Acórdão nº 605/98 de Tribunal Constitucional (Port, 21 de Outubro de 1998

Data21 Outubro 1998
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

Procº nº 97/98.

  1. Secção.

Relator:- BRAVO SERRA.

I

1. Não tendo, por despacho proferido em 23 de Setembro de 1997 pelo Juiz do Tribunal de comarca de Tondela, sido admitido o recurso que, por A. C., foi interposto da sentença que, nos autos pendentes por tal Tribunal e requeridos pelo Banco C...,S.A., decretou a sua falência, reclamou aquele para o Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra.

Na peça processual consubstanciadora da reclamação, suscitou o reclamante que, "[s]e se sufragasse uma interpretação do citado Artº. 129º Código da Falência, ou se se interpretasse qualquer outra norma deste Código, no sentido da interdição da possibilidade de recurso da sentença declaratória da falência, tal interpretação, tal regime de irrecorribilidade representaria a violação de preceitos constitucionais", "entre outros, os Artº. 2º, Artº 9º, alínea b), Artº. 18º, Artº. 20º, Artº 26º e Artº 204º da Constituição da República Portuguesa".

Por despacho de 25 de Novembro de 1997, foi a reclamação indeferida pelo Presidente da Relação de Coimbra e, não tendo sido deferido o pedido de esclarecimento que o então reclamante solicitara relativamente a tal despacho, veio o impugnante A. C. dele interpor recurso para o Tribunal Constitucional, fundando-se na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, pretendendo a apreciação da inconstitucionalidade da interpretação do artº 129º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e da Falência, aprovado pelo Decreto-Lei nº 132/93, de 23 de Abril.

2. Determinada a feitura de alegações, concluiu o recorrente a por si produzida do seguinte modo:-

"PRIMEIRA: Por efeito da Sentença Declaratória da Falência proferida

em Processo Especial de Recuperação da Empresa e da Falência, desencadeiam-se consequências jurídicas que importam a supressão, limitação ou restrição de direitos fundamentais do cidadão/falido, constitucionalmente previstos e protegidos, designadamente o direito à capacidade civil (Artº. 26º da CRP); o direito ao desenvol- vimento da personalidade humana (Artº. 26º da CRP); o direito ao bom nome e reputação (Artº. 26º da CRP); o direito à reserva da intimidade da vida privada (Artº. 26º da CRP); o direito à inviolabilidade da correspondência (Artº. 34º da CRP); o direito à liberdade (Artº. 27º da CRP); o direito à propriedade privada (Artº. 62º da CRP).

SEGUNDA: O Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e da Falência (Dec.-Lei nº 132/93), enquanto LEI RESTRITIVA daqueles direitos fundamentais, estava sujeito à RESERVA DE LEI RESTRITIVA prevista no Artigo 165º, nº 1 alínea b) da CRP.

TERCEIRA: A autorização legislativa que a Assembleia da República concedeu ao governo através da Lei nº 16/92, de 6 de Agosto, limitou-se a autorizar o governo a determinar a inibição do falido para o exercício do comércio.

QUARTA: Tal autorização não define o objecto, o sentido e a extenção de qualquer outra restrição áqueles direitos fundamentais.

QUINTA: Os efeitos e consequências juridicas decorrentes para o falido da Sentença Declaratória da Falência que afectem ou restrinjam os demais direitos fundamentais enunciados, não são aplicáveis por estarem feridos de inconstitucionalidade.

SEXTA: A Sentença Declaratória da Falência tem efeitos sancionatórios para o falido e afecta gravemente os seus direitos fundamentais.

Sem prescindir.

SÉTIMA: O direito ao Recurso, nos casos como os dos presentes autos, em que se está perante um acto jurisdicional de cariz sancionatório e que também afecta, comprime ou restrinje direitos fundamentais, goza de protecção constitucional como emanação do princípio da tutela jurisdicional efectiva, previsto no Artº. 20º da CRP, e é corolário do princípio do estado de direito democrático, plasmado no Artº. 2º da CRP.

OITAVA:A interpretação do Artº 129º do CPEREF e do sistema do Código em geral, no sentido da interdição ou proibição do RECURSO DA SENTENÇA DECLARATÓRIA DA FALÊNCIA, viola os princípios e normas constitucionais enumeradas na conclusão anterior;

NONA: No sentido em que o DIREITO AO RECURSO DA SENTENÇA DECLARATÓRIA DA FALÊNCIA constitui uma garantia contra um acto jurisdicional que restringe fortemente direitos e liberdades, a supressão desse DIREITO AO RECURSO só podia ser constitucionalmente válida se a Assembleia da República tivesse autorizado o governo a legislar com esse sentido e alcance ? o que não sucedeu.

DÉCIMA: A simplificação do processado, que é o argumento do legislador para suprimir o Direito ao Recurso da Sentença Declaratória da Falência, não constitui um Bem Jurídico com relevância constitucional que se sobreponha à protecção e garantia da intangibilidade dos direitos fundamentais em causa, mediante o recurso com efeitos suspensivos da sentença que decretou a falência.

DÉCIMA PRIMEIRA: O entendimento contrário, ou seja, conferir relevância a uma sentença com características precárias e condicionais, atribuindo-lhe efeitos executórios imediatos por supressão do direito ao recurso, por razões de mera simplificação processual, constituiria uma carga coactiva desmedida, desajustada, excessiva e desproporcionada, sobre os direitos, liberdades e garantias efectivas.

DÉCIMA SEGUNDA: Tal entendimento viola fundamentalmente o...

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