Acórdão nº 911/09.8TBAVR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução18 de Janeiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - RELATÓRIO 1.

No processo comum singular n.º 911/09.8T3AVR do Juízo de Média Instância Criminal de Aveiro, na comarca do Baixo Vouga, foi proferido o seguinte DESPACHO, datado de 7 de Junho de 2011: «A... foi neste processo condenado pela prática de crime de desobediência, por sentença de 20.12.2010, transitada em julgado em 02.02.2011, na pena de 90 dias de multa à razão diária de €6,50.

Antes de iniciado o prazo para pagamento voluntário da multa, requereu a substituição da mesma por trabalho a favor da comunidade (fls. 111-3).

O Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser deferida a requerida substituição por dias de trabalho, nos termos de fls. 115 e 124, promovendo a substituição da pena de 90 dias de multa por 90 horas de trabalho a favor da comunidade.

Foi solicitado aos Serviços de Reinserção Social a realização de relatório, que consta de fls. 121 e seguintes, de acordo com o qual, além do mais, o arguido tem disponibilidade para prestar em dias úteis diversas tarefas de apoio no Museu de Ovar, sendo que por esta entidade foi já expressa disponibilidade para dar ocupação ao arguido.

Atento o teor da referida informação dos Serviços de Reinserção Social, bem como o considerado na sentença acerca da situação do arguido (cfr. fls. 104-5), afigura-se que a substituição da multa por trabalho realiza de forma adequada e suficiente as finalidades de prevenção geral e especial que no caso se suscitam, nada obstando à substituição da multa por trabalho nos termos do artigo 48°, n.°1, do Código Penal.

Estabelece o n.° 2 do citado artigo 48° que “é correspondentemente aplicável o disposto nos n.°s 3 e 4 do artigo 58° e no n.° 1 do artigo 59°”.

Nos termos de tais disposições, “para efeitos do disposto no n.° 1 [substituição da pena de prisão por prestação de trabalho a favor da comunidade], cada dia de prisão fixado na sentença é substituído por uma hora de trabalho, n máximo de 480 horas”; “o trabalho a favor da comunidade pode se,- prestado aos sábados, domingos e feriados, bem como nos dias úteis, mas neste caso os períodos de trabalho não podem prejudicar a jornada normal de trabalho, nem exceder, por dia, o permitido segundo o regime de horas extraordinárias aplicável”; “a prestação de trabalho a favor da comunidade pode ser provisoriamente suspensa por motivo grave de ordem médica, familiar, profissional, social ou outra, não podendo, no entanto, o tempo de execução da pena ultrapassar 30 meses”.

Salvo o devido respeito por diverso entendimento, a aplicação “correspondente” do disposto no citado n.° 3 do artigo 58° do Código Penal (por remissão pelo artigo 48°, n.°2) não equivale à conversão de cada dia da pena de multa em uma hora de trabalho a favor da comunidade.

Com efeito, afigura-se que tal resultado conflituaria com a necessária unidade do sistema jurídico (cfr. artigo 9°, n.°1, do Código Civil), considerando a correspondência legalmente estabelecida entre a pena de multa e a eventual prisão subsidiária (esta equivalente ao número de dias daquela reduzido a 2/3 — artigo 49°, n.°1, do Código Penal), sendo que no presente caso, em que foi aplicada a pena de 90 dias de multa, o eventual incumprimento de tal pena poderia implicar a conversão da mesma em 60 dias de prisão.

A 60 dias de prisão, de acordo com o critério legal estabelecido no artigo 58°, n.°3 (norma de que resulta que são legalmente equiparáveis punições de um dia de privação da liberdade e de uma hora de prestação de trabalho a favor da comunidade), corresponderiam 60 horas de prestação de trabalho a favor da comunidade.

A consideração da diversa natureza dogmática da pena (principal) de prisão a substituir por trabalho nos termos do artigo 58° do Código Penal e da prisão subsidiária que hipoteticamente poderia substituir a pena (principal) de multa não pode fazer esquecer que em qualquer das hipóteses, “(. . ) na sua execução, quer uma quer outra têm exactamente o mesmo conteúdo material (..): a privação de liberdade de um cidadão, decorrente de uma sanção derivada de uma condenação criminal, cumprida em estabelecimento prisional durante um determinado período de tempo” (Acórdão da Relação de Coimbra de 09.12.2009 — em que se aprecia questão diversa — que pode ler-se em www.dgsi.pt/jtrc com o n° de processo 126/05.4GTCBR.C1).

Ora — sempre ressalvando o devido respeito por diverso entendimento — não se afigura coadunável com o princípio da unidade do sistema jurídico e a presunção de (além do mais) coerência das soluções legislativas (artigo 9°, n.°1 e n.°3, do Código Civil) aceitar que da remissão pelo artigo 48°, n.°3, para o artigo 58°, n.°3, possa resultar a conversão da pena de 90 dias de multa em 90 horas de trabalho (como resultaria da interpretação de tal remissão como implicando que aqui devesse ler-se que para efeitos do disposto no n° 3 do artigo 48° [substituição, a requerimento do condenado, da pena de multa por prestação de trabalho a favor da comunidade] cada dia de multa fixado na sentença é substituído por uma hora de trabalho — contra tal entendimento e no sentido que ora se subscreve, pode ver-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 19.01.2011, proferido no âmbito do processo n.° 2249/08.9PTAVR, deste Juízo).

Com efeito, a 90 dias de multa a lei equipara 60 dias de privação da liberdade e a mesma lei a 60 dias de prisão equipara 60 horas de prestação de trabalho a favor da comunidade.

Pelo exposto, decide-se substituir a pena de multa em que A... foi condenado no presente processo por 60 (sessenta) horas de trabalho a favor da comunidade, a...

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