Acórdão nº 331/08.1GCSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Setembro de 2011
Magistrado Responsável | JOSÉ MARIA MARTINS SIMÃO |
Data da Resolução | 12 de Setembro de 2011 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam, em Conferência, os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I- Relatório Nos presentes autos de processo comum singular, com o número acima mencionado do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Setúbal, a acusação foi julgada procedente por provada e em consequência o arguido L, foi condenado como autor material de um crimes de maus tratos a cônjuge, previsto e punido pelo art. 152º nº 1 e 2 do Código Penal, na pena de um ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sob condição de pagar à assistente, no prazo de seis meses, a quantia a que se alude no parágrafo que se segue.
O pedido cível foi julgado parcialmente procedente, tendo o arguido sido condenado a pagar à assistente (…) a quantia de € 8.000, improcedendo no demais o pedido; Inconformado o arguido recorreu, tendo concluído a motivação do seguinte modo: “1ª- O arguido ora recorrente foi condenado pelo crime tipificado no art. 152º nº 1 e 2 do C.Penal, numa pena de prisão suspensa embora nos termos do art. 50º do C. Penal.
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- Ora a sentença proferida, ao dar por verificados os elementos objectivos exigidos pelo art. 152º nº 2 do C.Penal por referência ao seu nº1 al. a) com base em factos não enunciados na enumeração dos factos provados da fundamentação enferma do vício previsto no art. 410º nº 2 al. b) do CPP, que não é possível vencer de outro modo salvo pela realização de novo julgamento após reenvio.
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- O recorrente entende que, salvo o devido respeito, houve factos que foram incorrectamente julgados, havendo provas que justificariam decisão contrária aquela outra que foi proferida: Facto 2.- da matéria provada [ todo o seu enunciado] pois foi valorada de forma genérica e conclusiva sem se ter apurado o lugar, o tempo, a motivação da prática dos factos e quais as suas circunstâncias relevantes e a adquirida por um depoimento sem credibilidade e sugestionado.
Provas que justificam decisão contrária Declarações do arguido [ 20100621095600 306012 65172 html] Depoimento da testemunha C [ 20100621095600 306012 65172.html] Facto 3. – da matéria provada [ na parte em que enuncia que o recorrente disse à primeira que lhe batia] pois que nenhuma testemunha referiu este facto.
Depoimento da testemunha (…) [ 20100621095600 306012 65172.html] Depoimento da testemunha (…) [ 20100621095600 306012 65172.html] Factos 12., 13., 14., 15. e 17. – da matéria provada [ na totalidade do seu enunciado] pois estão em contradição com os factos 3., 4. e 5 da enumeração da matéria não provada da fundamentação.
Provas que justificam decisão contrária A factualidade não provada enunciada nos pontos 3., 4. e 5.
Factos 6. 7. - da matéria não provada [ na totalidade do seu enunciado] pois a própria testemunha (…) refere que entrou em casa do pai para evitar alguma situação de agressão e que se sentou no topo da mesa ao lado do sofá onde o pai estava deitado tendo pegado numa faca, e que tendo confrontado o seu pai, recusando-se a sair da casa dele, no auge de discussão entre ambos admite ter batido com a faca na mesa que se encontrava junta ao sofá, onde o pai se encontrava. Pegar numa faca, mantendo-a na mão e bater com a mesma numa mesa junto do arguido, nas circunstâncias e do modo como descreve, este depoimento tem de ser valorado com provocação e ameaça.
Provas que justificam decisão contrária Depoimento da testemunha (…) [ 20100621095600 306012 65172.html] Declarações do arguido [ 20100621095600 306012 65172. html] 4ª – Pelo exposto a douta sentença proferida enferma do vício previsto no art. 410 nº 2 al. c) do CPPenal quanto aos factos dados como provados e que agora se pretende sejam considerados não provados, bem como, quanto aos factos não provados e que agora se pretende sejam considerados provados.
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- Também relativamente a este vício deve ordenar-se a realização de novo julgamento, após reenvio (art. 426º do CPP), ou caso assim não seja o doutamente entendido, deve o recorrente ser absolvido da prática do crime de maus tratos a cônjuge, p. e p. pelo art. 152º nº 1 e 2 do C.Penal e antes condenado pela prática do crime p. e p. no art. 143º em pena de multa.- 6ª- A douta sentença recorrida violou os arts. 283º nº 3 al. b) e 410º nº 2 als. b) e c) do CPP, 32º da CRP e 152º nº 1 e 2 do C.Penal.
Nestes termos, deve ser proferido douto Acórdão a ordenar o reenvio do processo para novo julgamento, ante a referida contradição insanável da fundamentação e do erro notório na apreciação da prova, ou, caso assim não seja o doutamente entendido, deve ser decretada absolvição do ora arguido por ausência de factos, que sejam pressupostos suficientes da sua responsabilização criminal da prática de crime de maus tratos a cônjuge, como é de Justiça”.
