Acórdão nº 193/12 de Tribunal Constitucional (Port, 18 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelCons. Pamplona Oliveira
Data da Resolução18 de Abril de 2012
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 193/2012

Processo n.º 120/12

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. A. recorreu para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de novembro (LTC), do acórdão proferido na Relação de Coimbra em 28 de setembro de 2011, nos seguintes termos:

    A., arguido nos autos supra referenciados e nos mesmos melhor identificado, tendo sido notificado do douto despacho proferido, no sentido da improcedência da nulidade e inconstitucionalidade invocadas, relativamente à interpretação do art. 428º do Código de Processo Penal (doravante CP brevitatis causa), vem, nos termos e para os efeitos dos arts. 280.º nº. 1 b) da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP brevitatis causa), 70º nº.1 b) e nº.2, 75º e 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional bem como da alínea i) do nº.1 do art. 61º do Código de Processo Penal (doravante CPP brevitatis causa), apresentar recurso de constitucionalidade nos termos e com os seguintes

    Fundamentos:

    Dando cumprimento ao plasmado nos nºs 1 e 2 do art. 75º-A da LTC, refere-se que o presente recurso versa sobre uma questão concreta e objetiva: inconstitucionalidade da interpretação das normas legais em causa (arts. 410º e 428º CPP) tendente aos poderes, e sua natureza, de cognição do Venerando Tribunal de recurso.

    Tal questão foi, em termos que reputamos por, valida e expressamente suscitada no requerimento de invocação de nulidade apresentado no dia 14 de outubro de 2011, [maxime 90 parágrafo de fls. 2, 8º de fls. 4, 2a conclusão a fls. 5 e introito de recurso de constitucionalidade nessa data apresentada e doutamente admitido)].

    Como fundamento do recurso aponta-se o entendimento sufragado no douto acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, inicialmente em resultado da omissão de pronúncia, e depois no douto despacho ora em causa, já de forma expressa, proferidos nos presentes autos e relativamente à cognição do recurso a justificar desconsideração, ausência de problematização ou discussão do depoimento do I) único terceiro imparcial II) que se mostrava presente no local, III) havia sido arrolado como testemunha pelo Ministério Público na acusação bem como pelo assistente ao nível do pedido de indemnização cível, IV) mantinha relação de amizade e profissional com o assistente e V) acabou por ser a melhor e única testemunha de defesa...

    Tem-se assim por inconstitucional, em violação do art. 32º nº. 1 CRP, o entendimento segundo o qual o conhecimento do recurso se basta com as questões essenciais na ótica do Tribunal ad quem, sem que se mostre justificada qual a razão da desconsideração das passagens indicadas em sede de recurso e que, modestamente, teriam a virtualidade decisiva e gritante de alteração a decisão final, seja ela de condenação vs absolvição ou simples alteração da medida da pena.

    Ora, tal desconsideração e cindibilidade da prova produzida tem-se por ilícita e inconstitucional, devendo a mesma ser aferida tendo por base a sua imagem globalmente considerada e a unicidade do recurso, não se mostrando legítima a interpretação do n.º 1 do art. 32º CRP que permita a cisão e desconsideração recursórias tal como se os poderes de cognição vertidos no art. 428º CPP e fundamentos de recurso vertidos no art. 410.º do mesmo diploma legal, não constituíssem um poder-dever e possam ser letra morta.

    Mais se alega que a interpretação da garantia de um segundo grau de recurso em matéria de facto se mostraria com “pés de barro” atenta a cindibilidade, ausência de análise integral do recurso bem como fundamentação, e omissão de pronúncia operadas, sendo tal circunstância geradora de inconstitucionalidade por violação do n.º 1 do art. 32º CRP que consagra o direito a um recurso pleno e não sectável obrigando assim o Tribunal ad quem, a pronunciar-se sobre todas as questões suscitadas ou a, pelo menos, fundamentar (nos termos do arts. 374.º nº.2, 379.º n.º 1 a), aplicáveis por força do nº. 4 do art. 425º, todos do CPP e exigência vertida no art. 205º CRP) tal exclusão ou omissão de pronúncia.

    Como tem por cumprido o dever de cognição quando inexiste tomada de posição expressa e concreta sobre a matéria de facto em concreto (nomeadamente o ponto inerente a uma alegada exaltação colérica) bem como a consideração de tal facto por provado ou não provado, quando é decisivamente relevante para a boa decisão da causa?!

    Tais decisões não se pronunciaram pela inconstitucionalidade e continuaram a aplicar tal norma de forma literal, em violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade e interpretação das leis, em nome de obediência pensante, sendo violadoras, desde logo, dos arts. 8º n.º 1 e 9º CC e 13º, 18º, 26º, 32º nº1, 202º nº2, 203º a 205º da CRP, para além de diversas normas legais consagradas de tais direitos e princípios, sejam nacionais ou com consagração e assento em diversos textos de Direito internacional.

