Acórdão nº 058/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelJOÃO BELCHIOR
Data da Resolução10 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (STA): I. Relatório: I.1.

O Presidente do Conselho de Administração da Caixa Geral de Aposentações (AR), recorre por oposição de julgados do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), de 27 de Maio de 2005, que concedeu provimento ao recurso jurisdicional que para ali interpôs da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo do Porto (TAC), que assim foi revogada, a qual havia negado provimento ao recurso contencioso ali instaurado por A...

, com os restantes sinais dos autos, indicando como acórdão-fundamento o Acórdão do TCAS de 15 de Janeiro de 2004, proferido no Rec. 11361/02.

Admitido o recurso (cf. fls. 174) a AR produziu alegações tendentes a demonstrar a invocada oposição (cf. fls. 182-185).

Tendo porém o aqui recorrido vindo aos autos informar que o acórdão indicado como fundamento ainda não transitara em julgado (cf. fls. 178), a Exmª Relatora ordenou que os autos aguardassem o trânsito daquele acórdão( cf. fls. 186).

Remetidos os autos a este STA a Digna Procuradora da República, no seu parecer de fls. 223-224, emitiu parecer no sentido de que este Pleno não devia conhecer do recurso em virtude de o acórdão indicado como fundamento ainda não ter transitado em julgado à data da interposição de recurso.

Por acórdão proferido nos autos a 18 de Setembro de 2007 (cf. fls. 236-242), depois de desatender o aludido fundamento relacionado com o (não) trânsito do acórdão-fundamento foi decidido julgar verificada a invocada oposição de julgados e ordenar o prosseguimento do recurso (cf. nº 2 do artº 767º do CPC, anterior redacção).

As partes vieram alegar ao abrigo daquele nº 2 do artº 767.

Na sua alegação a AR., em abono da sua posição invoca a doutrina vertida no Acórdão deste Pleno de 29 de Novembro de 2006 (rec. 294/06), segundo a qual, em síntese, a disposição constante do art.º 44.º, n.º 3, do actual EMFA/99 é inovadora e, por isso, inaplicável ao Recorrente contencioso.

Por seu lado o recorrente contencioso, ora recorrido, começa por afirmar que, ao abrigo do disposto no nº 3 do artº 766º do CPC, anterior redacção, deve rever-se a decisão que reconheceu a oposição e ordenou o prosseguimento dos autos.

Em seu fundamento sustenta em síntese: - o acórdão-fundamento deve mostrar-se transitado na data da interposição de recurso, sendo nesse sentido o nº 4 do artº 763º do CPC, sem o que a instância recursiva pode ficar suspensa sine die; - mostra-se padecer de inconstitucionalidade o entendimento vertido no acórdão interlocutório que reconheceu a oposição e ordenou o prosseguimento do recurso.

Afirma, em síntese, que um tal entendimento (segundo o qual a data relevante para o trânsito do acórdão-fundamento deve ser a da decisão e não a da interposição de recurso) viola o princípio da tutela jurisdicional efectiva a que se refere o artº 20º da CRP no ponto em que o mesmo implica, "o direito de obter em prazo razoável e mediante processo equitativo, uma decisão judicial", sem o que se dará "guarida à admissibilidade da suspensão da instância recursiva até à ocorrência do trânsito em julgado do acórdão invocado como fundamento do recurso".

Por outro lado um tal entendimento também viola o princípio da igualdade, na medida em que, e em síntese, se o que subjaz ao regime previsto nos artºs 763º, nº 4, e nos nºs 2 dos artºs 765º e 766º do CPC, concretamente a exigência de trânsito em julgado do acórdão-fundamento, é a de assegurar uma igualdade de tratamento de situações iguais, "essa desigualdade de tratamento só se coloca perante uma decisão anterior definitiva e que tal como os restantes requisitos tem de estar presente aquando da interposição do recurso".

No que tange ao mérito do recurso, o mesmo recorrente contencioso sustentou que deve firmar-se a doutrina defendida no acórdão recorrido.

O Digno Procurador-Geral Adjunto, no seu parecer de fls. 263, adere à posição vertida no acórdão interlocutório no que tange ao sentido conferido à norma do nº 2 do artº 766º do CPC, e que se mostra infundada a arguição de inconstitucionalidade que lhe é assacada.

No que respeita ao mérito do recurso louva-se em vasta jurisprudência deste STA, que cita, para concluir pela sua procedência e consequente revogação do acórdão recorrido.

Foram colhidos os vistos da lei.

II.FUNDAMENTAÇÃO.

II.1.