O Digno Procurador Adjunto respondeu ao recurso pugnando pela manutenção da decisão recorrida.
A assistente respondeu ao recurso dizendo: “1. A sentença recorrida não padece do vício de contradição insanável entre a fundamentação e a decisão.
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Desde logo, tal vício só se compreenderá por um mero lapso de escrita do Mmo Juiz “ a quo”, ou por ter elaborado a sentença provavelmente sobre decisão diversa e por desatenção de correcção final do texto.
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Pois que, em momento algum, nem mesmo na acusação se refere os anos de 1998 e inícios de 2001, mas sempre e como foi dado como provado no ponto 2 dos factos o momento é, “Desde data não concretamente apurada, aproximadamente no ano de 2004…” 4.Pelo que e como se vê trata-se efectivamente de um lapso.
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Os lapsos corrigem-se, sem necessidade de reenvio para novo julgamento, o que deverá ser feito.
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Assim como não padece a decisão do vício de erro notório na apreciação da prova.
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O arguido vem alegar que existem provas que justificariam decisão contrária àquela que foi proferida, contudo não cumpre os requisitos do art. 412º, nº 4 do CPP.
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Uma vez que competia ao arguido indicar concretamente as passagens em que se funda a sua impugnação.
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O que não fez, pois limitou-se a fazer referência ao CD, sem especificar qual ou quais os pontos concretos da prova que importariam decisão diversa.
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Quanto à alegada contradição existente entre os factos 12, 13, 14, 15 e 17 da matéria dada como provada com os factos 3, 4 e 5 da matéria dada como não provada, não se vislumbra qualquer contradição entre os mesmos.
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Em resposta aos factos 6 e 7 da matéria não provada e que o arguido entende ter resultado da prova produzida matéria que implicaria decisão contrária, não obstante o arguido transcrever partes do depoimento da testemunha C , o mesmo já não fez quanto às declarações do arguido.
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Ora, mais uma vez o arguido não indica concretamente as passagens em que funda a sua impugnação, pelo que se desconhece qual é efectivamente a prova que implicaria decisão diversa.
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O facto 6 só poderia ser dado como não provado, uma vez que a testemunha afirmou peremptoriamente que não fez qualquer gesto que pudesse ser entendido como qualquer tipo de ameaça.
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Quanto ao facto 7 também do depoimento da mesma testemunha, claramente se verifica que a sequência factual e o momento em que o arguido agarra a cadeira é distinto da faca.
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Fundamentação que a douta sentença claramente motiva.
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Ao condenar o arguido, como autor de um crime do art. 152º, nº 1 e 2 do CP, entendemos que a douta sentença recorrida não se mostra passível de qualquer censura”.
Nesta Relação, a Exma. Procuradora Geral Adjunta emitiu o seu douto parecer no sentido da procedência parcial do recurso.
Observado o disposto no artº 417º, nº 2 do CPPenal o arguido não respondeu.
Procedeu-se a exame preliminar.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
II- FUNDAMENTAÇÃO Discutida a causa resultaram provados os seguintes factos: O arguido é casado com (…) há cerca de 33 anos, tendo desta relação nascido duas filhas; Desde data não concretamente apurada, mas aproximadamente no ano de 2004, o arguido em diversas ocasiões desferia murros e pontapés em (…) e apelidava-a de «puta»; No dia 6 de Julho de 2008, pelas 19H00, no interior da residência do casal, (…), o arguido começou a discutir com (…)e a filha de ambas, (…), dizendo à primeira que lhe batia; Em determinado momento, procurou o arguido atingir a sua filha com uma cadeira, ao que (…) tentou agarrar, por trás, o arguido de modo a impedir o seu propósito; Então, o arguido desferiu, com a cadeira, uma pancada em (…), atingindo-a no peito; Em consequência, a (…) sofreu contusão da parede torácica, hematoma na região frontal e na mama, escoriações nos lábios e cotovelo, lesões que demandaram 15 dias de doença, sem incapacidade para o trabalho; O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, com o propósito de molestar física e psiquicamente (…), atingindo-a na sua integridade física e moral, o que conseguiu; Sabia que a conduta empreendida não lhe era permitida e constituía crime; Como consequências das lesões referidas, a demandante teve muitas dores; Durante esse período, a demandante teve dificuldade em fazer a sua vida normal, atentas as dores que tinha, nomeadamente conduzir, levantar pesos, dificuldade em movimentar os braços; A demandante teve que tomar medicação, mormente analgésicos, e colocar gelo nas zonas negras; Tanto estas lesões, como as que resultaram de outros actos perpetrados pelo arguido contra a sua pessoa ao longo dos anos, a demandante tentava...
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