Acórdão nº 355/07.6TBOFR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Novembro de 2011
Magistrado Responsável | TELES PEREIRA |
Data da Resolução | 08 de Novembro de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.
Em 08/11/2007[1], a Junta de Freguesia de …, do Concelho de … (A., Reconvinda e Apelada no contexto deste recurso), actuando em defesa do chamado “Baldio das Souças”, situado no lugar de … dessa freguesia, demandou M…[2] e mulher, P… (1ºs RR.), e A e mulher, J… (2ºs RR., Reconvintes e aqui Apelantes), pretendendo obstar à apropriação por estes últimos, na sequência de trato sucessivo que remonta aos 1ºs RR. (estes através de uma escritura de justificação notarial celebrada em 23/02/2006[3] os 2ºs RR. por contrato de compra e venda celebrado com os primeiros em 13/10/2006[4]), de um terreno, que, afirma-o a A., corresponde ao espaço ocupado por um “Baldio”, como tal afecto e utilizado pelos moradores do lugar de … daquela freguesia, desde tempos imemoriais[5].
Em função desta incidência (à qual se juntaria, sempre segundo a A., um corte de quinze pinheiros pelo 2º R no indicado Baldio) formula a A. os seguintes quatro pedidos: “[…]
-
Condenar-se os RR. a reconhecer, assim se declarando, não terem adquirido o direito de propriedade sobre o terreno ou prédio justificado por uma das escrituras e alienado pela outra escritura, dele devendo abrir mão para continuar a ser administrado pelos compartes, através da A., como sua delegada.
Em consequência, B) Declarar-se nulas e de nenhum efeito, ou mesmo ineficazes, quer a escritura de justificação feita pelos primeiros RR., quer a escritura de venda feita por aqueles ao 2º R., ambas juntas aos autos; C) Condenar-se os 2ºs RR. a pagar à A., entidade delegada, a quantia de €1.500,00, respeitante ao dano dos 15 pinheiros cortados e ao lucro cessante (subsidiariamente, na quantia a apurar, até com base na equidade).
D) Ordenar-se o cancelamento imediato das inscrições registais proporcionadas pelas escrituras atrás referidas (art. 8º do Código do Registo Predial).
[…]” [transcrição de fls. 5 e vº] 1.1.
Todos os RR. (o que inclui os habilitados) contestaram, o que fizeram conjuntamente a fls. 67/80, negando a natureza de baldio do terreno em causa (para eles denominado “Cabeço da Souça”), invocando a propriedade deste (isto é, dos dois prédios que o integram), sucessivamente pelos 1ºs RR. (relativamente a estes no que diz respeito ao prédio em causa na escritura de habilitação de fls. 18/20) e pelos 2ºs RR. e o registo em favor destes últimos, sendo que estes (os 2ºs RR.) formularam o seguinte pedido reconvencional: “[…] Deve […] ser julgada provada e procedente a reconvenção do R. A… e esposa e, consequentemente, condenada a A. a reconhecer que eles RR. são os donos e legítimos donos, senhores e proprietários dos prédios identificados no artigo 8º[[6]] […].
1.1.1.
Importa sublinhar neste relato, propiciando desde já a total compreensão do litígio entre a A. e os RR.
, nos termos em que este emergiu da fase dos articulados e alcançou expressão no julgamento, sublinhamos, dizíamos, que, correspondendo a pretensão da A. à afirmação da dominialidade da população de … sobre um determinado Baldio (o “Baldio das Souças”) do qual os RR. se apropriaram. A delimitação espacial deste Baldio foi apresentada na petição inicial como correspondente ao prédio objecto da escritura de justificação notarial de fls. 22/24 (o artigo matricial nº … correspondente à descrição predial nº …). Todavia, como resultado da contestação/reconvenção dos RR., a referenciação dessa delimitação sofreu uma evolução significativa que, embora correspondesse em última análise à mesma realidade indicada na petição, implicou uma ampliação, passando a abranger o prédio colindante com o primeiro, transmitido aos 2ºs RR. pela escritura de compra e venda de fls. 85/88 (o artigo matricial nº … correspondente à descrição predial nº …). O surgimento da referência a este prédio nesta acção resultou da contestação e, em função disso, a sua inclusão no objecto processual decorreu do pedido reconvencional dos 2ºs RR., como resulta do antecedentemente relatado em 1.1. Ou seja, por via do pedido reconvencional, passou a afirmar-se como pertença dos 2ºs RR., antagónica com a existência do “Baldio das Souças”, os dois prédios indicados por estes RR. (o … e o …), passando a afirmação da dominialidade dos RR. sobre estes prédios a corresponder à negação da pretensão da A. de que seja afirmado como Baldio determinado espaço do qual esses 2ºs RR. se afirmam proprietários.
Discute-se nesta acção, pois – como desde sempre ocorreu[7] –, o conteúdo espacial do “Baldio das Souças”, por referência, como se tornou claro findos os articulados, ao espaço correspondente aos dois prédios objecto do pedido reconvencional (… e …). Mas note-se, todavia, que esta asserção de facto já estava factualmente implícita no pedido inicial da A.
