Acórdão n.º 131/2003, de 04 de Abril de 2003

Acórdão n.º 131/2003 Processo n.º 126/2003 Acordam, em plenário, no Tribunal Constitucional: I Relatório 1 - Requerente e pedido O Presidente da República requereu, nos termos do artigo 278.º, n.os 1 e 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e dos artigos 51.º, n.º 1, e 57.º, n.º 1, da Lei sobre Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), a apreciação da constitucionalidade: a) Da norma constante do n.º 8 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1.º do decreto n.º 30/IX da Assembleia da República; b) Da norma constante do artigo 36.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1.º do decreto n.º 30/IX da Assembleia da República.

2 - Fundamentos do pedido 2.1 - Alega o requerente: 'I 1 - Entre outras disposições, o decreto da Assembleia da República n.º 30/IX altera, no que respeita às Regiões Autónomas, a definição legal da delimitação da largura da margem das águas do mar, bem como das águas navegáveis ou flutuáveis sujeitas à jurisdição das autoridades marítimas ou portuárias.

2 - Assim, segundo o disposto no novo n.º 7 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, 'nas Regiões Autónomas, se a margem atingir uma estrada regional ou municipal existente, a sua largura só se estenderá até essa via'. Por outro lado, segundo o novo n.º 8 agora introduzido ao mesmo artigo, 'o disposto no número anterior aplica-se a estradas regionais ou municipais a construir, mediante deliberação dos respectivos governos regionais [...]'.

3 - Uma vez que as margens das águas do mar e de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis, sempre que tais margens lhe pertençam, se consideram legalmente domínio público do Estado, as alterações legislativas em apreço integram, enquanto definição de bens de domínio público, a reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República [artigo 165.º, alínea v), da Constituição].

4 - O citado n.º 8 da nova redacção do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, remete para deliberação dos Governos Regionais a definição da delimitação definitiva da margem quando esta atingir estradas regionais ou municipais a construir. Como esta remissão não tem a necessária densidade normativa e a deliberação dos Governos Regionais se faz, necessariamente, por acto administrativo, suscita-se-me a dúvida se a norma constante desse n.º 8 do referido artigo 3.º não estará, com um tal conteúdo, a violar o princípio da legalidade e da reserva de lei constitucionalmente garantidos.

5 - Na medida em que o persistir da dúvida de constitucionalidade se poderia revelar de significativa gravidade em termos de insegurança das relações jurídicas constituídas ou a constituir ao abrigo da nova regulação, entendo como decisivo o esclarecimento preventivo desta questão por parte do Tribunal Constitucional.

II 1 - Nos termos do artigo 36.º, n.º 1, da nova redacção do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, introduzida pelo artigo 1.º do decreto da Assembleia da República n.º 30/IX, 'os poderes conferidos pelo presente diploma ao Estado cabem nas Regiões Autónomas aos respectivos órgãos de governopróprio'.

2 - Assim, todos os poderes sobre o domínio público hídrico atribuídos pelo Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, ao Estado passariam, nas Regiões Autónomas, a ser da competência dos respectivos órgãos de governo próprio.

Porém, considerando que o domínio público marítimo tem, por natureza, um interesse relevante para a defesa nacional, suscita-se-me a dúvida de constitucionalidade se esta descentralização de poderes não contende com o princípio do Estado unitário, segundo o qual devem ser reservadas aos órgãos de soberania as tarefas e obrigações do Estado, designadamente as atinentes à defesa nacional.' 2.2 - Conclui o requerente, pedindo a apreciação da constitucionalidade: a) Da norma constante do n.º 8 da nova redacção que o artigo 1.º do decreto n.º 30/IX da Assembleia da República dá ao artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, por eventual violação dos princípios da legalidade e da reserva de lei que se obtêm da interpretação conjugada do artigo 112.º, n.º 6, e do artigo 165.º, n.º 1, alínea v), da Constituição; b) Da norma constante do artigo 36.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1.º do decreto n.º 30/IX da Assembleia da República, por eventual violação dos artigos 6.º, n.º 1, e 273.º, n.º 1, da Constituição.

