Acórdão nº 298/10.6TAVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Novembro de 2011
Magistrado Responsável | ISABEL VALONGO |
Data da Resolução | 02 de Novembro de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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Relatório 1. No âmbito do processo n.º 298/10.6TAVIS do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Viseu, foi deduzida acusação pública contra o arguido A…, melhor identificado nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de violação de proibições previsto e punido no art. 353.°, do CP.
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Através de despacho judicial proferido em 19/05/2011, foi rejeitada a acusação deduzida pelo Ministério Público por entender que os factos de que vem acusado o arguido não constituem crime, foi determinado o arquivamento dos autos e dado sem efeito o julgamento designado para aquela data.
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Inconformado com o assim decidido, recorreu o Ministério Público, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1ª - Vem o presente recurso interposto da decisão do Mmº Juiz a quo de fls. 76 e ss que deu sem efeito a audiência de julgamento designada e determinou o arquivamento dos autos, por entender que os factos descritos na acusação deduzida pelo MP a fls. 41 e ss não configuram a prática de crime, concretamente do crime de violação de proibições pp pelo artigo 353º do CP, que ao arguido vinha imputado.
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- Porquanto tal decisão violou, por errada interpretação, o disposto no mencionado art. 353 do CP, bem assim como o artigo 69 do mesmo diploma.
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- Na verdade, entendeu o Mmº Juiz a quo que o artigo 353º do CP não abrange a falta de entrega do título de condução para cumprimento da pena acessória de proibição de conduzir, entendendo que aquela obrigação de entrega extravasa o âmbito de tal pena acessória (previsto no artigo 69), o qual se resume á proibição de conduzir (obrigação de non facere).
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- Porém, tal interpretação contraria manifestamente o texto da lei e deixa por explicar as alterações introduzidas pela Lei 59/2007 no artigo art. 353.° do CP.
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- Resultando manifesto da referida alteração que quando o legislador se refere à violação de imposições determinadas por sentença criminal a título de pena acessória, está a abranger a violação da obrigação/imposição de entrega da carta de condução para cumprimento da pena acessória de proibição de conduzir a que alude o artigo 69 do CP.
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- Na verdade, como decorre dos artigos 69°, n° 3, do Código Penal e 500°, n° 2 e 4 do CPP a obrigação (sinónimo de imposição) de entrega da carta de condução é inerente à própria pena acessória de proibição de conduzir, não existindo esta sem aquela.
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- Como decorre de tais normativos, a condenação em pena de proibição de conduzir implica a imposição ao condenado da obrigação de entrega do título de condução.
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- Aliás, a interpretação efectuada pelo Mmº Juiz, salvo o devido respeito por opinião contrária, para além de violar claramente o texto da lei, não tem em conta a unidade do sistema jurídico.
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- Na verdade, segundo tal interpretação teríamos de concluir que o legislador tratava de forma mais benévola a violação da «sanção» de natureza criminal do que a violação da correspondente sanção de natureza contra-ordenacional.
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- Pelo exposto, deve revogar-se a douta decisão em recurso e ordenar-se a sua substituição por outra que determine o prosseguimento dos autos com a designação de data para julgamento do arguido pelo crime de violação de proibições pp pelo artigo 353º do CP, de que vem acusado.
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Exas., no entanto, farão JUSTIÇA!” * 4. Respondeu o arguido, concluindo ( transcrição): “1ª Vem o presente recurso interposto pela Digníssima Sra. Procuradora do Ministério Público, da decisão proferida a fls. 76 e seguintes que deu sem efeito a audiência de julgamento designada e determinou o arquivamento dos autos, por considerar que os factos descritos na Acusação de fls.41-42 não constituem crime.
2a - Não concordamos com a integração dos factos no tipo legal do art.
º 353° do Código Penal como pretende o recorrente.
3a- Só pratica o crime de violação de proibições quem puser em causa o conteúdo material da pena acessória.
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- Os arts. 69º do CP e 500º do C.P.P não cominam expressamente a falta da entrega do título de condução com a prática de qualquer tipo legal de crime, antes neles se prescreve que essa falta dita a sua participação ao Ministério Público.
5a - O cumprimento da pena acessória não ocorre de forma imediata e automática a partir do trânsito em julgado da sentença que a aplicou, mas tão só após a entrega espontânea ou forçada do título.
6a - A alínea b) do art.
º 348° do Código Penal só prevê a prática do crime por cominação da autoridade ou funcionário nos casos de "ausência de disposição legal".
7a - A função de garantia do princípio da legalidade exige que o legislador formule a lei penal de modo preciso e não susceptível de interpretações gravemente díspares, sobretudo quanto à natureza, âmbito e círculo material da conduta proibida.
8a - A falta de entrega da carta constitui obrigação processual do condenado, não punida penalmente que não integra os elementos objectivos do tipo de ilícito do art. 353.° do Código Penal.
9a - A douta Sentença a quo procedeu ao correcto e criterioso enquadramento jurídico-penal da matéria de facto ali dada como provada e não provada e, consequentemente, não violou, interpretou ou aplicou qualquer norma legal em desconformidade com os Ordenamentos Jurídico-Penal, Processual.
Em consequência, deverá o presente recurso ser julgado improcedente, devendo ser integralmente mantida a douta Sentença a quo.” * 5. Admitido o recurso, fixado o respectivo regime de subida e efeito, foram os autos remetidos a este Tribunal.
6. Na Relação, o Ilustre Procurador – Geral Adjunto emitiu douto parecer, concluindo (transcrição): “4. … em face da jurisprudência mais recente desta Relação sobre esta matéria no sentido dos argumentos também defendidos pelo Mm.
º Juiz "a quo ", quer-nos parecer que o seu recurso poderá não proceder.
É que, apesar de terem existido algumas divergências nesta matéria, tem sido também entendimento deste Tribunal da Relação de Coimbra que, no que toca à execução desta sanção acessória de proibição de conduzir, está previsto que, feita a cominação para entrega da carta de condução com vista ao cumprimento da medida de inibição de conduzir, a não entrega da carta de condução...
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