Acórdão nº 373/09.0SZLSB.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 14 de Fevereiro de 2012
Magistrado Responsável | NETO DE MOURA |
Data da Resolução | 14 de Fevereiro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam, em conferência, na 5.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa I – Relatório No âmbito do processo comum que, sob o n.º 373/09.0 SZLSB, corre termos pela 8.ª Vara Criminal de Lisboa, A...
foi submetido a julgamento, por tribunal singular, acusado pelo Ministério Público da prática, em autoria material e em concurso real, de um crime de injúria agravada, um crime de resistência e coacção sobre funcionário e um terceiro crime de roubo simples na forma tentada, previstos e puníveis, respectivamente, pelos artigos 181.º e 184.º, 347.º, n.º 1, e 22.º, n.º 1, 23.º, n.ºs 1 e 2, e 210.º, n.º 1, todos do Código Penal.
Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, por acórdão de 09.06.2011 (fls. 291 a 307), foi o arguido absolvido do crime de roubo tentado, mas condenado, após convolação, pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples e outro de injúria agravado, previstos e puníveis pelos artigos 143º, n.º 1, e 181.º, n.º 1, e 184.º, com referência ao art.º 132.º, n.º 2, al. l), do Código Penal, respectivamente, nas penas parcelares de 1 (um) ano e de 2 meses de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena única de 13 meses de prisão, cuja execução foi suspensa por igual período. Foi, ainda, o arguido/demandado A... condenado a pagar ao Estado Português, a título de indemnização por danos patrimoniais, a quantia de € 781,67, acrescida de juros de mora.
Discordando parcialmente do acórdão proferido, o Ministério Público dele interpôs recurso para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, de que extraiu as seguintes “conclusões” (em transcrição integral): 1. “Delimitando o objecto do presente Recurso, consigna-se que o MºPº se conforma, quer com a condenação pela prática de um crime agravado de injúrias, quer com a absolvição pelo crime de roubo simples, na forma tentada; 2. A discordância cinge-se, assim, à requalificação do crime de resistência e coacção sobre funcionário (do artº 347º, nº 1, do C. Penal) para o crime de ofensa à integridade física simples (artº 143º, nº 1, do C. Penal), ao modo como foi operada e às correspondentes medidas das penas (parcelar e, consequentemente, única); 3. O Tribunal fundamentou a não condenação pelo crime previsto no artº 347º, no facto de não ter resultado "… provado nos autos que o arguido tivesse usado de violência sobre o agente da PSP B...
para se opor a que ele praticasse acto relativo ao exercício das suas funções, ou para o constranger a que ele desenvolvesse uma determinada acção no desempenho das suas funções, tanto mais que nem sequer se provou que o referido agente, na altura, pretendesse identificar ou deter o arguido, ou que lhe tivesse dado alguma ordem nesse sentido.
"; 4. Todavia, melhor analisando a Acusação, constatou-se que, nesta, havia sido omitido um elemento típico do crime; 5. No Libelo, consignara-se, tão só, que "o arguido agiu por meio de violência constrangendo agentes de forças públicas de segurança no desempenho das suas funções a uma acção e a suportar uma actividade desenvolvida contra si.
", mas, não, que agira "para se opor a que ele" (in casu, o Agente da PSP) praticasse "acto relativo ao exercício das suas funções"; 6. Alegando-se, expressamente, que o Arguido "agiu por meio de violência constrangendo agentes de forças públicas de segurança no desempenho das suas funções… a suportar uma actividade desenvolvida contra si ", omitiu-se o elemento essencial que consistiria no facto de o Arguido ter agido para se opor a que o Sr. Agente da PSP praticasse acto relativo ao exercício das suas funções; 7. Daí que, não possa deixar de se concluir que o Tribunal, em sede de Fundamentação, tenha considerado como não provado um facto que, não só a Acusação omitira, como, ainda, que nem sequer fizera constar dos "Factos não Provados"; 8. A consequência, a nosso ver, do que vem de explanar-se, é que, face às deficiências assinaladas à Acusação, o Arguido nunca poderia ter sido condenado pelo crime previsto no artº 347º, do C. Penal. Não pelas razões que o Acórdão refere, mas, sim, por omissão, naquela, de um dos elementos típicos do crime em apreço; 9. Por outro lado, ao "convolar" a infracção, o Tribunal afastou a verificação da qualificativa prevista na l), do nº 2, do artº 132º (ex vi do disposto nos artºs. 145º, nºs. 1, a) e 2, com referência ao artº 143º, do C. Penal), por ter entendido que o Arguido "...
