Acórdão nº 1/08 de Tribunal Constitucional (Port, 03 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Presidente
Data da Resolução03 de Janeiro de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 1/2008

Processos n.º : 9PP, 23PP, 32PP, 34PP e 41PP

Plenário

ACTA

Aos três dias do mês de Janeiro de dois mil e oito, encontrando-se presentes o Excelentíssimo Conselheiro Presidente Rui Manuel Gens de Moura Ramos e os Exmos. Conselheiros Ana Maria Guerra Martins, Joaquim José Coelho de Sousa Ribeiro, Mário José de Araújo Torres, Benjamim Silva Rodrigues, Maria Lúcia Amaral, Maria João da Silva Baila Madeira Antunes, Carlos José Belo Pamplona de Oliveira, Gil Manuel Gonçalves Gomes Galvão, João Eduardo Cura Mariano Esteves, Vitor Manuel Gonçalves Gomes e José Manuel Cardoso Borges Soeiro, foram trazidos à conferência os presentes autos para apreciação.

Após debate e votação, foi ditado pelo Excelentíssimo Conselheiro Presidente o seguinte:

ACÓRDÃO nº 1/2008

  1. Relatório

    ? Em 4 de Dezembro de 2007, o Presidente do Tribunal Constitucional determinou a notificação de todos os partidos políticos registados neste Tribunal para apresentarem, no prazo de 90 dias, os elementos necessários à comprovação do número mínimo de filiados exigido na Lei dos Partidos Políticos.

    O despacho de notificação, dirigido a cada um dos partidos tinha o seguinte teor:

    “Notifique o Partido (….) para nos termos e para os efeitos do artigo 19.º da Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de Abril, e no prazo de 90 dias consecutivos, comprovar o cumprimento do requisito da existência actualizada do número mínimo de filiados previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 18.º do mesmo diploma (pelo menos cinco mil militantes)”

    ? Na sequência do acto de notificação, foram apresentados cinco requerimentos de aclaração e três recursos.

    O Partido do Atlântico (PA) e o Partido Nacional Renovador (PNR) apresentaram, cada um, um pedido de aclaração.

    O Partido Nova Democracia (PND) e o Partido da Terra (MPT) apresentaram, cada um deles, um pedido de aclaração, em primeiro lugar, e, depois, um “recurso” de fiscalização concreta da constitucionalidade.

    O Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP) apresentou “recurso” do acto do Presidente para o plenário e juntou também um pedido de aclaração.

    ? Nos requerimentos de aclaração, os partidos vieram levantar a questão dos meios de prova que deveriam concretamente utilizar a fim de comprovarem o número mínimo de filiados, advertindo que o conteúdo da aclaração não poderia violar os direitos, liberdades e garantias prescritos na Constituição da República Portuguesa.

    O conteúdo dos respectivos requerimentos foi, em síntese, o que se segue.

    O PDA veio questionar se “bastará para o efeito a indicação dos nomes dos filiados”.

    O PCTP/MRPP pede a aclaração do despacho do Presidente dizendo que este “é omisso e, portanto ambíguo, no que respeita ao meio de prova a utilizar pelo notificado para demonstrar o cumprimento do invocado requisito, matéria de evidente relevância tendo em conta a observância de outros normativos legais que concretizam direitos liberdades e garantias”.

    O PDN e o MPT ressaltaram que “o meio de prova a utilizar deve ser consentâneo com outros normativos legais que concretizam direitos liberdades e garantias pessoais previstos na Constituição da República Portuguesa”.

    No mesmo sentido, o PNR acrescenta que “o meio de prova a utilizar (…) tem de ser consentâneo, com a C.R.P. e com outros normativos legais em vigor e nomeadamente a Lei n.º 67/98 de 26 de Outubro - Lei de protecção de dados pessoais, de modo a proteger os direitos liberdades e garantias dos cidadãos consagrados na C.R.P”. O mesmo partido refere em especial o artigo 7.º da citada Lei de Protecção de Dados pessoais e o artigo 35.º da Constituição da República Portuguesa.

    Sobre estes pedidos o Presidente do Tribunal fez recair o seguinte despacho: “Suscitando o pedido em causa questões que ultrapassam o âmbito de intervenção do Presidente, será ele resolvido pelo Plenário”.

    ? O conteúdo dos recursos apresentados pelo PCTP/MRPP, PND e MPT é aqui integralmente transcrito, omitindo-se apenas a parte do requerimento deste último que é idêntica ao do requerimento do PND.

    ? O recurso do PCTP/MRPP tem o seguinte teor:

    “Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional

    PARTIDO COMUNISTA DOS TRABALHADORES PORTUGUESES (PCTP/MRPP), partido político registado nesse Tribunal Constitucional, com sede na Rua da Palma, n° 159-2° Dt°, Lisboa, notificado do douto despacho exarado nos autos à margem referenciados, pelo qual se pretende dar cumprimento ao disposto no art° 19° da Lei Orgânica n° 2/2003, de 22 de Abril, e com o mesmo despacho se não conformando, dele vem interpor o competente recurso para o Plenário do Tribunal Constitucional.

