Acórdão nº 2015/07.9TBMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Outubro de 2011

Magistrado ResponsávelFILIPE CAROÇO
Data da Resolução20 de Outubro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 2015/07.9TBMTS.P1 – 3ª Secção (apelação) Relator: Filipe Caroço Adj. Desemb. Pinto de Almeida Adj. Desemb. Maria Amália Santos Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B… – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A., pessoa colectiva nº ………, com sede na Rua …, .. – …. … Lisboa, intentou acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra: 1. C…, S.A., pessoa colectiva nº ………, com domicílio no … – …, Estrada Nacional … – … – …, ….-… Matosinhos; e 2. D…, LDA., pessoa colectiva nº ………, com domicílio no …, …., ….-… …, …, alegando essencialmente que, na qualidade de seguradora da E…, S.A., pelo risco de transporte da mercadoria que aquela produzia e vendia, a indemnizou pelo valor dos bens (€ 22.914,61) que terão sido furtados do camião durante o transporte para uma empresa cliente da sua segurada, no Reino Unido.

Para a realização daquele transporte entre Portugal e aquele país a sua segurada contratou os serviços da 1ª R., que, por sua vez, contratou a 2ª R. que, efectivamente, o realizou, competindo ao transportador entregar a mercadoria no destino, tal como a recebia.

Porém, de 326 volumes transportados, apenas chegaram 29 por, aparentemente, essa mercadoria ter sido furtada durante a viagem de camião.

Acrescenta que ao pagar à sua segurada ficou sub-rogada nos direitos desta contra o “terceiro causador do sinistro”, ou seja contra as R.R., cuja responsabilidade é solidária. Ao valor da indemnização acrescem os juros de mora, à taxa lega.

Culmina a petição inicial com o seguinte pedido: «Nestes termos, deve a presente acção ser julgada procedente, por provada, e as R.R. condenadas a pagar à A. a quantia de Euros 22.914,61, (vinte e dois mil novecentos e catorze Euros e sessenta e um cêntimos) acrescida de juros vincendos até integral pagamento, conforme peticionado, e bem assim, custas, procuradoria e o mais legal.» Citada, a 1ª R. começou por dizer que prossegue actividade transitária e deduziu incidente de intervenção acessória da Companhia de Seguros F…, S.A. alegando que, em cumprimento do mandato que a E…, S.A. lhe conferiu, celebrou um contrato de transporte rodoviário com um transportador, não sendo, a contestante, responsável pelos prejuízos emergentes do furto de mercadoria que aconteceu no percurso do transporte.

Caso assim não se entenda, enquanto empresa transitária, celebrou um contrato de seguro com aquela companhia de seguros destinado a garantir a responsabilidade civil por danos causados no exercício da actividade a clientes ou a terceiros. Por isso, chama-a à acção por lhe assistir o direito de regresso contra ela para ser indemnizada do prejuízo que lhe cause a perda da presente demanda.

Na contestação, propriamente dita, defendeu-se por excepção e por impugnação.

Pela primeira via, invocou a prescrição do direito da A. e a ilegitimidade passiva da contestante.

Quanto ao primeiro fundamento, alegou que decorreu o prazo de 10 meses a contar da data da conclusão da prestação de serviços contratados entre a segurada da A. e a R. enquanto transitária, a que se refere o art.º 16º do Decreto-lei nº 255/99, de 7 de Julho (Estatuto Regulamentar da Actividade Transitaria), pelo que prescreveu o direito de indemnização a que a A. se arroga nesta acção.

Relativamente à ilegitimidade, entende que, enquanto transitária, a sua actividade se limitou ao desempenho de um contrato de expedição, interpondo-se entre o carregador e o transportador, na sequência da solicitação daquele para que se encarregasse de celebrar o contrato de transporte pretendido. Aquele contrato é um mandato pelo qual, enquanto transitário, se obrigou a celebrar um contrato de transporte por conta do expedidor-mandante, sem poderes de representação, por falta de procuração, assim, sob a disciplina dos art.ºs 1180º a 1184º do c e art.ºs 266º e seg.s do Código Comercial.

Foi no uso destes poderes que a contestante, em nome próprio, mas por conta do seu cliente, como expedidora, contratou a 2ª R. para a realização do transporte internacional rodoviário das mercadorias, sendo desta, enquanto transportadora, e não da contestante, a responsabilidade pela perda de mercadoria entre o momento do carregamento e a entrega no destino.

Com efeito, a 1ª R. enquanto «transitário é um simples encarregado do comitente (expedidor) para a celebração de um contrato de transporte, e como tal não assume nenhuma responsabilidade pessoal em ordem à execução do transporte. Não assumiu perante a cliente da Autora a obrigação de entrega, mas tão só a de contratar. E se o contrato de transporte foi efectivamente incumprido, a responsabilidade pelos danos emergentes desse incumprimento tem de ser aferida no contexto do obrigado no transporte e naturalmente assacada ao transportador. Daí a ilegitimidade da 1ª R., acrescenta.

Por via da impugnação, a 1ª R. alega que a quantia peticionada é superior ao valor da mercadoria efectivamente perdida. O valor da mercadoria em falta, 297 cartões é, conforme as facturas que a acompanhavam, de GBP 14.178,78.

