Acórdão nº 173/08 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Março de 2008

Data11 Março 2008
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 173/2008

Processo n.º 163/07

Plenário

Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro

(Conselheiro Benjamim Rodrigues)

Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional

I - RELATÓRIO

  1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, em que é recorrente o Ministério Público e recorrida A., S.A., foi interposto recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), da sentença proferida por aquele Tribunal, com fundamento na recusa da aplicação, por inconstitucionalidade, da norma constante do artigo 98.º, n.º 1, do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC).

  2. Dos autos emergem as seguintes ocorrências processuais, com relevância para a presente decisão:

    1. No Serviço de Finanças Loulé-1 foi instaurado contra A., S.A., um processo de contra-ordenação por falta de entrega do pagamento por conta, previsto no artigo 96.º, n.º 1, alínea a), do CIRC, sancionado nos termos dos artigos 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea f), e 26.º, n.º 4, do RGIT. [cfr. doc. fls. 5 dos autos.]

      b) Por despacho do Director da Direcção de Finanças de Faro, de 02.06.2006, foi aplicada à arguida a coima de € 30.000,00, com fundamento na violação do artigo 96.º, n.º 1, alínea a), do CIRC (falta de entrega de pagamento por conta). [cfr. doc. fls. 68/70.]

    2. Por despacho do Chefe de Finanças de Loulé, de 06.06.2006, foi determinado o seguinte:

      A fls. 5 vem A., S.A., devidamente identificada, apresentar defesa no presente processo de Contra-Ordenação n.º 1082200506007465, alegando em resumo que não há lugar ao pagamento por conta, uma vez que apresentou em 08 de Julho de 2003 a declaração de limitações aos pagamentos por conta prevista no artigo 96.º do C.I.R.C.

      Na verdade, dispõe o art. 99.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (C.I.R.C.), que se o contribuinte verificar, pelos elementos de que disponha, que o montante do pagamento por conta já efectuado é igual ou superior ao imposto que será devido com base na matéria colectável do exercício, pode deixar d e efectuar novo pagamento por conta…

      Isto significa que tendo enquadramento no artigo 96.º do C.I.R.C., o primeiro pagamento por conta é sempre devido, pelo que não tem qualquer eficácia a referida declaração apresentada.

      Nestes termos, foi aplicado pelo Sr. Director de Finanças de Faro, conforme parte final da alínea b) do art. 52.º do R.G.I.T., a coima no valor de € 30.000,00 (trinta mil Euros).

      Vigora o princípio da proibição da “reformatio in pejus”.

      Custas pela infractora, nos termos do Capítulo IX do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27/10, aplicável “ex vi” do art. 66.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (R.G.I.T.).

      Notifique-se para pagamento das importâncias devidas, ficando ciente que, se não for interposto recurso judicial ou efectuado o respectivo pagamento, no prazo de 20 (vinte) dias a contar da notificação, proceder-se-à à emissão da certidão de dívida.

      [cfr. doc. fls. 110 dos autos.]

    3. A A., S.A., intentou, ao abrigo do artigo 80.º do RGIT, recurso judicial da decisão de aplicação de coima, no qual conclui, nomeadamente, o seguinte:

      (…) A) Ao contrário do que considera a Administração Fiscal, a Recorrente não se encontrava obrigada a efectuar o primeiro pagamento por conta em sede de IRC relativo ao exercício de 2003 no valor reclamado;

      B) Porquanto a Recorrente apresentou, em tempo, a necessária declaração de limitação de pagamentos por conta;

      C) Não se verificando, assim, a prática de contra-ordenação prevista e punida nos termos do art. 114.º, n.ºs 2 e 5, alínea f) do RGIT, por violação ao disposto no artigo 96.º, n.º 1, alínea a) do Código do IRC, como lhe pretende imputar a Administração Fiscal (…)

      . [cfr. doc. fls. 97/104.]

    4. O recurso judicial foi julgado procedente e, em consequência, anulada a decisão recorrida, por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé de 09.10.2006.

  3. Essa sentença, ora recorrida, tem o seguinte teor, no que agora releva:

    (…) «1. Factos provados.

    O Director de Finanças de Faro aplicou uma coima à sociedade A., S.A., no valor de € 30.000,00, por ter considerado que ela não efectuou o primeiro pagamento especial por conta do IRC de 2003 (Julho de 2003), cujo prazo terminou em 31-07-2003.

    Foi ali considerado que essa conduta infringiu a norma do art. 98.º do CIRC e que era punível pelos arts. 114.º, n.º 2 e 5, alínea f) e 26.º, n.º 4, do RGIT.

    E foi essa a decisão que lhe foi notificada.

    (…)

    5. O mérito do recurso

    Salvaguardando o respeito devido pela opinião da Arguida, cremos que a Administração Fiscal interpretou adequadamente a lei ao considerar sempre exigível o primeiro pagamento especial por conta.

