Acórdão nº 28/12.8YRPRT de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelRAMOS LOPES
Data da Resolução24 de Abril de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Reclamação 28/12.8YRPRT Relator: João Ramos Lopes Adjuntos: Desembargadora Maria de Jesus Pereira Desembargador Henrique Araújo.

*Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto.

* RELATÓRIO *B…, S.A. intentou acção arbitral demandando C…, S.A., pedindo a declaração de nulidade de cláusulas que identifica de contrato de empreitada que vincula as partes e ainda a condenação da demandada a pagar-lhe quantias que discrimina, no valor global de 3.340.367,80€.

Instalado e constituído o Tribunal Arbitral ao abrigo de cláusula inserida no referido contrato de empreitada, a demandada apresentou contestação, invocando excepções dilatórias e pugnando também pela improcedência da pretensão da demandante.

Terminados os articulados, foi o processo saneado e elaborado um ‘guião de prova’.

Foram apresentados pelas partes os seus requerimentos de prova, tendo a demandante junto aos autos escritos, que designou como documentos, para prova de matéria controvertida e, sobre eles se pronunciando, negou a demandada que os mesmos pudessem ser considerados como documentos.

Sobre a referida questão, e por maioria, o Tribunal Arbitral deferiu a requerida junção dos documentos.

Notificada da decisão que admitiu a junção de tais documentos, a demandada interpôs recurso, que referiu ser de apelação, a subir de imediato, em separado e com efeito suspensivo, invocando o disposto nos arts. 691º, nº 2, i) e m) e 691º-A, nº 2, do C.P.C., aplicáveis ex vi art. 29ºda Lei 31/86 e cláusulas 3ª e 4ª do Regulamento do Tribunal Arbitral, anexo ao contrato de empreitada, logo juntando as respectivas alegações.

Tal recurso não foi admitido pelo Tribunal Arbitral, por entender ser inadmissível o recurso autónomo de acto interlocutório, fundando-se para tanto no já anteriormente expendido em despacho que não admitira outro recurso anteriormente interposto pela demandada, e cuja fundamentação é a seguinte: ‘(…) Apesar de as partes terem acordado na subordinação desta arbitragem às regras do Código de Processo Civil e de terem admitido recurso das decisões arbitrais para o Tribunal da Relação, importa distinguir.

A presente arbitragem, além do acordado pelas partes, segue o regime da Lei de Arbitragem Voluntária e do Código Civil. Do acordado pelas partes decorre que há recurso das decisões não tomadas por unanimidade dos árbitros. Não obstante, trata-se de um processo arbitral e não de um processo judicial. É ponto assente que não há recurso de actos interlocutórios nas arbitragens; só se pode impugnar a decisão arbitral. A questão é pacífica tanto na jurisprudência como na doutrina, até porque o Tribunal Arbitral não faz parte da hierarquia dos Tribunais Judiciais (ou Administrativos). Só numa estrutura judicial hierárquica é que pode haver recurso dos actos interlocutórios, que podem ser alterados pelo tribunal de hierarquia superior e respeitados pelo Tribunal de 1ª instância. O Tribunal Arbitral não é um Tribunal de 1ª instância. Na arbitragem, como não há hierarquia, o Tribunal da Relação só pode confirmar ou invalidar a decisão final.

Não se pode, pois, admitir o recurso autónomo – a subir em separado – de um acto interlocutório do Tribunal Arbitral para o Tribunal da Relação’.

Reclamou a demandada de tal despacho que não admitiu o recurso, nos termos do art. 688º do C.P.C., sustentando a admissão do recurso argumentando (em síntese): - o despacho que não admitiu o recurso consubstancia obstáculo ao recurso em violação do preceito constitucional do acesso ao direito previsto no art. 20º da Lei Fundamental, pois apesar das partes poderem, no exercício da sua autonomia, acordar sobre a tramitação processual a aplicar ao decurso da instância arbitral, com o limite dos princípios enformadores do sistema jurídico e da indisponibilidade do direito de requerer a anulação da decisão arbitral, as partes asseguraram no caso o duplo e até terceiro grau de jurisdição, nos casos de decisão não unânime dos árbitros (pelo que a decisão em causa viola o Regulamento do Tribunal Arbitral, as regras do processo e a vontade expressa das partes); - na arbitragem ad hoc nada obsta ao recurso de decisões interlocutórias, pois do regime legal traçado na Lei da Arbitragem Voluntária podem ser extraídos três princípios gerais, quais sejam os da recorribilidade, da disponibilidade e da equiparação: a recorribilidade, face ao carácter não definitivo da decisão arbitral, traduz-se na possibilidade das decisões arbitrais serem passíveis de recurso; a disponibilidade respeita à faculdade das partes conformarem, na arbitragem voluntária, o regime dos recursos, adaptando-o à sua vontade; a equiparação determina que na arbitragem voluntária se aplique, em sede de recursos, regime equivalente ao que preside a igual matéria relativamente às decisões dos tribunais judiciais (devendo entender-se que à decisão arbitral são aplicáveis não apenas os critérios de recorribilidade das decisões judiciais, como também todo o regime dos recursos previsto no C.P.C.); - o recurso da decisão interlocutória proferida por maioria é, no caso, admissível, considerando o disposto no art. 691º, nº 2, alíneas i) e m) do C.P.C..

A reclamada pronunciou-se pela improcedência da reclamação e consequente manutenção da decisão de não admissão do recurso.

Por decisão do relator de 15/02/2012, proferida nos termos do art. 688º, nº 4 do CPC, foi indeferida a reclamação, por se considerar a decisão irrecorrível, dado serem as decisões arbitrais interlocutórias insusceptíveis de recurso, só podendo ser impugnadas com o recurso da decisão final e desde que se trate de matérias que quadrem na previsão do art. 27º, nº 1, 2 e 3 da LAV.

Reage contra tal decisão a reclamante, suscitando a intervenção da conferência (art. 700º, nº 3 do C.P.C.), a fim de que sobre a matéria apreciada recaia acórdão.

Para lá de reafirmar os argumentos que apresentou no âmbito da reclamação deduzida (designadamente o de que as partes, no caso em presença, acordaram expressamente no recurso de todas as decisões arbitrais proferidas por maioria, assegurando o duplo e o terceiro grau de jurisdição), a reclamante sustenta ainda neste pedido de conferência (e tendo por referência a fundamentação daquela decisão do relator): - que da análise da LAV se constata que o termo ‘decisão’ é utilizado em vários sentidos e alcances, designadamente nos artigos 19º e 26º da LAV, onde aparece com o sentido de decisão final do litígio ou no artigo 21º, nº 4 da LAV, onde é empregado com o sentido de decisão final que julga de mérito, não obstante tratar-se de decisão relativa à competência do tribunal arbitral; - que o princípio da equiparação (um dos três princípios a observar em sede de recursos das decisões arbitrais) determina que a decisão arbitral segue, em sede de recursos, um regime equivalente ao que preside a igual matéria relativamente às decisões dos tribunais judiciais de primeira instância; - que as partes, quando escolhem um processo alternativo de resolução de litígios, não abdicam simultaneamente de direitos e garantias que os tribunais judiciais, ainda que mais morosos, lhes oferecem (sendo a arbitragem...

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