    E tal questão afigura-se, não só relevante como essencial para a boa decisão da causa principal, uma vez que em causa estão direitos, liberdades e garantias do recorrente, constitucionalmente tutelados, e sempre, em último caso, pelo menos, se não a condenação, a medida da pena será atenuada em razão da inexistência do quadro fáctico (a cólera e ira!) que presidiu à determinação da mesma.

    Razão pela qual, nos termos do art. 78º LTC, deverá o mesmo ter efeito suspensivo e subir nos próprios autos, sendo certo que em sede de alegações se corporizará os fundamentos do presente recurso e razões subjacentes à sua bondade e mérito.

    Destarte,

    Requer-se, mui respeitosamente a V. Exas., a procedência do presente requerimento com a verificação da apontada nulidade,

    Caso assim não entendam V/ Exas., mui respeitosamente e sempre com o V/ mui douto suprimento, se interpõe para o Tribunal Constitucional o competente recurso de decisão negativa de inconstitucionalidade, o qual deverá ser admitido, com todas as demais consequências legais.

    Assim decidindo, farão V/ Exas., como sempre, a costumada,

    Justiça

  2. Admitido o recurso na Relação de Coimbra, foi depois proferida a Decisão Sumária n.º 128/2012 que decidiu não conhecer do seu objeto. A decisão apresenta os seguintes fundamentos:

    [...] Os preceitos legais de onde o recorrente pretende extrair as normas impugnadas apresentam a seguinte redação:

    Artigo 410.º

    Fundamentos do recurso

    1 - Sempre que a lei não restringir a cognição do tribunal ou os respetivos poderes, o recurso pode ter como fundamento quaisquer questões de que pudesse

    conhecer a decisão recorrida.

    2 - Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:

    a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;

    b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;

    c) Erro notório na apreciação da prova.

    3 - O recurso pode ainda ter como fundamento, mesmo que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, a inobservância de requisito

    cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada.

    Artigo 428.º

    Poderes de cognição

    As relações conhecem de facto e de direito.

    Sustenta o recorrente que o tribunal recorrido retirou destes normativos um sentido, que «tem por inconstitucional», por violação do artigo 32º n.º 1 da Constituição, «segundo o qual o conhecimento do recurso se basta com as questões essenciais na ótica do Tribunal ad quem, sem que se mostre justificada qual a razão da desconsideração das passagens indicadas em sede de recurso e que, modestamente, teriam a virtualidade decisiva e gritante de alteração a decisão final, seja ela de condenação vs absolvição ou simples alteração da medida da pena.»

    É esta, em suma, a questão que afirma pretender ver decidida no presente recurso.

    Todavia, o Tribunal não pode conhecer do recurso, e por várias razões.

    Em primeiro lugar, o recorrente não suscitou a questão adequadamente, isto é, não colocou a questão ao tribunal de recurso antes de o tribunal ter proferido o acórdão recorrido, sendo certo que depois de proferida a decisão, os tribunais não podem conhecer de questões novas.

    Em segundo lugar, a questão colocada não reveste natureza normativa, pois resulta de uma pretensa subsunção concreta de normas, típica de uma decisão de natureza jurisdicional.

    Finalmente, afigura-se bastante claro que o tribunal recorrido não adotou, sequer, o entendimento aqui questionado, pois não afirmou, em parte alguma, que o conhecimento do recurso se basta com as questões essenciais, sem justificar a razão da desconsideração das passagens indicadas em sede de recurso, «que teriam a virtualidade decisiva e gritante de alteração a decisão final».[...]»

    3. Contra esta decisão reclama o arguido recorrente, nos seguintes termos:

    "A., arguido/recorrente nos autos supra referenciados e nos mesmos melhor identificado, tendo sido notificado de douta decisão sumária proferida, nº. 128/12, no sentido de não tomada de conhecimento do recurso interposto, vem, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do art. 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional (doravante LTC brevitatis causa), apresentar

    reclamação para a conferência nos termos e com os seguintes fundamentos:

    I) Da decisão sumária

    1.º Mediante douta decisão sumária, proferida pelo Ex.mo Juiz Conselheiro relator, foi decidido não se tomar conhecimento do objeto do recurso apresentado.

    2º Ora, tal douta decisão não deixa de ser curiosa e surpreendente na sua fundamentação...

    3º O presente recurso foi objeto de decisão sumária de não conhecimento em razão de 3 ordens de razões, às quais de seguida se exercerá...

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