Acórdão nº 1472/06.5TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução12 de Janeiro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA AA, S. A. veio intentar acção, com processo ordinário, contra BB– TRANSPORTES DE MERCADORIAS, LDA, pedindo: 1. que seja reconhecida judicialmente a resolução do contrato de locação financeira, junto aos autos, datado de 10/8/2005; 2. que seja confirmada a decisão proferida no âmbito da providência cautelar que, com o nº 4869/05.4TVLSB, corre termos pela 2ª Secção da 4ª Vara do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, que tem por objecto a apreensão dos veículos aí melhor identificados e a sua respectiva documentação, com a subsequente entrega à autora dos veículos nela devidamente discriminados, no estado em que se encontravam quando foram entregues, ressalvadas as deteriorações inerentes ao seu uso, bem como de todos os documentos que juntamente com os veículos foram entregues.

3. a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 131 125.00, a título de prejuízos decorrentes do mau estado de conservação dos veículos em causa; Alegando, para tanto, e em suma: Celebrou com a ré 111 contratos de locação financeira que foram rescindidos por incumprimento definitivo dos mesmos por parte da ré.

Uma vez que tinha interesse na recuperação do capital em dívida, bem como na remuneração adequada e atendendo a que a ré tinha interesse em continuar a gozar os bens objectos dos referidos contratos, acordaram entre si a celebração de um novo contrato de locação financeira, que teve por objecto o conjunto de equipamentos abrangidos pelos contratos rescindidos.

Nessa sequência, autora e ré celebraram o contrato de locação financeira nº 0000, que teve por objecto 51 equipamentos que foram entregues à ré, melhor descritos nos autos, sendo que esta se obrigou a entregar-lhe rendas mensais no valor de € 24 379,26 cada, acrescidas de IVA, calculado à taxa em vigor.

A ré não pagou, nas respectivas datas de vencimento, as rendas nºs 16 a 22, no valor total de € 203 079,24, o qual ocorreu nos dias 5 doe meses de Janeiro a Julho de 2005, respectivamente, na sequência de que a autora comunicou à ré, através de carta registada com AR, datada de 15/7/2005, que devia proceder à liquidação das rendas vencidas e não pagas no prazo máximo de 8 dias, sob pena de se considerar o contrato de locação financeira resolvido.

Porque decorreu tal prazo sem que a ré tivesse liquidado tal quantia, instaurou uma providência cautelar para recuperação das viaturas, tendo as mesmas lhe sido entregues.

Algumas das viaturas que lhe foram restituídas estavam em estado deplorável e, por isso, o valor que pode obter com a venda delas foi muito inferior ao valor de mercado que as mesmas tinham, constituindo tal diferença o prejuízo que a autora sofreu e do qual pretende ser indemnizada.

Citada a ré, veio a mesma contestar e reconvir, pedindo a sua absolvição do pedido, e, na procedência da acção reconvencional que: 1. seja declarado o incumprimento do contrato de locação financeira por parte da autora; 2. seja a autora condenada a pagar-lhe o valor por esta entregue a título de rendas, relativamente aos veículos identificados na p. i., ao abrigo do contrato de locação financeira nº 4239 e de todos os que lhe deram causa, a liquidar em execução de sentença; 3. seja a autora condenada a pagar-lhe a quantia de € 396 494,00 a título do valor dos veículos que indevidamente lhe retirou; 4. seja a autora condenada a pagar à ré uma indemnização por perdas de receitas, a liquidar em execução de sentença; 5. seja a autora condenada a pagar à ré uma indemnização, no montante de € 250 000,00, por danos sofridos pela sua imagem comercial; 6. seja a autora condenada a pagar à ré juros de mora, à taxa legal, sobre as quantias em que vier a ser efectivamente condenada, desde a data da notificação da contestação/reconvenção, até integral pagamento, a liquidar em execução de sentença; 7. seja a autora condenada como litigante de má fé, em multa e indemnização a seu favor, no montante de € 25 000,00.

Tendo alegado, também em síntese: A carta enviada pela autora apenas foi recepcionada em 2/8/2005, sendo que, nessa data, as rendas já não estavam em dívida.

Paralelamente ao contrato em referência existia um outro, a que foi dado o nº 0000, sendo que já antes, entre Abril e Junho de 2005, a ré havia pago à autora, através de transferências bancárias, o montante de € 174 400,00.

Antes da recepção da dita carta, já a ré, em 20/7/2005, lhe havia remetido uma outra, juntamente com dez cheques pós datados, no valor de € 30 583,38 cada, na qual comunicava a forma como devia ser feita a imputação dos montantes correspondentes aos cheques e às transferências bancárias.

A autora não lhe enviou as facturas correspondentes às rendas que reclama e, por isso, à data em que lhe enviou a carta de rescisão apenas podia exigir à ré o montante das rendas sem IVA, o qual perfazia € 170 654,82 e que já se encontrava pago através da transferência de € 174 400,00.

