Acórdão nº 0874/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MADUREIRA
Data da Resolução26 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO 1. 1.

A Associação Sindical do Juízes Portugueses (ASJP), em representação do seu associado A……… (ASJP), devidamente identificada nos autos, intentou a presente acção administrativa especial contra o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF), na qual formulou os seguintes pedidos: a) ser anulada a douta deliberação do CSTAF de 19 de Julho de 2011, pela qual foi indeferido o requerimento do seu identificado associado de ascender à categoria de juiz de círculo; b) ser declarado que o Associado da A. aqui representado tem direito a auferir o seu vencimento de acordo com o índice 220 desde a data do início da sua inspecção – 16 de Março de 2010; c) ser o R. condenado a pagar as diferenças remuneratórias entre o índice 135 pelo qual vence actualmente o Associado da A. e o índice 220 desde aquela data; d) ser o R. condenado a pagar juros à taxa legal incidentes sobre as diferenças remuneratórias supra referidas, vencidas e vincendas até integral pagamento.

O CSTAF contestou por excepção, defendendo a caducidade do direito de acção, e por impugnação, defendendo a inexistência do direito peticionado e a consequente improcedência da acção.

Foi elaborado despacho saneador, no qual a referida excepção foi julgada improcedente, tendo o processo prosseguido para alegações, que ambas as partes apresentaram.

  1. 2.

    Nessas alegações, a Autora (ASJP) formulou as seguintes conclusões:

    1. A douta deliberação impugnada incorre em vício de violação de lei, e por isso é anulável nos termos do artigo 135.º do CPA, porque desconforme com o disposto no artigo 3.º, n.ºs 10 e 11, da Lei n.º 1/2008, de 14 de Janeiro, na medida em que este n.º 10 equipara para efeitos remuneratórios o tempo de serviço prestado nos tribunais judiciais a tempo de serviço prestado nos tribunais administrativos e tributários, consagrando um verdadeiro princípio geral de aproveitamento do tempo de serviço prestado nos tribunais judiciais, pelos candidatos ao concurso a que se refere a Lei n.º 1/2008, de 14 de Janeiro.

    2. Princípio este que apenas é afastado nas excepções taxativamente plasmadas n.º 11 daquele artigo 3.º, nas quais não se inclui a situação do artigo 58.º, n.º 5, do ETAF, que é a do Associado da A., embora se inclua o artigo 69.º, n.º 1, do ETAF, cuja expressão “cinco anos de serviço nesses tribunais” é também utilizada.

    3. O âmbito da alínea a) do n.º 11 do artigo 3.º da Lei n.º 1/2008, de 14 de Janeiro, é claramente outro, diferente da exclusão da equiparação consagrada no n.º anterior (o n.º 10), relativamente ao artigo 58.º, n 5, do ETAF, na medida em que se pretende afastar a equiparação do tempo de serviço prestado nos tribunais judiciais, a tempo de serviço prestado nos tribunais administrativos e tributários, consagrada no n.º 10, para efeitos das listas de antiguidade dos juízes de cada quadro dos tribunais administrativos e fiscais, elaboradas nos termos do artigo 76.º do EMJ, aplicável por remissão do artigo 57.º do ETAF.

    4. Se a redacção do artigo 58.º, n.º 5 do ETAF tivesse o objectivo de não aproveitar o tempo de serviço prestado nos tribunais judiciais, consagrado no n.º 10 do artigo 3.º da Lei n.º 1/2008, de 14 de Janeiro, de igual modo a redacção do artigo 69.º, n.º 1 do ETAF precludiria esse mesmo aproveitamento, pelo que seria desnecessária a alínea b) do n.º 11 do artigo 3.º da Lei n.º 1/2008, de 14 de Janeiro.

    5. O artigo 3.º, n.º 10, desta Lei constitui lei nova e especial relativamente àquele artigo 58.º, n.º 5, do ETAF, pelo que derroga este preceito quando aplicável.

    6. As alíneas a) e b) do n.º 11 do artigo 3.º apenas tiveram o intuito de salvaguardar as situações respeitantes à lista de antiguidade para efeitos de concurso para os Tribunais Centrais e respeitantes aos concursos para movimentos de magistrados na primeira instância, respectivamente.

    7. O interesse funcional aponta, em nosso entendimento, no sentido da interpretação ora defendida, já que esta incentivará os magistrados admitidos no âmbito do concurso especial sub judice a dar o seu melhor no sentido de, o mais rapidamente possível, terem uma prestação funcional que justifique a atribuição da classificação de mérito necessária à progressão remuneratória, com a consequente melhoria do serviço prestado.

    8. A interpretação feita pela douta deliberação impugnada do n.º 5 do artigo 58.º do ETAF e dos n.ºs 10 e 11 do artigo 3.º da Lei n.º 1/2008, de 14 de Janeiro, é violadora do princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado no artigo 13.º da CRP, na medida em que não existe qualquer diferenciação ou maior grau de complexidade nas funções que exercem os juízes dos Tribunais Administrativos e Fiscais sejam ou não juízes de círculo, não justificando o tipo de tribunal onde a antiguidade foi adquirida a desigualdade de tratamento defendida pela interpretação propugnada pela douta deliberação impugnada.

