Acórdão nº 2716/06.9TBGRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução21 de Novembro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

  1. RELATÓRIO.

A...

foi condenado, por decisão da Delegação Distrital de Viação da Guarda, pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelos arts. 27º, nº 1, 138º, 143º, 145º, nº 1, b) e 147º, do C. da Estrada, na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 60 dias.

Inconformado, o arguido interpôs recurso de impugnação judicial para o Tribunal Judicial da comarca da Guarda, no qual sustentou, em síntese: - Não era na data da infracção, dono do veículo, nem foi identificado na sequência da infracção.

- Vendeu o veículo, em Agosto de 2005, a B... sendo este, presumivelmente, quem o conduzia, na data da infracção.

- É assim, totalmente alheio à infracção, dela devendo ser absolvido.

Liminarmente admitido o recurso, foram notificados o arguido e o Ministério Público, para os efeitos do art. 64º, nº 2, do Dec. Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, tendo-se aquele oposto a que o recurso fosse decidido por despacho.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou improcedente o recurso, mantendo a decisão recorrida nos seus precisos termos.

*Recorre agora o arguido para este Tribunal da Relação, formulando no termo da motivação, as seguintes conclusões: “ (…) I - O juízo interpretativo de subsunção da factualidade vertida ao direito, produzido pelo Meritíssimo Juiz a quo, conduz a uma solução desconforme aos preceitos e princípios constitucionalmente consagrados.

II - Quem conduzia o veículo no dia e hora da prática dos factos era uma pessoa ligada à firma C... Lda., compradora do veículo, portanto uma terceira pessoa que não o arguido. De forma alguma poderá ser considerada como "irrelevante" como o faz a Douta Sentença, a prova documental e testemunhal produzida nos autos pelo Arguido.

III - A interpretação da norma do nº 4 do artigo 175° do Código da Estrada, no sentido da responsabilidade contra-ordenacional depois de o Arguido ter pago a multa, ainda que por mero lapso, não poder ser atacada, e ainda a presunção derivada da qualidade de proprietário constante do registo, quando pode resultar provado em audiência de julgamento que foi um terceiro o responsável pela matéria contra-ordenacional em causa, é ferida de inconstitucionalidade, por violação do princípio da culpa, consagrado nos artigos 1° e 25°, nº 1, da Constituição da República Portuguesa.

IV - O recorrente não praticou qualquer acto integrador da contra-ordenação por que se viu sancionado, a sanção foi-lhe imposta apenas com base na ficção legal de que ao pagar a multa se presume que era ele o condutor infractor e de que o proprietário de um veículo é inelutavelmente o seu condutor, desde que não identifique outrem, como tal.

V - Excede em razoabilidade e mesmo em termos de legalidade que seja dada a essa presunção a qualificativa de iniludível, inatacável, não admitindo prova em contrário: presunção “juris et de jure”.

VI - As presunções são meras ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido, estas ilações são, por via de regra, ilidíveis mediante prova em contrário atento que, salvo casos excepcionais, previstos na lei, são presunções “tantum júris”, ou dizendo de modo similar o nº 2 do art. 350º do Código Civil considera excepcionais as presunções “juris et de jure".

VII - Ao Arguido não devia ter sido cerceada a possibilidade de comprovar nos autos que era outra pessoa a efectiva dona do e outra pessoa a condutora do veículo, sendo todo o seu esforço probatório - documental e testemunhal - apelidado de irrelevante, em função da presunção do art. 175º, nº 4, da qual foi feito uso ilegítimo e a qual foi ilidida, vertendo-se o sancionamento numa responsabilidade meramente objectiva, de todo inviável, por inadmissível.

VIII - A sentença a quo denota total ilogicidade entre a consequência da falta/omissão/não indicação dos elementos do verdadeiro condutor em prazo e do pagamento da multa, com a cominação da responsabilização pelo facto praticado por outrem devidamente identificado. Em coerência silogística, entender-se-ia tão só que a consequência da falta/omissão - não indicação dos elementos do verdadeiro condutor - fosse a de desobediência com a consequência vertida no Código da Estrada, e não a de responsabilização pelo uso da viatura, como decorre da interpretação do Meritíssimo Juiz a quo.

IX - De igual, modo a interpretação restritiva do nº 4 do art° 175º que faz a Douta Sentença de que uma vez paga a multa, esse facto é absoluto, e o Arguido nada pode fazer, tomando-se a sanção de inibição inelutável, é uma visão distorcida e cerceadora da lei, até porque o próprio facto de onde deriva a presunção infame - isto é o pagamento da multa -, pode...

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