3 - Resposta do órgão autor das normas Notificado o Presidente da Assembleia da República, nos termos e para o efeito do preceituado nos artigos 54.º e 55.º da Lei do Tribunal Constitucional, limitou-se o mesmo a oferecer o merecimento dos autos e a juntar os exemplares do Diário da Assembleia da República que contêm os relatos dos trabalhos preparatórios do diploma em apreciação.

4 - As normas questionadas É o seguinte o teor dos preceitos do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1.º do decreto n.º 30/IX da Assembleia da República, remetido à Presidência da República para ser promulgado como lei, cuja apreciação da constitucionalidade vem requerida ao Tribunal Constitucional: 'Artigo 3.º Noção de margem; sua largura 1 - ....................................................................................................................

2 - ....................................................................................................................

3 - ....................................................................................................................

4 - ....................................................................................................................

5 - ....................................................................................................................

6 - ....................................................................................................................

7 - ....................................................................................................................

8 - O disposto no número anterior aplica-se a estradas regionais ou municipais a construir, mediante deliberação dos respectivos Governos Regionais, após parecer das autarquias locais envolvidas, da autoridade marítima e portuária da administração regional competente e da respectiva capitania do porto.

Artigo 36.º Entidades competentes nas Regiões Autónomas 1 - Os poderes conferidos pelo presente diploma ao Estado cabem nas Regiões Autónomas aos respectivos órgãos de governo próprio.

2 - ....................................................................................................................

5 - Outras normas relevantes Todavia, com interesse para a dilucidação das questões de constitucionalidade a resolver, apresentam-se outros preceitos do diploma em apreço: 'Artigo 3.º Noção de margem; sua largura 1 - Entende-se por margem uma faixa contígua ou sobranceira à linha que limita o leito das águas.

2 - A margem das águas do mar, bem como a das águas navegáveis ou flutuáveis sujeitas à jurisdição das autoridades marítimas ou portuárias, tem a largura de 50 m.

3 - A margem das restantes águas navegáveis ou flutuáveis tem a largura de 30m.

4 - A margem das águas não navegáveis nem flutuáveis, nomeadamente torrentes, barrancos e córregos de caudal descontínuo, tem a largura de 10 m.

5 - Quando tiver natureza de praia em extensão superior à estabelecida nos números anteriores, a margem estende-se até onde o terreno apresentar tal natureza.

6 - A largura da margem conta-se a partir da linha limite do leito. Se, porém, esta linha atingir arribas alcantiladas, a largura da margem será contada a partir da crista do alcantil.

7 - Nas Regiões Autónomas, se a margem atingir uma estrada regional ou municipal existente, a sua largura só se estenderá até essa via.

8 - ....................................................................................................................' Artigo 5.º Condição jurídica dos leitos, margens e zonas adjacentes 1 - Consideram-se do domínio público do Estado os leitos e margens das águas do mar e de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis, sempre que tais leitos e margens lhe pertençam, e bem assim os leitos e margens das águas não navegáveis nem flutuáveis que atravessem terrenos públicos do Estado.

2 - Consideram-se objecto de propriedade privada, sujeitos a servidões administrativas, os leitos e margens das águas não navegáveis nem flutuáveis que atravessem terrenos particulares, bem como as parcelas dos leitos e margens das águas do mar e de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis que forem objecto de desafectação ou reconhecidas como privadas nos termos destediploma.

3 - ....................................................................................................................

4 - ....................................................................................................................

Artigo 7.º Avanço das águas 1 - ....................................................................................................................

2 - Se as parcelas privadas contíguas a leitos dominiais forem invadidas pelas águas que nelas permaneçam sem que haja corrosão dos terrenos, os respectivos proprietários conservam o seu direito de propriedade, mas o Estado pode expropriar essas parcelas.

Artigo 9.º Constituição da propriedade pública sobre parcelas privadas de leitos ou margens públicos 1 - Em caso de alienação, voluntária ou forçada, por acto entre vivos, de quaisquer parcelas privadas de leitos ou margens públicos, o Estado goza do direito de preferência, nos termos dos artigos 416.º a 418.º e 1410.º do Código Civil, podendo a preferência exercer-se, sendo caso disso, apenas sobre a fracção do prédio que, nos termos dos artigos 2.º e 3.º deste diploma, se integre no leito ou na margem.

2 - O Estado pode...

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