Acórdão nº 51/08.7GAMCD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Dezembro de 2011

Magistrado ResponsávelMELO LIMA
Data da Resolução20 de Dezembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

PROCESSO Nº 51.08.7GAMCD.P1P1 RELATOR: MELO LIMA Acordam na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório 1.

Em processo comum, Tribunal Coletivo, pelo Tribunal Judicial de Macedo de Cavaleiros, o MP acusou os arguidos B… e C…, imputando-lhes a prática, em co-autoria material e concurso real, de três crimes de burla qualificada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 217º/1 e 218º/2-a) do C. Penal.

  1. Realizado o julgamento, foi, a final, proferida DELIBERAÇÃO nos seguintes termos: «Acordam os juízes que constituem este Tribunal Colectivo em julgar a acusação parcialmente procedente e provada nos termos sobreditos.

    Consequentemente: 1) Absolvem os arguidos da prática do crime de burla qualificada, na pessoa de D…, que lhes era imputado.

    2) Absolvem o arguido C…, da prática, em co-autoria, do crime de burla qualificada, na pessoa de E…, que lhe era imputado.

    3) Absolvem o arguido B… da prática do crime de burla qualificada p. e p. pela al. a) do nº 2 do art. 218º C. Penal, que lhe era imputado na pessoa de E…; mas, 4) Como co-autor material de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art. 218º/1 C. Penal, na pessoa de E…, condenam o arguido B… na pena de 2 (dois) anos de prisão; 5) Absolvem os arguidos da prática do crime de burla qualificada p. e p. pela al. a) do nº 2 do art. 218º C. Penal, que lhe era imputado, na pessoa de F…; mas, 6) Como co-autores materiais de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art. 218º/1 C. Penal, na pessoa de F…, condenam os arguidos B… e C… na pena de 1 (um) ano e 10 (dez) meses de prisão, cada um; 7) Em cúmulo jurídico, e nos termos do art. 77º C. Penal, condenam o arguido B… na pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual prazo, subordinando-se a suspensão ao pagamento de 3.000,00 € (três mil euros) a E…, no prazo de dois anos a contar do trânsito; 8) Suspendem a execução da pena de prisão aplicada a C…, por igual prazo e subordinando-se a suspensão ao pagamento de 2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros) a F…, no prazo de um ano a contar do trânsito.» 4. Inconformados, recorrem os Arguidos, conjuntamente, rematando a respectiva motivação com as seguintes conclusões: 4.1 Da compatibilidade entre as declarações do Recorrente C…, da testemunha G… e ainda dás do arguido B…, com a testemunha, ofendido e vítima F… resulta que há contradição manifesta.

    4.2 Da compatibilidade das declarações do Recorrente B…, com as testemunhas, ofendido a vítima E… resulta contradição manifesta.

    4.3 O Recorrente B… sofre de doença de Parkinson e é visível o tremor da cabeça e mão direita, situação que não passa despercebida a qualquer pessoa. Esse sinal foi omitido no reconhecimento e no julgamento.

    4.4 Assim foi violado o disposto no art°. 4100. no. 2 a) e c) do CPP porquanto existe insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e erro notório na apreciação da prova.

    4.5 O julgamento foi gravado e o Tribunal da Relação do Porto tem competência para conhecer de facto e de direito.

    4.6 Por isso, deve determinar que:

    1. Atenta a contradição manifesta entre os depoimentos dos intervenientes.

    2. A decisão Acórdão sob recurso deve ser revogada e os Recorrentes absolvidos.

  2. Respondeu, no Tribunal recorrido, o Exmo. Procurador-Adjunto, rematando o respetivo articulado com as seguintes conclusões: 5.1 Vícios do art. 410º n.º 2 do CPP: 5.1.1 Os recorrentes confundem os vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e do erro notório com o erro de julgamento; 5.1.2 O que assim alegam traduz simplesmente a divergência de convicção, contrapondo à do Tribunal a sua pessoal apreciação e valoração das provas, que sempre lhe hão-de parecer insuficientes e incorrectamente julgadas; 5.1.3 Os factos provados suportam completamente a decisão de direito e não se detecta qualquer vicio procedimental que a possa inquinar; 5.2 Em matéria de facto: 5.2.1As provas produzidas na audiência são suficientemente firmes e elucidativas, alicerçando fundadamente a convicção do tribunal no que tange à decisão da matéria de facto, não deixando margem para duvidar razoavelmente de que os arguidos são os autores dos correspondentes crimes, pelos quais foram doutamente condenados; 5.2.2 Destacando-se a seriedade e firmeza dos depoimentos dos ofendidos, confirmados pelos autos de reconhecimento, corroborados, pelos documentos comprovativos dos levantamentos e complementados pela prova indiciária resultante da apreensão ao arguido C…, de uma folha de papel azul de 25 linhas e de 3 elásticos; 5.2.3 Apreensão essa ocorrida quando ambos foram detidos no cometimento posterior de idêntica burla, através do mesmo modus operandi e pela qual foram já doutamente condenados; 5.2.4 Sendo a negação dos arguidos: 5.2.4.1 Muito pouco firme –o B… acabou dizendo e repetindo: “não me lembro de nada”; 5.2.4.2 E muito pouco convincente –o álibi a que o C… se apega (a tradição do almoço no dia de São Martinho em …) é desmentido pelas suas próprias declarações (não almoçou lá em 2007 porque “trabalhava de dia e noite com o N… no transporte dos miúdos para a escola”, nem em 2009 porque “já a empresa estava cessada”; 5.2.4.3 Resultando do documento de fls. 81/82/83: 5.2.4.3.1 Que com o N… trabalhou realmente entre 30-06-1999 e 30-09-2008 e que os rendimentos que declarou a Segurança Social foram praticamente os mesmos nos anos de 2004 a 2007; 5.2.4.3.2 E que no São Martinho de 2008 a empresa de N… onde trabalhava tinha cessado já a respectiva actividade; 5.2.5 O depoimento da testemunha G… contradiz e desmente –disse: “encontrei ocasionalmente o sr. C… … por volta das duas da tarde … bebemos um copo”- ou desmonta completamente –disse: “a minha casa é um pub … [abre às] 9 e 30 da noite e fecha às 4 da madrugada … [e ele] com o N…, de vez em quando passava lá”- o álibi do C….

