Acórdão nº 253/98 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Março de 1998

Magistrado ResponsávelCons. Ribeiro Mendes
Data da Resolução05 de Março de 1998
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 253/98

Proc. nº 563/96

  1. Secção

Rel: Cons. Ribeiro Mendes

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:

I

1. H..., procurador-geral adjunto, residente na Rua Alexandre Ferreira, nº 34, 7º Esquerdo, em Lisboa, veio interpor, em 13 de Novembro de 1995, recurso contencioso da deliberação do júri do concurso curricular para recrutamento de juízes do Tribunal de Contas, dirigindo este recurso ao plenário deste último Tribunal, em obediência ao disposto no art. 37º, nº 3, da Lei nº 86/89, de 8 de Setembro, mas suscitando logo a questão da inconstitucionalidade dessa norma atributiva de competência para conhecer do recurso. Pediu a anulação da deliberação do júri que procedeu à classificação final dos candidatos, no concurso aberto por aviso publicado na 2ª Série do Diário da República de 20 de Abril de 1995, invocando que a actuação do júri fora "violadora da legalidade e ofensiva dos princípios da igualdade, de proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade, e ainda da transparência administrativa e do precedente administrativo, de que resultou como causa directa e necessária enfermar a deliberação de classificação final do candidato de erro de facto quanto aos pressupostos e dos vícios de forma, pela preterição de formalidade essenciais na formação e manifestação da vontade e pela não fundamentação" (a fls. 21).

Instruiu esta petição de recurso com 30 documentos, requerendo a citação do Tribunal de Contas na pessoa do seu Presidente, e, de entre os 17 candidatos admitidos, a citação dos candidatos graduados do 1º ao 11º lugares, ou seja, dos candidatos graduados antes do recorrente, em função dos valores atribuídos segundo o mérito relativo.

Conclusos os autos ao relator, ordenou este, por despacho proferido em 22 de Novembro de 1995, que os mesmos fossem a visto do Ministério Público, nos termos e para os efeitos do nº 1 do art. 173º do Estatuto dos Magistrados Judiciais (abreviadamente EMJ; Lei nº 21/85, de 30 de Julho), aplicável por força do disposto no art. 37º, nº 3, da Lei nº 86/89, de 8 de Setembro.

O Ministério Público exarou parecer, a fls. 394 vº, onde sustentou que o recurso contencioso seria extemporâneo, por ter sido interposto fora do prazo de 30 dias, conforme dispunha o art. 169º, nº 1, do Estatuto referido, e por não ter sido requerido prazo nos termos do art. 172º, nº 4, desse diploma, sendo aplicáveis as referidas normas do Estatuto dos Magistrados Judiciais por força do art. 37º, nº 3, da Lei nº 86/89 e dado que, tratando-se de lei especial, afastava a Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (Decreto-Lei nº 267/85, de 16 de Julho).

Em seguida, o relator elaborou exposição onde considerou ser manifesto que o nº 3 do art. 37º da Lei Orgânica do Tribunal de Contas (Lei nº 86/89, de 8 de Setembro) não sofria de inconstitucionalidade material ou orgânica e, por outro lado, sustentou que o recurso havia sido interposto de forma extemporânea, atento o disposto no art. 169º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, norma aplicável por força do art. 37º, nº 3, da Lei Orgânica do Tribunal de Contas, sendo certo que aquele Estatuto fora publicado depois da Lei de Processo nos Tribunais Administrativos (a fls. 395 a 399). Não foi ordenada a notificação do recorrente para se pronunciar sobre essa exposição.

Por acórdão de 21 de Dezembro de 1995 e pelas razões constantes da exposição do relator, o plenário do Tribunal de Contas decidiu, por maioria, não tomar conhecimento do recurso. Em declarações de voto de alguns juízes suscitou-se também a questão de falta de quorum de juízes para deliberar validamente, de harmonia com o disposto no nº 2 do art. 23º da Lei nº 86/89.

Notificado deste acórdão, veio o recorrente arguir a nulidade do mesmo, invocando a falta de fundamento da decisão, a omissão de pronúncia sobre certas questões, a proibição de elaboração de acórdãos per relationem e outros vícios. No requerimento de arguição de nulidade, e para a hipótese de improceder a mesma, o recorrente sustentou que a norma constante do nº 4 do art. 172º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, "e porque houve recurso aos meios facultados pelos arts. 82º-2 e 85º LP [Lei do Processo nos Tribunais Administrativos], padece de inconstitucionalidade na interpretação e aplicação vasadas na decisão sobre a intempestividade do recurso contencioso, o que se invoca para efeitos do disposto no art. 280º-1, b) e nº 4 C. Rep. e art. 70º-1, b) e nº 2 do L. nº 28/82, de 15/11, sendo esta a primeira oportunidade para semelhante arguição" (a fls. 428 dos autos). Este requerimento deu entrada no Tribunal de Contas em 26 de Janeiro de 1996.

Logo em 30 de Janeiro de 1996, o recorrente veio, por mera cautela, interpor recurso da decisão de 21 de Dezembro de 1996 - para a hipótese de a arguição de nulidade não vir a ser apreciada - indicando como questão de inconstitucionalidade objecto daquele as respeitantes às normas dos arts. 37º, nº 3, da Lei nº 86/89 e 172º, nº 4, do Estatuto dos Magistrados Judiciais (fls. 432). Através de complemento a esse requerimento apresentado em 5 de Fevereiro, acrescentou um ulterior fundamento ao juízo de inconstitucionalidade por ele formulado quanto à segunda destas normas.