    9. Desigualdade acentuada pelo facto de os destinatários normais do artigo 58.º, n.º 3, do ETAF, verem o seu tempo de estágio computado para a contagem do tempo de serviço aí previsto, na medida em que os magistrados admitidos ao abrigo do curso previsto na Lei n.º 1/2008, de 14 de Janeiro, não tiveram qualquer período de estágio.

    10. A interpretação sufragada pela douta deliberação do CSTAF ora em análise, é, em nosso entendimento, violadora do princípio de que para trabalho igual salário igual, consagrado no artigo 59.º, n.º 1, al. a) da CRP, princípio este, também ele, expressão do princípio da igualdade, na medida em que, no caso em apreço, as funções desempenhadas são iguais, as habilitações exigidas são idênticas, a antiguidade é a mesma, não existindo qualquer critério objectivo de diferenciação de remunerações que não seja o tipo de tribunal onde aquela antiguidade foi adquirida.

  2. 3.

    O Réu (CSTAF), por sua vez, formulou as seguintes conclusões:

    1. Com a Lei n.º 2/2008, de 14 de Janeiro, que aprovou o regime de ingresso nas magistraturas e de formação de magistrados (cfr. artigo 6.º), foi estabelecido um regime comum de recrutamento, por concurso público, para os tribunais judiciais e para os tribunais administrativos e fiscais.

    2. Daí decorre que os novos juízes ocuparão o seu lugar como juízes de primeiro acesso.

    3. Ascendendo à “categoria” de juiz de círculo após cinco anos de serviço nesses tribunais (administrativos ou tributários) com a classificação de Bom com Distinção, conforme n.º 5 do artigo 58.° do ETAF (revisto pela Lei n.º 1/2008).

    4. Já os juízes dos tribunais comuns só ascendem à categoria de juiz de círculo (hoje juiz de instância especializada) após dez anos de serviço, classificação de Bom com distinção e colocação em instâncias especializadas (artigo 45.º do EMJ).

    5. Ou seja, são dois os requisitos: o tempo de serviço - 5 anos de serviço na jurisdição administrativa e fiscal - e uma classificação de mérito, “Bom com distinção”.

    6. A exigência de um período de tempo, no caso 5 anos, de exercício de actividade como magistrado traduz uma preocupação com a formação de experiência, relevante para a evolução na carreira.

    7. Experiência essa que terá de ser na área administrativa e fiscal e não na jurisdição comum, tal a especialização que pauta aquela jurisdição.

    8. O artigo 58.º, n.º 5, do ETAF é a norma criada pelo legislador para definir as condições de acesso a esse estatuto de juiz de círculo, e nenhuma outra existe para o efeito.

    9. E aí se refere “nesses tribunais”, ou seja, os tribunais administrativos e os tribunais tributários referidos no início desse mesmo preceito.

    10. A norma directamente vocacionada para determinar as condições de acesso a juiz de círculo não prevê excepções.

    11. Basta atentar no uso de diferentes terminologias numa norma (n.º 10 do artigo 3.° da Lei n.° 1/2008) e noutra (n.° 5 do artigo 58.° do ETAF) para concluir que se referem a situações distintas.

    12. Se fosse intenção do legislador da Lei n.° 1/2008 criar uma excepção ao regime de ascensão a juiz de círculo também ali ponderado, socorrer-se-ia da mesma formulação patente no n.° 5 do artigo 58°, ou seja, falaria da “ascensão a Juiz de círculo” e não de “efeitos remuneratórios”.

    13. A expressão “efeitos remuneratórios’, consignada no n.° 10 do artigo 3.° da citada Lei n.° 1/2008, significa tão só que o tempo de serviço nos tribunais judiciais releva para esse efeito.

    14. Ou seja, o facto de ingressarem nos tribunais administrativos e tributários não os prejudica em termos remuneratórios.

    15. Um magistrado recrutado para os Tribunais Administrativos e Fiscais ao abrigo da Lei n.° 1/2008, com 3 anos de tempo de serviço nos tribunais judiciais, decorridos 4 anos de serviço nos Tribunais Administrativos e Fiscais, não poderá invocar o direito a ascender a juiz de círculo, visto ainda não ter perfeito os 5 anos de serviço nesta jurisdição, mas certo é que, no total, relevando o tempo de serviço nos tribunais judiciais, já perfez 7 anos de serviço.

    16. A contagem do tempo de serviço nos tribunais judiciais permite uma progressão no escalão salarial, ou seja, auferir o seu vencimento pelo índice 155, correspondente aos 7 anos de serviço - e já não apenas o correspondente a 3 anos de serviço, escalão anterior, índice 135, conforme tabelas legalmente fixadas e descritas.

    17. Existe uma evolução da remuneração de acordo com índices legalmente estabelecidos que se sucedem em função do preenchimento de módulos de tempo.

    18. Este é o sentido útil da ressalva dos efeitos remuneratórios prevista no n.° 10 do artigo 3.° da Lei n.° 1/2008, ou seja, assegurar a contabilização do tempo de serviço nos tribunais judiciais pata a progressão no escalão salarial.

    19. E não o direito a contabilizar esse tempo para efeito de ascender a juiz de círculo.

    20. Assim, não se afirmando a norma contida no n.° 10 do artigo 3.° como claramente destinada a prever um regime próprio face ao previsto no n.° 5 do artigo 58.° do ETAF - e podendo e devendo o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT