Acórdão nº 0101/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelCOSTA REIS
Data da Resolução26 de Outubro de 2011
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA A…, S.A.

B…, S.A.

C…, S.A.

Intentaram, no TAF de Loures, a acção administrativa especial pedindo a declaração de nulidade do despacho, de 4/10/2005, do Sr. Director Geral da Empresa, do Ministério da Economia e Inovação, que recusou o pedido de isenção da obrigação de redução dos preços de venda ao público dos medicamentos, ao abrigo do disposto no art.ºs 2.º, 3.º e 5.º da Portaria 618-A/2005, de 27/07, que elas lhe haviam dirigido.

A acção foi julgada totalmente procedente.

Inconformado, o Ministério da Economia e da Inovação interpôs recurso que finalizou do seguinte modo: Sobre o despacho interlocutório 1. A acção é inepta por ser instaurada contra ninguém. Não aplicando o art.º 193º n.° 2 e 201.º do CPC, anulando o processo e a PI, o despacho interlocutório saneador ocorrido na audiência preliminar violou estes preceitos - O despacho deveria ter conhecido também da falta de citação por esta ter sido dirigida à DGE.

  1. A DGE do MEI não é dotada de capacidade judiciária, nem é parte legítima, ao contrário do MEI. Tendo decidido em contrário o mesmo despacho interlocutório é ilegal por desrespeito do art.º 10 n.° 2 do CPTA 3. O acto impugnado na AAE é, o acto de 4 de Outubro de 2005 notificado a 5 de Outubro de 2005, que melhor se identifica no art.º 10 destas alegações, e se encontra no facto provado U da sentença. Identificação que é rigorosa e repetidamente confirmada pelas AA.

    Ainda que este acto impugnado fosse invalidado e removido da ordem jurídica, subsistiria eficaz e válido o anterior acto do mesmo autor de 27-9-2005, provado na alínea E dos fundamentos de facto da sentença e respectivo documento.

    Acto esse que tem exactamente a mesma decisão e teor material do acto impugnado.

    A sentença não pode abranger o primeiro acto e impugnando-se apenas o segundo a lide fosse qual fosse o desfecho, não era susceptível de satisfazer qualquer interesse das AA. Há pois falta de interesse em agir através do meio processual exercido, inutilidade da lide, e ilegitimidade das AA. O segundo acto (o acto impugnado) nem sequer é lesivo por nada adiantar ao primeiro.

  2. A esta conclusão se chega mesmo que se julgasse que o segundo acto é confirmativo do primeiro. Mas o acto impugnado não é meramente confirmativo do primeiro, nomeadamente por ter sido um reexercício do poder de praticar o acto em função de nova instrução promovida pela DGE/DGAE e fornecida pelos AA e Infarmed.

  3. Ainda que o segundo acto fosse confirmativo do primeiro constata-se a falta de lesividade do acto impugnado, e portanto a sua inimpugnabilidade por não ser susceptível de lesar (conforme o art.º 51º do CPTA garante), para além de falta de legitimidade das AA, a falta de interesse em agir e inutilidade da lide.

  4. Por outro lado o pretenso grupo societário de empresas AA não apresentou qualquer pretensão, ao contrário do definido na sentença quando considera as despesas conjuntas das AA para condenar à prática do acto devido. Em coerência com o invocado na causa de pedir só o grupo poderia ser parte legítima para uma pretensão ancorada nas despesas do grupo.

  5. O Estado deve também ser contra-interessado na acção por se verificarem os pressupostos do art.º 57º do CPTA. Verificando-se a preterição de litisconsórcio passivo. Deve também por isto anular-se o despacho interlocutório.

  6. Todas estas questões são de conhecimento oficioso – art.º 495º CPC.

  7. Não reconhecendo a ilegitimidade passiva e activa das partes, a inutilidade da lide, a falta de interesse em agir, a inimpugnabilidade por não lesividade (art.º 51º CPTA) como circunstâncias que obstavam ao prosseguimento do processo, antes decidindo o contrário, o despacho recorrido violou o art.º 89º n°1 em particular a), c), d), f).

    O despacho recorrido deve ser anulado e revogado anulando-se o processado desde a decisão. Mais se deve anular as invocadas nulidades do processo, anulando-se mesmo todo o processado até ao momento onde se verificaram os vícios reconhecidos, voltando-se a decidir desde essa matéria.

    Sobre a sentença 10.

    Delimita-se o recurso sobre a sentença à parte expressa, constante da parte dispositiva da sentença, no pressuposto de que ficou não anulado ou declarado nulo o acto impugnado.

    O que naturalmente exclui do recurso, e assim do poder do TCA Sul, a decisão, que se admite, de não declarar nulo ou anular o acto impugnado. Nesta AAE, tal como a instância e o recurso, não se pode atingir a validade e efeitos do acto de 27-10-2005, já consolidado, pelo qual se nega a isenção às AA conforme provado em “E” da sentença.

  8. A sentença condenou (à prática de um acto que entendeu devido com um certo conteúdo) fora do pedido da acção. Completamente fora do peticionado. E não decidiu expressamente do pedido: foi pedida a declaração de nulidade do acto e não foi concedida! 12.

    Não se invalidando o acto anterior e o acto impugnado, qualquer deles, seria juridicamente impossível condenar como se condenou à prática de acto devido necessariamente incompatível. (Não foi peticionada a condenação à pratica de acto devido que permitisse que uma condenação implicitamente anulasse o acto!) 13.

    Ao decidir a condenação à pratica de acto com determinado conteúdo, que não tinha sido pedida, fora do peticionado e fora dos limites da instância, a sentença incorreu em clara nulidade – art.º 668º n.° 1 e) e d) CPC e 95º n.° 1 CPTA. Condenou em objecto diverso do pedido, e dos limites da instância. E conheceu do que não podia conhecer.

  9. Face ao acto de 27/09/2005 e sua intangibilidade por não impugnado, o acto impugnado era inimpugnável por insusceptibilidade de lesão de direitos e interesses das AA.

    O que ilicitamente também não foi julgado.

  10. A sentença não respeitou nem se ateve aos factos que não deu como provados. Assentou em factos que não estão provados e que não deu como provados, violando o art.º 659.º, n.° 2, do CPC. Quer quanto ao valor quer quanto ao investido por cada A e pelo Grupo societário, quer ter a despesa sido realizada na actividade de I&D, quer a existência de grupo societário, quer as AA serem empresas detentoras de AIM, factos que não podiam ser nem foram admitidos por acordo - pois nem respeitam à entidade administrativa nem esta está investida do ónus da prova mesmo no procedimento administrativo em que nada estava requerido (vd. o provado sob “A “da sentença).

    Factos que são pressupostos de aplicação do art.° 5 da Port. 618A/2005, e que não se provaram.

  11. Para o caso de reapreciação da acção pelo TCA Sul na eventualidade de não se reconhecerem as razões alegadas para negar as pretensões das AA, e por ser essencial deve ser apreciada a prova do valor do investimento na fase I da actividade de I&D de cada uma das AA em 2004. Não houve esse investimento, alega-se.

    A isenção só é reconhecida a quem tenha realizado o valor mínimo estabelecido no art.° 5º da Portaria 618-A/2005.

    As AA não cumpriram o requisito pressuposto no art.° 5.º da Portaria 618A/2005, de terem investido o valor mínimo de 5 milhões de euros.

    Decidindo em contrário a sentença violou esse preceito legal.

  12. O «incluindo fase I» do art.º 5º da Portaria 618A/2005 deve ser interpretado como exigindo necessariamente a fase I (e as correspondentes despesas de investimento) na actividade I&D desenvolvida que é pressuposto da isenção. O sentido literal da norma excepcional aponta claramente nesse sentido. Conforme se alegou.

  13. É que a lei ao longo do art.º 5.º da Port. está a enunciar requisitos necessários para se obter um determinado efeito. Ao arrolar os requisitos numa enunciação de necessidade está a expressá-los indispensáveis e não meramente facultativos. Como seria próprio de uma norma excepcional, como é uma norma de isenção. Ao exigir um «que tenham», salvo sinal em contrário, o preceito está a cumular os requisitos que enunciará. Não é legitimo ver num discurso lógico de enunciação de necessidades (de requisitos) uma inversão lógica, de enunciação de uma faculdade.

  14. Através da especificação «incluindo fase I» a lei tem o cuidado de, para o efeito da isenção, sair da dispensabilidade de cada uma das fases 2, 3 ou 4 para garantir a indispensabilidade da fase I.

    Que as «actividades» desenvolvidas incluíam a fase I era naturalmente adquirido no conceito de «actividades» dotadas de fases.

    Se se destacou a Fase I, especificando-a, necessariamente não foi para repetir o que estava escrito. Nem para manter que irrelevava que qualquer das actividades não tivesse sido desenvolvida desde que outras o fossem. Nem porque poderiam haver razões para se esquecer de integrar a Fase I. Como é óbvio e a numeração garante, se as Fases 2, 3 e 4 estavam incluídas nas «actividades» tinha que haver uma fase 1 dessas actividades.

    O intérprete deve presumir que o legislador não usou de redundâncias inúteis, art.º 9º n.°3 CC.

  15. Para além do elemento de interpretação literal do próprio preceito há um elemento interpretativo que dá a conhecer a finalidade da norma do art.° 5º da Portaria 618-A/2005 e constitui seu enquadramento legal, que é o último parágrafo do preâmbulo da Portaria 618-A/2005. Esse parágrafo do preâmbulo não pode ter a leitura artificiada na sentença. Deve ter a leitura oposta, sendo que a investigação original a que o preâmbulo afirma dever-se a isenção, corresponde a actividade I&D relativa a medicamentos de fase I.

  16. Ainda que o sentido literal do preceito admitisse duas interpretações possíveis (a defendida na sentença, e a defendida pelo recorrente), o que não se concede, por força do último parágrafo do preâmbulo Portaria 618A/2005, a interpretação acima concluída é inevitável.

    Face ao preâmbulo é pois inevitável, que perante as duas interpretações literais do art.° 5º da Portaria 618-A/2005 acima admitidas por mera hipótese de raciocínio, se reconheça apenas procedência à que exige o investimento da Fase I, ou investigação original, como condição de isenção.

  17. É essa a interpretação que faria sentido para que a norma realizasse o seu objectivo...

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