A autora, sem motivo, rescindiu o contrato de locação financeira celebrado entre as partes, devendo devolver à ré todas as quantias recebidas a título de rendas, referentes aos equipamentos identificados na p. i.

Ao vender os veículos, já não os pode restituir à ré, devendo, por isso, ser condenada a pagar-lhe o valor dos mesmos, seja € 396 497,00.

A retirada dos veículos, de forma súbita, deixou a ré sem instrumentos de trabalho, o que provocou que ficasse impossibilitada de realizar os transportes encomendados, o que traduziu uma diminuição de receitas, cujo valor deve ser apurado em liquidação.

Tendo a autora difundido informação de que tinha retirado os veículos à autora por falta de pagamento, tendo, por causa disso, a ré passado a ser olhada com desconfiança, deixando os fornecedores de lhe conceder crédito e os clientes de lhe encomendar transportes.

Ainda por causa disso, as operações bancárias ficaram suspensas ou passaram a ser analisadas com rigor, o que se traduziu num abalo da imagem da ré/reconvinte, que a mesma contabiliza em € 250 000,00.

Replicou a autora, pugnando pela improcedência da reconvenção.

Pedindo a condenação da ré como litigante de má fé, em multa pelo máximo legalmente admissível e em indemnização à autora, correspondente ao reembolso de todas as despesas em que vier a incorrer, designadamente com as quantias que tiver que despender com os honorários dos mandatários forenses.

Treplicou a ré/reconvinte, respondendo à matéria da má fé processual e exercendo o contraditório sobre os documentos juntos pela autora.

Foi proferido despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

Em sede de instrução do processo, apresentou a autora o seu requerimento de produção de prova (fls 487/496), no qual, e alem do mais, requer “ … para contraprova da matéria de facto constante do art. 6.º da base instrutória, ao abrigo do disposto nos arts 519.º e 528.º do CPC, que se ordene a notificação da ré para vir juntar aos autos cópia das declarações periódicas do IVA e bem assim a documentação de suporte ao preenchimento das mesmas, relativas ao período compreendido entre Janeiro a Junho de 2005 …”.

Por despacho de fls 636, o senhor Juiz indeferiu tal diligência, pois “… Não se vislumbra que interesse as declarações de IRC e IVA podem ter para contraprova do quesito 6.º da BI que se prende com a emissão ou não pela autora das facturas referentes às rendas de Janeiro a Junho de 2005 …”.

Inconformada, veio a autora interpor recurso, recebido como agravo, com subida diferida.

Apresentou a ré articulado superveniente (fls 652/656) no qual alega, em síntese, que, por sentença de 17/7/2006, foi revogada a providência cautelar decretada, decisão essa de que a autora, sem êxito, recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa.

Tendo a ré alegado que tal decisão constitui um facto novo, o qual, conjugado com o art. 387.º-A do CPC lhe confere o direito de deduzir o pedido subsidiário formulado em sede de reconvenção.

Devendo a autora indemnizá-la por ter proposto uma providência cautelar injustificada e, uma vez que já vendeu os veículos, deve indemnizá-la do valor dos mesmos, em € 396 497,00.

Acrescentando factos já alegados na sua contestação e que se prendem com o desgaste da sua imagem comercial com a retirada dos veículos da autora, que contabiliza em € 250 000,00, ao qual deve acrescer o montante a liquidar em execução devido pela perda das receitas, pelo aluguer dos veículos de substituição e pelos juros de mora.

Foi admitido tal articulado superveniente, tendo sido aditados à base instrutória os pertinentes factos (quesitos 21.º a 31.º).

Inconformada com tal despacho, veio a autora do mesmo interpor recurso, admitido como agravo, com subida diferida.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 1845 a 1856 consta.

Foi proferida a sentença na qual se decidiu: a) julgar validamente resolvido o contrato de locação financeira nº 0000 objecto destes autos, com a consequente validação da entrega dos veículos objecto do mesmo à autora.

b) julgar improcedente o pedido de condenação da ré a pagar à autora a quantia de € 131 125,00, dele se absolvendo a ré; c) julgar improcedente o pedido reconvencional formulado pela ré, dele absolvendo a autora; d) julgar parcialmente procedente o pedido de condenação da autora em indemnização decorrente do facto de a providência cautelar ter sido julgada injustificada, por decisão transitada em julgado, condenando a autora a pagar à ré uma indemnização pelos prejuízos causados pela não entrega dos veículos desde o momento em que a providência cautelar foi julgada injustificada até ao trânsito em julgado desta decisão, cujo montante se relega para fixação em liquidação de sentença; e) julgar improcedentes os pedidos de condenação da autora e ré como litigantes de má fé, deles se absolvendo ambas.

Inconformadas, vieram, autora e ré, interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde, por acórdão...

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