Acórdão n.º 52/90, de 30 de Março de 1990

Acórdão n.º 52/90 Processo n.º 173/89 Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional: I 1.º O procurador-geral-adjunto neste Tribunal, como representante do Ministério Público, veio requerer, ao abrigo do preceituado no artigo 281.º, n.º 2 (versão de 1982), da Constituição da República e do artigo 82.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade da norma constante do n.º 2 do artigo 30.º do Código das Expropriações (Decreto-Lei n.º 845/76, de 11 de Dezembro).

Alega que tal norma já foi julgada inconstitucional, por violação dos artigos 13.º, n.º 1, e 62.º, n.º 2, da Constituição, através dos seguintes acórdãos, de que juntacópia: Acórdão n.º 109/88, de 1 de Junho, publicado no Diário da República, 2.' série, n.º 202, de 1 de Setembro de 1988; Acórdão n.º 381/89, de 3 de Maio, publicado no Diário da República, 2.' série, n.º 207, de 8 de Setembro de 1989; Acórdão n.º 420/89, de 15 de Junho, publicado no Diário da República, 2.' série, n.º 213, de 15 de Setembro de 1989.

O Governo, notificado na pessoa do Primeiro-Ministro para, querendo, se pronunciar sobre o pedido formulado, nada veio dizer dentro do prazo do artigo 54.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro.

O processo vem-nos agora para relato, por virtude de vencimento.

II 2.º O Tribunal Constitucional, de acordo com o determinado no n.º 2 do artigo 281.º da Constituição (versão de 1982), 'aprecia e declara ainda, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade ou a ilegalidade de qualquer norma, desde que tenha sido por ele julgada inconstitucional ou ilegal em três casos concretos'.

O processo aplicável à repetição do julgado consta do artigo 82.º da Lei n.º 28/82, podendo a iniciativa do respectivo processo caber ao Ministério Público ou a qualquer juiz do Tribunal, que promoverá a organização de um processo com as cópias das correspondentes decisões, o qual, uma vez concluso ao Presidente do Tribunal, deve seguir os termos dos processos de fiscalização abstracta sucessiva da constitucionalidade ou da ilegalidade que a Lei Orgânica do Tribunal prevê.

Como decorre das decisões juntas aos autos, a norma cuja inconstitucionalidade se pretende ver apreciada e declarada é a constante do n.º 2 do artigo 30.º do Decreto-Lei n.º 845/76, de 11 de Dezembro, diploma conhecido por Código das Expropriações.

Cumpre decidir, apreciando a invocada inconstitucionalidade.

  1. A norma em causa tem a seguinte redacção: O valor dos terrenos situados em zona diferenciada do aglomerado urbano, que, pelas suas condições, sejam insusceptíveis de rendimento como prédios rústicos, não poderá exceder o valor correspondente aos terrenos de médio rendimento da mesma zona ou região.

    Uma questão similar à que vem suscitada nos autos foi já levantada relativamente ao n.º 1 do mesmo artigo 30.º e resolvida pelo Acórdão deste Tribunal de 8 de Junho de 1988 (Acórdão n.º 131/88, publicado no Diário da República, 1.' série, n.º 148, de 29 de Junho de 1988) no sentido da declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade daquela norma, por violação dos artigos 13.º, n.º 1, e 62.º, n.º 2, da Constituição normas estas também invocadas no presente processo.

    O n.º 1 do artigo 30.º do Código das Expropriações tinha a seguinte redacção: 1 - Para efeito de expropriação, o valor dos terrenos situados fora dos aglomerados urbanos será calculado em função dos rendimentos efectivo e possível dos mesmos, atendendo exclusivamente ao seu destino como prédio rústico e ao seu estado no momento da expropriação, devendo tomar-se em conta, porém, a natureza do terreno e do subsolo, a sua configuração e as condições de acesso, as culturas predominantes e o clima da região, os frutos pendentes e outras circunstâncias objectivas susceptíveis de influírem no seu valor, desde que respeitem unicamente àquele destino.

    Para fundamentar a declaração de inconstitucionalidade escreve-se, a dado passo, no citado acórdão: É que essa norma, ao impor que o valor dos terrenos situados fora dos aglomerados urbanos seja calculado em função dos rendimentos efectivo e possível dos mesmos, atendendo exclusivamente ao seu destino como prédio rústico, e só permitindo que se tomem em conta certas circunstâncias objectivas, susceptíveis de influírem no seu valor desde que respeitem unicamente àquele destino, afasta-se não apenas do critério geral daquele Código, contido nos artigos 27.º, n.º 2, e 28.º, mas também dos princípios materiais da Constituição (igualdade e proporcionalidade), já anteriormente referidos, e que não permitem que a indemnização seja irrisória ou desproporcionada.

    E mais adiante escreve-se: [...] a norma do artigo 30.º, n.º 1, do Código das Expropriações, na medida em que impõe um critério de valorização restritivo que não assegura uma adequada restauração da lesão patrimonial sofrida pelos expropriados, acaba também por determinar para estes uma desigualdade de tratamento, impondo-lhes uma onerosidade forçada e acrescida sem a tutela do princípio da igualdade, por inexistência de justificação material para a diferença de tratamento dessas situações, nos termos aí previstos.

  2. Existe entre a situação prevista no n.º 1 do artigo 30.º e aquela que se contempla no n.º 2 do mesmo preceito uma profunda similitude e, por isso, a sua abordagem jurídico-constitucional deverá ser também semelhante.

    Vejamos, pois, se também a norma do n.º 2 do artigo 30.º do Código das Expropriações contende ou não com os preceitos constitucionais dos artigos 62.º, n.º 2, e 13.º, n.º 1.

    O artigo 62.º, n.º 2, da Constituição estabelece: 2 - A requisição e a expropriação por utilidade pública só podem ser efectuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa indemnização.

    Segundo Marcelo Caetano e numa noção clássica, a expropriação por utilidade pública pode definir-se como 'a relação jurídica pela qual o Estado, considerando a conveniência de utilizar determinados bens móveis com um fim específico de utilidade pública, extingue os direitos subjectivos constituídos sobre eles e determina a sua transferência definitiva para o património da pessoa a cujo cargo esteja a prossecução desse fim, cabendo a esta pagar ao titular dos direitos extintos uma indemnização compensatória' (Manual de Direito Administrativo, vol. II, 9.' ed., p. 1020).

    Seja, porém, qual for a noção mais rigorosa de expropriação, o certo é que ela só pode ser efectuada mediante o pagamento de uma indemnização que a nossa lei fundamental quer 'justa', mas sem que nesta lei se estabeleçam os critérios concretos que permitam realizar tal conceito indemnizatório.

    O legislador constitucional deixou, por isso, para o legislador ordinário a definição de tais critérios, os quais sempre terão de respeitar, não só na sua formulação, como na sua concretização, os princípios materiais da Constituição, designadamente o princípio da igualdade e da proporcionalidade.

    O Código das Expropriações, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 845/76, de 11 de Dezembro, dispõe no seu artigo 27.º: 1 - A expropriação por utilidade pública de quaisquer bens ou direitos confere ao expropriado o direito a receber uma justa indemnização.

    2 - A indemnização será fixada com base no valor real dos bens expropriados e calculada em relação a propriedade perfeita, saindo deste valor o que deva corresponder a quaisquer ónus ou encargos, salvo no que se refere à caducidade do arrendamento nos termos do...

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