Acórdão nº 486/98 de Tribunal Constitucional (Port, 02 de Julho de 1998

Magistrado ResponsávelCons. Sousa Brito
Data da Resolução02 de Julho de 1998
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 486/98

Proc. nº 166/98

Cons.Sousa e Brito

(Cons.Messias Bento)

Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório:

1. J. B. recorre, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 8 de Outubro de 1997, que negou provimento ao recurso por si interposto do acórdão da 4ª Vara Criminal do Porto, que o condenou a 16 (dezasseis) anos de prisão efectiva, como autor material de um crime de tráfico agravado de estupefacientes (previsto e punível pelos artigos 21º, nº 1, e 24º, alíneas b), c) e j), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro) e de um crime de branqueamento agravado (previsto e punível pelos artigos 23º, nº 1, e 24º, alíneas b), c) e j) do mesmo Decreto-Lei nº 15/93).

Pretende ver apreciada a inconstitucionalidade das seguintes normas:

(a). dos artigos 410º, nº 2, e 433º do Código de Processo Penal;

(b). do artigo 129º, nº 1, do mesmo Código;

(c). do artigo 374º, nº 2, do dito Código;

(d). do artigo 1º, nº 1, alínea f), do citado Código;

(e). dos artigos 21º, nº 1, 23º, nº 1, e 24º, alíneas b), c) e j), do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro.

Alega o recorrente que "a questão das inconstitucionalidades foi suscitada, quer na motivação, quer nas alegações de recurso do acórdão".

Neste Tribunal, o recorrente apresentou alegações, formulando as seguintes conclusões:

  1. Só através dos factos provados e não provados se poderá aferir qualquer dos vícios previstos no art. 410º, al. b) e c) do C.P.P., quanto ao texto decisório.

  2. No Acórdão da 1ª instância não se vislumbra a fundamentação dos factos não provados, omissão que deveria constituir nulidade conforme art. 379º al. a) do C.P.P.;

  3. Na enumeração dos factos dados como provados e não provados, omitiu o Tribunal matéria alegada pela defesa, mais propriamente no seu artigo 6º a 8º e 18º a 20º da contestação, com interesse para influir na decisão da causa, pelo que foi violado o disposto nos artigos 32º nº1 e 5 da C.R.P.;

  4. Quer o Tribunal da 1ª instância quer o S.T.J. ao confirmar aquele Acórdão decidindo que a 1ª instância tinha feito aplicação correcta das normas contidas no artigo 374, fez errada interpretação das normas contidas naquele preceito porque violadoras do artigo 32º nº 1 e 5 da CRP no sentido em que foram aplicadas pelas anteriores instâncias, estando feridas de inconstitucionalidade material.

  5. O Acórdão deu como provado determinados factos que nem sequer constam da acusação ou da pronúncia e com os quais o arguido não foi confrontado, impedindo-o pois de exercer o contraditório;

    Nem se constacta da acta do julgamento que tivesse sido dado cumprimento ao vertido nos artigos 358º, 359º do C.P.P.;

  6. Por que os factos foram vertidos no acórdão, não podem ser inócuos e como tal tiveram interesse para a Decisão, e consequentemente para a condenação do arguido em termos de agravamento da pena aplicada.

  7. O arguido ao não ter tomado anteriormente conhecimento dos factos que influiram para agravar a medida da pena, ainda que dentro da mesma moldura penal, e não se ter podido defender quanto aos mesmos foi prejudicada no seu direito de defesa, artigo 32º nº 1 da CRP; neste sentido Acórdão do Trib. Const. 279/95 e 445/97.

  8. O Acórdão recorrido fundamentou a sua convicção em: relatos de diligências externas, vigilâncias, informações de serviço, declarações e depoimentos escritos e relatos de conversas informais.

    1. Relatos de diligências externas e informações de serviço são meras declarações juntas aos autos pelas testemunhas que entretanto depuseram em audiência, não podendo pois serem consideradas como meios de prova, vedado que é a leitura dos depoimentos das testemunhas fora dos casos legalmente considerados, que ficam a constar de acta, o que não foi o caso.

    2. Foram valoradas conversas informais de fls. 539 a 540, 578 a 580 conforme se verifica a fls. 55 do acórdão, tidas com arguidos enquanto detidos e não presos.

    3. Foram valoradas conversas informais de fls. 738-739 sobre o que se "ouviu dizer" sem identificarem a quem se ouviu dizer e sem as mesmas terem sido confirmadas.

    4. Foram também utilizadas como meios de prova certidões de inquéritos de processos alheios ao presente processo por conterem declarações e depoimentos escritos, referindo-se alguns desses depoimentos a pessoas que nem sequer foram arroladas como testemunhas ou ouvidas nos presentes autos; e outras declarações referem-se aos arguidos, apesar dos mesmos terem estado presentes em audiência.

    5. Nas actas não se verifica que tenha sido dada autorização para a sua leitura e justificação legal nos termos dos artigos 357º e 356º nº 8 do C.P.P.

  9. O Tribunal ao ter formado a sua convicção com base nestes meios de prova, que foram confirmados pelo acórdão do STJ violou os princípios da oralidade, imediação e contraditório, tendo feito errada interpretação do artigo 129º nº 1 do CPP, interpretação essa ferida de inconstitucionalidade material por violação dos princípios consagrados no artigo 32º da CRP.

  10. O arguido foi condenado pela prática do crime p e p artigo 21 nº 1 e 24º al. b), c) e j); e artigo 23º nº 1 al. a) e art. 24º b) c) j) do DL 15/93.

    O arguido praticou o crime de tráfico (art. 21º), obtendo lucros e consequentemente com esses lucros fez compras e pôs em nome de familiares.

    Os dois crimes estão totalmente interligados sendo um causa e outro efeito e fazendo parte do mesmo comportamento.

  11. No caso concreto o crime de branqueamento surge dentro de uma mesma resolução que é o efeito do crime pelo arguido praticado (tráfico de estupefacientes), pelo que só deve ser condenado por um único crime, o mesmo se diga quanto às agravantes porque foi duplamente condenado quanto a ambos os crimes.

  12. Todavia e mesmo que assim se não entenda, tendo a arguido sido condenado pelo crime p e p art 23º com a agravante da al. j) do art. 24º do DL 15/93 deixará esta agravante de subsistir, na medida em que os restantes membros que com ele constituíram o bando dele foram absolvidos, em virtude de terem sido absolvidos do crime p e p do artigo 23º, donde concluir que não pode continuar a militar contra o recorrente a agravante da al. j).

  13. Tendo o arguido sido duplamente condenado quanto aos crimes e às agravantes violou o Tribunal o princípio consignado no nº 5 do art. 29º da CRP, ou seja o princípio "Ne bis in idem".

  14. O arº 410º não permite o reexame da matéria de facto;

    As alíneas do nº 2 do artº 410º, circunscreve a reapreciação de facto ao "texto da decisão recorrida";

  15. Não sendo os factos quesitados, não permitem que se descubra o vício mesmo quando a decisão em si enferma de irregularidades na ponderação da prova recolhida em audiência;

  16. Quando a matéria de direito de não apresenta como controversa o cidadão recorrente encontra limitado na sua legítima expectativa de ver o seu caso reexaminado sob o aspecto fáctico;

  17. As disposições combinadas dos arts. 432º, al. c) 433º, 410º, nºs 2 e 3 do C.P.P. estão feridas de inconstitucionalidade por violação do duplo grau de jurisdição ex vi artº 32º, nº 1, da C.R.P. artº 11º, nº 1 da Declaração Universal dos Direitos do...

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