Acórdão nº 1924/10.2TJPRT-C.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 24 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelFILEPE CAROÇO
Data da Resolução24 de Novembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 1924/10.2TJPRT-C.P1 – 3ª Secção (apelação em separado) Juízos Cíveis do Porto Relator: Filipe Caroço Adj. Desemb. Pinto de Almeida Adj. Desemb. Maria Amália Santos Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B…, divorciada, residente na Rua …, …, .°, … Porto, declarada insolvente no processo principal de insolvência por ela requerida, deduziu incidente de diferimento da desocupação de casa de habitação, nos termos do art.º 150º, nº 5, do CIRE[1], alegando, aqui resumidamente, que terá lugar a venda dos seus bens, incluindo a sua casa de habitação, sem que disponha de rendimentos que permitam obter de imediato um outro espaço habitacional, ainda que temporariamente, ou de ajuda de familiares ou amigos.

Apesar do esforço que tem desenvolvido naquele sentido, tem encontrado adversidades resultantes do valor das rendas que lhe são propostas e até da própria declaração de insolvência. Está a diligenciar por habitação social, mas não a obterá de imediato, nem nos meses mais próximos, como resulta da experiência.

Obtém mensalmente um rendimento de € 466,90, exíguo e insuficiente para satisfazer as suas próprias despesas mensais, de cerca de € 484,00.

O C…, S.A. pronunciou-se sobre o requerido. Na sua perspectiva, não pode ter aplicação o disposto no art.º 930º-C[2] do Código de Processo Civil por este normativo apenas se aplicar à execução para entrega de imóvel arrendado, sendo a requerente sua proprietária. Ao caso apenas podem ser aplicadas as disposições do art.º 930º-B, nºs 3 a 6.

Por outro lado, acrescenta aquele Banco e credor reclamante que o prejuízo que advém para a insolvente da desocupação imediata da habitação não é muito superior ao que advém do respectivo diferimento para os credores graduados.

Entende ainda aquele credor que, ainda que a insolvente pudesse, por mera hipótese, invocar a al. a) do nº 2 do art.º 930°-C, teria de caucionar as rendas, conforme se prevê no nº 3 do mesmo artigo, o que só por si demonstra a inaplicabilidade do preceito ao presente caso.

Conclui pela falta de fundamento legal da pretensão da insolvente, a indeferir.

Sobre a questão, pronunciou-se também o Sr. Administrador da Insolvência, mas apenas no sentido de que o requerido tem cabimento legal, e de que, no caso do deferimento da pretensão, dever ser nomeada fiel depositária a própria requerente.

Em despacho fundamentado, a Ex.ma Juiz concluiu pela viabilidade do incidente, assim justificando a designação de uma sessão de prova, com inquirição de testemunhas que teve lugar e na sequência da qual o tribunal deu, motivadamente, como provados determinados factos, de que não houve reclamação.

Foi depois proferida sentença que conheceu do mérito do incidente e cujo dispositivo se transcreve ipsis verbis: «Nessa conformidade e em face de todo o exposto, decide-se julgar procedente o incidente de diferimento de desocupação formulado pela requerente B… e, em consequência, diferir na desocupação da fracção autónoma designada pela letra “B” do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº 3309/20020410 (freguesia de …), sito na Rua …, nº …, .°, no Porto, pelo período de 5 (cinco) meses, que se contará a partir do trânsito em julgado da presente decisão, ficando a requerente constituída depositária do imóvel durante o referido período.».

Inconformada, a credora C…, S.A., interpôs recurso de apelação, onde, alegando, CONCLUIU assim: «1. O presente recurso vem interposto da sentença que julgou procedente o incidente de diferimento de desocupação formulado pela Requerida e, em consequência, diferiu a desocupação da fracção autónoma designada pela letra B do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial do Porto sob o nº 3309, freguesia de …, no Porto, pelo período de cinco meses, o que representa uma incorrecta aplicação da lei ao caso em apreço.

  1. A Insolvente apresentou-se à insolvência em 24 de Novembro de 2010, tendo a sentença declaratória sido proferida em de 14 de Dezembro de 2010.

  2. O aqui Recorrente, reclamou oportunamente os seus créditos sobre a Insolvente os quais, resultam de um contrato de mútuo, vulgarmente designado por crédito à habitação, garantido por hipoteca sobre a fracção pertença da insolvente, e de uma Livrança, tendo tais créditos sido devidamente reconhecidos e, relativamente aos créditos emergentes do contrato de mútuo com garantia de hipoteca, os mesmos estão graduados em primeiro lugar, de acordo com os preceitos da lei substantiva.

  3. Na Assembleia de Credores realizada a 24 de Março de 2011 foi então aprovada a imediata liquidação do activo, do qual faz parte o referido imóvel, e o pagamento aos credores.

  4. Logo de seguida, ou seja, há cerca de quatro meses, a Insolvente apresentou requerimento em que pedia o diferimento da desocupação do imóvel hipotecado ao aqui Recorrente, por dez meses a contar da data do trânsito em julgado da decisão, alegando as dificuldades em obter uma habitação alternativa e a demora em conseguir uma habitação social, invocando para o efeito a aplicação dos artigos 930º-C e 930º-D do Código de Processo Civil, tendo esse diferimento foi-lhe concedido pelo prazo de cinco meses, de acordo com a decisão de que agora se recorre.

  5. Ora, o diferimento da desocupação, no caso de venda judicial (ou em processo de insolvência), está previsto na lei apenas para as circunstâncias enumeradas no artigo 930º-C do CPC, que, sendo um preceito excepcional, apenas se aplica à execução para entrega de imóvel arrendado, o que não é o caso dos autos, pois o imóvel apreendido para a massa é pertença da Insolvente/Recorrida.

  6. À execução para entrega de imóvel ocorrida na sequência de venda judicial – o que será o caso dos presentes autos de insolvência – aplicam-se apenas as normas dos nºs 3 a 6 do artigo 930º-B, conforme resulta do nº 6 do artigo 930º.

  7. Não tem, por isso, aplicação o preceito excepcional que a Insolvente invoca como fundamento do diferimento da desocupação (o artigo 930º-C).

  8. De qualquer modo, alega que o prejuízo que terá com a desocupação imediata é muito superior ao que advém para os credores, o que não é verdade.

  9. E, nesse período de tempo correspondente ao prazo em que é diferida a desocupação, continuam a ser devidas rendas e, por isso, o requerente do diferimento tem de caucionar as rendas. É a contrapartida do diferimento.

  10. No caso concreto, não só não são devidas rendas (porque o imóvel é propriedade da insolvente) e, portanto, a Insolvente não as pode caucionar, como o diferimento da desocupação causa atrasos consideráveis na liquidação do activo.

  11. A verdade é que, com o prolongamento do prazo para desocupação do imóvel, não existirão potenciais compradores para adquirir um imóvel ocupado, pois ninguém apresentará proposta, sabendo que o imóvel não está livre e devoluto de pessoas e bens quando o...

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