do arguido que leva a tal integração.

  3. Não se detecta, na douta sentença recorrida, qualquer vício, nomeadamente o do erro notório na apreciação da prova e da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada alegados pelo recorrente.

  4. Perante o quadro factual descrito na decisão recorrida não merecem reparo as penas de prisão parcelares a pena única aplicadas ao recorrente nessa decisão.

  5. Não foram violadas quaisquer disposições legais.

II - 1) Subidos os autos a esta Relação, o Exm.º Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer por via do qual corroborou a argumentação já expendida na antecedente resposta para evidenciar a falta de razão do arguido em relação aos diversos pontos em que se desdobra o seu recurso.

*No cumprimento do preceituado no art. 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, nada mais foi acrescentado.

*Seguiram-se os vistos legais.

*Uma vez que não foi requerida a realização de audiência, nos termos do art. 411.º, n.º 5, do Cód. Proc. Penal, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 48/2007, de 29/08, teve lugar a conferência.

II - 2.) Ainda que se reconheça que a atitude por nós assumida não traduza a melhor prática processual, uma vez que o arguido se encontra preso à ordem destes autos, não se conveio no seu convite ao aperfeiçoamento das conclusões oferecidas.

É que mesmo que se perceba pelo seu articulado quais as questões que pretende ver submetidas à apreciação deste Tribunal (e que se identificam com os tópicos atrás elencados), dado o papel nuclear que aquelas assumem na definição do objecto do recurso, não queremos deixar aqui de recordar, que àquele cabe o ónus de as concretamente identificar e sintetizar.

III - 2.) Factos provados: No dia 20 de Fevereiro de 2007, o arguido B.........., a hora não concretamente apurada, deslocou-se para a localidade de .........., área da comarca de Vila Real, onde decorriam festividades referentes a uma concentração motard.

O arguido B.......... passou parte do dia na localidade de .........., tendo ao longo do tempo que aí permaneceu consumido algumas bebidas alcoólicas.

Já cerca das 19H00 horas, o arguido envolveu-se numa discussão acalorada com um morador de .........., por motivos que não foi possível apurar.

Face a tal discussão, alguns dos presentes no local, de entre os quais o aqui assistente C.........., intervieram no sentido de tal discussão cessar, separando-o do indivíduo com quem o arguido discutia e com o qual trocava já agressões físicas.

Cessada que foi a contenda, o assistente C.......... deslocou-se para junto do seu motociclo, de matrícula ..-..-JB, estacionado por si momentos antes, na berma da .........., na referida localidade de .......... .

Por sua vez, o aqui arguido deslocou-se para o seu veículo automóvel de matrícula UF-..-.., estacionado a poucos metros do motociclo do assistente, ao mesmo tempo que proferia a seguinte expressão, referindo-se a este último "para o ano já cá não estás".

O arguido ia, pois, animado de "vingança", já que não aceitou de forma positiva a interferência do assistente na contenda acima descrita, e de imediato decidiu utilizar para o efeito, o veículo automóvel de que dispunha para lhe tirar a vida.

Se bem o pensou, melhor o fez e, colocando a sua viatura em marcha, animando a mesma de velocidade que não foi possível apurar, fez com que esta embatesse no assistente C.........., no momento em que este se preparava para subir para o seu motociclo.

Face ao embate o C.......... caiu ao chão e foi arrastado conjuntamente com o seu motociclo a uma distância de cerca de 4 metros.

Por sua vez, o arguido completamente indiferente à situação na qual o C.......... se encontrava e ao alvoroço dos que correram de imediato para o local a fim de o socorrer, continuou com o seu veículo imobilizado, com a roda dianteira do mesmo embatida no capacete de protecção que o assistente tinha colocado, o que determinou que as pessoas que ali chegaram, tivessem de empurrar o veículo do arguido de forma a poderem soltar o corpo do assistente que estava preso por baixo da referida viatura, deslocando-o alguns metros para longe da vítima.

Entretanto D.........., amiga do assistente e que se encontrava no local, tendo um curso de socorrista dos Bombeiros, deslocou-se para junto dele e efectuou-lhe manobra de tracção cervical enquanto este se encontrava prostrado no solo.

Nesse período de tempo, o arguido permaneceu sempre dentro do seu veículo automóvel, fixando a vítima e D.........., que o socorria e que se encontravam a não mais de quatro metros deste veículo, sendo que foi então que alguns populares que ali se encontravam, e que não foi possível identificar, arremessaram pedras ao veículo do arguido, partindo vidros do mesmo, o que levou a que o arguido, receando que estes populares o pudessem agredir, reagiu colocando novamente a sua viatura em andamento e tentando ausentar-se do local, sem que no entanto deixasse de, mais uma vez, tentar atingir com a sua viatura o assistente, e também D.........., apenas não o tendo conseguido, face à rápida reacção desta última que puxou bruscamente o C.......... do local onde este se encontrava, fazendo com que o arguido falhasse o embate no assistente e na própria D.......... e seguindo a rota por si traçada e fosse bater com o veículo na esquina duma casa que ali se encontra.

Após o embate na referida residência, o arguido efectuou manobra de marcha-atrás e fugiu do local, apenas sendo localizado no dia seguinte, pela GNR de .........., na sua residência.

Em consequência directa e necessária da acção do arguido, a vítima C.......... sofreu as seguintes lesões, das quais ainda não se encontra totalmente curado: - Fractura-luxação tarso-metatársica do pé direito; - Contusão da mão direito, fractura da costela à direita e entorse cervical.

O arguido agiu com o firme propósito de tirar a vida ao assistente C.......... e a D.........., e ao utilizar um veículo automóvel da forma como o conduziu em direcção àqueles, visou atingir, de forma violenta, os seus corpos que sabia albergarem órgãos e funções vitais, e dessa forma produzir-lhes a morte, o que só não aconteceu por razões estranhas à sua vontade.

Agiu ainda o arguido com total insensibilidade pelo valor da vida humana, que sabia dever respeitar.

Quis castigar...

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