    Na verdade, o n.º 1 do art. 98.º do CIRC reza assim:

    “Sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 96º, os sujeitos passivos aí mencionados, excepto os abrangidos pelo regime simplificado previsto no artigo 53º, ficam sujeitos a um pagamento especial por conta, a efectuar durante o mês de Março ou, em duas prestações, durante os meses de Março e Outubro do ano a que respeita ou, no caso de adoptarem um período de tributação não coincidente com o ano civil, no 3º mês e no 10º mês do período de tributação respectivo.”

    Por sua vez, o n.º 1 do preceito legal que se lhe segue diz-nos o seguinte:

    “Se o contribuinte verificar, pelos elementos de que disponha, que o montante do pagamento por conta já efectuado é igual ou superior ao imposto que será devido com base na matéria colectável do exercício, pode deixar de efectuar novo pagamento por conta, mas deve remeter à direcção de finanças da área da sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável onde estiver centralizada a contabilidade uma declaração de limitação de pagamento por conta, de modelo oficial, devidamente assinada e datada, até ao termo do prazo para o respectivo pagamento.”

    Deste modo, se é verdade que os sujeitos passivos podem pedir a limitação dos pagamentos por conta conforme diz o n.º 1 do artigo 99.º do CIRC, também é seguro que, á luz do n.º 1 do art. 99.º do mesmo diploma legal, se terá que concluir que tal só é possível depois de se ter efectuado o primeiro pagamento por conta (foi esta também a opinião perfilhada por Vítor Monteiro, a qual pode ser vista em http://pwp.netcabo.pt/0163251501/PCePEC.htm).

    E porque assim é, não pode acolher-se a tese da Arguida/Recorrente.

    Pese embora isso, a decisão não pode manter-se, ainda que pelas razões que abaixo se vão alinhar.

    ***

    Dispõe o n.º 1 do art. 98.º do CIRC (Redacção do Decreto-Lei n.º 198/2001- 3 de Julho) que:

    “Sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 96.º, os sujeitos passivos aí mencionados, excepto os abrangidos pelo regime simplificado previsto no artigo 53.º, ficam sujeitos a um pagamento especial por conta, a efectuar durante o mês de Março ou, em duas prestações, durante os meses de Março e Outubro do ano a que respeita ou, no caso de adoptarem um período de tributação não coincidente com o ano civil, no 3.º mês e no 10.º mês do período de tributação respectivo.”

    E do art. 33.º da LGT consta a seguinte comando:

    “As entregas pecuniárias antecipadas que sejam efectuadas pêlos sujeitos passivos no período de formação do facto tributário constituem pagamento por conta do imposto devido a final.”

    Por seu turno, o art. 114.º do RGITT diz-nos o seguinte:

    “1. A não entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período superior, desde que os factos não constituam crime, ao credor tributário, da prestação tributária deduzida nos termos da lei é punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o seu dobro, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.

    2. Se a conduta prevista no número anterior for imputável a título de negligência, e ainda que o período da não entrega ultrapasse os 90 dias, será aplicável coima variável entre 10% e metade do imposto em falta, sem que possa ultrapassar o limite máximo abstractamente estabelecido.

    5. Para efeitos contra-ordenacionais são puníveis como falta de entrega da prestação tributária:

    (…)

    f) A falta de pagamento, total ou parcial, da prestação tributária devida a título de pagamento por conta do imposto devido a final, incluindo as situações de pagamento especial por conta.

    (…).”

    E a seu tempo o n.º 5 do art.º 27.º da Lei n.º 32-B/2002 de 30 de Dezembro estatui o que segue:

    “O incumprimento do disposto no artigo 98.º do Código do IRC é punido, nos termos da alínea f) do n.º 5 do artigo 114.º do Regime Geral das Infracções Tributárias, com coima variável entre 50% e o valor da prestação tributária em falta, no caso de negligência, e com coima variável entre o valor e o triplo da prestação tributária em falta, quando a infracção for cometida dolosamente.”

    Também é sabido que no, n.º 4 do art. 26.º do RGIT estabeleceu-se esta norma:

    “Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, os limites estabelecidos nos números anteriores, os limites mínimo e máximo das coimas previstas nos diferentes tipos legais de contra-ordenação, são elevados para o dobro sempre que sejam aplicadas a uma pessoa colectiva, sociedade, ainda que irregularmente constituída, ou outra entidade fiscalmente equiparada.”

    Sendo as coisas assim e uma vez que a Arguida deixou de entregar nos cofres do Estado o pagamento especial por conta a que a citada norma do art. 98.º, n.º 1, do CIRC refere, naturalmente que a conclusão a retirar dessa situação seria a que a Administração Fiscal retirou, a saber, o cometimento negligente da contra-ordenação prevista e punível pelos demais normativos atrás referidos.

    Acontece, porém, que o n.º 2 do art.º 104.º da Constituição da República Portuguesa reza assim: “A tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real.

    E ainda relevante se mostra o que, ao tempo, dispunha o n.º 2 do art.º 98.º do CIRC (na...

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