actuou no contexto de uma discussão, onde normalmente os ânimos se mostram exaltados, consubstanciando tal conduta do arguido um crime de ofensa à integridade física simples p. e p. pelo artº. 143º, nº. 1 do mesmo diploma legal,…"; 10. Desta solução, o MºPº discorda frontalmente, uma vez que, dos "Factos Provados" resulta, à saciedade, que a actuação do Arguido foi particularmente perversa e censurável; 11. Tratava-se de um Agente da Autoridade - facto que, comprovadamente, o Arguido conhecia, posto que a Vítima se encontrava fardada -, no exercício das suas funções, o qual procurava por fim a uma agressão perpetrada numa terceira pessoa pelo próprio Arguido; 12. A agressão teve lugar na via pública, tendo sido presenciada por várias pessoas e acompanhada de expressões comprovadamente injuriosas, aliás, agravadas pela circunstância de terem sido dirigidas a uma das pessoas referidas na l), do nº 2, do artº 132º - ex vi do artº. 184º, do C. Penal (uma vez que, neste caso, a Lei não exige a verificação da especial perversidade ou censurabilidade, funcionando a agravante, sem mais, ope legis); 13. Acresce que as agressões foram reiteradas, violentíssimas e persistentes, tendo o Arguido agredido a Vítima, com socos e pontapés, atingindo o Sr. Agente da PSP, sucessivamente, "na zona do tronco, na zona abdominal, na cabeça e no rosto, até este cair no solo", sendo certo, ainda, que "Enquanto o ofendido B... permanecia no chão, o arguido desferiu-lhe vários pontapés" - cfr.
itens nºs. 2 e 4, dos "Factos Provados"; 14. Por outro lado, "Em consequência das agressões de que foi vítima, sofreu o ofendido traumatismo na face, no cóccix e nos membros inferiores e escoriações várias na região frontal direita, na região malar direita e no hemilábio superior direito, equimoses na face anterior da perna esquerda e no terço inferior da face externa da coxa esquerda, lesões essas que determinaram um período de 5 dias de doença, sendo 3 dias com afectação da capacidade para o trabalho geral e 5 dias com afectação da capacidade para o trabalho profissional", agindo com intenção de causar padecimento à Vítima, o que conseguiu - cfr.
itens nºs. 5 e 7, dos "Factos Provados"; 15. A única explicação que o Acórdão dá para assim ter considerado é que o Arguido "actuou no contexto de uma discussão, onde normalmente os ânimos se mostram exaltados". Note-se que o que acaba por constituir a razão de ser do afastamento da qualificativa, paradoxalmente, decorre de uma outra agressão de que estava a ser vítima uma outra pessoa e que precedeu a agressão perpetrada no Agente da PSP que interveio para obstar à continuação daquela; 16. Daí que não possa deixar de concluir-se que, não só o motivo referenciado pelo Acórdão não é causa de afastamento da qualificativa, como, ao invés, conjuntamente com toda a factualidade provada e que se salientou, impunha a caracteri-zação da conduta do Arguido como especialmente perversa e censurável e, como tal, subsumível, não, como foi, ao artº 143º, nº 1, mas, antes, ao artº 145º, nºs. 1, a) e 2, do C. Penal; 17. Face à gravidade dos factos consignados no Acórdão e que foram tidos em conta na escolha e medida da pena, entende-se por adequada uma pena parcelar de 2 anos e 6 meses de prisão e única de 2 (dois) anos e 7 (sete) meses de prisão, não se configurando qualquer factor que leve a admitir uma prognose favorável, relativamente à conduta do Arguido, antes se lhe impondo a aplicação de uma pena de prisão efectiva; 18. Em qualquer caso, ainda que, porventura, se entendesse ser de manter a qualificação pelo artº 143º, nº 1, do C. Penal, ainda assim, a medida da pena aplicada é manifestamente desajustada; 19. O MºPº entende que, nesse caso, se imporia uma agravação de 1 ano, para 1 ano e 9 meses de prisão e, em concurso com a pena de 2 meses de prisão, aplicada ao crime agravado de injúrias, a pena única de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão, a qual, pelas razões apontadas, se entende não dever ser suspensa na sua execução; 20. Por fim, haverá que avaliar se a "convolação" operada (para o artº 143º, nº 1), ou (como defendemos), a operar (para o artº 145º, nºs. 1, a) e 2), impunha/õe, ou não, a comunicação de uma alteração não substancial, nos termos do artº 358º, do CPP; 21. Ao requalificar a conduta do Arguido, do artº 347º, nº 1, para o artº 143º, nº 1, do C. Penal, o Tribunal entendeu que não era de proceder a qualquer comunicação; 22. Se é certo que os interesses tutelados, em primeira linha, nuns e noutro, são diversos (no que aos primeiros diz respeito, o bem protegido é a integridade física da pessoa humana, ao passo que, no que tange ao segundo, tratando-se de um crime de perigo, o bem jurídico tutelado é a autonomia intencional do Estado, com a qual "pretende evitar-se que não-funcionários ponham entraves à livre execução das "intenções" estaduais, tornando-as ineficazes"), não é menos certo que, como mais patente ficou, após a revisão de 2007, a tutela da integridade física do funcionário se inclui, concomitantemente, na previsão normativa do crime de resistência e coacção sobre funcionário; 23. O mesmo se deverá considerar se a "convolação" for, como defendemos que seja, para o artº 145º, do C. Penal, uma vez que todos os elementos do tipo, incluindo os que caracterizam a especial perversidade e censurabilidade da conduta do agente, estão descritos na Acusação, posto que, tratando-se a censurabilidade e a perversidade de asserções conclusivas, hão-de elas emergir das condutas típicas descritas na...
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