Por acórdão de 5 de Junho de 1996, o plenário geral do Tribunal de Contas julgou por maioria "totalmente improcedente a arguição de nulidade oposta pelo recorrente ao acórdão aprovado em sessão de 21 de Dezembro de 1995" (a fls. 446 a 456).

A fls. 458, foi admitido o recurso para o Tribunal Constitucional.

2. Subiram os autos ao Tribunal Constitucional.

Foi fixado prazo de 10 dias ao recorrente, ao Presidente do Tribunal de Contas e aos onze candidatos opositores ao concurso para, sucessivamente, alegarem no presente recurso.

Apenas apresentaram alegações o recorrente e o Presidente do Tribunal de Contas.

O recorrente formulou as seguintes conclusões:

"1.1 - O recurso de constitucionalidade destina-se a ajuizar se certa norma jurídica infraconstitucional, que foi aplicada ou uma interpretação pela decisão recorrida é conforme à Constituição ou viola algum dos seus preceitos ou princípios;

1.2 - É objecto deste recurso a inconstitucionalidade das normas constantes do nº 3 do art. 3[7]º da L. nº 86/89, de 8/9 e do nº 4 do art. 172º da L. nº 21/85, de 30/7 (EMJ);

1.3 - As normas em causa foram na oportunidade, no 1º momento possível, arguidas pelo recorrente de inconstitucionais, por si ou na interpretação que o tribunal delas fez.

2.1 - Tanto os preceitos constitucionais como a lei ordinária, por interpretação gramatical ou racional ou das fontes, limitam a competência do TContas, exclusivamente, à área da fiscalização financeira do Estado e de outros entes públicos. Por outro lado,

aquando da discussão do respectivo diploma orgânico na AR não foi prevista e jamais se questionou a competência de excepção do TContas para o julgamento de recursos contenciosos de anulação, pelo que

a norma constante do nº 3 do art. 37º da L. nº 86/89 está em oposição aos arts. 216º e 214º-3 e 168º-1, q) CRep., e também aos arts. 1º, 8º, 9º e 24º e ainda 28º-1, g) do primeiro diploma, todos de valor reforçado relativamente àquele nº 3, e ainda aos arts. 26º-1, d) do d.l. nº 129/84, de 27/4;

2.2 - A referida norma, ao atribuir competência ao Plenário Geral do TContas para o julgamento dos recursos contenciosos dos actos relativos aos concursos e à nomeação dos juízes deste tribunal, traduz-se, na prática, na instituicionalização de foro pessoal e na criação de um tribunal especial,

o que viola o estatuído nos arts. 13º-2 e 211º CRep.;

2.3 - A norma constante do nº 3 do art. 37º cit., na interpretação feita, ao permitir que o tribunal a quo invadisse a competência que fora exercída pelo tribunal administrativo de círculo, estabilizadamente,

com fundamento em que é o Plenário Geral do TContas o único interventor em tudo quanto ao concurso respeita, mesmo que para providências anteriores ao intentar do recurso contencioso de anulação,

afronta os preceitos constitucionais da distribuição de competências pelos diferentes tribunais e o princípio constitucional da imperatividade e prevalência das decisões judiciais transitadas em julgado, em violação do art. 208º-2 e dos art. 216º e 214º-3 CRep.

3.1 - O nº 4 do art. 172º da L. nº 21/85, de 30/7, na interpretação que foi dada pelo acórdão recorrido no sentido de que veda aos candidatos a concurso para juiz do TContas o direito de utilizarem os meios facultados pelos arts. 31º e 82º LPTA

e ao impossibilitar a fundamentação da deliberação do júri e inviabilizando a propositura do pertinente recurso contencioso de anulação devidamente alicerçado,

enferma de inconstitucionalidade, por violação do disposto nos arts. 13º, 17º, 266º e 268º-1, 2 e 3 CRep.;

3.2 - Tal interpretação levou ainda o tribunal a quo, relativamente ao objecto do recurso contencioso, a nem sequer permitir ao recorrente um grau de jurisdição, assim lhe tendo vedado o acesso à justiça,

o que está em contradição com o estatuído nos arts. 20º, 268º-4 e 5 e 207º CRep.;

3.3 - Porque para recursos similares é facultado um 2º grau de apreciação (art. 168º-2 EMJ e art. 26º-d) da L. nº 38/87, de 23/12), a mesma norma do cit. nº 4, pela forma como foi interpretada e aplicada,

viola o princípio da igualdade garantido pelo artº 13º CRep.;

3.4 - A leitura feita pelo acórdão recorrido àquela norma de que não permite lançar mão de outros dispositivos legais alheios às leis nº 86/89 e 21/85,

ao não ter facultado ao interessado o exercício do direito de prévia audição quanto à questão prévia da intempestividade do recurso,

está em contradição com os princípios da CRep., constantes, nomeadamente, dos arts. 3º, 205º-2 e 267º;

3.5 - Esta mesma norma ao permitir que, consoante a interpretação do acórdão recorrido, fosse tratada como res nullius uma decisão do tribunal administrativo de círculo, que conhecera da sua competência e do pedido de intimação e que formou caso julgado formal e material,

viola o...

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