Acórdão nº 88/05.8TAACN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Abril de 2008

Data23 Abril 2008
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. RELATÓRIO. Findo o inquérito no âmbito do processo nº 88/05.8TAACN, dos serviços do Ministério Público junto do Tribunal Judicial da comarca de Alcanena, em que foi constituído arguido AA. …, pelo Digno Magistrado do Ministério Público foi proferido despacho de arquivamento relativamente aos factos participados pelas assistentes MM. … e NN. … .

    Pelas assistentes, em requerimento subscrito apenas pelo Exmo. Mandatário da MM. …, foi requerida a abertura da instrução, nos seguintes termos (transcrição): “ (…).

    I O Ministério Público fundamentou o arquivamento no facto de não resultarem dos autos prova suficiente de que os arguidos praticaram o crime denunciado.

    II Baseia tal conclusão no facto de não existir um elemento concreto da localização do outdoor em causa.

    III Porém, tal resulta do depoimento da testemunha JJ. …e em particular do levantamento topográfico de que se junta cópia e que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos (Doc. nº l).

    IV Além disso, tal situação de conflito resultou do facto de os arguidos não quiseram reconhecer a situação quando sabiam perfeitamente que estava a invadir a propriedade da Assistente e aqui requerente MM. …. Deste modo, V Não foi por ignorância que os arguidos facturaram e continuaram a facturar à Assistente NN. …verbas em contrapartida da utilização do outdoor, que ocupa a extensão de 5 metros e oitenta e nove centímetros, dos quais 5,45 metros são na propriedade da Assistente MM. ….

    VI Na verdade o arguido sabia perfeitamente que o mesmo se encontrava em propriedade alheia, com excepção de 54 centímetros, como resulta claro do levantamento.

    VII Houve sempre discussão sobre essa matéria, o que levou a aqui Assistente MM. …a fazer o referido levantamento topográfico, mas os arguidos nunca quiseram saber de tal situação no óbvio intuito de extorquir as correspondentes quantias à Assistente NN. ….

    VIII Nessas facturas, juntas ao processo, os arguidos sempre afirmaram que o referido painel estava instalado na sua propriedade, sabendo sempre que tal declaração era falsa no referido intuito astucioso de continuar a receber as mensalidades correspondentes.

    IX Ora, não sofre dúvidas que o arguido tinha intenção de enganar a Assistente NN. … pois astuciosamente refere expressamente nas facturas que o painel estava em propriedade sua, pois caso contrário a assistente NN. … nunca tinha pago nenhuma quantia (Doc. nº 2).

    X Não pode prevalecer o depoimento do arguido gerente de que não foi ele próprio que contactou as Assistentes mas sim um representante seu, pois foi ele próprio que redigiu uma carta à Assistente NN. …a solicitar o pagamento das facturas em atraso, que esta deixou de pagar ao ter conhecimento que o outdoor se encontrava em terreno alheio (Doc. nº 3).

    XI Note-se que o próprio acaba por confessar que o terreno que ele diz ser seu já desde há muito deixou de ser propriedade sua, tendo-o devolvido às finanças de Alcanena.

    Pelo exposto, requerem a V.Exa., declarando-se aberta a Instrução, se proceda a: … (…)”.

    * Sobre este requerimento incidiu o seguinte despacho (transcrição): “ (…).

    O Tribunal é o competente.

    Dispõe o art. 287.º, n.º 3 do Código de Processo Penal que o requerimento de abertura de instrução só pode ser rejeitado por extemporâneo, por incompetência do juiz ou por inadmissibilidade legal da instrução, esclarecendo o seu n.º 2 que o mesmo não está sujeito a formalidades especiais, mas deve conter, em súmula, as razões, de facto e de direito, de discordância relativamente à acusação ou à não acusação, bem como, sempre que disso for caso, a indicação dos actos de instrução que o requerente desejaria que o juiz levasse a cabo, dos meios de prova que não tenham sido considerados no inquérito e dos factos que, através de uns e de outros, se espera provar, sendo ainda aplicável ao requerimento do assistente o disposto no artigo 283.º n.º 3, alíneas b) e c) (…).

    Nos presentes autos, pelo Ministério Público foi proferido o despacho de arquivamento constante de fls. 111 e seguintes, consubstanciando a sua comprovação por via judicial, precisamente, o escopo da fase instrutória; in casu, e perante a solução entretanto preconizada nos autos, pretenderão as assistentes que, a final, seja proferido despacho de pronúncia dos arguidos.