(como se veio a tornar claro no julgamento), sendo certo que esta juntou com a petição inicial o documento de fls. 25 (Doc. nº 8), constituído por um levantamento perimetral de GPS do espaço correspondente ao “Baldio das Souças”, no qual este corresponde à soma dos espaços aí identificados como “A” e “B” (750 m2). Isto mesmo foi explicitado pela Exma. Juíza a quo na fundamentação da matéria de facto, nos trechos de fls. 257 e de fls. 259, a propósito da configuração e extensão do Baldio (o que veio a originar os pontos I), J) e L) da matéria de facto adiante referida).
Fica assim explicitado, desde já, um aspecto central desta acção com importante reflexo neste recurso: está aqui em causa o Baldio a que se refere o documento de fls. 25 – o “Baldio das Souças” –, sendo que este abrange os prédios … e … (descrições prediais) registados em nome dos 2ºs RR.
1.2.
Entretanto, retomando o relato da marcha da acção, sublinharemos que foram interpostos pela A.
na fase de instrução e no decurso da audiência, em função de diversas incidências processuais aí ocorridas, dois recursos de agravo interlocutórios (o primeiro a fls. 163 e o segundo a fls. 274), aos quais foi fixado o regime de subida a final, terminando as respectivas alegações com as conclusões seguintes: “[…] [agravo de fls. 163, referido ao despacho de fls. 155, admitido a fls. 211] […]” [agravo de fls. 274, referido ao despacho de fls. 270/272, admitido a fls. 277] … 1.3.
A culminar o julgamento foi a acção decidida através da Sentença de fls. 254/287 – esta constitui a decisão objecto da presente apelação – que, na parcial procedência do pedido da A. (e na total improcedência da reconvenção), formulou os seguintes pronunciamentos decisórios: “[…] - Julga-se parcialmente procedente a presente acção, e em consequência: • Condena-se os RR. a reconhecer, assim se declarando, não terem adquirido o direito de propriedade sobre o terreno ou prédio justificado pela escritura de justificação notarial referida em E) da fundamentação de facto e alienado pela escritura referida em G) da fundamentação de facto, dele devendo abrir mão para continuar a ser administrado pelos compartes, através da A., como sua delegada.
• Declara-se ineficaz a escritura de justificação feita pelos primeiros RR., e referida em E) da fundamentação de facto, e declara-se nulo e de nenhum efeito o contrato de compra e venda feito pelos primeiros RR. aos segundos RR., titulado pela escritura referida em G) da fundamentação de facto; • Ordena-se o cancelamento das inscrições registais correspondentes à inscrição a favor de … e mulher, aludida em F) da fundamentação de facto, e Ap. 1 de 2006/11/06 sobre o prédio rústico descrito sob o n.º …, na Conservatória do Registo Predial de Oliveira de Frades, e Ap. 2 de 2007/11/23 sobre o prédio rústico descrito sob o n.º …, na mesma Conservatória; • absolvendo-se o R. A… e esposa (2.ºs RR.) do demais peticionado.
E - Julga-se totalmente improcedente o pedido reconvencional deduzido pelos RR. A… e esposa contra a A., absolvendo-se a A./Reconvinda do pedido reconvencional.
[…]” [transcrição de fls. 286] 1.4.
Inconformados com este resultado, interpuseram os RR. (a fls. 302) o presente recurso de apelação, motivando-o a fls. 310/330, rematando esta peça com as seguintes conclusões: “[…] 1.4.1.
A Apelada respondeu ao recurso a fls. 336/353, pugnando pelo seu não atendimento, sendo que nos preliminares dessa resposta, invocando o disposto no artigo 684º-A do Código de Processo Civil (CPC), mencionou o seguinte: “[…] [N]estas suas alegações-resposta, como é de lei, a A. e ora apelada também requer subsidiariamente, nos termos das disposições combinadas dos artigos 684º-A e 698º, nº 5, ambos do CPC, que o tribunal de recurso conheça também da nulidade e, assim, das consequências quanto à indemnização pelo dano, resultante este do corte dos pinheiros que, aliás, sempre serviu de fundamento à acção (a condenação de que a declaração é pressuposto, como se disse).
[…]” [transcrição de fls. 336/337] II – Fundamentação 2.
Como sucede com qualquer recurso, o âmbito objectivo deste – e referimo-nos tanto à apelação, enquanto recurso dominante, como aos dois agravos interlocutórios arrastados pela subida a final daquela[8] – é delimitado pelas conclusões com as quais os Apelantes (e também a Agravante) remataram, num e noutro caso, as respectivas alegações (artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1 do CPC), importando decidir as questões colocadas através dessas conclusões – e, bem assim, se se vierem a colocar, as que forem de conhecimento oficioso –, exceptuadas aquelas questões cuja decisão se mostre prejudicada pela solução dada a outras precedentemente apreciadas e decididas nesta instância (artigo 660º, nº 2 do CPC).
É nestes termos que se fixa o âmbito temático da intervenção da instância de recurso.
2.1.
Importará ter presente, no quadro de apreciação que se abre a esta Relação, a subsistência dos referidos dois agravos interlocutórios (admitidos a fls. 211 e a fls. 277, v. nota 8 a este texto), arrastados pela presente apelação e cujo conhecimento deveria ocorrer agora, “[…] pela ordem da sua interposição […]”, como indica o nº 1 do artigo 710º do CPC. Ora, sendo certo que esta...
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