Acórdão n.º 256/92, de 06 de Agosto de 1992

Acórdão n.º 256/92 Processo n.º 405/92 I 1 - O Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores veio, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 278.º da Constituição, requerer a este Tribunal a apreciação preventiva da constitucionalidade das normas constantes do artigo 2.º do decreto legislativo regional aprovado pela respectiva Assembleia Legislativa Regional em 28 de Maio de 1992 e a ele remetido para assinatura e publicação em 23 de Junho de 1992, na parte em que adapta o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 421/83, de 2 de Dezembro, na sua aplicação àquelaRegião.

2 - Fundamenta o requerente o seu pedido baseado nas seguintes considerações: O Tribunal Constitucional, em jurisprudência constante, tem afirmado que, quando as normas emanadas dos órgãos de Governo Regional se limitam a reproduzir, quer literalmente, quer sem alterações relevantes que traduzam qualquer especificidade, as normas constantes de diplomas emanadas dos órgãos de soberania, são aquelas inconstitucionais, uma vez que o tratamento dado à matéria, igual ao já constante da normação advinda dos ditos órgãos, não lhe confere um tratamento legislativo imposto pela configuração que deveria especialmente assumir nas Regiões, consequentemente falecendo, nessas hipóteses, o interesse específico; Que, assente uma tal postura, tendo em conta: a) Que a adaptação pretendida efectuar pelo diploma aprovado pela Assembleia Legislativa Regional através do ora questionado artigo 2.º, relativamente ao que consta do n.º 1 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 421/83, não introduz qualquer alteração significativa em relação à legislação nacional constante daquele n.º 1, que quase reproduz, excepção feita à utilização da expressão 'contrato a termo certo ou incerto' em vez da expressão 'contrato a prazo', utilizada neste último normativo - mas que já devia ser interpretada como abarcando o regime de contrato a termo certo ou incerto, tendo em vista a revogação do Decreto-Lei n.º 781/76, de 28 de Outubro, operada pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, que passou a admitir esse regime -e; b) Que a desejada adaptação do n.º 2 desse mesmo artigo 4.º igualmente em nada inova relativamente a ele, pois se limita a desdobrar esse texto em duas alíneas; então há-de concluir-se que com aquelas adaptações se não introduziu qualquer inovação na ordem jurídica, pelo que, no caso, se não mostra preenchido o requisito do interesse específico que deve credenciar a legislação regional, violando-se, assim, os artigos 115.º, n.º 3, e 229.º, n.º 1, alínea a), da Constituição; As Regiões Autónomas não podem, em caso algum, legislar em matérias reservadas aos órgãos de soberania, como deflui dos já citados artigos 115.º, n.º 3, e 229.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), tendo, a este respeito, o Tribunal Constitucional afirmado, em abundante jurisprudência, que as matérias reservadas à competência própria daqueles órgãos se não circunscrevem às que a lei fundamental explicitamente elenca, pois que também se abarcam nessa competência todas as matérias que reclamem a intervenção do legislador nacional, tendo em vista o carácter unitário do Estado e os laços de solidariedade que devem unir todos os portugueses; Neste enquadramento, e reconhecendo que o n.º 3 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 421/83, desejado adaptar pela norma sub specie, procede a uma reformulação substancial do regime jurídico do trabalho suplementar através da introdução de significativas modificações nos pressupostos da sua prestação, torna-se seguro que a Assembleia Legislativa Regional veio a produzir normação sobre matéria ligada a direitos dos trabalhadores, nomeadamente no que respeita à fixação das condições de trabalho suplementar prestado na Região Autónoma dos Açores, ou seja, num domínio que a Constituição reclama como impondo a intervenção do legislador nacional, desta sorte violando essa normação os aludidos artigos 115.º, n.º 3, e 229.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), da Constituição; Por outro lado, o que se contém nos artigos 13.º do Decreto-Lei n.º 421/83 e 3.º do Decreto-Lei n.º 398/91, de 16 de Outubro, não pode ser considerado como uma credencial legislativa atribuída aos órgãos de governo regional; Acresce que o n.º 3 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 421/83, agora pretendido adaptar pela norma em apreço, além de versar sobre matéria reservada aos órgãos de soberania, no sentido já indicado, ainda infringe a alínea b) do n.º 2 do artigo 59.º da Constituição, na parte em que comete ao Estado a 'fixação, a nível nacional, dos limites da duração do trabalho', infringindo também a alínea a) do artigo 230.º do diploma básico, que veda às Regiões Autónomas 'restringir os direitos legalmente reconhecidos aos trabalhadores', entendida esta expressão 'legalmente' no sentido de incluir não só os direitos constitucionais dos trabalhadores, como ainda os direitos concretizados na legislaçãoinfraconstitucional; A circunstância de a norma agora questionada, ao fazer a adaptação das disposições constantes do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 421/83, ter consagrado soluções idênticas às que já se continham no artigo 3.º do Decreto Legislativo Regional n.º 4-A/86/A, de 11 de Janeiro, não constituirá causa impeditivo da pronúnciasolicitada.

3 - O Presidente da Assembleia Legislativa Regional autora da norma em apreciação, notificado, por intermédio de ofício expedido por fax em 30 de Junho último, nos termos e para os efeitos do artigo 54.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, veio, no dia 6 do corrente mês de Julho, a oferecer resposta na qual propugna pela improcedência do pedido, argumentando, em síntese: Que o decreto em apreço visou dar cumprimento ao artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 421/83, salvaguardando as especificidades da Região Autónoma dos Açores, não sendo, por isso, intenção do legislador regional afrontar os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, antes pretendendo minorar os efeitos negativos que se vinham verificando na economia da Região, onde o índice de desemprego é menos significativo que no resto do País e em que há uma carência de trabalhadores especializados; Que, perante aquela carência, as empresas têm de recorrer ao trabalho suplementar, o que fazem com o fim de minimizar a falta de mão-de-obra especializada, com os consequentes efeitos nas quebras de produtividade e de qualidade dos serviços prestados, o que, a suceder, se reflectiria negativamente na economia da Região; A matéria referente ao trabalho suplementar não se encontra no âmbito da reserva de competência legislativa da Assembleia da República, razão pela qual a Assembleia Legislativa Regional dos Açores teria competência para sobre essa matéria editar normação, dado que se encontra, no caso, presente o interesse específico da respectiva Região; A doutrina que não circunscreve às matérias que constituem reserva legislativa da Assembleia da República e do Governo, consagradas nos artigos 167.º, 168.º e 201.º, n.º 2, da Constituição, as matérias reservadas à competência própria dos órgãos de soberania, conduz a restrições e enfraquecimentos da autonomia regional tal como está constitucionalmente prevista; O decreto em causa teve como objectivo definir as situações em que o recurso ao trabalho suplementar é condição essencial à viabilização das empresas, constituindo, pois, uma adaptação do regime geral à realidade insular açoriana, em obediência aos princípios básicos consagrados na lei fundamental; Uma tal adaptação não restringe os direitos constitucionalmente reconhecidos aos trabalhadores, uma vez que estes detém a faculdade de, existindo motivos atendíveis, solicitar a dispensa do trabalho suplementar.

A adaptação introduzida nos n.os 1 e 2 do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 421/83 não conduziu, de facto, a qualquer alteração significativa relativamente à legislação nacional, sendo intenção do legislador regional tão-somente esclarecer dúvidas de interpretação do diploma em causa, porquanto, de um lado, se limita a transcrever, de forma...

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