    Sucede que, sendo a instrução requerida por assistente, a par dos requisitos insertos no n.º 2 do art. 287.º do Código de Processo Penal, supra transcrito, o requerimento tendente à sua abertura deve conter os requisitos de uma acusação, os quais se evidenciam necessários à própria realização da instrução, particularmente no tocante ao funcionamento do contraditório e à elaboração da decisão instrutória.

    Na verdade, e ainda antes da última alteração legislativa do Código de Processo Penal, argumentava Souto Moura que "se o assistente requerer a abertura de instrução sem a mínima delimitação do campo factual sobre que há-de versar, a instrução será inexequível, ficando o juiz sem saber que factos é que o assistente gostaria de ver provados" (Souto Moura, in "Jornadas de Processo Penal", CEJ, 120 e seguintes).

    Ora, o requerimento de abertura de instrução em causa, ainda que aponte algumas concretas razões de facto e de direito para a discordância relativa à não acusação, detém-se sobretudo em conclusões de facto e em conceitos de direito, não precisando com os contornos que reputamos indispensáveis a matéria objecto de instrução. É que a sindicância da decisão de arquivamento está intrinsecamente ligada aos meios de prova colhidos no inquérito e por via dos quais se chegou à decisão que o encerrou, não servindo a fase ora em discussão para que o Juiz se substitua ao Magistrado do Ministério Público, por meio de transformação da instrução em nova investigação. Em crise encontra-se, tão só, o quanto é preceituado pelo n.º 1 do art. 286.º do Código de Processo Penal, o mesmo é dizer, a comprovação judicial da decisão de deduzir acusação ou de arquivar o inquérito em ordem a submeter ou não a causa a julgamento.

    Termos em que, por ter como irregular o presente requerimento destinado à abertura de instrução, determino a notificação das assistentes para, querendo, procederem ao seu aperfeiçoamento, mormente completando-o com os elementos omitidos e formulando uma concreta e delimitada acusação, quanto aos factos possíveis de sindicância nesta fase, e que constituam ou possam constituir objecto da instrução, porque passíveis de sanção penal.

    Prazo: 10 dias.

    (…)”.

    Foi apresentado novo requerimento para abertura da instrução, em nome de ambas as assistentes mas, novamente, apenas subscrito pelo Exmo. Mandatário da MM. …, com o seguinte teor (transcrição): “ (…).

    I O Ministério Público fundamentou o arquivamento no facto de não resultarem dos autos prova suficiente de que os arguidos praticaram o crime denunciado.

    II Baseia tal conclusão no facto de não existir um elemento concreto da localização do outdoor em causa.

    III Porém, tal resulta do depoimento da testemunha JJ. …e em particular do levantamento topográfico de que se junta cópia e que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos (Doc. nº 1).

    IV Além disso, tal situação de conflito resultou do facto de os arguidos não quiseram reconhecer a situação quando sabiam perfeitamente que estava a invadir a propriedade da Assistente e aqui requerente MM. …. Deste modo, V Não foi por ignorância que os arguidos facturaram e continuaram a facturar à Assistente NN. …verbas em contrapartida da utilização do outdoor, que ocupa a extensão de 5 metros e oitenta e nove centímetros, dos quais 5,45 metros são na propriedade da Assistente MM. ….

    VI Na verdade o arguido sabia perfeitamente que o mesmo se encontrava em propriedade alheia, com excepção de 54 centímetros, como resulta claro do levantamento.

    VII Houve sempre discussão sobre essa matéria, o que levou a aqui Assistente MM. … a fazer o referido levantamento topográfico, mas os arguidos nunca quiseram saber de tal situação no óbvio intuito de extorquir as correspondentes quantias à Assistente NN. ….

    VIII Nessas facturas, juntas ao processo, os arguidos sempre afirmaram que o referido painel estava instalado na sua propriedade, sabendo sempre que tal declaração era falsa no referido intuito astucioso de continuar a receber as mensalidades correspondentes.

    IX Ora, não sofre dúvidas que o arguido tinha intenção de enganar a Assistente NN. …pois astuciosamente refere expressamente nas facturas que o painel estava em propriedade sua, pois caso contrário a assistente NN. …nunca tinha pago nenhuma quantia. (Doc. nº 2) X Não pode prevalecer o depoimento do arguido...

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