Sendo o câmbio oficial do Banco de Portugal daquela moeda, à data da emissão da respectiva nota de crédito, de 0,6946 por euro, o valor da mercadoria cifra-se em € 20.412,87 (14.178,78 X 0,6946).

Encerra a sua defesa solicitando o deferimento do chamamento, a procedência das excepções que invocou e a improcedência da acção, com a sua absolvição do pedido.

A 2ª R. também contestou a acção, impugnando parte dos factos alegados na petição inicial.

Alega que não tem qualquer responsabilidade na perda parcial da mercadoria porque foi furtada durante a execução do transporte em circunstância que o transportador não podia evitar e a cujas consequências não podia obviar. Concretamente, enquanto, durante a noite, o motorista dormia na cabine do camião, num parque de repouso, vigiado e com boa luminosidade, junto a uma estrada nacional, em Inglaterra, rasgaram a lona que cobria o semi-reboque e por ali subtraíram a mercadoria. E tal como o camião da R., outros camiões foram ali assaltados naquela noite, nada fazendo prever que o semi-reboque pudesse ser alvo de furto naquele local.

Acrescenta que se tratou de uma situação inevitável e imprevisível tendo em conta o modus operandi dos assaltantes.

Por outro lado, a mercadoria tinha o valor de GBP 14.178,78, constante da nota de crédito alegadamente enviada à cliente da A. Sendo o câmbio oficial do Banco de Portugal na data da referida nota de crédito era de 0,6946, o valor correcto da mercadoria era de € 20.412,61.

Pugnou pela improcedência da acção, com absolvição da R. do pedido.

A A. replicou.

Quanto à contestação da 2ª R., alega que o desaparecimento da mercadoria não ocorreu devido a circunstâncias que a 2ª R. não podia evitar e cujas consequências não podia obviar, uma vez que bastaria ter utilizado um outro tipo de semi-reboque, ou parado o veículo transportador num parque fechado e vigiado para evitar o furto, tendo a mesma R. aceitado, implicitamente, a sua responsabilidade pelo acidente em causa, ao reconhecer os perigos do transporte que efectua e a necessidade de cobertura de seguro CMR. Entende que deve improceder a excepção de exclusão de responsabilidade invocada pela 2ª R.

No que respeita à contestação da 1ª R., alega que esta assumiu o transporte da mercadoria da segurada da A., tendo subcontratado esse transporte com a 2ª R. Como transportadora, não só tem legitimidade passiva, como devem ser aplicados os prazos de prescrição constantes da Convenção CMR que, no caso, é de um ano, nos termos do respectivo art.º 32º, nº 1.

A acção foi expedida para o Tribunal de Matosinhos em 28.2.2007, com pedido de citação urgente. Tendo a mercadoria chegado ao seu destino, embora com faltas, em 9 de Março de 2006, a presente acção foi instaurada em tempo.

Concluiu no sentido da improcedência das excepções invocadas.

Deferido o chamamento da Companhia de Seguros F…, S.A. ao abrigo do art.º 331º, nº 2, do Código de Processo Civil, foi a mesma citada, oferecendo a contestação de fl.s 142 e seg.s, pela qual invocou também a prescrição do direito de indemnização da A. pelo decurso do prazo de 10 meses a que se refere o art.º 16º do Decreto-lei nº 255/99, de 7 de Julho, respeitante à responsabilidade do transitário.

Mais invocou a ilegitimidade das R.R. C…, S.A. e F… – Companhia de Seguros, S.A., essencialmente, com os argumentos expendidos na contestação da 1ª R. sua segurada.

Impugnou parcialmente os factos da petição inicial e defendeu que o furto ocorrido no veículo da segunda R. é uma circunstância que o transportador não podia evitar e a cujas consequências não podia obviar, por não ser previsível que o furto fosse ocorrer nas condições em que estava parqueado o veículo que efectuava o transporte.

Defende ainda a correcção do valor da mercadoria furtada nos termos em que as R.R. o fizeram nas suas contestações.

Termina no sentido de que se julgue a acção improcedente.

A A. replicou à matéria de excepção invocada pela interveniente B…, SA, dando como reproduzida a réplica anteriormente apresentada em resposta às mesmas excepções, acrescentando, porém, que o início do prazo prescricional só começa a correr quando o direito pode ser exercido (art.º 306º, nº 1, do Código Civil), como tal, apenas na data em que a A. indemnizou a sua segurada, ou seja, em 19.5.2006. Com efeito, devendo a prescrição considerar-se interrompida a 6.3.2007, nos termos do art.º 323º do Código Civil, o prazo de 10 meses invocado pela interveniente para o exercício do direito ao abrigo do art.º 16º do Decreto-lei nº 255/99, de 7 de Julho ainda não tinha decorrido.

Quanto à questão da legitimidade, acrescenta ao já anteriormente aduzido, que nem na hipótese --- que continua a não aceitar --- da 1ª R. ter agido exclusivamente na qualidade de transitário ela deixaria de ser parte legítima, responsável perante a A. pelo incumprimento dos contratos celebrados com terceiro, independentemente de ter actuado com ou sem representação, por tal resultar do disposto no artigo 15°, nº 1, daquele...

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