    Por se achar interposto em tempo e por quem para tal tem legitimidade, deve o presente recurso ser admitido por Vossa Excelência.

    O mesmo recurso deve considerar-se interposto sem prejuízo do resultado do pedido de aclaração que simultaneamente se apresenta.

    Também por mera cautela de patrocínio e apenas para prevenir qualquer eventual interpretação que conduza ao indeferimento deste recurso por falta da respectiva motivação e sem que o que adiante se consigna se entenda como prescindindo da alegação que ao caso compete após a admissão do presente recurso, sempre se argui desde já a ilegalidade e inconstitucionalidade do despacho recorrido nos termos seguintes:

    1. A douta decisão sindicada reporta-se, como é evidente, ao contencioso dos partidos políticos, regulado nos art°s 103° e seguintes da Lei do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n° 28/82, de 15 de Novembro, com a redacção que lhe foi dada pelas Leis nºs 143/85, 88/95 e 13-A/98.

    2. Sucede que, precisamente nos termos do disposto no n° 3 daquele preceito constitucional, as competências que, no âmbito do Decreto- -Lei 595/74, estavam cometidas ao Supremo Tribunal de Justiça e aos tribunais comuns de jurisdição ordinária — aqui, exactamente referentes à extinção dos partidos políticos (art° 21° daquele diploma legal) — passaram a ser atribuídas ao Tribunal Constitucional.

    3. Como continuam igual e obviamente atribuídas ao mesmo Tribunal Constitucional todas as competências previstas na Lei Orgânica n° 2/2003 (Lei dos Partidos Políticos), nomeadamente, no que toca ao processo de extinção dos partidos políticos.

    4. Porque assim, a matéria objecto do despacho cujo recurso acima se requer é da exclusiva competência do Tribunal Constitucional.

    5. Nestas circunstâncias, não podia o Presidente do Tribunal Constitucional proferir o despacho em causa, sem que para tal estivesse munido de um acto de delegação de competências por parte do Tribunal Constitucional.

    6. Não se tendo invocado uma tal delegação de competências para a prática do acto em questão, terá de considerar-se que o mesmo se acha ferido de incompetência.

    7. Para o caso de a aludida delegação de competências existir, sempre se dirá que, então, a decisão sindicada sofre do vício de forma por total omissão do despacho de delegação de competências.

    8. Sem nada conceder quanto ao que antecede, o mesmo despacho sempre padeceria do vício de inconstitucionalidade, o qual aqui se argui para todos os devidos efeitos legais.

    9. E isto porque a norma do art° 18°, n° 1, alínea b), da Lei Orgânica n° 2/2003, de 22 de Abril, que o despacho recorrido pretende aplicar viola frontalmente o disposto, entre outros, nos art°s 46°, n° 1, e 51° da Constituição da República Portuguesa.

    10. Sem prescindir das futuras alegações do recurso que ora se interpõe, desde já se dirá que o citado art° 46°, n° 1, consagra que os cidadãos têm o direito de livremente e sem dependência de autorização, constituir associações, desde que estas não se destinem a promover a violência e os respectivos fins não sejam contrários à lei penal.

    11. Por outro lado, acrescenta e precisa o art° 51°, n° 1, da mesma Lei Fundamental, que a liberdade de associação compreende o direito de constituir ou participar em associações e partidos políticos e de através deles concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e a organização do poder político.

    12. Excepto no que se refere a matérias relacionadas com o conteúdo dos seus fins programáticos (art° 46°, n° 4), denominação (art° 51°, n° 3), âmbito territorial (51°, n° 4) e princípios de prática interna e relação com os seus membros (51°, n° 5), a CRP não prevê, nem podia prever, qualquer outra limitação à liberdade democrática de constituição de partidos políticos.

    13. E só no que concerne às regras do financiamento dos partidos políticos é que a mesma Constituição da República remete expressamente para a lei ordinária a respectiva regulamentação.

    14. Assim, a imposição de um número mínimo de filiados, e não militantes, (no caso, cinco mil) para a constituição e existência legal de um partido político traduz—se numa flagrante e intolerável anulação da liberdade fundamental da constituição de partidos políticos consagrada nas disposições dos citados art°s 46° e 51° da CRP e mostra-se em total oposição com a definição do Estado de direito democrático constante do art° 2° da mesma Constituição.

    15. Bastaria, aliás, um mínimo de bom senso para se verificar que não existe nem pode sequer conjecturar-se qualquer argumento válido do ponto de vista democrático ou civilizacional, para não dizer racional, que sustente a defesa de uma monstruosidade como aquela a que o Meritíssimo Autor do presente despacho, ainda que com...

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