Acórdão nº 04919/09 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelPAULO PEREIRA GOUVEIA
Data da Resolução12 de Abril de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul: I.RELATÓRIO I.1.

· A……………… - PRODUTOS …………………., Lda., com os sinais nos autos, intentou no T.A.C. de Sintra acção administrativa especial contra · INFARMED - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P., · MINISTÉRIO DA ECONOMIA E DA INOVAÇÃO e · a Contra-interessada, G…….. F………………, S.A, pedindo a anulação a) dos actos administrativos que concederam AIMs aos medicamentos genéricos Ebastina Generis, nas dosagens de 10 mg e 20 mg, em 28/05/2007 e b) do acto de fixação do preço de venda ao público do Ebastina Generis pela Direcção Geral das Actividades Económicas, datado de 10/07/2007.

Por despacho saneador de 2-7-08, o referido tribunal decidiu julgar improcedente a “excepção de incompetência absoluta” do tribunal.

I.2.

Inconformada, a G………… recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: 1° - O artigo 89°, n° 1 alínea f) da Lei n° 3/99, de 13 de Janeiro dispõe que compete aos Tribunais de Comércio preparar e julgar as acções [...] em que a causa de pedir verse sobre propriedade industrial, em qualquer das modalidades previstas no Código da propriedade Industrial.

  1. - No caso presente, a causa de pedir centra-se na validade, conteúdo e âmbito de eficácia da patente, enquanto título de protecção de direitos de propriedade industrial.

  2. - São as próprias autoras que ao longo dos autos, reconhecem expressamente que os actos administrativos de autorização de introdução no mercado (AIM) e que aprovaram o preço do novo medicamento (PVP), eles próprios em si considerados não são ilegais; 4° - As AA apenas sustentam que é a actividade futura de comercialização do medicamento genérico, propiciada pela existência destes dois actos administrativos que será violadora da sua patente e Ipso facto os dois actos administrativos devem ser considerados ilegais.

  3. - Ora para apreciar se a actividade de comercialização do novo medicamento genérico é ou não é violadora da patente, haverá que averiguar se o processo de fabrico de tal medicamento genérico viola ou não viola o conteúdo da patente das AA. e tal competência está legalmente cometida aos tribunais de comércio.

  4. - Apesar de o objecto imediato da acção administrativa especial consistir no pedido de declaração de nulidade/anulação de actos administrativos, a verdade é que a causa de pedir versa indubitavelmente sobre matéria de propriedade industrial, sem cuja apreciação não pode ser apreciada a legalidade requerida.

  5. - São os Tribunais de Comércio os competentes para julgar as acções cuja causa de pedir verse sobre propriedade industrial, ainda que as referidas acções corram nos termos do CPTA, como é sabido e sucede em muitas outras matérias (vd., a título de exemplo, a impugnação dos actos administrativos de entidades reguladoras).

  6. - Daqui resulta que os Tribunais de Comércio constituem urna jurisdição especializada, face à jurisdição administrativa, no âmbito das acções que tenham como causa de pedir matérias relativas aos direitos de propriedade industrial.

  7. - A não ser assim entendido, podem os Tribunais Administrativos colocar-se na posição de apreciar a validade de actos administrativos cuja causa de pedir constitui uma alegada e hipotética violação de patentes e, entretanto, os Tribunais de Comércio decidirem sobre a nulidade ou a caducidade dessas mesmas patentes, ou declararem que o processo de fabrico do novo medicamento genérico não ofende a patente - colocando em causa a harmoniosa e coerente aplicação da justiça e do sistema judicial.

Nas contra-alegações, o recorrido A………… conclui assim: 1) O presente recurso deve subir imediatamente e em separado, com efeito meramente devolutivo, porquanto da remissão constante do artigo 142.°15 in fine do CPTA para o Código de Processo Civil resulta que o presente recurso sobe imediatamente (artigo 734.°/1/c)) e em separado (artigo 737.n, por não se encontrar nos casos do artigo 736.°), pelo que tem efeito meramente devolutivo e não suspensivo quer da decisão, quer do processo (cf. artigo 740.°/1 e 2 a contrario).

