Acórdão nº 07B4690 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelSALVADOR DA COSTA
Data da Resolução10 de Janeiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I AA e BB, na qualidade de herdeiros do seu filho CC, instauraram, no dia 20 de Junho de 2005, contra T...S...-Companhia de Seguros de Vida, SA acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe € 86 067,93 e juros à taxa legal.

Fundamentaram a sua pretensão no falecimento de CC no dia 17 de Novembro de 2002 em acidente de viação ocorrido no dia 13 de Novembro de 2002, em contratos de mútuo por ele celebrados com o Banco S... Portugal, SA e na garantia de pagamento por via de contratos de seguro de vida celebrados com a ré e na recusa por esta do pagamento do capital de mútuo de € 86 067,93.

A ré, em contestação, afirmou que os contratos de seguro não cobriam o risco invocado pelos autores, excluído por uma das suas cláusulas, por virtude de CC conduzir o veículo automóvel na altura do acidente com taxa de alcoolemia de 1,19 gramas por litro de sangue.

Os autores, na replica, afirmaram que não há nexo de causalidade entre a alcoolemia e o acidente, declararam ampliar o pedido relativamente às prestações vencidas e às que se vencerem e aos encargos bancários derivados do contrato de mútuo que viessem a celebrar com instituição bancária.

A ampliação do pedido foi admitida no despacho saneador, e, realizado o julgamento, foi proferida sentença, no dia 28 de Novembro de 2006, por via da qual a ré foi absolvida do pedido, sob o fundamento de o acidente ter ocorrido por virtude de a vítima conduzir sob a influência do álcool.

Apelaram os autores, e a Relação, por acórdão proferido no dia 3 de Julho de 2007, revogou a sentença e condenou a apelada no pagamento ao Banco S... Portugal, SA a quantia de € 86 067,93, sob o fundamento de aquela não ter cumprido o dever de comunicação da exclusão de responsabilidade.

Interpôs a apelada recurso de revista, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - o acórdão recorrido é nulo por violação da alínea c) do nº 1 do artigo 668º do Código de Processo Civil por haver concluído que os factos dos artigos quarto e quinto da base instrutória não foram provados; - o acórdão recorrido é nulo porque a Relação não se pronunciou sobre a exigibilidade do nexo de causalidade ao caso vertente, infringindo o disposto no artigo 668º, nº 1, alínea d), do Código de Processo Civil; - ainda que se entendesse que para a aplicação da cláusula em causa seria necessária a prova do nexo de causalidade entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente, estar o mesmo provado; - o acórdão recorrido interpreta erradamente a matéria de facto ao considerar não provados os factos constantes dos quesitos 4º e 5º da base instrutória, porque foi considerado provado o que constava da alínea n) da especificação; - face à decisão da matéria de facto, a Relação só poderia determinar a renovação dos meios de prova produzidos no tribunal da primeira instância; - é uma cláusula de exclusão de conhecimento geral, porque o homem médio, colocado na posição do contraente, conhece que o seguro de vida não suporta o ónus de condutas que coloquem a vida do próprio segurado em risco; - está exonerada da responsabilidade de pagamento do capital de mútuo por virtude do consumo de bebidas alcoólicas pelo tomador do seguro e da cláusula de exclusão da sua responsabilidade.

Responderam os recorridos, em síntese de conclusão de alegação: - o acórdão não é nulo, porque os quesitos quarto e quinto não foram considerados provados; - é inaplicável o disposto no artigo 712º, nº 3, do Código de Processo Civil por não ter havido impugnação da matéria de facto; - o acórdão não tinha de se pronunciar sobre a questão do nexo de causalidade entre a condução sob o efeito do álcool e o sinistro por virtude de tal pronúncia estar prejudicada; - deve ser apreciada no recurso de revista a questão do nexo de causalidade entre o estado de alcoolemia de CC, nos termos do artigo 684º-A do Código de Processo Civil; - o tribunal da primeira instância violou o artigo 349º do Código Civil por virtude de ter extraído uma ilação de factos que obtiveram na decisão da matéria de facto a resposta não provado; - as presunções servem para a prova de factos e não para alterar a prova feita ou eliminar o ónus de prova; - é incorrecto e inadmissível o raciocínio lógico do julgador porque os factos provados não permitem extrair a conclusão do nexo de causalidade nem este se presume, não sendo lícito saltar de presunção em presunção para se dar como assente certo facto; - a cláusula do contrato de seguro em causa exige a prova do nexo de causalidade, cujo ónus cabia à recorrente e não se trata de acção de regresso nem de aplicação da concernente jurisprudência uniformizada; - não ficou provada a comunicação pela recorrente da cláusula do contrato de seguro em causa nem a informação e o seu esclarecimento e dos riscos excluídos do contrato, cabendo à recorrente tal ónus, pelo que deve considerar-se excluída; - não sendo tal cláusula nula em si por absolutamente proibida em razão de atentar contra os princípios da boa fé, deveria ser comunicada com completa informação e esclarecimento face à amplitude dos riscos que exclui, nomeadamente abaixo da taxa de alcoolemia legalmente proibida e excedendo sinistros por condução de veículos motorizados.

II É a seguinte a factualidade considerada no acórdão recorrido: 1. CC celebrou com o Banco S... Portugal, SA, no dia 30 de Novembro de 1999, um empréstimo no montante de 11 000 000$, ao abrigo do regime de crédito à habitação jovem bonificado, e, no dia 1 de Julho de 2002, para fazer face a compromissos financeiros, celebrou com o mesmo Banco um outro empréstimo, no montante de € 17 500.

  1. Os autores, pais de CC, declararam assumir solidariamente com o seu filho, nos termos dos referidos contratos, o seu cumprimento, constituindo-se para o efeito fiadores e principais pagadores da dívida contraída por ele e renunciarem ao benefício da excussão prévia.

  2. Foram celebrados entre CC e a ré, como garantia do pagamento dos aludidos créditos, em caso de morte ou invalidez do segurado, dois contratos de seguro de vida, titulados pelas apólices nºs .../52170 e .../118623, respectivamente, sobre o crédito à habitação e multi-funções, tendo todos os prémios sido atempadamente pagos.

  3. Consta no ponto 6.1. do artigo 6º das condições gerais do seguro de vida de grupo - crédito à habitação, sob a epígrafe, riscos excluídos, sendo contratualmente estabelecido que "a seguradora não garante o pagamento das importâncias seguras, caso o falecimento da pessoa segura seja devido a ... c) acidentes ou doenças que sobrevenham à pessoa segura por consumo de bebidas alcoólicas ou uso de estupefacientes não prescritos medicamente".

  4. CC conduzia, no dia 13 de Novembro de 2002, às 18 horas e 45 minutos, ao quilómetro 164,63 Estrada Nacional n.º 221, no sentido de trânsito Pinhel-Guarda, o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula nº 43-94-..., quando, ao descrever uma curva, perdeu o controle do veículo que derrapou e capotou, sofrendo lesões físicas.

  5. Após ter sido socorrido no local, foi de imediato transportado para o Hospital Sousa Martins, na Guarda e, posteriormente, transferido para os Hospitais da Universidade de Coimbra, onde faleceu no dia 17 de Novembro...

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