Impõe-se prioritariamente conhecer dos pressupostos da alegada oposição, começando pela questão suscitada quanto ao momento do trânsito em julgado do acórdão-fundamento, pois que a proceder a inverificação do respectivo pressuposto levará a que não se conheça da oposição e se declare findo o recurso.

Na verdade, como decorre do nº3 do artº 766º do CPC, pese embora o acórdão interlocutório já haja conhecido dos pressupostos da alegada oposição, e, bem assim, da aludida invocação, tal não obsta a que o Pleno reaprecie os pressupostos da alegada oposição e decida em sentido contrário.

Adiante-se desde já que a aludida questão não deve proceder, de harmonia aliás com doutrina já afirmada, pelo menos, nos Acds. deste Pleno de 11 de Dezembro de 2007 (Rec. 197/07) e de 31 de Janeiro do ano em curso (Rec. nº 01235/06), com a qual se concorda e relativamente à qual nada é afirmado que leve a revê-la.

Dispõe o art.º 24.º do ETAF que compete ao pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo conhecer: "a)... b) Dos recursos dos acórdãos da Secção que, relativamente ao mesmo fundamento de direito e na ausência de alteração substancial da regulamentação jurídica, perfilhem solução oposta à de acórdão de diferente Secção ou do respectivo pleno; b') Dos recursos de acórdãos da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo proferidos em último grau de jurisdição que, na hipótese prevista na alínea anterior, perfilhem solução oposta à de acórdão da mesma Secção ou da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, ou do respectivo pleno; c)...; d) ...".

Entende-se que os pressupostos da interposição deste recurso são em tudo similares aos referidos no art.º 763.º do CPC, sendo que apesar da revogação dos arts. 763.º a 770.º deste corpo normativo no âmbito do processo civil, ditada pelos arts. 3º e 17º, nº 1, do Dec-Lei nº 329-A/95, de 12.12, continuam os mesmos aplicáveis, com as necessárias adaptações, na tramitação do recurso por oposição de julgados, como a jurisprudência deste STA, ao nível do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, vem reiteradamente afirmando, pelo menos, desde o Acórdão de 27.05.96 (Rec.36829).

Ora, à relevância da referida questão opõe-se o disposto no nº 2 do artº 766º do CPC no ponto em que prescreve: "Tendo o recorrido alegado que o acórdão anterior não transitou, a secção verificará qual é a situação na data em que vai decidir sobre a oposição, e abster-se-á de conhecer desta, ficando sem efeito o recurso, quando reconheça que o acórdão não passou em julgado.

(...)".

Deduz-se de tal normativo, a contrario sensu, que, se na data em que vai decidir-se sobre a oposição, o acórdão-fundamento houver transitado, não será pelo motivo alegado pelo recorrido (não trânsito do acórdão) que deixará de conhecer-se do recurso.

É, justamente, o caso dos autos: na presente data (como também quando foi proferido o acórdão interlocutório) já se verificou o trânsito do acórdão invocado como fundamento.

Assim, pese embora tal acórdão ainda não tivesse transitado em julgado aquando da interposição do presente recurso, tendo porém os autos sido remetidos a este STA quando se verificara já a sua consolidação na ordem jurídica, o disposto no nº 2 do artº 766º do CPC não obsta ao conhecimento do recurso, devendo assim o nº 4 do artº 763º articular-se com aquele normativo.

Em tal sentido, pode ver-se o Prof. Alberto dos Reis (in Código de Processo Civil Anotado-Vol. VI., reimpressão 1985, a p.284), e na jurisprudência mais recente do STA, cf., pelo menos, os acds. deste PLENO de 29-05-2007 (Rec. nº 01235/06) e de 18-09-2007 (Rec. nº 58/07).

II.2.

Mas será que um tal entendimento do nº 2 do artº 766º do CPC se mostra inquinado de inconstitucionalidade por afronta aos princípios da tutela jurisdicional efectiva e da igualdade como propugna o recorrente? Como os tribunais, "nos feitos submetidos a julgamento não podem aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados" (artigo 204.º), há que conhecer da referida invocação de inconstitucionalidade.

Como acima se disse, o disposto no nº 2 do artº 766º pretende obviar a que, se na data em que vai decidir-se sobre a oposição, o acórdão-fundamento houver já transitado, não será pelo motivo de tal ainda se não haver verificado aquando da interposição do recurso que deixará de conhecer-se do mesmo.

Uma tal norma, no entanto, não restringe o acesso ao direito e aos tribunais.

O n.º 1 do art. 20.º da C.R.P., sob a epígrafe "Acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva", estabelece que "a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos".

Com tal norma é consagrado o direito de os cidadãos verem apreciadas por...

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