2) Os Tribunais administrativos são competentes para decidir a presente causa, de acordo com artigo 1.° do artigo do E.T.A.F., na linha da definição contida no n.° 3 do artigo 212.° da Constituição; 3) O artigo 89.° n.° 1 f) da LOTFJ deve ser interpretado à luz do previsto no artigo 8.° do mesmo diploma, do qual resulta que os Tribunais judiciais serão apenas competentes para decidir um caso se o mesmo não cair na competência de outros Tribunais e que as regras de competência previstas no artigo 89.° da LOTFJ servem apenas para resolver conflitos de competência entre Tribunais judiciais, e não entre estes e Tribunais administrativos; 4) A causa de pedir neste processo é um conjunto complexo de factos, entre os quais avulta a existência de vários actos administrativos dirigidos ao lançamento no mercado de um medicamento contendo a Ebastina como princípio activo e o facto do respectivo processo de fabrico estar protegido por uma patente em vigor, pelo que a acção a que esta providência se reporta cabe no âmbito da jurisdição administrativa (vide Acórdão do S.T.A. de 25.10.2005, Ac. Dout. 527, 137); 5) Os actos de AIM do Ebastina Generis são impugnados, não apenas com fundamento em que os mesmos constituem actos lesivos de direitos fundamentais da Almirall, mas também com base num facto que a Generis insiste em ignorar, apesar de ter sido expressamente invocado pela Almirall: o de tais actos consubstanciarem uma violação do regime jurídico aplicável à autorização de introdução no mercado de medicamentos genéricos (artigos 3.°/1/nn), 15.°, n°s 1 e 2, 19.°, n.° 1 e Anexo I, Parte II, 2 b) do EM); 6) Os pedidos formulados na presente acção consistem unicamente em requerer a invalidação de actos administrativos, pelo que também por aqui a acção cabe no âmbito da jurisdição administrativa; 7) A concessão de uma AIM ou de uma autorização de PVP constituem actos administrativos, adoptados por pessoas colectivas públicas sob regras de direito público e, por isso, a análise da validade desses actos só pode ser realizada por Tribunais Administrativos.

8) Nestes termos, A decisão de admissão do presente recurso deve ser alterada, de modo a que suba imediatamente em separado, com efeito meramente devolutivo; e O presente recurso deve ser julgado improcedente, com as legais consequências.

(2º RECURSO) Inconformado, o INFARMED recorre para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: 1. A única questão de fundo que a A pretende (abusivamente) discutir nos presentes autos prende-se com os "direitos de exploração da patente" a que se arroga, algo que, como parece evidente, extravasa por completo o âmbito da jurisdição administrativa.

  1. É inegável que a causa de pedir nos presentes autos respeita à existência, validade e aos efeitos de direitos de propriedade industrial, algo que é estranho ao conhecimento pelos tribunais administrativos, mas, outrossim, da competência dos tribunais de comércio.

  2. Aliás, o reconhecimento do direito de propriedade industrial da A está sempre omnipresente em toda a argumentação da mesma, pelo que é apodíctico que se trata de uma questão de direito privado.

  3. No Ordenamento Jurídico português, o pedido e a causa de pedir estão na completa disponibilidade das partes apenas quanto à oportunidade dos mesmos, não podendo, porém, a formulação de um pedido servir de fundamento para escolher o tribunal que mais serve os intentos da parte.

  4. A organização judiciária portuguesa, definida em primeira linha pela Constituição (artigos 209.° a 214.°), serve um propósito: o da especialização dos tribunais em função das matérias, com as inerentes e auto-explicativas vantagens daí decorrentes.

  5. O despacho recorrido limitou-se a verificar a conformidade formal do pedido "livremente" formulado pela A, de acordo com os pressupostos que permitem aferir o âmbito da jurisdição administrativa, quando com isso não se podia bastar, pois que deveria ter indagado da relação substancial que os presentes autos comportam.

  6. Dada a especificidade do regime de protecção da propriedade industrial, o procedimento administrativo de autorização de introdução no mercado de medicamentos não é claramente a sede idónea para compor os diversos interesses concorrentes presentes na disciplina daqueles direitos.

  7. Como tal, os tribunais administrativos não têm, pois, e sempre salvo melhor opinião, competência para conhecer dos pedidos sub judice, mas sim o Tribunal de Comércio (cfr. artigo 89.° da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais, aprovada pela Lei n° 3/99, de 13 de Janeiro), na medida em que se trata de uma matéria em que a questão de fundo teria de culminar com uma "declaração em que a causa de pedir verse sobre propriedade industrial (...)".

  8. Pelo que é apodíctico que se verifica uma excepção dilatória de incompetência (absoluta) em função da matéria, prevista alínea a) do artigo 494.° e no artigo 101.° do Código de Processo Civil (de ora em diante, CPC), aplicáveis ex vi o disposto no artigo 1.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (de ora em diante, CPTA), e no artigo 7.° do ETAF.

  9. Acresce ainda que a A. não é parte na relação material controvertida (cfr. artigo 9.°, n.° 1, in fine, do CPTA) no que diz respeito à concessão de AIM quanto ao medicamento genérico da Contra-interessada que contém Ebastina como substância activa.

  10. Pois, não se vislumbra qualquer interesse direto e pessoal, ou mesmo qualquer interesse fáctico da A.

  11. Neste sentido, a concessão de uma AIM apresenta-se para o INFARMED como um acto predominantemente vinculado e com efeitos meramente inter partes, i.e., com efeitos restritos aos requerentes que o solicitam ao INFARMED.

  12. Pelo que, verifica-se uma excepção dilatória de ilegitimidade processual da A., prevista na alínea e) do artigo 494.° do CPC...

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