    5.3 Deve ser julgado improcedente o recurso.

  3. Realizada a requerida audiência, cumpre conhecer e decidir.

    II FUNDAMENTAÇÃO Foi a seguinte a decisão proferida pelo Tribunal recorrido em termos de factos provados, factos não provados e motivação: 1. FACTOS PROVADOS 1.1 O arguido B… tinha conhecido o queixoso E…, num hospital, em data anterior a 22/10/07.

    No dia 22/10/07, de manhã, E… deslocou-se à agência do H…, sita na Rua …, desta cidade de Macedo de Cavaleiros, onde efectuou o levantamento de 6.560,00 € em dinheiro, que pretendia depositar na agência do I… na conta da filha.

    1.1.1 O arguido B…, que se encontrava, nesse momento, na caixa ATM da agência do H…, apercebeu-se desse levantamento, e foi esperar o ofendido E… junto ao ….

    1.1.2 Quando o queixoso E…, que trazia consigo a referida quantia, passou junto a esse local, o arguido B… chamou-o, e ambos começaram a conversar, caminhando até à Rua ….

    1.1.3 Nesse momento, surgiu no local um indivíduo cuja identidade não foi possível apurar, que se aproximou deles, exibindo um saco que aparentava estar cheio de notas de 50 €, e que lhes perguntou se sabiam onde poderia encontrar um certo médico, ao que o arguido B… respondeu que lhe conhecia a empregada e que sabia onde ela morava, prontificando-se a ir falar com ela.

    1.1.4 Para tanto, abandonou o local, deixando ali o queixoso e o indivíduo cuja identidade não se apurou, fazendo menção de ir procurar a tal suposta empregada do médico, e reapareceu pouco depois, sozinho, e dizendo que o referido médico tinha já falecido.

    1.1.5 Então, o referido indivíduo referiu-lhes que uma parte do suposto dinheiro que trazia consigo se destinava a pagar uma dívida do irmão, que padeceria de cancro em fase terminal, para com o J… e que precisava de duas testemunhas com dinheiro que pudessem assistir ao pagamento, perguntando-lhes se o queriam acompanhar.

    1.1.6 Então, o arguido B… referiu-lhe que estava com sorte, tinha encontrado as pessoas certas para testemunhas, visto que, rematou, o ora queixoso também tinha dinheiro.

    1.1.7 Nessa sequência, o referido indivíduo de identidade não apurada referiu que uma vez que a outra parte do suposto dinheiro do irmão se destinava ao médico e que este já tinha falecido, o melhor seria distribui-la pelo ora queixoso e pelo arguido B….

    1.1.8 Porém, referiram tal indivíduo e o arguido B…, era necessário adquirir uma folha azul de 25 linhas, antes de irem ao J…, a fim de formalizarem o pagamento.

    1.1.9 Então, o arguido B… deslocou-se até um quiosque, a fim de comprar tal folha, enquanto o outro indivíduo passou para a mão do queixoso o saco contendo as supostas notas de 50 €.

    1.1.10 Todavia, quando o arguido B… regressou com a folha azul, fingindo claudicar, o outro referiu que era precisa mais uma folha, pedindo então ao queixoso que fosse comprar a segunda folha, visto que o arguido B… se tinha supostamente aleijado.

    1.1.11 Antes de o queixoso ir comprar a folha, pediram-lhe, o arguido B… e o outro indivíduo, que metesse o seu dinheiro no saco, porque ainda o poderia perder.

    1.1.12 O queixoso, como tinha ficado, da primeira vez, com o saco, acedeu, colocou os 6.650 € no saco, que ficou na posse dos outros dois, e foi comprar a folha azul de 25 linhas.

    1.1.13 Porém, quando regressou ao local onde tinha estado com o arguido B… e o outro indivíduo, constatou que estes se tinham ido embora e levado consigo o dinheiro.

    1.2 No dia 11/11/2008, cerca das 13 h., no interior do restaurante K…, em Macedo de Cavaleiros, o arguido C… aproximou-se de F… e estabeleceu conversa com o mesmo, após o que saíram do restaurante, sendo então abordados pelo arguido B…, que com eles iniciou, também, conversa.

    1.2.1 Nessa ocasião, o arguido B… transmitiu ao arguido C… e ao queixoso F… que o seu irmão lhe tinha entregue muito dinheiro, parte do qual seria para ser dado à J…, sendo que a outra parte seria para distribuir, exibindo, debaixo do braço, um embrulho contendo, supostamente, o dinheiro.

    1.2.2 Referiu-lhes ainda que, caso os mesmos tivessem dinheiro no banco, e lho exibissem, lhes pagaria, com aquela parte do dinheiro que era para distribuir, muito mais juros do que...

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