Acórdão nº 0744653 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Janeiro de 2008
Magistrado Responsável | JOSÉ PEIDADE |
Data da Resolução | 16 de Janeiro de 2008 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam, em Conferência, os Juízes desta 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: No .º Juízo do TJ de Paredes, processo supra referenciado, teve lugar a Audiência de Julgamento de B........., acusado da prática de 1 crime de detenção e cedência com fins lucrativos de imagens e filmes onde foram utilizados menores de 14 anos, crime p. e p. nos termos das disposições conjugadas dos arts. 172º, nº 3, als. d) e e) e nº 4 do CP (redacção da Lei 99/2001, em vigor à data dos factos).
Encerrada a Audiência, e marcada a leitura da Sentença, na data para esse efeito designada, foi a Audiência reaberta, e ditado para a Acta Despacho com o seguinte teor: «Da ilegitimidade do MºPº: Exceptuando os crimes previstos nos arts. 166º, 169º, 170º e 176º CP, os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual, dependem de queixa do ofendido ou de outras pessoas (art. 178º, nº 1, do CP), o que significa serem crimes de natureza semi-pública (crime de natureza semi-pública é aquele em que a legitimidade do MºPº para poder exercer a acção penal precisa de ser integrada com uma queixa). A razão de ser assenta nos valores que se encontram em causa, podendo os ofendidos ou seus representantes entenderem ser mais violenta a publicidade decorrente da apresentação da queixa e respectiva perseguição criminal do arguido do que o esquecimento, sofrimento e exposição previstos no art. 178º, nº 1 do CP (arts. 163º a 165º, 167º, 168º e 171º a 175º) o procedimento criminal deixa de estar dependente de queixa se: a) da prática do crime resultar suicídio ou morte da vítima (art. 178º, nº 1 do CP); b) o crime for praticado contra menor de 16 anos e o interesse da vítima o impuser, o MºPº pode dar início ao procedimento criminal (art. 178º, nº 2 do CP - redacção introduzida pelo DL 48/95, de 15/03 e alterada pela Lei 65/98, de 02/09); c) o titular do direito de queixa couber apenas ao agente do crime e especiais razões de interesse público o impuserem, o MºPº pode dar início ao procedimento criminal (art. 113º, nº 5 do CP).
No presente caso, e quando se iniciou o Inquérito, estávamos perante indícios da existência da prática de 1 crime de abuso sexual de crianças, previsto e punido pelo art. 172º, nº 3, als. d) e e) e nº 4 do CP, de que eventualmente foram vítimas diversos menores, não identificados, com idades a 14 anos, tendo o MºPº iniciado o respectivo procedimento criminal, portanto, perante a situação configurada em b), a qual se articula igualmente com o nº 6 do art. 113º do CP ("Quando o procedimento criminal depender de queixa, o MºPº pode, nos casos previstos na Lei, dar início ao procedimento criminal quando o interesse da vítima o impuser"). Na versão original do CP de 1982, os crimes sexuais que tivessem por vítima menor de 12 anos, possuíam sempre natureza pública (art. 211º, nº 2 do CP). Actualmente, com a redacção dada ao art. 178º, nº 2 CP, quando o direito de queixa não for exercido por quem para tal possui legitimidade, o MºPº pode dar início ao processo se o interesse da vítima, menor de 16 anos, o impuser.
Será que o Legislador com a Reforma de 1995, pretendeu retirar a natureza de público ao crime em análise nestes autos? Entendemos que não. Na verdade, o MºPº reunidas aquelas duas circunstâncias (idade e interesse da vítima), pode intervir em termos subsidiários, não só para dar início ao processo, o que significa que o mesmo deixou de estar dependente de queixa, como para o fazer prosseguir, como aconteceu in casu através de Despacho proferido nos autos em 25 de Fevereiro de 2004.
Aliás, como refere o próprio ponto 8 do Preâmbulo do DL 48/95 - "uma outra nota que acentua a protecção do menor é a possibilidade de o MºPº, sempre que especiais razões de interesse público o justifiquem, poder desencadear a acção penal quando a vítima for menor de 12 anos [A Lei 65/98, de 02/09, elevou a idade para 16 anos]" - é claro quanto à preocupação do Legislador, em pôr razões político-criminais, não deixar à mercê do titular do direito de queixa ou de outras pessoas aquele tipo de crimes que pela sua natureza ferem a sensibilidade colectiva, se o interesse da vítima o impuser. Digamos que nessa situação o crime passa, a nosso ver, a ter natureza pública, como escreveu Maia Gonçalves em anotação ao art. 113º CP [CPP, 13º edição, pág. 389] "este dispositivo veio permitir que os crimes semi-públicos, em casos previstos na Lei, como os dos arts. 152º, nº 2 e 178º, nº 2, passem a ter a...
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